Acórdão nº 54/05.3TABRR-B.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelAGOSTINHO TORRES
Data da Resolução17 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM EM CONFERÊNCIA OS JUÍZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA – 5ª SECÇÃO (PENAL) I-RELATÓRIO 1.1- Por despacho de 24/05/2014, no 2º no juízo criminal de Lisboa, proferido no apenso de liquidação de sentença, foi decidido: “A assistente MS... veio deduzir incidente declarativa contra a Companhia de Seguros X..., S.A., peticionando a sua condenação no pagamento do valor de 35.419,31 euros, em cumprimento da al. d) da decisão proferida nestes autos.

Foi cumprido o contraditório, quanto à excepção da incompetência absoluta deste Tribunal, em função da matéria, tendo-se a assistente pronunciado no sentido de já ter deduzido nos tribunais civis o incidente em causa, mas enxertado em acção executiva, o que mereceu decisão de indeferimento liminar, tal como resulta de fls. 90 e segs..

Cumpre apreciar: O Tribunal proferiu decisão, transitada em julgado nestes autos, no âmbito dos presentes autos de processo comum, com intervenção do tribunal singular, com base no princípio da adesão, arbitrando indemnização à aqui assistente, mas, quanto a parte do pedido, relegando para decisão ulterior, a quantificação e qualificação dos danos derivados do acidente de viação, por futuros e ainda não determináveis, tal como resulta da decisão proferida e para a qual se remete (al. d) da mesma), tudo por via e consequência de ilícita criminal de que a assistente foi vítima.

Nos termos do Artigo 82°, n° 1 do C.P.P. "se não dispuser de elementos bastantes para fixar a indemnização, o tribunal condena no que se liquidar em execução de sentença. Neste caso, a execução corre perante o tribunal civil, servindo de título executivo a sentença penal".

Ora, daqui resulta que o presente Juízo Criminal é incompetente, em termos materiais, para a dedução e apreciação do aludido incidente, sendo-o, ao invés os tribunais cíveis, o que implica incompetência absoluta.

A incompetência em função da matéria (secções especializadas) constitui excepção dilatória, de conhecimento oficioso, até ao inicio da Audiência de Julgamento, que implica a absolvição do Réu da instância (Artigos 576°, n° 1 e 2, 577°, al. a) e 578°, 96°, 97°, n° 2 e 99° todos do C.P.C.).

DECISÃO: Termos em que, face ao exposto, julgo o presente Juízo de Competência Especializada materialmente incompetente para conhecer do incidente deduzido, absolvendo a Ré da instância.” 1.2 – Desta decisão recorreu a demandante civil MS... dizendo em conclusões da motivação apresentada: “I - Não estamos perante um caso de incompetência em razão da matéria por parte do Tribunal "a quo".

- A ora recorrente, lesada e demandante cível no processo crime supra identificado, deduziu pedido de indemnização cível, por adesão ao processo penal; II - Tal pedido de indemnização cível foi julgado procedente, tendo a sentença, na parte decisória, fixado que: " D) Mais condeno a demandada civil "Companhia de Seguros X... SA, a pagar à mesma demandante civil, MS..., o valor que se vier a liquidar em enxerto declarativo atinente às despesas/custos de 2011, suportadas pela demandante civil que se vierem a apurar, despesas conexionadas com elas, valor atinente aos tratamentos médicos, despesas médicas e medicamentosas, e outras despesas /custos conexionados cm a recuperação funcional da demandante civil, bem como o valor que se vier a apurar, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, atinentes à previsível intervenção cirúrgica a que a demandante civil terá que se submeter quanto à articulação tíbio-társica.

" III - A recorrente, deduziu incidente de liquidação, por apenso ao enxerto cível, no processo penal; IV- O incidente, não foi admitido, com fundamento no disposto no artigo 82° n° 1 do C.P.P., porque o Tribunal "a quo" se declarou incompetente em razão da matéria; V - Deduzida acção executiva sob a forma comum para pagamento de quantia certa, calculada por simples cálculo aritmético, foi a mesma indeferida, com fundamento na violação do disposto no artigo 716° n° 5 do C.P.C., no qual se estipula que a liquidação em processo executivo, só ocorre quando não vigore o ónus de proceder à liquidação no âmbito do processo de declaração; VI- O indeferimento liminar da acção executiva, fundamenta-se ainda no facto de a sentença condenatória proferida no processo criminal, remeter a quantificação do valor a indemnizar, para o enxerto declarativo; VII- Face ao indeferimento liminar, renovou a ora recorrente, o seu pedido de prosseguimento do incidente declarativo de liquidação, por apenso e sob a forma de enxerto cível no processo principal; VIII- O Tribunal "a quo" indeferiu o incidente; IX- Decidindo como decidiu, o Tribunal "a quo" violou, entre outros, os seguintes preceitos legais, aplicáveis ao caso: artigos 358° n° 2, 360°, 609°, n° 2, 704° n° 6, 716° n° 4 e n° 5, todos do Código de Processo Civil; X - Ao decidir como decidiu, violou ainda a norma do artigo 102º-A n° 1 da LOFTJ, na redacção que lhe foi dada pela lei 42/2005, de 29/08, ao considerar que o incidente declarativo deve correr sob a forma executiva, a sentença condenatória proferida genéricos, porque não liquidada, não constitui título executivo suficiente para a sua execução junto dos tribunais cíveis.

