Acórdão nº 2647/15.1YLPRT.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | ISABEL FONSECA |
Data da Resolução | 03 de Outubro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de ... 1.
–RELATÓRIO: Ação: De despejo, com forma de processo especial.
* Autor – Maria..........
* Réus – Maria.......... e Maurício..........
***** Pedido.
Que se declare a cessação do contrato de arrendamento, com a condenação dos réus na entrega do imóvel à autora, livre de pessoas e bens “no estado de conservação que se encontrava aquando da celebração do contrato de arrendamento” e, ainda, a pagarem-lhe a indemnização devida nos termos do disposto no artigo 1045.° nº 1 do Código Civil, até efetiva entrega do locado, computando tal montante, à data da instauração da presente ação, em € 367,44.
Causa de pedir.
A autora procedeu à denúncia do contrato de arrendamento celebrado em 11 de dezembro de 1990, entre Maria ... ... ... da Câmara e a ré mulher, tendo por objeto o prédio sito na Estrada de ..., nº 25, e Azinhaga da ..., nº 2, porta 2, em ..., operada através de cartas registadas, com aviso de receção, enviadas a cada um dos réus em 13.03.2013 e que estes receberam, mas os réus não entregaram o locado, como se impunha.
Oposição.
O contrato de arrendamento mantém-se em vigor porquanto a autora continua a receber as rendas e a emitir os respetivos recibos.
A coberto de uma cláusula do contrato de arrendamento, os réus realizaram no locado, em 1991, obras gerais de conservação e beneficiação, incluindo chão, paredes, janelas, instalações sanitárias, cozinha, instalação elétrica e canalização de esgotos; o custo das obras foi de 13.000.000$00 (atualmente €120.670,53€), traduzindo “benfeitorias necessárias e úteis” tendo os réus direito à compensação respetiva, nesse valor.
Os requeridos têm direito de retenção sobre o locado até ao pagamento da compensação pelas obras aí realizadas.
Reconvenção. No caso de os pedidos formulados pela autora serem julgados procedentes, os réus pretendem a condenação da autora no pagamento de uma indemnização “pelas obras realizadas no locado no valor de €120.670,53”, “reconhecendo-se aos Requeridos o direito de retenção sobre o locado até integral pagamento daquela indemnização”.
Réplica.
A autora impugna a factualidade invocada pelos réus.
Julgamento.
Realizou-se a audiência de julgamento após o que, em 06-03-2017, proferiu-se sentença que concluiu como segue: “Nestes termos, I.
–Julgo validamente denunciado pela autora o contrato de arrendamento celebrado entre si e os réus no dia 11 de dezembro de 1990 tendo por objecto o prédio urbano sito na Estrada de ..., nº 25, e Azinhaga da ..., nº 2, porta 2, em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº 1538 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1169, da freguesia de ... com efeitos a 31 de março de 2015, e em consequência, condeno os réus a)-a entregarem de imediato o locado à autora, livre de pessoas e bens e b)-a pagarem à autora a quantia devida a esta a título de indemnização pela mora na entrega do locado, desde 1 de Abril de 2015 até efectiva entrega, livre de pessoas e bens, correspondente ao dobro do valor da renda mensal devida, a liquidar em execução de sentença, e à qual devem ser deduzidos todos os valores já entregues pelos réus à autora desde 1 de Abril de 2015; II.-Julgo improcedente, por não provada, a reconvenção, absolvendo a autora de tudo o peticionado pelos réus.
Custas da acção e do pedido reconvencional pelos réus - artigo 527.° nº 1 do Cód. Proc. Civil.
Notifique e registe”.
Recurso.
Não se conformando os réus apelaram, formulando as seguintes conclusões: “ 1ª –Deve dar-se por prova do que as obras elencadas nas alíneas iu, iv, vi, vii , viu , ix, xii , xi u, xiv, xv, xxii, xxiii, xxiv, xxvi, xxví.i, xxviu , xxix, xxx, xl iii , xliv , xlv , xlvi , xlii , 1, iiv , lvii., lx, Ixiii , lxiv, lxviii , lxix, lxx, lxxi, lxxiv, lxxv, lxxviii, lxx, lxxxi, lxxxii, lxxxii i, lxxvii i, xc, xci , xci i e xciv do ponto 13 dos factos provados não podem ser levantadas, ou que podendo, isso implicaria detrimento do locado.
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–Deve dar-se como provado que os RR, ora recorrentes despenderam nas obras realizadas no locado a quantia de € 43.516,43.
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–A circunstância da Autoral ora recorrida, ter continuado a emitir recibos de renda após a data em que a denúncia do contrato de arrendamento deveria ter operado os seus efeitos, significa que o arrendamento se manteve em vigor após essa data.
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–Termos em que ao decidir cm contrário a douta sentença fez errada apreciação dos factos e igualmente errada interpretação e aplicação do direito, maxime do artº 1045.° do CC.
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–Todas as obras realizadas pelos RR, ora recorrentes, destinaram-se a dotar - e dotaram efectivamente - o locado de condições de habitabilidade e conforto que antes da respectiva realização não dispunha, e valorizaram-no.
