Acórdão nº 451/15.6YLPRT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelONDINA CARMO ALVES
Data da Resolução09 de Dezembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I. RELATÓRIO MARIA ………., residente na Rua ……, intentou, em 13.04.2015, contra FERNANDA ……, residente na Rua ……., procedimento especial de despejo, que teve início no requerimento apresentado no Balcão Nacional do Arrendamento, invocando como fundamento do despejo a resolução do contrato de arrendamento pelo senhorio, nos termos do nº 3 do artigo 1083º do Código Civil.

Notificada, a ré deduziu oposição, em 02.07.2015, através da qual alega: 1. As comunicações alegadamente enviadas pela Requerente em 30 de Janeiro de 2014 (carta registada com comunicação de actualização de renda) e em 13 de Março de 2014 (nova carta registada, remetida em face da devolução da anterior carta, e nos termos e para os efeitos do disposto do art.º 10º, n.º 3 do NRAU), não foram por si recebidas, nem quaisquer avisos relativamente às mesmas para o seu levantamento na Estação dos Correios, em causa, Alhandra; 2. A Requerida apresentou reclamação de tal facto junto dos CTT, sendo que estes últimos responderam-lhe por carta datada de 24 de Outubro de 2014 que “(…)Como o aviso de levantamento é um objecto de correio normal que não deixa vestígios de passagem nos circuitos postais, não possuímos qualquer prova factual da ocorrência que nos permita garantir com absoluta certeza que o mesmo tivesse sido depositado no receptáculo postal respectivo (…)” doc. n.º 2; 3. E, de tal facto deu a Requerida conhecimento aos Requerentes, através de seu Mandatário, mediante carta registada enviada em 21 de Outubro de 2014, e recebida pelo mesmo - doc. n.º 3; 4. São recorrentes os problemas com a recepção de correspondência postal em Alhandra, localidade onde a Requerida habita; 5. Sendo comum, a existência de correspondência de terceiros ser depositada no receptáculo postal da Requerida e, por sua vez, a sua correspondência ser depositada noutros receptáculos postais; 6. É recorrente a Requerida ou não chegar a receber correspondência sua, ou então esta mesma correspondência ser colocada na caixa de correio dos vizinhos que, mais tarde e por gentileza, lha fazem chegar; 7. A Requerida continuou a liquidar o valor de renda mensal de € 62,00, como sempre fez (depósitos de rendas nos meses de Janeiro de 2014 a Junho de 2015) - Docs. 4.

Por despacho de 14 de Julho de 2015 foi admitida a Oposição deduzida, com a concessão de Apoio Judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento da compensação a Patrono, considerando-se não haver lugar ao pagamento de caução (fls. 143).

Foi levada a efeito a audiência de julgamento, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, em 02.09.2015, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte: Nestes termos e em face do exposto, julgo a presente acção improcedente, por não provada e, em consequência, absolvo a Requerida do pedido de despejo, formulado no âmbito do presente procedimento especial.

Inconformada com o assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.

São as seguintes as CONCLUSÕES da recorrente: i. Vem o presente recurso interposto da douta Sentença que julgou o procedimento especial de despejo improcedente.

ii. A decisão recorrida define o objeto do litígio como sendo um pedido de desocupação para habitação própria da Recorrente quando se pretende a desocupação do locado pela Recorrida pelo incumprimento no pagamento de renda.

iii. Considerou a Douta Sentença a oposição apresentada pela Recorrida, na inobservância do disposto no art. 10, n.º 2 da Portaria n.º 9/2013, de 10 de Janeiro.

iv. A Recorrida, ainda que beneficiando de proteção jurídica, devia prestar caução no valor das rendas em dívida, atento o preceituado no art. 10.º, n.º 2 da Portaria n.º 9/2013, de 10 de Janeiro, o que não fez, devendo a oposição ser considerada por não deduzida, convertendo-se o requerimento de despejo em título para desocupação do locado.

v. De facto, o art. 15.º-F, n.º 3 da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, na sua actual redação, prevê que as situações de isenção para quem beneficia de apoio judiciário são regulamentadas pela Portaria n.º 9/2013.

vi. A isenção estabelecida no art. 15.º-F, n.º 3, reporta-se e apenas ao pagamento da taxa de justiça pela apresentação de oposição e nunca para a prestação de caução.

vii. A Portaria n.º 9/2013 limita-se a complementar e definir a aplicação da própria Lei n.º 6/2006, como esta prescreve.

viii. Por outro lado, a matéria de facto dada como provada sob os artigos 2, 8, 9, 11 e 12 enferma de erro por resultar em contradição com a prova constante dos autos e/ou por esta impor decisão diversa da proferida.

ix. O facto provado sob o n.º 2 deve ser revogado e alterado no sentido de considerar que o primitivo proprietário do locado arrendou-o ao ex-marido da Recorrida, pelo prazo de seis meses, renováveis.

