Acórdão nº 396/14.7TVLSB-A.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelOLINDO GERALDES
Data da Resolução09 de Dezembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO M – Sociedade de Gestão e Investimento Imobilário, S.A., instaurou na Instância Central de Lisboa, Secção Cível, Comarca de Lisboa, contra V, ação declarativa, sob a forma de processo comum, pedindo que lhe fosse reconhecido o direito de propriedade sobre a fração autónoma identificada pela letra “B” do prédio urbano, sito na Rua das Trinas, n.º 120, freguesia da Lapa, concelho de Lisboa, e descrito, sob o n.º 21 (Lapa), na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, e o Réu condenado, designadamente, a restituir-lhe a fração livre e devoluta de pessoas e bens.

Para tanto, alegou em síntese, ser a única e legítima possuidora da fração, sendo ocupada pelo R. sem qualquer título que o legitime.

Contestou o R., alegando que o contrato de arrendamento com o anterior arrendatário não caducou com a sua morte, o qual lhe foi transmitido, continuando a A. a emitir os recibos de renda, e concluindo pela absolvição, designadamente, do pedido de restituição.

Foi designada a audiência prévia, durante a qual se conheceu de imediato do pedido de reivindicação, sendo proferido, em 12 de junho de 2015, despacho saneador-sentença, nos termos do qual foi reconhecido à Autora o direito de propriedade sobre a referida fração e o Réu condenado a restituí-la, à Autora, completamente livre e devoluta de pessoas e bens, e prosseguindo o processo, no demais, com a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova (pedido de indemnização).

Inconformado com o despacho saneador-sentença, em separado, recorreu o Réu e, tendo alegado, formulou essencialmente as seguintes conclusões: a) A data da audiência prévia foi alterada nos termos do art. 151.º do CPC, a pedido da mandatária da A., tendo a mandatária da R., impossibilitada de comparecer, enviado requerimento, onde solicitava a interrupção dos trabalhos, para designação de data para a sua continuação.

b) Não foram atendidos os princípios da cooperação e da boa fé processual e foi posto em causa o direito de defesa do Recorrente.

c) O Juiz não se pronunciou sobre questões que deveria apreciar, o que constitui nulidade, nos termos da alínea d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC.

d) É o art. 1106.º do CC que, atualmente, prevê o regime de transmissão do arrendamento, que revoga a norma transitória constante do art. 57.º do NRAU.

e) A decisão recorrida defende uma aplicação diferenciada entre ascendentes e descendentes, violando o disposto no art. 13.º da CRP, porque são ambos maiores e podem não ser deficientes.

f) Por outro lado, ao não permitir a transmissão para filhos maiores e sem deficiências que vivam em economia comum com os progenitores, titulares do contrato de arrendamento, a decisão recorrida viola o art. 65.º da CRP, não deixando que o Recorrente se mantenha na casa morada de família, que sempre foi a sua habitação.

g) A decisão recorrida violou ainda os arts. 20.º da Constituição da República Portuguesa, 7.º do Código Civil, 411.º e 608.º, ambos do Código de Processo Civil.

Pretende o Réu, com o provimento do recurso, a declaração de nulidade da sentença e a revogação da decisão recorrida, com a sua substituição por outra que considere a transmissão do arrendamento a seu favor, com todas as consequências legais.

Contra-alegou a Autora, no sentido da confirmação integral do despacho saneador-sentença.

O Mmo. Juiz a quo exarou despacho, concluindo pela não verificação de nulidade da sentença, por omissão de pronúncia.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Neste recurso, está essencialmente em discussão, para além da nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, o direito de transmissão do contrato de arrendamento para habitação por morte do arrendatário.

II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Na sentença recorrida, foram dados como provados os seguintes factos: 1. A A. é dona da fração autónoma identificada pela letra "B" do prédio urbano sito na Rua das Trinas, n.º 120, freguesia de Lapa, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º 21.

  1. Por acordo escrito de 28 de janeiro de 1959, o proprietário desse prédio, à data, João, acordou com V Santos, casado com Ermelinda, em dar de arrendamento o primeiro andar do prédio, para habitação, cedendo-lhe o gozo e fruição.

  2. O referido contrato foi celebrado por um período de seis meses, com início em 1 de fevereiro de 1959 e termo a 31 de julho de 1959, sendo sucessivamente renovável por iguais períodos.

  3. A renda inicialmente contratada foi de 1 000$00.

  4. Por sentença de 30/10/1987, proferida no 4° Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Sintra, nos autos de divórcio litigioso n.º 1098/85, transitada em julgado a 11/11/1987, foi decretado o divórcio entre V Santos e Ermelinda, sendo homologado o acordo estabelecido entre os cônjuges em ata de julgamento de 1/7/1986, que estabelecia que o arrendamento da casa de morada de família passaria a pertencer à mulher, tendo o proprietário tomado conhecimento, em 14 de outubro de 1986, que o direito ao arrendamento ficava a pertencer a Ermelinda.

  5. Ermelinda faleceu no dia 1 de julho de 2013, no estado civil de divorciada de V Santos.

  6. A A. foi informada desse facto em 9 de julho de 2013 pelo R.

  7. O R. é filho de V Santos e de Ermelinda, tendo nascido no dia 26 de setembro de 1955.

  8. Por carta registada, enviada em 15 de julho de 2013, a A. solicitou ao R. o envio dos documentos comprovativos da transmissão do arrendamento, nomeadamente certidão de óbito da arrendatária e certidão de nascimento do R.

  9. Em resposta, e por carta de 21 de agosto de 2013, o R. transmitiu à A. que pretendia a transmissão do arrendamento, por força do disposto na alínea c), do n.º 1 do Art. 1106.º do Código Civil, atendendo ao facto de ter vivido em economia comum com a mãe, anexando, para esse efeito, os documentos requeridos pela A.

  10. Por carta registada, de 3 de setembro de 2013, a A. comunicou ao R. que, tendo em conta que o contrato de arrendamento era anterior à vigência do RAU, o contrato tinha caducado, atenta a circunstância de ter falecido a arrendatária, pelo que o R. deveria...

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