Acórdão nº 82511/13.5YIPRT.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelTOME RAMI
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório.

1.

W…, com sede em …, instaurou procedimento injuntivo contra A…, com sede …, destinado a exigir o cumprimento da obrigação pecuniária emergente de contrato de prestação de serviços no valor de € 13.807,43, a título de capital, acrescida de juros de mora no valor de € 1 494,03, e da taxa de justiça paga no valor de € 153,00, invocando a instalação e aplicação de material informático e afins à requerida, a pedido desta, e correspondente às faturas emitidas com os n.ºs 368 (com vencimento em 29/12/2011, no valor de € 1435,58), 369 (com vencimento em 29/12/2011, no valor de € 3703,11), 22 (com vencimento em 1810112012, no valor de € 5554,68), 23 (com vencimento em 18/01/2012, no valor de € 2153,39) e 60 (com vencimento em 28/02/2012, no valor de €960,67).

Citada a Ré, deduziu oposição alegando, em síntese, que o contrato celebrado entre é nulo, em virtude de não ter sido assinado pelo gerente da requerida A…, ou não ter sido assinado conjuntamente pelas duas outras gerentes da requerida, os equipamentos fornecidos pela requerente nunca funcionaram adequadamente, porque as câmaras não filmam, os telefones não tocam, nem foi elaborado um procedimento para proteção de dados.

Os autos foram distribuídos como ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias regulada no Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.09.

Realizado o julgamento, foi proferida a competente sentença que julgou a ação procedente e condenou “ a requerida A… a pagar à requerente W … a quantia de € 15.403,46, acrescida de juros de mora vincendos, à taxa legal, desde a data da apresentação da injunção até efetivo e integral pagamento”.

E mais condenou a requerida “no pagamento da multa de € 1.500,00, como litigante de má-fé, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 542°, n.ºs 1 e 2, alínea a), do CPC”.

  1. Inconformada com esta sentença veio a Ré interpor o presente recurso, apresentando as respetivas alegações e concluindo nos termos seguintes: 1) Na oposição à Injunção apresentada pela credora, a sociedade requerida defende-se por exceção invocando que o alegado contrato de prestação de serviços celebrado entre a gerente L… e W.., é inválido, na medida em que aquela não detinha poderes para isoladamente vincular a sociedade.

    2) Não houve contrato porque não houve deliberação dos sócios nesse sentido.

    3) O ato de “contratação” foi praticado isoladamente pela sócia gerente L... à revelia e com total desconhecimento dos demais sócios gerentes que à data encontrava-se ausentes do país (Cf. 5.º Facto Assente).

    4) Considerando a forma de obrigar consagrada no Pacto Social à data dos factos (Cf. 2.º Facto Assente), o ato praticado desacompanhada dos demais, pela sócia gerente L... é inválido, por assentar unicamente em solicitação e decisão desta, padecendo, por isso, de nulidade.

    5) Trata-se de uma exceção perentória (invocação de factos que impedem, o efeito jurídico dos factos articulados pela requerente) e, consequentemente importa a absolvição total do pedido, nos termos do art.º 576.º, n.º 3 do CPC de 2013.

    6) Sobre esta exceção não se pronunciou a requerida, o que poderia ter feito no início da audiência de discussão e julgamento, devendo em consequência dar-se como provada a matéria da exceção.

    POR MERO DEVER DE PATROCÍNIO, 7) Por aplicação do art.º 260.º, n.º 2 do Código das Sociedades Comerciais, a falta de poderes da gerente L... é oponível à requerente; 8) No caso concreto, a recorrida sabia e não podia ignorar as limitações de poderes resultantes do objeto social da requerida/recorrente, tendo em conta que as demonstrações do produto foram realizadas na presença dos três sócios gerentes e que, em momento posterior à sua concretização, a única que manifestou vontade em contratar foi a Sr.ª L....

    9) Não se compreendendo como, tendo lidado sempre com os três gerentes, para a “celebração” do contrato, a apelada bastou-se com a aposição da assinatura de uma das sócias gerentes, a Sr.ª L..., no contrato celebrado.

    10) A prestadora de serviços sabia que deveria tratar dos assuntos relacionados como a eventual instalação do serviço com os 3 (três) gerentes, ainda que concretamente desconhecessem as regras de vinculação da sociedade, 11) A sociedade pode opor as limitações de poderes resultantes do seu objeto social à requerente, enquanto terceiro que, tendo em conta as circunstâncias acima elencadas, sabia e não podia ignorar que o ato praticado não respeitava essa cláusula. Ou seja, que sabia ou não podia ignorar que a Sr.ª L... não tinha poderes para sozinha vincular a A ...

