Acórdão nº 253/11.9TBVZL.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DO ROS
Data da Resolução03 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa 1-Relatório: A autora, (...) intentou acção de reconhecimento e investigação de paternidade, com processo ordinário, contra os réus, (...), peticionando que seja reconhecido que a autora é filha legítima de (...) e de (...), que seja oficiado à Conservatória do Registo Civil para averbamento da ascendência completa e que seja declarado nulo o procedimento simplificado de habilitação de herdeiros com o nº (...) elaborado na Conservatória do Registo Civil de (...).

Alega para tanto, que nasceu do relacionamento sexual havido entre o falecido (...) e a sua mãe e que o falecido sempre tratou a A. como filha.

Citados os Réus, veio o réu AM impugnar a matéria alegada pela autora, dizendo ainda que desconhecia a existência da autora, concluindo pela improcedência da acção.

Também o réu EA contestou, arguindo a incompetência territorial do tribunal de (...) e impugnando os factos alegados pela autora, concluindo também pela improcedência da acção.

O réu AC também contestou reproduzindo o já referido nas demais contestações e arguindo ainda a caducidade da acção., Concluiu pela improcedência da acção. A A. replicou mantendo o alegado e dizendo que a acção foi interposta no prazo de um ano desde a data em que teve conhecimento da morte do pai, sendo que tal direito é imprescritível.

Por despacho proferido a fls. 110 dos autos, foi julgada procedente a incompetência do tribunal em razão do território e ordenada a remessa dos autos, ao Tribunal competente. Foi proferido despacho saneador, com a elaboração dos factos assentes e pertinente base instrutória.

Por despacho proferido a fls. 220 dos autos foi julgada improcedente a excepção de caducidade invocada.

Prosseguiram os autos, vindo a final a ser proferida sentença, com o seguinte teor na sua parte decisória: «Por tudo o exposto, julga-se a presente acção, procedente e, em consequência:

  1. Reconhece-se judicialmente (...), como filha de (...) e de (...), devendo ainda figurar como avoenga paterna (...) e (...); b) Declara-se a nulidade do procedimento simplificado de habilitação n° (...), datado de 15709/2010, elaborado na Conservatória do Registo Civil de (...).

    Ordeno a comunicação à Conservatória do Registo Civil de (...), da decisão ora proferida, após trânsito, por meio de certidão, a fim de se proceder ao devido averbamento ao assento nº (...).

    Inconformado recorreu o réu EA, concluindo nas suas alegações: I - Foram incorretamente julgados como provados os seguintes pontos da matéria de facto: 6. Nessa propriedade, numa casa da herdade onde ficavam alojados os trabalhadores, entre os quais a mãe da A., esta manteve relações sexuais com (...); 7. Em finais de Junho de 1952, a mãe da A. e o falecido mantiveram relações sexuais de cópula completa; 8. Foi em consequência de tais relações sexuais que a A. foi gerada; II - Os depoimentos das Testemunhas JCC [00:12:51 a 00:13:07 e 00:13:58 a 00:14:25], de JC [00:06:24 a 00:07:00] e AC [00:02:31 a 00:03:23 e 00:17:05 a 00:17:16] impunham que tais pontos devessem ter sido julgados como não provados.

    III - Foi igualmente incorretamente julgado como provado que: 10. Na localidade onde a A. vive sempre foi reconhecido que (...) era pai da A.

    IV - Os depoimentos das Testemunhas MC [00:02:01 a 00:03:00], MA [00:01:34 00:02:16] e Maria L [00:02:06 a 00:03:00] impunham que tais pontos devessem ter sido julgados como não provados impunha antes que se desse como provado que: 10. Na localidade onde a A. vive sempre se disse que (...) era pai da A.

    V - Igualmente para dar como provado o ponto 7 e 8 da matéria de facto não se pode considerar da análise crítica efetuada à prova pericial a mesma como relevante, porquanto:

  2. Os resultados baseiam-se num conjunto de procedimentos em que devem ser observadas as legis artis reconhecidas pela comunidade científica e que estão tipificadas em procedimentos padrão, reconhecidos como válidos no âmbito da normalização; b) Para a realização dos exames de genética forense foram efetuadas recolhas de material genético que não foram efectuadas no âmbito de procedimentos certificados; c) Pelo que da análise crítica de tal prova resulta ter sido obtida fora dos procedimentos científicos reconhecidos como válidos pela comunidade científica; d) A prova pericial não obsta a que o juiz possa analisar o processo de aquisição de conhecimento dos peritos e aderia ou rejeite o mesmo; e) Ambas as partes reconhecem não ser possível analisar esse processo porquanto, como pareceres técnicos que juntam, referem a necessidade de fazer acompanhar o relatório dos Senhores peritos das análises dos cromotrogramas para que se possam retirar conclusões; VI - Ao considerar nulo o procedimento simplificado de habilitação sem que para isso tenha fundamentado a base legal para a referida nulidade a sentença é nula por violação dos disposto no art.º 615.º, n.º 1 al b) do CPC.

