Acórdão nº 4840/13.2T3SNT.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 31 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelAGOSTINHO TORRES
Data da Resolução31 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em Conferência, os Juizes no Tribunal da Relação de Lisboa.

* * * 1.1-Por sentença de 17/2/2016, proferida no procº comum singular NUIPC 4840/13.2T3SNT, foi decidido: “ RELATÓRIO: O Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, de: -J.

, imputando-lhe a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.º, nº 1 al. d) do Cód. Penal, cujos factos constantes do requerimento do Ministério Público para julgamento, aqui se dão por integralmente reproduzidos.

* A demandante BS, Lda. formulou pedido de indemnização cível contra o arguido, peticionando a condenação deste no pagamento de € 8.905,91, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos desde a notificação para contestar até integral pagamento.

Para tanto, aduz que, no âmbito do contrato de franchising que celebrou com o Café Snack –Bar O.N., Lda.”, representado pelo demando, este não consumiu os quilogramas de café mensalmente acordados, no mínimo. Nesta senda, a demandante resolveu o contrato por incumprimento, o que gera a obrigação de indemnização, aqui peticionada no valor de € 4.908,00.

Aduz, ainda, que foram efetuados fornecimentos de café pela demandante ao estabelecimento, cujas faturas não foram pagas pela sociedade, no total de € 3.387,67, valor que vêm também peticionar neste pedido de indemnização cível.

* O arguido apresentou contestação escrita e rol de testemunhas, aduzindo que o vertido na acusação não é totalmente verdadeiro, relegando a sua defesa para a audiência de discussão e julgamento.

* Procedeu-se ao julgamento, com observância do legal formalismo, conforme decorre da ata respetiva.

* Mantêm-se os pressupostos de validade e regularidade da instância apreciados no despacho que recebeu a acusação e designou dia para julgamento.

* FACTOS PROVADOS: Da acusação, com relevo para a decisão da causa, provou-se que: 1-O arguido era o único sócio e gerente da sociedade Café-Snack-Bar O.N., Lda., com sede na Av.IS, em Agualva.

2-Nessa qualidade, o arguido deliberou em assembleia da sociedade realizada no dia 25 de Janeiro de 2012, na sede sita em Agualva, que a sociedade não tinha ativo nem passivo, nada havendo a partilhar, encontrando-se em condições de poder ser dada como liquidada, pelo que consideraram a mesma dissolvida.

3-Com base nessa ata de dissolução e liquidação da sociedade, porque o sócio gerente declarou que a sociedade não tinha ativo nem passivo a liquidar e por estarem reunidos todos os requisitos legais, foi ordenada a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade e a feitura do respetivo registo.

4-Não obstante, a sociedade era, à data de 25 de Janeiro de 2012, devedora à sociedade BS, Lda., da quantia de € 3.090,70 (três mil e noventa euros e setenta cêntimos).

5-Além disso, a referida sociedade era titular da conta bancária n.º 28558539.10.001 junto do Banco B., que, naquela data, apresentava saldo no valor de € 56,52 (cinquenta e seis euros e cinquenta e dois cêntimos).

6-O arguido sabia que as declarações que fez e que ficaram a constar na ata e no registo de dissolução e liquidação da sociedade não correspondiam à realidade e que, ao faltar à verdade nessas declarações, abalava a confiança e credibilidade na autenticidade e genuinidade dos referidos documentos e atentava contra a fé pública que merecem.

7-Atuou da forma descrita com o propósito, conseguido, de criação de um documento a que fosse atribuída fé pública, sabendo que o que declarava e fazia constar no mesmo era juridicamente relevante e não correspondia à verdade, logrando assim inscrever no registo e tornar pública a dissolução da sociedade e inexistência de ativo e passivo e levar à extinção da mesma enquanto pessoa coletiva, com vista à obtenção de um benefício ilegítimo a que não tinha direito.

8-Agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo ser a sua conduta proibida e punida por lei. Do pedido de indemnização cível formulado pelo demandante, com relevo para a decisão da causa, provou-se que: 9-O Café Snack-Bar O.N., Lda., representado pelo arguido, obrigou-se a consumir um mínimo mensal de 34 quilos do café T. Lote Blue, num total de 2000 quilos até ao termo do contrato, com o preço de 17,50 € por lote.

10-Apenas foram consumidos 1182 quilos, tendo ficado por consumir 818 quilos.

11-Tendo em consideração a cláusula 7.ª, ponto 3 do contrato de fornecimento de café, o incumprimento do acordado dá lugar à obrigação de indemnizar o Café T., no montante de € 6,00 por cada kg de café incumprido, pelo que a demandante é credora de uma indemnização no valor de € 4.908,00.

12-À data de 25.01.2012, o Café Snack-Bar O.N., Lda., representado pelo arguido demandado devia à demandante € 3.090,70 (três mil e noventa euros e setenta cêntimos) referentes a fornecimentos de café efetuados pela demandante.

