Acórdão nº 3070/12.5TBBRR-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | PEDRO MARTINS |
Data da Resolução | 12 de Outubro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: –Relatório: N, com domicilio na Praceta x, nº. x, 1º. Dtº, em VA, intentou em 15/10/2012, a presente acção contra o seu marido J, pedindo que o tribunal decrete, sem consentimento do réu, o divórcio entre ambos, fixe a seu favor uma pensão de alimentos a pagar pelo réu, no montante mensal de 400€, 14 vezes ao ano, e lhe atribua [o uso d]a casa de morada de família (de que é proprietária de metade e nua proprietária de outra metade, sendo o réu usufrutuário desta metade).
Alegou para o efeito, em síntese, na parte que importa, que contraíram casamento a 10/10/2001; não existem filhos desse casamento; desde 2009 deixaram de fazer vida em comum e o réu vive com uma companheira de facto; desde Janeiro de 2012 o réu deixou de contribuir com qualquer valor para as despesas da autora, que vive da pensão de reforma no valor de 300€ e a expensas de uma amiga em França.
Realizada tentativa de conciliação, as partes não chegaram a acordo quanto a eventual prestação de alimentos, nem quanto à atribuição do uso da casa de morada de família, notificando-se o réu para, querendo, contestar a acção.
O réu contestou, impugnando os factos vertidos pela autora e alegando, em síntese, na parte que importa, que foi a autora quem abandonou o lar conjugal; deixaram de fazer vida em comum desde 2008; para além da pensão que aufere em Portugal, a autora aufere uma pensão em França; concluiu pela improcedência do pedido de alimentos e pelo decretamento do divórcio.
Os autos prosseguiram para julgamento, e no início do mesmo foi obtido acordo por parte da autora e do réu quanto à casa de morada de família, cujo uso ficou atribuído àquela, e à inexistência de bens comuns do casal, prosseguindo os autos quanto ao pedido de alimentos, convolando-se os autos em divórcio por mútuo consentimento, nos termos do disposto no artigo 931, nºs. 3 e 4 do CPC.
Foi feito julgamento, restrito à questão do direito a alimentos, e depois foi proferida sentença, que, na parte que importa, decretou o divórcio entre a autora e o réu, atribuiu o uso da casa de morada de família, sita na Praceta x, nº. x, 1º. Dtº, em VA, à autora até à partilha, e condenou o réu a prestar alimentos à autora, através de transferência bancária para a conta da mesma, na quantia mensal referente à diferença entre a pensão de velhice auferida, actualmente de 305,96€, e o valor em vigor a título de IAS, actualmente de 421,32€, ou seja, 115,36€, com efeitos a partir da data da sentença.
A 07/03/2017, o réu recorre da sentença – para que seja revogada, na parte que se refere ao pedido de alimentos, e substituída por outra que o absolva do pedido -, arguindo em conjunto a existência de vícios da sentença e impugnando a decisão da matéria de facto e discutindo a matéria de direito noutra parte.
A autora contra-alegou, levantando a questão prévia da intempestividade do recurso e defendendo a improcedência do mesmo.
* Questões que importa decidir: da intempestividade do recurso, das nulidades da sentença, da impugnação da decisão da matéria de facto e da improcedência do pedido de alimentos.
* Da questão prévia – da intempestividade A autora não tem, manifestamente, razão.
Tendo a sentença sido enviada através de carta elaborada a 23/01/2017, ou seja, tendo sido notificada a 26/01/2017 (art. 248 do CPC), e incluindo o recurso impugnação da decisão da matéria de facto, sendo pois o prazo para alegações de 30 + 10 dias (art. 638/1 e 7 do CPC), é evidente que a 07/03/2017, quando ele foi interposto, ainda o prazo não tinha decorrido (iniciando-se a 27/01/2017, só terminava a 07/03/2017).
* Das nulidades da sentença Considerando que as conclusões do recurso foram elaboradas em flagrante violação da exigência de síntese constante do art. 639/1 do CPC, este tribunal de recurso resume agora a argumentação do réu, nesta parte, ao seguinte: Depois de uma extensão transcrição de requerimentos, despachos, notificações, respostas e informações, o réu diz que o tribunal não deu seguimento adequado ao deferimento do seu pedido de que as autoridades francesas viessem informar se pagavam à autora alguma pensão ou reforma; pelo que não poderia ter dado como não provada a afirmação de que a autora aufere uma pensão de reforma ou qualquer outro rendimento em França; por outro lado, o tribunal não poderia ter dado como provado o que consta do ponto 5, mas antes aquilo que resulta da prova testemunhal que a ré invoca; o começo indeterminado do ponto 3 dos factos provados devia ter sido concretizado com base em prova testemunhal que o réu identifica e o resto devia ser considerado não provado por falta de prova.
Mais à frente, na parte do recurso sobre matéria de direito, o réu invoca ainda a omissão da sentença sobre o pedido que o réu fez de informação sobre, grosso modo, valores mobiliários da autora.
