Acórdão nº 1925/10.0TBTVD.L1.-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelEZAG
Data da Resolução05 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I - A, casado com B, intentaram ação declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra C e mulher, D, pedindo a condenação dos RR. a:

  1. Reparar todos os defeitos de construção e de quebra de garantia de boa qualidade, reclamados pelos Autores no imóvel que identificam, bem como dos que venham a detetar-se no decurso do prazo de garantia ou, em alternativa, a pagar-lhes todas as despesas necessárias a essas reparações.

  2. Indemnizar os Autores pelos danos patrimoniais já suportados ou que venham a suportar, até efetiva reparação dos defeitos do imóvel.

  3. No pagamento de juros vencidos e vincendos.

    Alegando, para tanto e em suma, que por escritura pública de 16.08.2006, os AA. compraram aos RR. o prédio urbano sito Réus, um contrato de compra e venda do prédio urbano – moradia – sito no lugar de Ameal, freguesia de Ramalhal, concelho de Torres Vedras, que melhor identificam.

    Desde o início da ocupação do prédio pelos Autores, que se vêm verificando defeitos de construção vários, que referenciam, e que têm afetado, para além do mais, a salubridade do Prédio e diminuído a sua normal fruição por banda dos Autores.

    Os quais têm procurado, insistentemente, junto dos Réus, solução para tais anomalias que os afectam, mas não lograram êxito.

    Em Agosto de 2009, o Autor A, efetuou o destrate da hipoteca no Millennium BCP, sendo, por via dos defeitos acima aludidos, forçado a contrair uma nova hipoteca, esta no valor de trinta mil euros, para obras na moradia em apreço, por forma a minimizar e corrigir os defeitos.

    Desde que os Autores adquiriram a habitação e a sua viatura, em 2006, nunca a conseguiram guardar, como desejável na garagem, devido à localização desta e configuração do acesso à mesma, sendo que desde essa data a dita viatura tem de permanecer ao sol e chuva com os danos daí decorrentes.

    Mais ainda, acabam os Autores de ser notificados pelos SMAS de T. Vedras de que devem pagar quantia superior a 400 euros para trabalhos de saneamento pois que a fossa do quintal nunca foi pelos RR ligada à rede pública.

    Contestaram os RR., arguindo a ilegitimidade do A., por… litigar desacompanhado de sua mulher; a caducidade do direito invocado por aquele, na circunstância de serem já decorridos, aquando da propositura da ação, os prazos previstos nos n.ºs 2 e 3 do art.º 1225º, do Código Civil, nem sequer constituindo alguns dos invocados defeitos…defeitos de construção “nos termos supostos pelo n.º 1 do artigo 1225º do Código Civil.”.

    Deduzindo no mais impugnação.

    E rematando, “sem prejuízo da defesa elaborada em sede de exceção”, com a improcedência da ação, por não provada, absolvendo-se os RR. de todos os pedidos.

    Houve réplica do A., requerendo a intervenção principal provocada de sua mulher, B, e sustentando a improcedência das arguidas exceções.

    Por despacho de folhas 80-81, foi admitida a chamada a intervir nos autos, e ordenada a sua citação.

    Deduzindo aquela intervenção, subscrita pela própria, em que, depois de contrariar a versão dos RR., dá conta de aguardar a nomeação de competente patrono oficioso, para ulteriores intervenções.

    Vindo a patrona entretanto nomeada…subscrever o requerimento assim anteriormente apresentado pela interveniente.

    O processo seguiu seus termos, com saneamento e condensação, sofrendo a base instrutória reclamação de banda dos RR., totalmente desatendida.

    Teve lugar a realização de perícia.

    Vindo, realizada que foi a audiência final – em cuja primeira sessão foram aditados dois “quesitos” à base instrutória – a ser proferida sentença que, julgando procedente a exceção perentória de caducidade, absolveu os Réus, “mais julgando prejudicadas as demais questões suscitadas”.

    Inconformada, recorreu a A., formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões: “A. Em 16/08/2006 os AA. adquiriram dos RR. o prédio urbano composto de cave, rés-do-chão, primeiro andar, sótão, anexo e logradouro, sito no lugar de Ameal, freguesia de Ramalhal, concelho de Torres Vedras, descrito na Conservatória do registo Predial de Torres Vedras, sob o n.º ..., da freguesia do Ramalhal e na mesma registada a favor dos Autores pela inscrição G- um e inscrito na matriz sob o artigo nº....

    1. Este prédio foi construído e vendido pelos AA. no exercício da sua actividade comercial de construção e venda de imóveis.

    2. Os AA. ocuparam o imóvel em Setembro de 2006.

    3. Entre Setembro e Dezembro de 2006 apenas foram detectados defeitos ao nível dos azulejos da casa de banho que não estavam à esquadria, do chão da moradia, existindo algumas falhas que estavam pintadas, e da inclinação do lava-loiças.

    4. A partir de Janeiro de 2007, verificou-se uma progressiva manifestação dos restantes defeitos em causa nos presentes autos, F. sendo a partir dessa altura que o A. marido efectuou várias denúncias telefónicas à medida que os defeitos eram constatados.

