Acórdão nº 871/07.0TCSNT-A.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL FONSECA
Data da Resolução05 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa: 1.

RELATÓRIO: Por apenso à execução que C & F, Lda intentou contra A.P., Lda, veio a executada deduzir oposição invocando, em síntese, a inexistência de título executivo, por não valerem os cheques dados à execução como títulos cambiários e não ter sido invocada pela exequente a relação subjacente; embora tenha existido uma relação comercial entre a exequente e a executada, aquela não forneceu quaisquer bens e serviços no período referido no requerimento executivo (2006) e a executada não se encontra em mora, uma vez que a exequente não emitiu sequer as facturas referentes às quantias que peticiona na execução, como não emitiu ainda os recibos de quitação alusivos aos pagamentos que a executada já efectuou, pese embora as insistências da executada nesse sentido – de 224.807,73€ que a executada pagou a exequente apenas emitiu recibos pela quantia de 119.170,00€, não podendo a executada fazer repercutir na sua contabilidade o IVA que pagou.

A exequente apresentou contestação invocando, em síntese, que os cheques apresentados sempre valeriam como quirógrafos, documentos particulares assinados pelo devedor e que implicam o reconhecimento da dívida pelo que são títulos executivos nos termos da alínea c) do art. 46º do C.P.C., incumbindo então ao executado o ónus de prova da inexistência da relação subjacente invocada no requerimento executivo, causal à emissão dos cheques (arts. 344º nº 1 e 458º, nº1 do C.Civil), a saber, o fornecimento de bens e serviços à executada; a executada reconheceu ter existido uma relação comercial entre as partes e confessou que a exequente fez fornecimentos no valor de 343.977,03€, que apenas pagou a quantia de 224.807,37€ pelo que ainda está em dívida a quantia de 119.169,30€, “dos quais 115.970,00€ estão titulados pelos cheques que servem de base à presente execução”, o que a executada expressamente reconhece. O contrato tem-se por cumprido, por parte da exequente, com o fornecimento á executada dos bens e serviços de panificação por esta encomendados”, “[e] não com a emissão de facturas, que representam apenas o cumprimento de uma obrigação de natureza fiscal”.

Procedeu-se a julgamento após o que foi proferida decisão que concluiu nos seguintes termos: “De acordo com os fundamentos supra referidos e de harmonia com o disposto nos preceitos legais citados, decide-se:

  1. Julgar a presente oposição procedente, por provada.

  2. Determinar a extinção da execução intentada contra a opoente A.P., Lda.

  3. Determinar o cancelamento e o levantamento da penhora sobre o prédio urbano sito na Rua ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Agualva-Cacém, sob o número … e da penhora sobre o prédio urbano sito na Rua ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Agualva-Cacém sob o número ….

  4. Condenar a Exequente C & F, Lda no pagamento das custas do processo.

    * Registe e Notifique”.

    Não se conformando a exequente apelou formulando as seguintes conclusões: “I – A douta sentença recorrida delimitou a questão a decidir nos autos, que é a de saber se “os cheques dados à execução constituem título executivo” II - A douta sentença recorrida determinou a extinção da execução, por considerar que os cheques dados à Execução não constituem títulos executivos uma vez que “Incidindo sobre a exequente o ónus de alegar a relação causal, o que fez identificando-a como fornecimentos ocorridos no período de tempo que invocou de Janeiro de 2006 a Dezembro de 2006, e impendendo sobre a executada o ónus de alegar e demonstrar que a relação causal invocada não se verificou, como fez, conclui-se que os cheques dados à execução como documentos particulares não constituem títulos executivos“; III – Embora não possam valer como títulos de crédito, os cheques dados à execução valem como títulos executivos (meros quirógrafos) por serem documentos particulares assinados pelo devedor - nos termos do disposto no artigo 46º, nº 1 al. c) do Cód. Proc. Civil, na versão aplicável.

    IV- Os cheques em causa representam, por si só, um reconhecimento unilateral (por parte da devedora Executada) da dívida e uma promessa de pagamento, pelo que, fazem funcionar a presunção legal da existência da dívida e da respectiva causa justificativa, o que determina a inversão do ónus da prova, de harmonia com as disposições conjugadas dos artigos 344º, nº 1 e 458º, nº1 ambos do Cód. Civil.

    V- Impendia, por isso, sobre a devedora, Executada, o ónus de alegação e prova da inexistência da dita relação subjacente e da dívida, prova essa que, ao contrário do que refere o Tribunal a quo, a Executada não fez.

    VI – Ao invés, a Executada alegou e provou que a relação causal e a dívida exequenda dela emergente existem, e fê-lo por confissão expressa nos artigos 19º, 44º, 29º, 30º, 31º e 32º da Oposição.

    VII - Tal confissão é judicial, escrita e foi aceite pela Exequente, pelo que tem força probatória plena contra a confitente Executada – cfr. artigos 356º, nº 1 e 358º, nº 1 do Cód. Civil – prova essa que não foi considerada pelo Tribunal a quo.

    VIII - Carece, por isso, em absoluto, de fundamento legal e fáctico a conclusão extraída pelo Tribunal a quo, de que a executada fez a demonstração da inexistência da relação causal e que, por isso, inexiste título executivo.

    IX - Quando se entenda, o que apenas se admite por dever de patrocínio, que impende sobre a Exequente o ónus de alegar a relação causal subjacente à emissão dos cheques, sempre se dirá que a Exequente identificou de forma muito clara e sucinta, como lhe competia, a causa de pedir da execução: fornecimento de bens e serviços de panificação pela Exequente à Executada– cfr. art. 810º, nº 3, alínea b) do Cód. Proc. Civil na versão aplicável.

    X - Dúvidas não subsistem – nem para a Executada, nem para o Tribunal a quo - que os cheques dados à execução titulam o pagamento de bens e serviços de panificação que a Exequente forneceu à Executada; XI – Uma vez que, apesar de ter considerado provado que “no período entre Janeiro de 2006 e Dezembro de 2006, a Exequente não forneceu bens e serviços de panificação à Executada”, na fundamentação de direito da sua decisão, o Tribunal a quo acabou por reconhecer que “da matéria que foi possível apurar relativamente às relações comerciais existentes entre as partes, concretamente, do relato das testemunhas e dos documentos emitidos” resulta que tais relações comerciais se situam “entre meados de 2004 e início de 2005.” XII – É irrelevante delimitar o período de tempo em que ocorreram os ditos fornecimentos, uma vez que, a alegação da relação causal feita pela Exequente é perfeitamente inteligível e foi bem apreendida pela Executada que, exercendo o contraditório, reconheceu, expressa e voluntariamente, não só a existência dos fornecimentos, como também da dívida deles emergente.

    XIII - Pelo que, mesmo sufragando o entendimento de que cabia à Exequente alegar a relação causal e uma vez que esta o fez cabalmente e de forma inteligível, não pode deixar de considerar-se que os cheques objecto da execução valem como títulos executivos XIV- Tendo o Tribunal a quo optado por considerar inexistente o título executivo, fez incorrecta aplicação do disposto, conjugadamente, nos artigos 344º, nº 1 e 458º, nº1 ambos do Cód. Civil e nos artigos 46º, nº 1, al. c), 814º, al. a) e 816º do Cód. Proc. Civil, na versão aplicável e, tendo desconsiderado a confissão expressa da Executada, violou o disposto artigos 356º, nº 1 e 358º, nº 1 do Cód. Civil.

    Nestes termos e nos mais de direito que Vossas Excelências doutamente se dignarão suprir, deverá a presente Apelação ser julgada procedente, revogada a douta sentença recorrida e substituída por outra que, julgando improcedente a Oposição, ordene o prosseguimento da Execução”.

    A executada apresentou contra alegações e peticionou, subsidiariamente, a ampliação do objecto do recurso, formulando as seguintes conclusões: “

    1. A recorrente apresentou à execução um conjunto de cheques, com data de 2006, que não foram apresentados a pagamento.

    2. Tendo dado à execução os referidos cheques como título cambiário.

    3. E não tendo alegado a relação causal subjacente à emissão dos referidos cheques.

    4. Ora, nos termos do artigo 29.º da LUL, os cheques devem ser apresentados a pagamento no prazo de 8 dias contados do dia que constar na data de emissão dos referidos cheques.

    5. Sendo que os cheques só valem como título executivo se apresentados a pagamento no prazo legal, e a ação executiva for intentada no prazo de seis meses contados da data de apresentação dos cheques a pagamento.

    6. Não tendo sido os cheques apresentados a pagamento, não constituem título executivo, pelo que existe ausência de título executivo, o que leva à improcedência do requerimento executivo apresentado.

    7. Sem conceder, existe uma corrente doutrinária que admite que os cheques constituem título executivo, não como título cambiário, mas como mero quirógrafo, desde que conste do próprio cheque ou seja alegada no requerimento executivo a relação causal subjacente à emissão dos referidos cheques.

    8. Ora, tal não consta dos cheques dados à execução, sendo que, inclusivamente, num dos cheques consta a menção “sem efeito”.

    9. Nem alegou a recorrente no requerimento executivo a alegação causal subjacente à emissão dos cheques apresentados à execução.

    10. Pois o que referiu foi uma consideração muito genérica de que os cheques tinham como origem a prestação de serviços e fornecimento de bens decorridos no ano de 2006.

    11. Sendo que resultou provado que em 2006 não houve nenhuma prestação de serviços nem fornecimento de bens entre a recorrente e a recorrida.

    12. Tendo a relação comercial entre ambas ocorrido entre Agosto de 2004 e Janeiro de 2005.

    13. Sendo que a recorrente apenas corrigiu este facto na resposta à oposição à execução.

    14. O que configura uma alteração à causa de pedir inadmissível, que não pode ser tida em consideração.

    15. Ainda assim, o doto tribunal recorrido poderia e deveria ter...

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