XI - Violou ainda o principio do Juiz natural.

XII- Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente, e em consequência ser admitido o incidente de liquidação por apenso ao pedido de indemnização cível, que correu termos pelo Tribunal Criminal, prosseguindo os autos os ulteriores termos.” 1.3- Em resposta disse apenas a demandada cível, em síntese : “Negar-se provimento ao recurso porquanto a interpretação do artº 82º nº1 do CPP foi a correcta.” 1.4- Admitido o recurso e remetido a esta Relação, o MºPº limitou-se à aposição de mero visto nos autos.

1.5- Após exame preliminar e vistos legais foram remetidos os autos à Conferência, cumprindo agora decidir.

II- CONHECENDO 2.1-O âmbito dos recursos encontra-se delimitado em função das questões sumariadas pelo recorrente nas conclusões extraídas da respectiva motivação, sem prejuízo do dever de conhecimento oficioso de certos vícios ou nulidades, designadamente dos vícios indicados no art. 410º, n.º2 do CPP [1].

Tais conclusões visam permitir ou habilitar o tribunal ad quem a conhecer as razões de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida[2].

Assim, traçado o quadro legal temos por certo que as questões levantadas no recurso são cognoscíveis no âmbito dos poderes desta Relação.

2.2-Está em discussão para apreciação , em síntese, a seguinte questão: A que tribunal é atribuída a competência para liquidação de quantia certa, prévia a acção executiva, com base em condenação genérica em indemnização por danos futuros arbitrada em processo criminal ou seja, para a tramitação do incidente de liquidação prévia dessa indemnização? 2.3- A POSIÇÃO DESTE TRIBUNAL Dispõe o Artigo 82.º do CPP (Liquidação em execução de sentença e reenvio para os tribunais civis) “1 - Se não dispuser de elementos bastantes para fixar a indemnização, o tribunal condena no que se liquidar em execução de sentença.

Neste caso, a execução corre perante o tribunal civil, servindo de título executivo a sentença penal.

2 - Pode, no entanto, o tribunal, oficiosamente ou a requerimento, estabelecer uma indemnização provisória por conta da indemnização a fixar posteriormente, se dispuser de elementos bastantes, e conferir-lhe o efeito previsto no artigo seguinte.

3 - O tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento, remeter as partes para os tribunais civis quando as questões suscitadas pelo pedido de indemnização civil inviabilizarem uma decisão rigorosa ou forem susceptíveis de gerar incidentes que retardem intoleravelmente o processo penal.” Os actuais pontos nº1 e 3 (ex nº2) correspondem à redacção original conferida pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro O ponto nº 2 foi introduzido pelo artº 17º do DL DL n.º 423/91, de 30 de Outubro.

Actualmente, dispõe também o artigo 129º da lei 62/2013 (LEI DA ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA JUDICIÁRIO) “1 - Compete às secções de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código de Processo Civil.

2 - Estão excluídos do número anterior os processos atribuídos ao tribunal de propriedade intelectual, ao tribunal da concorrência, regulação e supervisão, ao tribunal marítimo, às secções de família e menores, às secções do trabalho, às secções de comércio, bem como as execuções de sentenças proferidas por secção criminal que, nos termos da lei processual penal, não devam correr perante uma secção cível.

( negrito e itálico nossos) 3 - Para a execução das decisões proferidas pela secção cível da instância central é competente a secção de execução que seria competente caso a causa não fosse da competência daquela secção da instância central em razão do valor.” No caso dos autos a sentença condenou em primeira instância, além do mais, nos seguintes termos: “(…) D) Mais condeno a demandada civil "Companhia de Seguros X... SA, a pagar à mesma demandante civil, MS..., o valor que se vier a liquidar em enxerto declarativo atinente às despesas/custos de 2011, suportadas pela demandante civil que se vierem a apurar, despesas conexionadas com elas, valor atinente aos tratamentos médicos, despesas médicas e medicamentosas, e outras despesas /custos conexionados cm a recuperação funcional da demandante civil, bem como o valor que se vier a apurar, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, atinentes à previsível intervenção cirúrgica a que a demandante civil terá que se submeter quanto à articulação tíbio-társica.

" A demandante viu negada a sua pretensão no tribunal cível com os seguintes fundamentos...

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