Decidindo: Tudo isto não tem nada a ver com vícios da sentença que dessem causa a nulidades da mesma mas sim, por um lado, com nulidades processuais (art. 195/1 do CPC) e, por outro lado, com a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 640 e 662 do CPC).
Ou seja, se a secção de processos, depois de o tribunal ter deferido um pedido de informações feito pelo réu, não fez o pedido de informações em termos correctos, e se o tribunal proferiu sentença sem que as informações em causa tivessem sido obtidas e também sem dar sequência ao pedido feito pelo réu de informação sobre valores mobiliários da autora, verificar-se-iam nulidades processuais (art. 195/1 do CPC) e não nulidades da sentença (previstas no art. 615 do CPC). Nulidades processuais que, a terem-se verificado, o réu teria de ter arguido oportunamente, ou seja, por força do art. 199/1 do CPC, pelo menos até ao momento em que foi dada a palavra ao seu advogado para alegações finais, pois que a partir daí não podia deixar de saber que aquelas informações não tinham sido obtidas (pois que foi notificado de todas as que foram juntas ao processo) e apesar disso o tribunal tinha encerrado a produção de prova (art. 604/3-e do CPC, sem prejuízo do disposto no art. 607/1, parte final, do CPC, mas esta já seria uma eventualidade com que o advogado do réu não podia contar para o efeito).
Quanto à impugnação da decisão da matéria de facto ela será apreciada à frente.
* No tribunal recorrido foram dados como provados os seguintes factos: 1–A autora e o réu celebraram casamento civil, no regime imperativo da separação de bens, em 10/10/2001 [deu-se o documento como integralmente reproduzido, dele resultando ainda que à data do casamento a autora tinha 49 anos e o réu 64 anos].
2–Em data concreta não determinada mas que se situou em 2008, a autora e o réu deixaram de fazer vida em comum.
3–Desde data que não se logrou determinar, o réu deixou de contribuir com qualquer valor para as despesas da autora, que vive a expensas de uma amiga a residir em França, que lhe dá alojamento e alimentação quando a autora se desloca a esse país e de 305,96€ a título de pensão de velhice, paga pelo CNP.
=> Por força do que se decidirá abaixo, este ponto passa a ter a seguinte redacção: Desde Janeiro de 2012, o réu deixou de contribuir com qualquer valor para as despesas da autora; a autora, quando se desloca a França, vive a expensas de uma amiga que aí reside, que lhe dá alojamento e alimentação; a autora recebe 305,96€ mensais a título de pensão de velhice paga pelo CNP.
4–O réu é reformado do exército português, auferindo 1200€ líquidos mensais, a título de pensão de reforma paga pela caixa geral de aposentações.
5–O réu vive actualmente com uma ex-companheira, mãe dos seus filhos, contribuindo mensalmente com 500€ para o sustento da casa, suportando ainda, o montante mensal médio de 110€ em medicamentos e 180€ em deslocações a C para ser observado no Hospital M, cujas consultas e taxas moderadoras não são pagas por serem comparticipadas pelo seu sistema de saúde.
A parte inicial deste ponto passa a ter a seguinte redacção, por força da decisão proferida mais abaixo: O réu vive actualmente na casa de um seu filho, onde também vive uma ex-companheira, mãe daquele, contribuindo… [o resto mantém-se].
6–A autora suporta despesas em alimentação em montante não concretamente apurado, e, em montantes mensais médios, 7,47€ de gás, 14,65€ de luz, 6,47€ de água, 37,16€ de comunicações e TV, 10,73€ de medicamentos, e 10€ de despesas de condomínio.
7–Por sentença confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 02/11/2016, o réu foi condenado a pagar à autora 5100€, a título de indemnização por factos subsumíveis à prática de um crime de violência doméstica (artigo 152/1-a do Código Penal) e de um crime de dano (art. 212 do CP).
8–A autora tem actualmente 64 anos [o actualmente, aqui, refere-se inequivocamente à data da sentença…].
9–Tem problemas de saúde ao nível da coluna, tendo sido operada à mesma por duas vezes, não conseguindo trabalhar.
* Da impugnação da decisão da matéria de facto.
I– Já decorre do que se disse acima que o réu considera que o tribunal não devia ter dado como não provado a afirmação feita por si de que: “a autora aufere uma pensão de reforma ou qualquer outro rendimento em França.” O tribunal fundamentou assim a sua convicção quanto a esta matéria: Deram-se como não provados aquelas afirmação de facto feitas pelo réu uma vez que incumbia ao mesmo fazer prova da sua ocorrência, não o tendo feito, não logrou o tribunal firmar convicção sobre a ocorrência de tais factos, razão pela qual deu os mesmos como não provados. Diga-se ainda que, mais uma vez, a Segurança Social, em resposta à solicitação efectuada pelo tribunal, veio responder a fl. 256, que a autora não recebe pensão estrangeira, mas tão-só a do regime geral no montante de 305,96€. Também as...
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