x. O artigo 8. da matéria de facto dada como provada deve ser revogado parcialmente, porquanto a primeira parte é contrariada pelo disposto no facto dado por provado sob o n.º 9.

xi. O segundo segmento do facto 8. deve ser dado como não provado, uma vez que o Tribunal estribou a sua apreciação quanto a este ponto, e apenas, nas declarações de parte da Recorrida, contestando-se a valorização atribuída a este meio de prova.

xii. Existe documentação junta ao processo que impõe ao Tribunal decisão oposta, concretamente o ofício dos CTT, datado de 03-08-2015, que expressamente refere que “1. Relativamente ao registo RD368620473PT (…) foi deixado um aviso para que o registro fosse levantado na Loja CTT de Alhandra (cfr. docs. 1 a 5 que se juntam), (…) 3. Quanto ao registo RD368620796PT (…) foi deixado um aviso para que o registo fosse levantado na Loja CTT de Alhandra (cfr. doc. 7)”, bem como a informação que se retira do verso dos envelopes correspondentes às comunicações devolvidas à Recorrente, violando assim o Tribunal o disposto no art. 607.º, n.º 4 do CPC.

xiii. Igualmente deve ser revogada a primeira parte do facto n.º 9, porquanto a documentação constante dos autos é suficiente, designadamente o ofício dos CTT, de 03-08-2015, para sustentar decisão diversa, devendo este ponto ser alterado em conformidade.

xiv. Quanto ao facto 11 se refira ter o Tribunal, mais uma vez, utilizado como único meio de prova as declarações da Recorrida, o que, também aqui se contesta.

xv. As declarações de parte devem ser consideradas como um meio de prova complementar, que não pode fundar a decisão de uma causa.

xvi. Do depoimento das testemunhas, em momento algum resulta comprovado o facto dado como provado sob o n.º 11, devendo ele ser dado por não provado.

xvii. O ponto 12, fundamentado pelas declarações de parte, deve ser dado como não provado, porquanto, a documentação junta aos autos e a prova testemunhal não permitem concluir pela recorrência da não entrega de correspondência à Recorrida.

xviii. Os meios de prova colocados à disposição do Tribunal a quo impunham a fixação de matéria de facto diversa da produzida, tendo sido violado o disposto no art. 607.º, n.º 4 do CPC.

xix. A Sentença em crise incorreu em erro na aplicação do Direito, ao recusar a aplicação do art. 10.º, n.º 3 e 4 do NRAU, com a produção dos competentes efeitos.

xx. O Tribunal a quo, embora reconhecendo a idoneidade do meio de comunicação a utilizar entre senhorio e arrendatário, impediu a produção dos respetivos efeitos e colocou em causa o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança dos cidadãos.

Pede, por isso, a apelante, que o recurso seja julgado procedente e, consequentemente, seja revogada a decisão recorrida e substituída por Acórdão que determine: a) A não admissão da oposição apresentada pela Recorrida, considerando-a não deduzida; ou a assim se não entender, b) A procedência da ação, decidindo no sentido da notificação eficaz e regular da Recorrida para efeitos de atualização da renda do locado.

A ré apresentou contra-alegações, formulando as seguintes CONCLUSÕES: i. É jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa que “Impõe-se interpretar o art. 15º F nº 3 do NRAU, aprovado pela Lei 6/2007 de 27 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pela Lei 31/2012 de 14-08 no sentido de que o legislador pretendeu isentar o arrendatário que goza do benefício do apoio judiciário da obrigação de demonstrar, aquando da apresentação do articulado de oposição (ao pedido de despejo), que pagou a taxa de justiça devida (responsabilidade perante o Estado) e que pagou a caução no valor das rendas, encargos ou despesas em atraso (responsabilidade perante o senhorio); É por isso de afastar a regulação que, em contrário, emana do art. 10º da Portaria n.º 9/2013 de 10 de Janeiro, verificando-se uma invalidade da portaria aludida, porquanto o seu conteúdo é incompatível com a respectiva fonte de produção.” ii. Por esse mesmo motivo não assiste razão à recorrente quando faz depender a admissão da oposição com a prestação de caução; iii. Todas as testemunhas ouvidas em sede de audiência de discussão e julgamento foram coerentes e razoáveis no seu depoimento e, nessa medida, credíveis; iv. Todas as testemunhas foram unanimes em referir todas as dificuldades existentes na freguesia de Alhandra na distribuição do correio; v. O que também foi confirmado pelas declarações de parte da própria recorrida; vi. Por esses motivos deve considerar-se a presunção do artigo 9º do NRAU como ilidida nos termos e para os efeitos no artigo 350º, n.º 2 do Código Civil; vii. Logo, não existiu errada aplicação do direito: o contrato de arrendamento aqui em causa não transitou para o NRAU, logo não pode existir aumento de renda e, por isso mesmo, não há causa de resolução do contrato de trabalho por motivo de não pagamento de rendas.

viii. Nestes termos, deve ser confirmada a douta sentença proferida pelo douto Tribunal a quo.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Importa ter em consideração que, de...

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