Acórdão nº 215314/09.3YIPRT.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelRUI VOUGA
Data da Resolução10 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO: No dia 28 de Setembro de 2009, a A, com sede na Rua (...), instaurou contra a R, com sede na Estrada (...), procedimento de injunção, a fim de obter título executivo contra esta, pelo montante de € 82 460,00 de capital e € 76,50 de taxa de justiça, com base em trabalhos a mais ditos facturados sob os n.ºs 6 a 9, 11, 18 e 20 a 29, e não pagos por ela, no âmbito de um contrato de empreitada celebrado entre ambas no dia 26 de Janeiro de 2009.

A Requerida deduziu oposição, invocando a ineptidão da petição (por falta de indicação da causa de pedir) e defendendo-se por impugnação (afirmando que, das facturas indicadas no requerimento injuntivo, só recebeu as nºs 6, 8, 9 e 11, que devolveu à Requerente - por não mencionarem o número da encomenda - e que não sabe a que se referem as outras, concluindo que a Autora não realizou, na empreitada ajustada entre as partes, quaisquer trabalhos a mais).

Acedendo ao convite do juiz, a Autora apresentou petição inicial aperfeiçoada, esclarecendo que se tratou da realização para a Ré de trabalhos de empreitada na fábrica da (...) em Setúbal e especificando o conteúdo das mencionadas facturas e pedindo - a final - a condenação da Ré a pagar-lhe € 82 460,00 e juros de mora desde a citação.

A Ré contestou, negando ter solicitado à Autora trabalhos a mais na execução do contrato de empreitada da construção civil ou que ela os tivesse realizado, concluindo no sentido de nada lhe dever.

Findos os articulados, teve lugar uma audiência preliminar, na qual foi julgada prejudicada a questão da ineptidão da petição inicial e, no mais, proferido despacho saneador tabelar e seleccionados os factos assentes (por acordo das partes e por documentos dotados de força probatória plena) e os controvertidos entre as partes.

No início da audiência de julgamento, foi ordenada a correcção de alguns pontos da base instrutória e a supressão do respectivo artigo/quesito 39.º.

Após a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença (datada de 15/11/2013) com o seguinte teor decisório: «Pelo exposto, julgando procedente a ação: 1. Condeno a Ré R a pagar à Autora A a quantia de oitenta e dois mil e quatrocentos e oitenta e seis euros, acrescidos de juros desde a citação às taxas acima referidos e as que foram posteriormente fixadas.

  1. Condeno a Ré no pagamento das custas da ação.

  2. Fixo o valor da ação em 82 460 € (artigo 306º, nº1 do Código de Processo Civil).» Inconformada com o assim decidido, a Ré apelou da referida sentença, tendo rematado as concernentes alegações com as seguintes conclusões: “1- Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida a fls ___dos autos que correm termos no 1º Juizo do tribunal Judicial da Moita sob o numero 215314/09.3YIPRT com a qual a Ré agora Apelante , salvo o devido respeito , não se poderá conformar .

    .2- O presente recurso tem como objeto quer a alteração à matéria de facto por via de reapreciação da prova gravada e de todos os demais elementos probatórios constantes dos autos , quer da alteração da matéria de direito , pretendendo a ora Apelante , mais concretamente .a) impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos previstos no nº 1 do artº 685 B do CPC , adiante especificando em concreto os pontos de facto que considera incorretamente julgados, assim como os concretos meios probatórios , constantes do processo que impôem decisão diversa da ora recorrida ; b) Pugnar pela alteração do teor da sentença proferida com base nos depoimentos prestados e na matéria dada como provada nos presentes autos e bem assim o sentido com que as normas que constituem fundamento jurídico da presente decisão deveriam ter sido interpretadas e concretamente aplicadas .

    3- Da apreciação de toda a prova documental constante dos autos operada em sede de audiência de julgamento entendeu o douto tribunal a quo dar como provados factos que fundamentaram a sentença e identificados a II dos factos provados da sentença e com relevância para a decisão : .3.1- Deverá ser reapreciada a prova , quer por audição das gravações das testemunhas , quer pelos documentos juntos aos autos de sendo alterada a matéria dada como provada e não provada .