Mais se provou que: 13-Nos anos de 2013 e 2013, o arguido continuou a consumir café fornecido pela demandante, mas pediu que o mesmo lhe fosse faturado a título de pessoa singular.

14-O arguido não tem antecedentes criminais.

15-O arguido não demonstrou arrependimento.

16-Vive em casa do filho e aufere uma pensão de reforma, no valor mensal de € 430,00.

17-Tem o 5.º ano do liceu antigo.

18-Corre termos ação executiva sob o n.º 25963/13.2T2SNT na Instância Central de Sintra, 1.ª Secção de Execução – Juiz 3 da Comarca de Lisboa Oeste, movida pela aqui demandante desde Novembro de 2013, reclamando o pagamento de faturas, de entre as quais as elencadas nestes autos, tendo sido efetuado já penhoras sobre bens do executado, aqui arguido.

* FACTOS NÃO PROVADOS: Da acusação, com relevo para a decisão da causa, não se provou que: 1-À data de 25 de Janeiro de 2012, o arguido era devedor à demandante de € 8.295,67; Do pedido de indemnização cível, com relevo para a decisão da causa, não se provou que: 2-À data de 25 de Janeiro de 2012, o arguido era devedor à demandante de € 8.295,67; 3-Como consequência direta da conduta do arguido, a ofendida ficou privada da possibilidade ressarcitória do seu crédito, o que lhe causou um prejuízo patrimonial correspondente a € 8.295,67, que se encontra por receber e ao qual acrescem os juros moratórios no valor de € 610,24.

Ao demais vertido no pedido de indemnização cível não se responde por conter matéria de direito, juízos de natureza conclusiva ou irrelevantes à boa decisão da causa.

* MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO: (…) DIREITO: Estatui o artigo 256.º, n.º 1, alínea d) do Código Penal, que: «1-Quem, com intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, ou de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo (…): d)Fizer constar falsamente de documento facto juridicamente relevante (…) é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa» Este tipo de crime faz parte do título IV do Código Penal – Dos crimes contra a vida em sociedade.

Subsunção normativa dos factos: Vertendo ao caso concreto, resultou provado que o arguido era o único sócio e gerente da sociedade Café-Snack-Bar O.N., Lda., com sede na Av. IS, em Agualva.

Nessa qualidade deliberou em assembleia da sociedade realizada no dia 25 de Janeiro de 2012, na sede sita em Agualva, que a sociedade não tinha ativo nem passivo, nada havendo a partilhar, encontrando-se em condições de poder ser dada como liquidada, pelo que consideraram a mesma dissolvida.

Com base nessa ata de dissolução e liquidação da sociedade, porque o sócio gerente declarou que a sociedade não tinha ativo nem passivo a liquidar e por estarem reunidos todos os requisitos legais, foi ordenada a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade e a feitura do respetivo registo.

Não obstante, a sociedade era, à data de 25.01.2012, devedora à sociedade BS, Lda., da quantia de € 3.090,70 (três mil e noventa euros e setenta cêntimos).

Além disso, a referida sociedade era titular da conta bancária n.º 28558539.10.001 junto do Banco B., que, naquela data, apresentava saldo no valor de € 56,52 (cinquenta e seis euros e cinquenta e dois cêntimos).

O arguido sabia que as declarações que fez e que ficaram a constar na ata e no registo de dissolução e liquidação da sociedade não correspondiam à realidade e que, ao faltar à verdade nessas declarações, abalava a confiança e credibilidade na autenticidade e genuinidade dos referidos documentos e atentava contra a fé pública que merecem.

Atuou da forma descrita com o propósito, conseguido, de criação de um documento a que fosse atribuída fé pública, sabendo que o que declarava e fazia constar no mesmo era juridicamente relevante e não correspondia à verdade, logrando assim inscrever no registo e tornar pública a dissolução da sociedade e inexistência de ativo e passivo e levar à extinção da mesma enquanto pessoa coletiva, com vista à obtenção de um benefício ilegítimo a que não tinha direito.

Agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo ser a sua conduta proibida e punida por lei penal.

No caso, concreto, não houve prejuízo concreto para a BS Lda., na medida em que moveu ação executiva contra o sócio liquidatário, reclamando o pagamento das faturas alusivas ao fornecimento de cafés, sendo que, inclusive, foram já efetuadas penhoras no âmbito dessa ação; moveu, igualmente, ação cível para pagamento da reclamada indemnização por incumprimento contratual culposo.

Perguntar-se-á: uma vez que o credor da sociedade extinta não ficou impossibilitado de ver ressarcida a obtenção dos seus créditos, o que fez através da ação executiva intentada para pagamento de faturas e através da ação cível instaurada, que correu termos neste Tribunal, ambas contra o único sócio liquidatário, estará preenchido o tipo de crime de falsificação de documento? –ou seja, será que o facto falso feito constar foi juridicamente relevante, na medida em que não inviabilizou a ofendida de reclamar nos foros competentes os seus créditos sobre a extinta sociedade? Não obstante tal facto, entendemos...

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