Acórdão nº 1496/09.0YXLSB.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL FONSECA
Data da Resolução22 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa: I.

RELATÓRIO: FP e ES, intentaram a presente ação, que segue a forma de processo sumário contra D., S.A.., entidade que, aquando do saneamento do processo, foi absolvida do pedido, prosseguindo os autos contra a sociedade A (EUROPE), LTD, cuja intervenção principal foi requerida pelos autores.

Os autores formulam pedido com vista a que: a)Seja a “Ré condenada a pagar aos Autores a quantia de €23.601,14, a título de danos patrimoniais por responsabilidade civil profissional do advogado”; b)Seja a “Ré condenada a pagar aos Autores a quantia de € 2.832,00, a título de juros vencidos à taxa de 4% desde a data da reclamação acrescida dos juros vincendos”; c)Seja a ré “condenada a pagar a título de honorários a pagar ao mandatário a quantia de € 3500”; d)A ré junte “aos autos o contrato de seguro celebrado entre o mandatário e a ré , bem como a respectiva apólice”; Para fundamentar a sua pretensão invocam, em síntese, que por força da atividade profissional de um segurado da ré sofreram prejuízos no valor de 29.933,14€.

Admitida a intervenção principal de A (EUROPE), LTD, veio esta apresentar a sua defesa, excecionando a existência de cláusula de exclusão da sua responsabilidade por força do contrato, em virtude de o segurado não ter oportunamente participado qualquer sinistro. Impugna ainda a factualidade invocada na petição inicial.

Os autores responderam.

Procedeu-se ao saneamento do processo.

A autora ES desistiu do pedido, tendo sido homologada tal desistência e declarado extinto o respetivo direito, conforme despacho de fls. 313.

Procedeu-se a julgamento e proferiu-se decisão quanto ao julgamento de facto, após o que foi proferida sentença que concluiu nos seguintes termos: “Nos termos expostos, julgo a presente acção improcedente, por não provada, e absolvo a R do pedido que contra si foi dirigido.

Valor da causa: já indicado em Saneador.

Custas pelo A.

Notifique e registe”.

Não se conformando o autor apelou formulando as seguintes conclusões: “1) Por douta sentença proferida pelo tribunal a quo foi julgada improcedente a acção e em consequência absolvida a Ré do pedido, entendeu aquele tribunal que: "( ... ) impõe-se julgar procedente, por provada, a invocada excepção peremptória de direito material de exclusão do sinistro do âmbito da responsabilidade contratualmente assumida e, em consequência, absolver a R do pedido que contra si foi formulado, nos termos gerais da aplicação conjugada dos artigos 405. ° e 342. °n. ° 2 do Código Civil, 498º do Código de Processo Civil, 101. ° Decreto-Lei n. ° 72/2008 de 16 Abril à luz da cláusula 4ª do contrato de seguro celebrado." O ora Recorrente não se conforma com a decisão, dela interpondo recurso.

2) Entendemos salvo o devido respeito, que a sentença é nula nos termos do artigo 668°, n° 1, b), porquanto não foi fundamentada a matéria de facto.

3) Não existe naquela sentença qualquer menção à prova produzida, nomeadamente para prova dos factos considerados como provados nos artigos 13.°, 15.° e 19.° da contestação e que determinaram a procedência da excepção peremptória de exclusão da responsabilidade da Ré, absolvendo-a.

4) Ora, tal recai numa clara infundamentação da sentença, Assim como em omissões tangentes à prova produzida, Concluindo-se pela nulidade daquela.

5) Segundo o art. 205º n° 1 da CRP, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.

6) Pois a fundamentação cumpre uma dupla função: de carácter objectivo - pacificação social, legitimidade e autocontrole das decisões; e de carácter subjectivo - garantia do direito ao recurso e controlo da correcção material e formal das decisões pelos seus destinatários.

7) Para cumprir a exigência constitucional, a fundamentação há-de ser expressa, clara e coerente e suficiente. Ou seja, não deve ser deixada ao destinatário a descoberta das razões da decisão; os motivos não podem ser obscuros ou de difícil compreensão, nem padecer de vícios lógicos; a fundamentação deve ser adequada à importância e circunstância da decisão.

8) A fundamentação da decisão deve, pois, permitir o exercício esclarecido do direito ao recurso e assegurar a transparência e a reflexão decisória, convencendo e não apenas impondo.

9) Sempre se dirá que uma decisão vale o que valerem os seus fundamentos e os fundamentos destinam-se precisamente a convencer que a decisão é justa.

10) Aliás, este dever de fundamentação para as decisões judiciais em geral encontra-se previsto e fundamentado no art. 158º do CPC.