    .a- Os quesitos 2,17,20,23,35,37 deveriam ser dados como provados que os trabalhos realizados foram para cumprimento do contrato inicial ; .b- quesitos 36 provado que parte do trabalho na casa compressores foi trabalho pedidos a mais ,assim como parte do trabalho colocação da vedação -quesito 14.

    .c- Quesitos 8, 26, 29, apenas provado que parte trabalhos foram realizados e que foram deixados por terminar .

    .d- dar como provados os quesito 56, 72, 73 e 74 .

    4- Os contratos de empreitada ( obra nova ) quesito 8 e 9 teriam que ter forma escrita por serem de valor superior a 16 600€ nos termos do disposto no artº 29 do dec.lei 12/2004 e por não terem sido reduzidos a escrito serem considerados nulos .

    .5- O orçamento é uma previsão de custos e no caso foram enviados orçamentos de trabalho que já teriam sido realizados , não se trata de orçamentos e não foram aceites os custos pela aqui recorrente.

    .6- Reapreciando a prova e alterando-se factos dados como provados , concluindo-se que os trabalhos realizados não foram como trabalhos a mais decorrentes da empreitada inicial e que não foram acordados deverá alterar -se douta sentença .

    .7- De modo que, ressalvando , o devido respeito que é muito , deverá ser concedido provimento ao presente recurso , alterando -se resposta á matéria de facto e absolvendo-se a Ré dos pedidos formulados , Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso.” A Autora/Apelada não apresentou contra-alegações, no recurso interposto pela Ré da sentença condenatória contra si proferida.

    Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    O OBJECTO DO RECURSO: Como se sabe, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintéctica, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 639º, nº 1, do C.P.C. de 2013) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem .

    Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 635º, nº 3, do C.P.C. de 2013), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 4 do mesmo art. 635º) . Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.

    Por outro lado, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, i.é., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo.

    Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5º, nº 3, do C.P.C. de 2013) – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respectivo objecto, exceptuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras (art. 608º, nº 2, do C.P.C. de 2013, ex vi do art. 663º, nº 2, do mesmo diploma).

    No caso sub judice, emerge das conclusões da alegação de recurso apresentada pela Ré ora Apelante que o objecto da presente Apelação está circunscrito às seguintes questões: a) Se o tribunal “a quo” julgou erradamente a matéria de facto, no que respeita aos Quesitos 2º,17º, 20º, 23º, 35º e 37º [apenas deveria ter sido dado como provado que os trabalhos realizados foram para cumprimento do contrato inicial], no que concerne aos Quesitos 36º [apenas ficou provado que parte do trabalho na casa compressores foi trabalho pedido a mais] e 14º [somente ficou provado que uma parte do trabalho de colocação da vedação foi trabalho pedido a mais], no que se refere aos Quesitos 8º, 26º e 29º [apenas ficou provado que parte dos trabalhos foram realizados e que foram deixados por terminar] e ao considerar não provados os Quesitos 56º, 72º, 73º e 74º da Base Instrutória; b) Se os contratos de empreitada (obra nova ) a que respeitam os quesitos 8º, 26 e 29º terão de ser considerados nulos, por não terem sido reduzidos a escrito – como impõe o artº 29º do Dec.Lei nº 12/2004, de 6 de Janeiro -, visto serem de valor superior a 16 600,00€; c) Se, uma vez alterada a matéria de facto fixada em 1ª instância, nos termos preconizados pela Ré ora Apelante, terá de se concluir que os trabalhos realizados não o foram como trabalhos a mais decorrentes da empreitada inicial e que não foram acordados entre as partes (porquanto, no caso, apenas foram enviados orçamentos de trabalhos que já teriam sido realizados - não se tratando, pois, de verdadeiros orçamentos - e não foram aceites os custos pela ora Recorrente), pelo que a Ré deverá ser absolvida dos pedidos condenatórios contra ela deduzidos pela Autora.

    MATÉRIA DE FACTO: Factos Considerados Provados na 1ª Instância: Devidamente ordenados, segundo uma sequência lógica e cronológica, os factos que a sentença recorrida elenca como provados são os seguintes: 1. Por adjudicação direta efetuada pela ré à autora, foi atribuída a esta, em 2008, uma empreitada de construção civil, na fábrica da (...), em Setúbal, mediante o pagamento por aquela do respetivo preço.

  3. Os trabalhos referidos em 1 consistiram na: - Execução do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT