Acórdão nº 23/12.7YUSTR - B.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelGUILHERME CASTANHEIRA
Data da Resolução14 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 9.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO: No nuipc 23/12.7YUSTR - B.L1, relativo a contra-ordenações, que correu termos no 1.º Juízo do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, foram, após trânsito em julgado da sentença condenatória, proferidos os despachos judiciais de fls. 11322 a 11327 (deferindo os requerimentos dos “arguidos LT..., e PS..., que impetram pelo pagamento em prestações dos valores em que foram condenados, fazendo aqui incluir as sanções acessórias” e indeferindo, quanto a todos os visados pelo processo, a promoção do Ministério Público no sentido de se proceder “de imediato à apreensão” dos “valores em que aqueles foram, além do mais, condenados, em sanção acessória”, relativos à “perda dos benefícios diretamente obtidos com a prática das contraordenações”) e de fls. 11349 a 11354 (deferindo este os “requerimentos de JM..., de 26.11.2014 e de 02.01.2015 (folhas 11308 e 11333/6)”, por onde se solicitava “o pagamento da coima e da sanção acessória em prestações”, sobre os quais se havia pronunciado o Ministério Público, a fls. 1337 a 1338, como se escreve, “favoravelmente quanto ao pagamento da coima em prestações”, mas “aduzindo discordância quanto ao pagamento da sanção acessória em prestações”.

*** Inconformado, recorreu o Ministério Público, formulando as seguintes conclusões: - Quanto ao “despacho proferido a fls. 11322 a 11327”: “1. Não é legalmente admissível o pagamento faseado da quantia declarada apreendida e perdida, sob pena de se desvirtuar a sanção acessória aplicada na douta sentença, consubstanciada na apreensão e perda dos mencionados valores e com violação de caso julgado.

  1. Tratando-se de uma sanção acessória, não lhe poderá ser aplicável o disposto nos artigos n.ºs 111.º e 112.º do Código Penal, porquanto tais preceitos não respeitam a qualquer pena acessória que tenha sido aplicada.

    3. Conforme Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayete em Código Penal Anotado, 2 ed. anot.12, ao art.º 111.º "A perda de vantagens prevista no artigo 111.º do Código Penal não é uma pena acessória. É antes uma providência sancionatória de natureza análoga à da medida de segurança. Na verdade «previne a prática de futuros crimes» e mostra ao agente e à generalidade que, em caso da prática de um facto ilícito típico, é sempre em qualquer caso instaurada uma ordenação de bens adequada ao direito» instauração que «se verifica com inteira independência de o agente ter ou não actuado com culpa»." 4. Estando em causa uma sanção acessória de apreensão e perda de parte do produto do benefício directamente obtido com a prática das contraordenações, com vista ao seu efectivo cumprimento, deverá ser ordenada a apreensão de depósitos bancários pertencentes a cada um dos Arguidos no montante declarado apreendido e perdido, nos termos do disposto no art.º 499.º do Código de Processo Penal.

  2. Só assim se observará o próprio RGCO que no Capítulo VIII, sob a epígrafe "Da Execução", no seu artigo 89.º, n.º 4, determina que à execução das sanções acessórias "é aplicável o disposto sobre a execução de penas acessórias em processo criminal".

  3. Não há no RGCO qualquer lacuna no que respeita à execução das sanções acessórias.

  4. A sanção acessória em causa não é de aplicação automática, mas depende de juízo de necessidade e proporcionalidade, cabendo ao tribunal de julgamento, segundo tais critérios ponderar da necessidade da aplicação da sanção acessória com a apreenso e perda da totalidade ou de parte do benefício obtido, atendendo a sua adequação e também ao sacrifício para o visado.

  5. Após a douta sentença ter sido confirmada por Tribunal Superior e ter transitado em julgado, não cabe ao tribunal a quo vir ponderar novamente aqueles critérios.

    9. O douto despacho recorrido não só neutraliza a sanção acessória em desrespeito pelo caso julgado, com desrespeito por decisão do Tribunal Superior, como cumula quantias de diferente natureza jurídica e com modos de cumprimento legalmente diversos.

  6. O douto despacho recorrido violou o disposto nos artigos 88.º, n.º 4, do RGCO, e 499.º, do Código de Processo Penal.

    Em face do exposto, deverá ser revogado o despacho recorrido e substituído por outro que ordene a apreensão de depósitos bancários pertencentes a cada um dos Arguidos no montante declarado apreendido e perdido pela sanção acessória aplicada, com a subsequente pronúncia sobre o pagamento da coima em prestações, prosseguindo os autos os seus ulteriores termos”.

    - Quanto ao “despacho proferido a fls. 11349 a 11354”: “1.

    Não é legalmente admissível o pagamento faseado da quantia de € 102.353,84 declarada apreendida e perdida sob pena de se desvirtuar a sanção acessória aplicada na douta sentença, consubstanciada na apreensão e perda do mencionado valor e com violação de caso julgado.

  7. Tratando-se de uma sanção acessória, não lhe poderá ser aplicável o disposto nos artigos n.ºs 111.° e 112.° do Código Penal, porquanto tais preceitos não respeitam a qualquer pena acessória que tenha sido aplicada.

  8. Conforme Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayete em Código Penal Anotado, 2.ª ed. anot. 12, ao art.º 111.º “A perda de vantagens prevista no artigo 111.º do Código Penal não é uma pena acessória. É antes uma providência sancionatória de natureza análoga à da medida de segurança. Na verdade «previne a prática de futuros crimes» e mostra ao agentes e à generalidade que, em caso da prática de um facto ilícito típico, é sempre em qualquer caso instaurada uma ordenação de bens adequada ao direito» instauração que «se verifica com inteira independência de o agente ter ou não actuado com culpa»." 4. Estando em causa uma sanção acessória de apreensão e perda de parte do produto do benefício directamente obtido com a prática das contraordenações, com visto ao seu efectivo cumprimento, deverá ser ordenada a apreensão de depósitos bancários pertencentes ao Arguido no montante declarado apreendido e perdido, nos termos do disposto no art.° 499.º do Código de Processo Penal.

  9. Só assim se observará o próprio RGCO que no Capítulo VIII, sob a epígrafe "Da Execução", no seu artigo 89.º, n.º 4, determina que à execução das sanções acessórias "é aplicável o disposto sobre a execução de penas acessórias em processo criminal".

  10. Não há no RGCO qualquer lacuna no que respeita à execução das sanções acessórias.

  11. A sanção acessória em causa não é de aplicação automática, mas depende de juízos de necessidade e proporcionalidade, cabendo ao tribunal de julgamento, segundo tais critérios ponderar da necessidade da aplicação da sanção acessória com a apreensão e perda da totalidade ou de parte do benefício obtido, atendendo a sua adequação e também ao sacrifício para o visado.

    8.

    Após a douta sentença ter sido confirmada por Tribunal Superior e ter transitado em julgado, não cabe ao tribunal a quo vir ponderar novamente aqueles critérios.

  12. O douto despacho recorrido não só neutraliza a sanção acessória em desrespeito pelo caso julgado, com desrespeito por decisão do Tribunal Superior, como cumula quantias de diferente natureza jurídica e com modos de cumprimento legalmente diversos.

  13. O douto despacho recorrido violou o disposto nos artigos 89.º, n.º 4 do RGCO e 499.º do Código de Processo Penal.

    Em face do exposto, deverá ser revogado o despacho recorrido e substituído por outro que ordene a apreensão de depósitos bancários pertencentes ao arguido no montante declarado apreendido e perdido pela sanção acessória aplicada, com a subsequente pronúncia sobre o pagamento da coima em prestações, prosseguindo os autos os seus ulteriores termos”.

    * Respondeu um dos visados pelo processo, JM...

    , (cfr. fls. 11408 a 11410), concluindo: “1 - O Mmo. Juiz "a quo", no Douto Despacho recorrido, entende e bem, que o Regime Geral das Contra-ordenações e Coimas não prevê o modo de execução das sanções acessórias.

    2 - O mesmo acontece com o art. 499.º do CPP que não regula os casos de perda de benefício.

    3 - Ao contrário do que defende a Digna. Procuradora, o enquadramento do requerido pelo recorrido, deverá obter resposta no disposto nos artigos 111.º e 112.º do CP, aplicável por força dos artigos 407.º do CdVM e 32.º do RGCO.

    4 - O deferimento do pagamento em prestações não neutraliza ou desvirtua a sanção acessória aplicada, porquanto a perda do produto do benefício obtido torna-se efectiva com o pagamento dos montantes das prestações fixadas.

    5 - Ou, no caso de incumprimento, com o vencimento de todas as prestações em falta e, aí sim, com a execução da decisão penal condenatória.

    6 - Nunca caberia no âmbito da Sentença, ou mesmo do Acórdão proferido, equacionar a forma do pagamento da multa e da sanção acessória, tendo em consideração o prazo legalmente concedido ao arguido para requerer o respectivo pagamento em prestações (n.º 5 do art. 88.º do RGCO).

    7 - Pelo que, tal concessão apenas poderia ser concedida em Despacho a proferir sobre esse requerimento.

    8 - Não existe, assim, nova ponderação sobre quaisquer critérios, ao contrário do defendido pela Digna. Procuradora.

    9 - Acresce que, independentemente do Douto Despacho recorrido ser, na perspectiva do recorrido, inatacável do ponto de vista jurídico, também existe desacordo quanto à pretensão da imediata apreensão de depósitos bancários.

    10 - Porquanto, na eventualidade do indeferimento do requerido pelo recorrente, o que não se admite, sempre deveria ser concedido prazo para o pagamento voluntário do valor da sanção acessória aplicada.

    11- O despacho recorrido fez correcta interpretação da Lei e não merece reparo.

    ” * Neste Tribunal, a Ex.ª Procuradora-Geral Adjunta apôs visto nos autos.

    Proferido despacho preliminar, e colhidos os necessários vistos, teve, de seguida, lugar a conferência, cumprindo decidir.

    *** II. FUNDAMENTAÇÃO: 1 - Conforme entendimento pacífico nos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos...

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