Acórdão nº 235-15.1T8MFR.L1--6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCA MENDES
Data da Resolução08 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, no Tribunal da Relação de Lisboa.

I–Relatório: A Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas veio requerer no Tribunal de Comarca de Lisboa Oeste a notificação judicial avulsa de C, com as seguintes finalidades: Entrega do despacho de acusação e para a notificanda apresentar, querendo, a sua defesa, por escrito, no prazo de vinte dias.

Em 06.07.2015 pela Exmª Juiz a quo foi proferido o seguinte despacho: «(..) O acto que se pretende comunicar ao requerido consubstancia-se num despacho de acusação prolatado em sede de procedimento disciplinar instaurado no exercício das atribuições da requerente.

Por outro lado, não se pode deixar de atentar na natureza jurídica da requerente, que se constitui como pessoa colectiva de Direito Público, na categoria de Associação Pública, que integra a denominada Administração Autónoma (…) Na subespécie a que pertence a requerente, a saber, associação pública de entidades privadas, a lei confere-lhes poderes de autoridade para o exercício de determinadas funções públicas, que em princípio pertenceriam ao Estado (...) Por fim, resta acrescentar que a estas associações se aplica o Direito Administrativo sempre que exerçam os poderes públicos que lhe foram atribuídos.

Ora, a notificação de um despacho de acusação proferido em sede de processo disciplinar consubstancia um acto do iter procedimental em apreço, que por sua vez e sem margem para quaisquer dúvidas, consubstancia a manifestação do exercício das acima referidas funções de autoridade, ou seja, manifestação do exercício de um poder público.

Do exposto resulta com clareza para este Tribunal que tudo o que se relacione com o exercício dos poderes sancionatórios sobre os associados de uma qualquer associação pública é substantivamente tema de Direito Administrativo, e processualmente da competência dos Tribunais Administrativos.

Tal resulta do vertido no artigo 1.º e 4.º, n.º 1 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, ínsito na Lei n.º 13/2002 de 19.02. É que o último dos preceitos encerra uma enumeração meramente exemplificativa, como é doutrina unânime, não se incluindo apenas no foro em apreço as situações jurídicas aí descritas, mas antes todas as que se reconduzam ao conceito de relação jurídica administrativa, critério constitucionalmente consagrado como atributivo de juris dictio à ordem judicial administrativa – cfr. artigo 212.º, n.º 3 da Const. Rep. Portuguesa (…) Mas não só: após da reforma do Processo Administrativo, este passou a ser um contencioso de plena jurisdição, ao qual se aplica subsidiariamente o Cód. Proc. Civil, o que resulta dos artigos 1.º in fine, 2.º, n.ºs 1 e 2, 23.º e 25.º, todos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contido na Lei n.º 15/2002 de 22.02; razão pela qual é perfeitamente admissível que naquele foro se tramitem e realizem as notificações judiciais avulsas que se reportem a relações jurídicas administrativas, pois é o mesmo o único constitucionalmente reputado como detendo o apetrechamento técnico jurídico que lhe faculta a correcta aferição, em abstracto, da validade do acto/comunicação que se pretende levar ao conhecimento de outrem.

É que não se pode olvidar que semelhante aferição é imposta pelo regime resultante do artigo 256.º do Cód. Proc. Civil: este preceito, aplicável subsidiariamente ao contencioso administrativo nos termos preditos, faz depender a realização da notificação solicitada de despacho prévio do Juiz por forma a aquilatar da validade da situação jurídica na base da qual se encontra a comunicação que se pretende empreendida mediante notificação judicial. Entendimento que prescinda de tais sumárias análise e julgamento, transforma o julgador, in casu, num mero elemento no circuito do correio, a quem nada mais se pede do que olhar para o requerimento que lhe é presente, e bem assim ordenar o seu cumprimento.

Sendo inaceitável o entendimento consignado no parágrafo anterior, não se vislumbra qual a razão, não sendo o tribunal judicial competente para dirimir os conflitos emergentes da aplicação de sanções disciplinares aos membros de uma qualquer Ordem Profissional, aquela lhe há-de ser reconhecida somente para determinação da realização de um acto de comunicação, quando tal determinação envolve a realização de um julgamento sobre matérias...

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