    VII - Consistindo a falsidade no facto de um determinado documento ser fabricado, forjado, alterado ou dele constar de forma abusiva uma assinatura ou, no ponto de vista penal, em se fazer constar dolosamente de documento facto juridicamente relevante, o que não ocorre não é falso o acto de habilitação de herdeiros; VIII - O correcto julgamento da prova produzida, que se impõe pelas razões expostas, determina a improcedência da ação por não provada; IX - Ainda que se entendesse proceder a ação, os efeitos da paternidade deverão se restringir à natureza pessoal da mesma restringindo-se os efeitos patrimoniais da mesma, porquanto se assim não fosse a inconstitucionalidade do disposto no art.º 1871.º do CC, traria uma clara violação dos princípios da confiança e segurança jurídica, permitindo a alguém poder eternamente exercer um direito com importantes consequências patrimoniais; X - Alegando a A. sempre ter sabido quem era o seu pai e decorridos quase 40 anos sobre a sua maioridade, só vir pedir o estabelecimento da paternidade, após a morte do pretenso pai e peticionando logo a nulidade de um processo sucessório em curso configura uma situação de abuso do direito na modalidade de supressio, violando a sentença recorrida o disposto no art.º 334.º do CC ao não reconhecer a mesma e ao permitir que o reconhecimento da paternidade tenha outros efeitos que não o efeito de atribuir à A. o direito ao uso do nome paterno e satisfazendo assim o seu direito à identidade que determinou o julgamento de inconstitucionalidade do disposto no art.º 1871.º do CC.

    Também inconformado recorreu o réu AC, concluindo nas suas alegações: 1- As questões suscitadas no presente recurso prendem-se essencialmente com: I) A Caducidade do Direito de Acção, como excepção peremptória extintiva do direito invocado pela A.; II) No que respeita ao julgamento da matéria de facto: O excesso da matéria de facto dada como provada, no que concerne a relações sexuais entre o pretenso pai com a mãe da A., em face dos meios de prova e da prova produzida, por um lado. Por outro, a junção aos autos de elementos na posse do INML necessários para valorar o Relatório Pericial produzido e a realização de segunda perícia, que o ora R. entende que o tribunal devia oficiosamente ter ordenado. III) No que respeita ao direito: Os efeitos da insuficiência de prova da Posse de Estado; O Abuso de Direito, como causa impeditiva dos efeitos (alguns) pretendidos pela Autora.

    1. O art° 1817° do C. Civil, com a redacção introduzida pela Lei nº 14/2009, de 1 de Abril, aplicável por força do art° 1873° do mesmo diploma, estabelece um prazo regra (nº 1) e prazos especiais (nº 3, ais a), b) e c), consoante a causa de pedir da acção de investigação da paternidade seja directamente o vínculo biológico ou as presunções legais do art. 1871 ° do CC.

    2. Contrariamente ao preconizado no despacho de 20/09/2012 em abono da tese da imprescritibilidade deste tipo de acções, o direito de investigação da paternidade mostra-se caducado por força do nº 1 do art° 1817°, com a redacção introduzida pela Lei nº 14/2009, de 1 de Abril, o qual dispõe que a acção de investigação só pode ser proposta durante a menoridade do investigante ou nos dez anos posteriores à sua maioridade ou emancipação.

    3. Não resultando provada a Posse de Estado, nunca poderia ter aplicação no caso o disposto na al b) do nº 3 do art. 1817° do C.Civil, como eventualmente a A. poderia pretender, ao considerar a morte do pretenso pai como causa de cessação do tratamento como filha pelo pretenso pai.

    4. O Acórdão do Tribunal Constitucional nº 23/2006, publicado no Diário da República, I-A Série, nº 28, de 2006-02-08, a que alude o douto aresto, ao declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do nº 1 do artigo 1817° do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873° do mesmo código, reportou-se à redacção anterior daquela disposição legal, na medida em que esta previa, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante.

    5. Contrariamente ao afirmado na sentença sob recurso a jurisprudência dominante mais actual, quer do Tribunal Constitucional, quer do Supremo Tribunal de Justiça é também no sentido da constitucionalidade da referida disposição legal com a redacção vigente, introduzida pela Lei nº 14/2009. (vide Ac. do Tribunal Constitucional (Plenário) - Proc. 401/2011 (JusNet 4516/2011); Ac. do TC de 22.5.2012- Processo nº 638/10 - (JusNet 677/2009); Ac. do TC nº 247/2012 (Jusnet 3082/2012 de 22/05/2012) e Acórdãos do STJ de 29/11/2012, Proc 367/10.2TMCBC- A.G1.S1 (Jusnet 7305/2012), de 9/04/2013 - Proc 187/09.7TBPFR.P1.S1 (JusNet 1855/2013) entre outros.

    6. O despacho de 20/09/2012 viola por erro de interpretação o disposto no art° 1817° nº 1 do C. Civil, na sua actual redacção, decidindo prematuramente a excepção, sem declarar expressamente, como devia, se a norma em questão é ou não constitucional.

    7. Não resultou da instrução/discussão da causa a prova dos factos constantes de 6,7,8...

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