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–A circunstância dos RR, ora recorrentes terem usufruído das obras não exclui o enriquecimento da Autora, ora recorrida, pois a contrapartida do contrato de arrendamento é a renda e não as obras realizadas no locado.
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–Em suma, as obras realizadas no locado não podem ser levantadas, pelo menos sem detrimento do mesmo, e valorizaram-no, operando-se o correspondente e enriquecimento da Autora, ora recorrida, assistindo por isso aos ora recorrentes, o direito a serem compensados pelo respectivo valor nos termos do disposto no artº 1074.º/5 do CC, ou seja,€ 43.516,43.
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–Termos em que, ao decidir em contrário, a douta sentença recorrida faz também nesta parte errada apreciação dos factos e igualmente errada interpretação e aplicação do direito, maxime do art. 1074º /5 do CC.
Nestes termos, nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de V.Exas. Venerandos Desembargadores, deve revogar-se a sentença recorrida, proferindo-se em sua substituição decisão que julgue a reconvenção parcialmente procedente, condenando-se a Autora, ora recorrida, a pagar aos RR, ora recorrentes, uma compensação no valor de € 43.516,43 pelas obras realizadas no locado.
Assim se fazendo JUSTIÇA!” Foram apresentadas contra alegações.
Cumpre apreciar.
II.
–FUNDAMENROS DE FACTO.
O tribunal de primeira instância deu por provada a seguinte factualidade 1.
–A autora é contitular, em comum e sem determinação de parte ou de direito, de 66672/100000 do prédio urbano sito na Estrada de ..., nº 25, e Azinhaga da ..., nº 2, porta 2, em ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 1.... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...9, da freguesia de ....
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–A autora é titular do direito identificado em 1. por o ter adquirido por sucessão hereditária da sua mãe, Maria ... ... ... da Câmara, falecida em 25 de setembro de 2008.
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–Mediante acordo escrito realizado no dia 11 de dezembro de 1990, a então proprietária dos prédios declarou dá-los de arrendamento à ré mulher, que declarou tomá-los de arrendamento, para habitação e pelo prazo de um ano, renovável automaticamente por mais e sucessivos períodos, pela renda mensal de 6.000$00.
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–Tal renda ascende, atualmente, à quantia mensal de € 91,86.
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–Consta do escrito particular descrito em 3.
a seguinte cláusula 5ª: «1.
–A arrendatária poderá realizar nos prédios arrendados obras de conservação e de beneficiação, podendo inclusive alterar substancialmente a disposição interna das suas divisões, para o que fica desde já autorizada pela senhoria.
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–A arrendatária, nos termos do disposto no número anterior, poderá efectuar nomeadamente as seguintes obras: a)- Reparação dos tectos, paredes e chão.
b)- Reparação de sanitários.
c)- Reparação de instalação eléctrica».
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–Em 13 de março de 2013 a autora enviou a cada um dos réus, que a recebeu, uma carta registada, com aviso de receção, com o seguinte teor: «Assunto: Denúncia de contrato de arrendamento referente ao prédio sito na Estrada de ..., nº 25, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº 1... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...9, da freguesia de ....
Ex.ma Senhora / Senhor (. . .) Na qualidade de Senhoria do prédio urbano supra identificado, de que V. Excia é arrendatária[o], venho pela presente comunicar a V. Ex.a que, na presente data, procedo à denúncia do contrato de arrendamento para habitação própria, referente ao imóvel acima identificado, e que celebrei com V. Ex.a no dia 11 de Dezembro de 1990.
A presente denúncia contratual é efectuada ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 1101º do Código Civil, actualizado pela Lei nº 31/2012 de 14 de Agosto.
Assim sendo, o referido contrato cessará os seus efeitos no dia 31 de Março de 2015, data em que o arrendado deve ser entregue livre de pessoas e bens e no estado de conservação em que se encontrava aquando da celebração do contrato de arrendamento.
Sem outro assunto (. . .)».
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–Em 2 de abril de 2015 a autora enviou aos réus, que a receberam, uma carta registada, com aviso de receção, com o seguinte teor: «Assunto: Cessação do contrato de arrendamento relativo ao prédio sito na Estrada de ..., nº 25, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº 1... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...9, da freguesia de ... (de ora em diante abreviadamente designado por o "Imóvel"): entrega do arrendado, livre de pessoas e bens.
Ex.mos Senhores No seguimento da N/ carta datada de 13 de março de 2013 que V/ remeti e independentemente de qualquer circunstância, o contrato de arrendamento em referência cessou os seus efeitos no passado dia 31 de março de 2015.
De acordo com a mencionada carta, o arrendado deveria ter sido entregue, livre de pessoas e bens, até à data aí referida, o que até à presente data não se verificou.
Assim sendo, serve a presente para solicitar a entrega do arrendado, nos termos supra mencionados, no prazo máximo de 5 (cinco) dias úteis a contar da recepção da presente carta, sob pena de me ver forçada a exigi-lo coercivamente.
Sem outro assunto (. . .)».
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–Em 7 de abril de 2015 a ré enviou à autora, que a recebeu, uma carta registada, com aviso de receção, com o seguinte teor...
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