Acórdão nº 969-09.0TYLSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução12 de Outubro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes na 6ª Secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa.

1.

–Relatório: A ( Sociedade de Capital de Risco, S.A.) , e B, intentaram acção especial nos termos do disposto no art. 1479º,nº1, do pretérito Código de Processo Civil ( anterior ao aprovado em 2013), contra: 1º C ; 2º D ; 3º E, e 4º F ( Sociedade de Serviços Médicos, S.A. ), com sede em …..

Peticionam os AA : – Que seja realizado um inquérito judicial à sociedade Requerida F para averiguação dos pontos que indicam no artigo 33.° do requerimento inicial.

1.1.

– Para tanto, alegaram ambos os autores, em síntese que : - São accionistas da sociedade Requerida, sendo titulares de uma percentagem do capital social superior a 10%, beneficiando portanto do direito colectivo à informação ; - Daí que, no âmbito do referido direito, dirigiram ao Conselho de Administração da sociedade Requerida, do qual são membros os três Requeridos/pessoas singulares, dois pedidos de informação por escrito sobre assunto social, concretamente sobre as obras de remodelação efectuadas na Clínica Europa, propriedade da sociedade Requerida, obras que acabaram por custar aquando concluídas quase mais 230% do que tinham sido orçamentadas; - Com os esclarecimentos pretendidos, visam os Requerentes apurar, nos termos do disposto no artigo 72º do CSC, da eventual responsabilidade dos membros da Administração da Sociedade no desvio orçamental verificado de 230%, até porque consideram os Requerentes que, com o desvio mencionado, foi colocada em causa a viabilidade económico - financeira da Sociedade.

- Sucede que, os referidos pedidos foram recusados pela Administração da sociedade requerida, com fundamentos inatendíveis e injustificados, maxime com o argumento - que não é verdadeiro - de que a Sociedade requerida havia já prestado todos os esclarecimentos pretendidos pelos requerentes ; - No essencial, no entender dos requerentes, interessa averiguar e obter informação sobre os seguintes aspectos referentes às obras de remodelação: 1.

–Projectos de execução de arquitectura e das especialidades, incluindo memórias descritivas, mapas de quantidades e orçamentos; 2.

–Projectos aprovados e licenciados pela Câmara Municipal de Cascais; 3.

–Propostas iniciais das empresas construtoras, incluindo a da Hagen; 4.

–Contrato de empreitada que deverá incluir planeamento de obra com cronograma de meios humanos e de equipamentos para a realização dos trabalhos, cronograma financeiro e cronograma de pagamentos, mapa de quantidades e lista de preços unitários, garantias de qualidade dos trabalhos; 5.

–Contrato com a entidade/empresa independente para fiscalização da execução da obra; 6.

–Contrato com as equipas projectistas; 7.

–Actas de reunião, correspondência trocada e negociação realizada com a empresa construtora Hagen; 8.

–Relatórios da fiscalização; 9.

–Contrato de empréstimo destinado ao financiamento das obras; 10.

–Actas do conselho de administração referentes à adjudicação da empreitada e à contratação do empréstimo e respectivas garantias.

1.2.

–Após citação dos RR, vieram todos apresentar contestação, em articulado conjunto, deduzindo no essencial impugnação motivada, maxime alegando que esclareceram já os AA das efectivas razões que levaram à alteração do valor da obra, o que fizeram no âmbito de uma Assembleia Geral, tendo então prestado uma informação completa, verdadeira e elucidativa.

Consequentemente, terminam os RR por impetrar a total improcedência da acção e, concomitantemente, requerem que sejam os AA sancionados como litigantes de má fé.

1.3.

–Após resposta dos AA ao incidente de litigância de má fé, procedeu-se à produção de prova ( inquirição das testemunhas arroladas ) , e , concluída a mesma ( em 6/2/2017 ) , veio em 31/03/2017 a ser proferida decisão que pôs termo à acção, sendo o respectivo excerto decisório o seguinte : “(…) IX.

–DECISÃO Face ao exposto: 1.- Julgo a presente acção improcedente e, em consequência: a.- Não determino a realização de inquérito judicial à sociedade F., absolvendo-se os Requeridos do pedido.

b.- Condeno os Requerentes A e B no pagamento das custas do processo, ao abrigo do disposto no artigo 1052.°, n.° 1. do Código de Processo Civil.

  1. - Julgo totalmente improcedente o pedido de condenação dos Requerentes como litigantes de má fé e, em consequência : a.- Dele absolvo os Requerentes A e B b.- Condeno os Requeridos C , D, E, e F no pagamento das custas do incidente, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal, nos termos do disposto nos artigos 527.°, n.°s 1 e 2. do Código de Processo Civil e 7.°. n.°s 4 e 8. e Tabela II anexa, do Regulamento das Custas Processuais.

    Registe e notifique.

    Lisboa, 31/03/2017 “ 1.4.

    –Notificados da sentença identificada em 1.3., e da mesma discordando, vieram então os requerentes A e B, interpor recurso de apelação, que admitido foi e com efeito meramente devolutivo, formulando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões: A.