    12) O princípio da confiança contratual no âmbito das relações comerciais não é nem poderia ser absoluto! A sua natureza absoluta transformaria o disposto no art.º 260.º do CSC em “letra morta”, esvaziando de sentido e utilidade prática as regras de vinculação da sociedade aí definidas.

    13) A regra constante do art.º 260.º, n.º 2 do CSC visa também acautelar a utilidade e aplicabilidade das regras sobre a vinculação das sociedades, contemplando as situações em que a contraparte conhece os seus interlocutores e não pode ignorar quem são as pessoas que vinculam a pessoa coletiva.

    14) Deveria ter sido entendido pelo Tribunal a quo que: - As partes não celebraram entre si qualquer contrato de prestação de serviços; - A sociedade recorrente não contratou o serviço em apreço nos autos.

    15) Ao contrário do que defende na sentença a MM.ª Juiz do tribunal recorrido, não se aplica ao caso vertente o art.º 261.º do CSC, já que existe norma expressa no pacto social em contrário. Não havendo possibilidade de ratificação, que de resto a existir seria da sociedade e não de um gerente.

    16) No mesmo sentido, o art.º 260.º n.º 2 do CSC, refere-se a “deliberação expressa ou tácita dos sócios” e não dos gerentes. Remetendo-se claramente para as formas de deliberação dos sócios, por exemplo em assembleia.

    17) A Mm.ª Juiz insiste em falar de ratificação pelos gerentes.

    POR MERO DEVER DE PATROCÍNIO, 18) A nulidade invocada não foi sanada mediante ratificação, por deliberação expressa ou tácita, pelos outros dois gerentes, máxime, pelo Sr. A…, como consta da decisão recorrida.

    19) Não pode entender-se como um ato de ratificação tácita do ato societário praticado pela gerente L..., o facto de, após a instalação dos serviços pela requerente, o gerente A...os ter passado a utilizar.

    20) Nenhum dos dois outros gerentes, A… e E… alguma vez aceitaram ou até mesmo mostraram-se conformados com o negócio celebrado, tendo repetidas vezes se manifestado contra a instalação do equipamento associado ao contrato em apreciação.

    21) A utilização dos ditos serviços pelo sócio gerente A... foi única e exclusivamente a consequência de imperativos de manutenção da normalidade da laboração diária/corrente do estabelecimento comercial explorado pela apelante.

    22) A não utilização dos únicos equipamentos de telecomunicação que tinham ao seu dispor, máxime, a central telefónica que era o serviço a que o Sr. A...atribuía mais relevância por se afigurar como altamente necessário ao desenvolvimento normal da atividade da empresa.

    23) Na pendência da resolução da situação descrita, o Sr. A… viu-se forçado pelas circunstâncias a fazer uso do equipamento.

    24) Em diversas ocasiões, o Sr. A… ter dado indicações no sentido da remoção do sistema.

    25) O não pagamento do serviço objeto destes autos expressa a oposição daqueles dois gerentes; foi esta a forma escolhida pelos dois gerentes preteridos na decisão para manifestarem a sua oposição ao negócio celebrado.

    26) A única interpretação permitida é aquela que pugna pela não ratificação, por qualquer um dos gerentes ausentes, A… e E…, do ato societário praticado por L....

    27) Apesar de se manter firme no intento de remover os equipamentos, caso estes tivessem funcionado corretamente, provavelmente o ato societário praticado pela gerente L... tivesse sido ratificado e o contrato por aquela celebrado sem os poderes necessários teria sido cumprido.

    Acontece que, 28) Desde o primeiro momento que o funcionamento dos equipamentos instalados pela requerida e pelos seus colaboradores na sede da sociedade apelante têm revelado a existência de defeitos de funcionamento.

    29) Perante a prova produzida em audiência de discussão e julgamento não se percebe que na decisão em crise, no ponto VI – Factos Não Provados, com interesse para a boa decisão da causa não tenha resultado como provado que: «(…) b) As câmaras e os telefones fornecidos e instalados pela requerente não filmem, nem toquem. (…)».

    30) O Tribunal a quo deveria ter entendido como provados os requisitos de aplicação do art.º 260.º, n.º 2 do CSC, decidindo pela procedência da sua tese e, consequentemente, concluindo pela invalidade (por vício de nulidade) do contrato de prestação de serviços em discussão.

    31) Ao não o fazer, o Tribunal de 1.ª Instância fez uma errada aplicação do Art.º 260.º (Vinculação da Sociedade) do Código das Sociedades Comerciais (CSC), máxime do seu n.º 2 e do disposto no Art.º 261.º, n.º 1 do mesmo diploma legal.

    32) Decorre igualmente da prova carreada para os autos que os serviços prestados pela requerente foram-no com as...

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