11) A fundamentação da sentença tem regulamentação específica no artigo 659° do Código Processual Civil, que dispõe que:" 1. A sentença começa por identificar as partes e o objecto do litígio, fixando as questões que ao tribunal cumpre solucionar. 2. Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final. 3. Na fundamentação da sentença, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer. " 12) Ora o referido no n° 3 deste artigo não se verificou em parte alguma da sentença, resultando num claro vazio de fundamentação, violando aquela decisão os referidos dispositivos normativos: arts. 205.° e 695.° ambos do C.P.C(anterior). Pelo que não tendo sido fundamentada esta sentença, é, sem mais, nula.

13) Entendeu o tribunal a quo que "( ... )se configuram como questões por resolver, no caso sub judice, segundo a ordem de precedência lógica indicada: -dos pressupostos de facto e de direito da invocada excepção da responsabilidade de indemnizar, por falta de comunicação, pelo segurado, do sinistro; -dos pressupostos de facto da obrigação de indemnizar decorrente da responsabilidade civil profissional do advogado; -em caso de resposta afirmativa à segunda questão: determinação do quantum indemnizatório.

14) Considerando o tribunal a quo que no caso em apreço estamos perante um contrato de seguro facultativo. Ora salvo o devido respeito, não lhe assiste razão, de acordo com o disposto no art. o 99 do EOA: Artigo 99° (Responsabilidade civil profissional) : 1 - O Advogado com inscrição em vigor deve celebrar e manter um seguro de responsabilidade civil profissional tendo em conta a natureza e âmbito dos riscos inerentes à sua actividade, por um capital de montante não inferior ao que seja fixado pelo conselho geral e que tem como limite mínimo € 250 000, sem prejuízo do regime especialmente aplicável às sociedades de Advogados 14) Tanto no Estatuto da ordem dos Advogados como no Código de Deontologia da União Europeia (C.C.B.E), a matéria do seguro de responsabilidade civil profissional está inserida no capítulo das relações com os clientes.

15)Em relação a estes, poderá haver limitação na responsabilidade em consequência de erro, omissão ou negligência cometidos pelo Advogado, ou por seus colaboradores e empregados, exclusivamente no exercício da actividade profissional de Advogado.

16) O Advogado que pretenda limitar a sua responsabilidade pessoal na sua relação com o cliente, necessita, em primeiro lugar, de contratar o reforço de capital seguro com a Seguradora ou de contratar outro seguro de responsabilidade civil profissional pelo menos até ao limite de 250.000 €.

17) Quanto aos danos produzidos nos bens e nas pessoas de terceiros, inexiste limitação, funcionando o seguro como uma transferência parcial ou total da cobertura do risco da actividade profissional do Advogado, seus colaboradores e empregados.

18) O Advogado com inscrição em vigor deve celebrar e manter um seguro de responsabilidade civil profissional tendo em conta a natureza e âmbito dos riscos inerentes à sua actividade, por um capital de montante não inferior ao que seja fixado pelo Conselho geral e que tem como limite mínimo 250.000 euros.

19) Sendo que a apólice do segurado se encontrava válida à data da reclamação tratando-se o seguro em causa de seguro de responsabilidade de grupo.

20) Ora este seguro, pretende na sua essência a protecção do lesado, garantindo aquele o respeito por direitos constitucionalmente consagrados.

21) O que se pretende proteger é o interesse do lesado em ser indemnizado dos danos sofridos, e é esse interesse que a lei quer proteger (vide nesse sentido por aplicação analógica o Ac. do STJ de 17/01/2013).

22)O A. conhecendo da obrigatoriedade do seguro accionou/reclamou o pagamento dos danos sofridos pela omissão do segurado com culpa junto dessa instituição, a qual declinou a responsabilidade por entender estar verificada clausula de exclusão, no entanto, nada resulta dos autos que comprove que efectivamente após a reclamação da Ré esta tenha interpelado o seu segurado para vir prestar as informações necessárias ou tenha recorrido a qualquer meio para que o mesmo fosse judicialmente interpelado, conforme alega nos seus articulados.

23) Ora de acordo com a teoria da distribuição dinâmica do ónus da prova, o ónus da prova incumbe à parte que possui melhores condições de produzir a prova, independentemente de quem alega os factos.

24) Ao atribuir-se o ónus da prova à parte que tiver melhores condições de produzi-la garantir-se-á o acesso à justiça, respeitando o direito constitucionalmente consagrado no art.º 20º da C.R.P., bem como se evitará a utilização do processo como fim em si mesmo, fazendo com que se atinja, cada vez mais, a sua finalidade de proporcionar a prestação jurisdicional de acordo com a verdade real/material.

25) Além disso, a teoria da distribuição dinâmica da prova visa repelir a chamada prova impossível. Não porque a lei impõe um ónus a uma das partes que esta deve ser penalizada, se é possível descobrir a verdade. Se a parte que não tem o ónus possui condições de produzir a prova e...

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