    – Por sentença de fls... o douto tribunal a quo julgou a acção improcedente e, em consequência, não determinou a realização de inquérito judicial à sociedade Recorrida F, absolvendo os Recorridos do pedido; B.

    – Decidiu o douto tribunal a quo "(...) que os Requerentes os formulam ao abrigo do estatuído no artigo 291° do Código das Sociedades Comerciais (...) [cabendo] apreciar se são pedidas informações sobre factos ou se são pedidos documentos, tendo presente tudo o que supra se deixou dito (...).

    "; C.

    – E concluiu a Meritíssima Juiz a quo que "(...) estamos perante um pedido de documentos e não perante um pedido de informações efectuado ao abrigo do estatuído no artigo 291.° do Código das Sociedades Comerciais (...) não se enquadrando os documentos pedidos nos documentos que os Requerentes teriam direito de consultar e sendo, como é, taxativo o elenco legal, não pode deixar de concluir-se que não têm direito à sua consulta e muito menos a cópia dos mesmos, porquanto nada tendo sido alegado ou sequer apurado no sentido da aplicabilidade do disposto no n.°4 do artigo 288. ° ainda que fosse admissível a sua consulta, nunca a mesma poderia ocorrer fora da sede social. Destarte, não estando os Requeridos obrigados a fornecer tais documentos, por os Requerentes não terem direito à sua consulta e/ou cópia, podem recusar-se a fazê-lo, sem que isso configure uma recusa de informação susceptível de fundar o inquérito judicial à sociedade (...) "; D.

    – No entanto, com o devido respeito, mal andou o tribunal a quo na sua decisão, permitindo que aos Recorrentes fosse preterido o seu direito à informação, na qualidade de accionistas da sociedade Recorrida, nos termos do artigo 21.°, n.° 1, al. c), do CSC, sendo este um direito irrenunciável e inderrogável; E.

    – E, antes de mais, relembre-se que o direito à informação do titular da participação social terá sempre a natureza de direito subjectivo, de que é credor o sócio ou o accionista, consubstanciando-se na faculdade de obter informações sobre a vida da sociedade nos termos da lei e dos estatutos sociais, e de que é devedor a própria sociedade; F.

    – Uma vez que estamos perante uma zona de autonomia privada por excelência, sempre se dirá que "a liberdade e o discernimento exigem informação. O agir negocial pressupõe que a pessoa que age o faça informadamente. Por isto, a informação é imprescindível no exercício societário." ( Pedro Pais de Vasconcelos, A Participação Social nas Sociedades Comerciais, 2.a edição, Almedina, página 204 ); G.

    – Pelo que, atenta a sua imprescindibilidade como condição prévia do exercício de direitos sociais, quiçá para uma eventual responsabilização dos administradores em efectividade de funções por actos praticados durante o exercício do seu mandato, ou até para um correto exercício do direito de voto pelo titular do capital social, afigura-se premente que a informação solicitada pelos accionistas, nos presentes autos ao abrigo do previsto no artigo 291.°, do CSC, lhes seja facultada, de forma verdadeira, completa e elucidativa; H.

    – Os Recorrentes, fazendo uso do meio legal previsto no artigo 291.°, do CSC, efectuaram dois pedidos de informação à sociedade Recorrida, o primeiro a 17 de Abril de 2009 e o segundo a 29 de maio de 2009, os quais lhes foram peremptoriamente negados pela sociedade Recorrida, vendo assim um dos seus direitos sociais, advenientes do seu status de accionistas de fruto do seu investimento, ser lesado e afectado, de forma irreversível; I.

    – Perante m desvio orçamental de 230% (duzentos e trinta porcento) nas obras de remodelação da sociedade Recorrida, face ao orçamento aprovado, não pode deixar de ser lícito o pedido de informação por parte dos accionistas que pretendem compreender o seu conteúdo e apurar a responsabilização dos administradores em efectividade de funções, e solicitando em especial : 1-Projectos de execução de arquitectura e das especialidades, incluindo memórias descritivas, mapas de quantidades e orçamentos; 2-Projectos aprovados e licenciados pela Câmara Municipal de Cascais; 3-Propostas iniciais das empresas construtoras, incluindo a da Hagen; 4-Contrato de empreitada que deverá incluir, planeamento de obra com cronograma de meios humanos e de equipamentos para a realização dos trabalhos, cronograma financeiro e cronograma de pagamentos, mapa de quantidades e lista de preços unitários; 5-Contrato com a entidade/empresa independente para fiscalização da execução da obra; 6-Contrato com as equipas projectistas; 7-Actas de reunião, correspondência trocada e negociação realizada com a empresa construtora Hagen; 8-Relatórios da fiscalização; 9-Contrato de empréstimo destinado ao financiamento das obras; 10-Actas do conselho de administração que sustentam as deliberações tomadas relativamente à adjudicação da empreitada e à contratação do empréstimo e respectivas garantias.

    J.

    – No caso em apreço, ficou claro que os Recorrentes cumprem todos os requisitos formais para se fazerem valer deste mecanismo jurídico de defesa do...

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