Acórdão nº 225/16.7YHLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução23 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

RELATÓRIO: Em 21.6.2016 A Laboratories Inc.

, inconformada com o despacho proferido pela Senhora Diretora do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), que recusou a concessão do Certificado Complementar de Proteção (CCP) por si requerido sob o n.º 576, impugnou tal decisão perante o Tribunal da Propriedade Intelectual.

A A. alegou, em síntese, que em 01.11.2013 pediu ao INPI a concessão de um CCP com base na Patente Europeia n.º 999825 (EP 999825), válida em Portugal até 17.07.2018, relativamente à qual goza de autorização de introdução no mercado (AIM) do medicamento para uso humano denominado “Nevanac – nepafenac”, datada de 03.5.2013. O INPI levantou objeções ao deferimento do requerido, a que a ora A. respondeu, mas em 21.4.2016 foi publicado o despacho de recusa ora impugnado, porque alegadamente o CCP pretendido não cumpria o disposto no art.º 3.º, alínea a) do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamentos, nem o disposto no n.º 1 do art.º 116.º do Código da Propriedade Industrial (CPI). Ora, alega a A., o pedido de CCP n.º 576 requer proteção para o Nevanac 3 mg/mL, que contém guar, ácido bórico e nepafenac e está coberto pela patente de base EP 999825, conforme decorre das reivindicações 1, 8, 9, 23 e 29, pelo que estão reunidas todas as condições para que seja concedido o CCP peticionado, sendo certo que CCPs idênticos foram concedidos noutros países, que indicou.

A A. terminou pedindo que o recurso fosse julgado totalmente procedente por provado e, em consequência, o despacho recorrido fosse revogado e fosse concedido o certificado complementar de proteção n.º 576.

A entidade recorrida enviou ao tribunal o processo respetivo e apresentou resposta ao recurso, na qual reiterou as razões que haviam fundado a recusa do CCP.

Em 29.9.2016 foi proferida sentença em que se julgou o recurso improcedente e consequentemente se confirmou o despacho recorrido.

Dessa decisão apela agora a A.

, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões: A.–A sentença ora posta em crise é nula: a decisão não especifica os fundamentos de facto e de direito que a justificam (art.º 615.º n.º 1 alínea b) do CPC) e a fundamentação está em oposição com a decisão proferida (art.º 615.º n.º 1 alínea c) do CPC).

B.–A ora Recorrente não consegue determinar em que factos e exactos meios de prova se baseou o Tribunal a quo para decidir do modo que decidiu.

C.–A exigência de fundamentação da decisão encontra-se prevista não só no art.º 154.º n.º 1 do CPC, como tem também assento constitucional no art.º 205.º n.º 1 da CRP, e já nas Ordenações Filipinas se encontrava prevista.

D.–Esta exigência de fundamentação responde por um lado, à necessidade de certeza e segurança jurídica, na medida em que não pode uma sentença deixar margens para dúvidas e interpretações subjetivas sobre o seu conteúdo.

E.–Por outro lado, responde à necessidade de ter que se assegurar que as Partes conseguem avaliar da Bondade da mesma, e especificamente, se a sentença deve ou não ser posta em crise v.g. por via recursiva, nomeadamente atendendo à respectiva fundamentação.

F.–Ora, salvo o devido respeito, a sentença ora posta em crise não cumpre tais propósitos e é por esse motivo nula, já que não cabe à Recorrente, ora Apelante, tentar adivinhar o que esteve ou não na base da formação de convicção do Julgador. É precisamente nesse sentido que vai o texto extraído da internet, da autoria do Exmo. Senhor Juiz Desembargador Fernando Manuel Pinto de Almeida, relativamente à fundamentação da sentença cível que se cita, e de onde decorre especificamente que “Para cumprir a exigência constitucional, a fundamentação há-de ser expressa, clara e coerente e suficiente. Ou seja, não deve ser deixada ao destinatário a descoberta das razões da decisão; os motivos não podem ser obscuros ou de difícil compreensão, nem padecer de vícios lógicos; a fundamentação deve ser adequada à importância e circunstância da decisão [3]. A fundamentação da decisão deve, pois, permitir o exercício esclarecido do direito ao recurso e assegurar a transparência e a reflexão decisória, convencendo e não apenas impondo.” G.–Sem conceder quanto ao predito, o vício de nulidade da sentença decorre ainda da existência de contradição entre a fundamentação e a decisão proferida, de acordo com o estatuído no art.º 615.º n.º 1 alínea c) do CPC, já que bastaria atentar na patente de base para forçosamente se concluir que a composição do medicamento Nevanac está dentro do âmbito de protecção da patente de base Patente Europeia n.º 999825, estando nomeadamente protegido pelas reivindicações 1, 8, 9, 23 e 29.

H.–Pelo que se conclui que a sentença deve ser declarada nula com as legais consequências.

I.–Acresce que o presente recurso versa sobre matéria de direito (art.º 639.º, n.º 2, do C.P.C.), existindo erro de julgamento e erro na aplicação do direito aos factos, sendo que as normas jurídicas violadas (para os efeitos do art.º 639.º n.º 2 a) do CPC) são o art.º 3.º (a) do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de Maio de 2009 relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos, e os arts. 115.º e 116.º do CPI.

J.–As normas supra referidas deveriam ter sido interpretadas no sentido de se terem considerado preenchidos os requisitos de concessão do CCP n.º 576 sub judice (o que se indica em obediência e para os efeitos do disposto no art.º 639.º n.º 2 b) do CPC).

K.–A aqui Apelante apresentou o pedido de CCP ora sub judice, em 01/11/2013, com base na patente Europeia n.º 999825 válida em Portugal até 17/07/2018, e tempestivamente explicitou qual a AIM a ter em conta.

L.–Ainda em sede de processo administrativo junto do INPI, e após ter sido notificada de que o INPI entendia não estarem preenchidos os requisitos de concessão do CCP, em sede de resposta à notificação do INPI, a ora Recorrente explicitou que o presente pedido de CCP respeitava, entre outros, o estatuído no art.º 3.º (a) do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de Maio de 2009 relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos (doravante designado apenas por Regulamento), pelo que deveria ser concedido.

M.–Nomeada, mas não exclusivamente, refere-se a decisão mais recente proferida no âmbito do caso C-493/12 (Eli Lilly vs HGS) na qual o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) desenvolveu este ponto, declarando que uma reivindicação satisfaz o disposto no art.º 3.º (a) do Regulamento desde que «(…) com base nessas reivindicações, interpretadas designadamente à luz da descrição da invenção, conforme previsto no artigo 69.° da CPE e no protocolo interpretativo do mesmo, seja possível concluir que essas reivindicações visavam, implícita mas necessariamente, o princípio activo em causa, de forma específica, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

” N.–Assim, a conclusão a que se chega, e que deveria ter norteado a tomada de uma decisão diferente pelo digníssimo Tribunal a quo, é a de que a análise a ser feita para comprovar se, nos termos do art.º 3.º (a) do Regulamento o produto está protegido pela patente de base, no caso de um produto que consista num único ingrediente activo, é determinar se o produto está dentro da extensão de protecção das reivindicações à luz do art.º 69.º da CPE [vide ainda neste sentido decisão proferida no caso Actavis vs. Sanofi (C-443/12), que foi junta aos autos como Doc. n.º 5 na qual o TJUE admite que a reivindicação de uma composição que compreende irbesartan e "um diurético", na verdade protege um produto definido como uma combinação de irbesartan e hidroclorotiazida.] O.–O pedido de CCP n.º 576 está coberto pela patente de base EP 999825, como se demonstra pela sua reivindicação 1 infra transcrita: 1.–Composição líquida oftálmica tópica compreendendo um ou mais galactomanano(s) e um ou mais composto(s) borato(s) com um pH ligeiramente acídico a pH neutro, e em que o galactomanano e o composto borato estão contidos na composição em concentrações eficazes para criar um gel límpido ou um gel parcialmente límpido por instilação no olho e por aumentos do pH e da força iónica.

P.–Na reivindicação 6 são indicados o galactomanano e o composto borato presentes no Nevanac: 6.–Composição de acordo com qualquer uma das reivindicações 1 a 5, em que o galactomanano é guar hidróxipropilo, ou goma de guar, e o composto borato é ácido bórico.

Q.–E na reivindicação 8 é indicada a presença de um agente farmaceuticamente activo (princípio activo farmacêutico): 8.–Composição de acordo com quaisquer uma das reivindicações 1 a 7, compreendendo ainda um ou mais princípio(s) activo(s) farmacêutico(s).

sendo que de um modo particular, a reivindicação 9 da referida patente especifica o agente farmaceuticamente activo como sendo um agente anti-inflamatório: 9.–Composição de acordo com a reivindicação 8, em que o(s) princípio(s) activo(s) farmacêutico(s) é/são seleccionados a partir do grupo que consiste em: anti-hipertensivos, antiglaucoma, neuroprotectores, anti-alérgicos, secretagogo de muco, angiostáticos, anti- microbianos, agente de alívio da dor e anti-inflamatórios.

R.–Mais, a reivindicação 23 refere-se a uma composição oftálmica estéril: 23.–Composição farmacêutica oftálmica estéril, compreendendo 0,1 a 5% (p/v) de galactomanano seleccionado a partir do grupo que consiste em guar e seus derivados, 0,05 a 5,0% (p/v) de um composto borato, e água.

S.–Verifica-se que o produto Nevanac está também protegido por esta reivindicação 23 e, de um modo particular, a reivindicação 29 refere ainda que a composição compreende um agente farmaceuticamente activo (princípio activo farmacêutico): 29.–Composição oftálmica estéril de acordo com qualquer uma das reivindicações 23 a 28, em que a...

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