    5. Tal resulta das declarações do A., bem como da testemunha V.G.

    6. No Verão de 2008, o R. marido deslocou-se ao imóvel, acompanhado da testemunha LTS, tendo reconhecido a existência dos defeitos e acordado a data da reparação.

      I. Os RR. procederam à colocação de isolados (silicones) em 2008, J. de modo a que no início de 2009 a testemunha LTS efectuasse a reparação dos restantes defeitos.

    7. Esta testemunha efectuou, por conta dos RR., reparações ao nível de paredes estuque, pintura e muros exteriores, L. as quais ocorreram nos meses de Janeiro e Fevereiro de 2009.

    8. Decidiu mal o Tribunal a quo ao dar como privado que os defeitos se verificaram logo no início da ocupação (Setembro de 2006).

    9. Em primeiro lugar porque tal é contrário às declarações do A. e da testemunha V.G..

    10. Em segundo, não é compatível com as regras da experiência comum que uma casa vendida em estado de “novo” seja entregue ao comprador apresentando fissuras e rachas nas paredes e muros, bem como defeitos na pintura.

    11. Por outro lado, o Tribunal a quo não procedeu à correcta subsunção dos factos ao direito. Concretamente não identificou correctamente o regime jurídico aplicável, não atribuiu quaisquer efeitos à realização de obras de reparação, nem interpretou corretamente as regras sobre ónus da prova quanto à excepção de caducidade invocada.

    12. O Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril, “transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio, sobre certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas”.

    13. Deste modo, o regime jurídico aplicável ao caso dos presentes autos é, s.m.o., o constante do DL n.º 67/2003, de 08 de Abril, e não o art. 1218.º e ss. do Código Civil, uma vez que os RR. actuaram no exercício da sua actividade comercial.

    14. Nos termos do n.º 4 deste diploma “em caso de desconformidade do bem com o contrato o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação…”, T. direito que pode ser exercido quando o defeito se manifeste nos cinco anos seguintes à entrega do bem – art. 5.º.

    15. De acordo com os n.ºs 2 e 3 do art. 5.º-A do mesmo diploma, o comprador deve denunciar os defeitos no prazo de um ano a contar da data em que o tenha detectado e instaurar a correspondente acção no prazo de três anos a contar da denúncia, sob pena de caducidade.

      V. Prazos esses que, conforme resulta da prova documental e das declarações do A. e da testemunha V.G., foram cumpridos.

    16. Acresce que dispõe o n.º 2 do art. 331.º do C.C. que quando “se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deve ser exercido”.

      X. Face a este preceito, entende o Supremo Tribunal de Justiça que “o reconhecimento, pronto e espontâneo, por parte da Ré do direito do A. à reparação dos defeitos por si reclamados «torna certa a situação, dispensando dessa forma o recurso do dono da obra ao tribunal para obter de forma coerciva aquilo que tem já a certeza de vir a obter de forma voluntária»”.

    17. Como tal, o reconhecimento dos defeitos e a realização de reparações constitui facto impeditivo da caducidade.

    18. Igualmente não decidiu bem o Tribunal a quo ao considerar impender sobre os AA. o ónus de provar a verificação de factos impeditivos da caducidade.

      AA. Não obstante se considerar que tais factos deveriam ser dados como provados, BB. nos termos do n.º 2 do art. 342.º do C.C. a prova dos factos “extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita”.

      CC. Como bem decidiu o Supremo Tribunal da Justiça “(d)e harmonia com as regras do ónus probatório (art.ºs 342.º e ss. do C.C.), será ao empreiteiro ou vendedor que, pretendendo fazer extinguir o direito do dono da obra à eliminação de alegados defeitos, cabe arguir e provar que o direito foi exercitado para além dos prazos supra indicados”.

      DD. Assim, caberia aos RR. provar que os AA. não respeitaram os prazos de caducidade (causa extintiva da caducidade), EE. prova essa que não aconteceu, não podendo a excepção proceder.”.

      Remata com a procedência do recurso, devendo: “a) ser julgada improcedente a excepção peremptória extintiva da caducidade; b) ordenar-se a baixa dos autos de modo a que o MM.º Juiz a quo conheça as restantes questões suscitadas no processo.”.

      Contra-alegaram os Recorridos, pugnando pela manutenção do julgado, e requerendo ainda, “à cautela”, a ampliação do âmbito do recurso, de molde a abarcar a questão da caducidade do direito de ação, aquando da instauração da mesma pelo A.; a insuficiência da matéria de facto para concluir que os defeitos provados devam ser imputados aos Réus; a restrição da denúncia a apenas parte dos defeitos provados; a impossibilidade legal de os AA. realizarem obras para corrigir defeitos e depois virem reclamar dos RR. o pagamento da despesa que fizeram com tal obra.

      Tendo-se a A./recorrente oposto a tal ampliação… Que veio a ser indeferida por despacho do Relator, nos termos que de folhas 440-441...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT