Acórdão nº 1225/14.7TVLSB-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução16 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: A intentou a 07/08/2014 a acção supra identificada contra B, SA (anteriormente denominada C, SA), D, E, F e G, pedindo a condenação solidária destes a pagar-lhe 500.000€, a título de indemnização por danos não patrimoniais, consequência da publicação de notícias que considera que põem em causa o seu direito à honra e consideração.

Os réus contestaram, no essencial, no que agora importa, dizendo que: o 2º réu, jornalista há mais de 20 anos, investigou devidamente (o que é descrito de forma pormenorizada) e durante meses os factos que noticiou, conseguiu atestar a veracidade desses factos e controlou o rigor das diferenciadas fontes de informação que utilizou, tendo-as a todas, de forma justificada, como sérias; a notícia tinha interesse público, dizendo respeito a suspeitas num inquérito contra um ex-primeiro-ministro; o autor foi confrontado com os factos antes da publicação da notícia e só não se pronunciou sobre eles porque não quis; a notícia foi dada com moderação e objectividade; a liberdade de imprensa é reconhecida quer na Constituição quer em textos internacionais acolhidos naquela e exclui, tendo em conta o alegado acima, a ilicitude da conduta dos réus; para além disso não se verifica a culpa e o autor não alega factos concretos que constituam danos que lhe tenham sido provocados com a notícia em causa, nem o necessário nexo de causalidade entre os factos dados como ilícitos e os danos não alegados.

Realizado o julgamento foi proferida sentença julgando a acção improcedente e absolvendo os réus.

O autor recorre desta sentença – para que seja revogada e substituída por outra que condene os réus – concluindo as suas alegações com as seguintes conclusões: A.-Na sua petição inicial, o autor identificou os danos que lhe provocou a notícia dos autos; B.-A posterior confirmação do teor da notícia por meros e declarados indícios, nunca confirmados, não afasta a falsidade actual dela; C.-Essa notícia, pelo seu conteúdo, pelas circunstâncias próprias do autor, pelo quadro pessoal, social e político dele, é gravemente ofensiva da honra e da consideração do autor e, por isso, ilícita; D.-Dos depoimentos das testemunhas ouvidas, designadamente do prestado pelo Dr. H, há-de concluir-se que que provocou no autor os sentimentos a que referiu os danos sofridos; E.-Tais danos são, ademais, muito graves, por isso merecedores da tutela do direito, objectivos e notórios, independentemente da sua alegação e prova que, em todo o caso, existem resultam dos autos e do julgamento.

F.-Esses danos resultaram directamente e necessariamente da notícia dos autos.

G.-A culpa intensa dos réus está demonstrada e declarada.

H.-A sentença recorrida viola os arts 483/1 e 496/1 do Código Civil e 412/1 do Código de Processo Civil.

Os réus contra-alegaram, defendendo a improcedência do recurso e, para a hipótese de procederem as questões por este suscitadas, requereram, ao abrigo do art. 636 do CPC, a ampliação do objecto do mesmo, de modo a abranger os fundamentos alegados por eles no sentido da exclusão da ilicitude das notícias publicadas e/ou da culpa dos réus e/ou da falta de danos (quer alegados quer provados).

O autor não respondeu.

* Questões que importa decidir: se há razões para alterar a decisão da matéria de facto e se a decisão de direito deve ser alterada no sentido pretendido pelo autor, tendo em conta quer os fundamentos do autor quer os dos réus, incluindo aqueles fundamentos que não foram considerados na sentença.

* No tribunal recorrido deram-se como provados os seguintes factos considerados como essenciais [em itálico acrescentou-se agora, nos pontos 7 e 8, os restantes subtítulos da peça jornalística; e em 9 acrescentou-se agora […] parte da notícia referida de modo a contextualizar as frases que foram transcritas isoladamente, estando estas sublinhadas; o que foi feito ao abrigo dos arts. 663/2 e 607/4, ambos do CPC]: 1.-A B é uma empresa jornalística proprietária de diversas publicações, entre as quais o jornal diário J e a revista semanal K.

  1. -D é jornalista da K.

  2. -E é o director da K.

  3. -F é jornalista do J.

  4. -G é o director do J.

  5. -O autor exerceu o cargo de Primeiro-Ministro do Governo de Portugal durante seis anos, entre 2005 e 2011.

  6. -A capa da edição de 31/07/2014 da K tem como título «A É SUSPEITO NO CASO L»; Tem o subtítulo em letras mais pequenas: “Depois de M, o Ministério Público pondera deter o ex-primeiro-ministro para interrogatório. Está sob vigilância há vários meses e já lhe quebraram o sigilo bancário e fiscal.’ 8.-Nas páginas 40 a 43 da mesma edição a K publicou um artigo da autoria de réu D, intitulado «A NA REDE DO 'L'»; a anteceder este título consta: “Exclusivo. Investigação quebra sigilo bancário ao político E depois do título consta: “O ex-primeiro-ministro está sob vigilância há largos meses. O MP pondera detê-lo para interrogatório e constituí-lo arguido. Outros suspeitos são o primo que apareceu no caso N e o amigo que comprou as casas da mãe de A.” Na página seguinte está uma fotografia do autor e sobre ela a palavra ‘apanhado’. No canto inferior direito, em letras pequenas: A não quis comentar ao K o facto de ser um dos suspeitos no caso L.” 9.-Nesse artigo é afirmado, além do mais, o seguinte: “Nos últimos meses A tem-se multiplicado em contactos políticos, continua a frequentar o restaurante M, nas imediações da sua casa em Lisboa, apareceu nas eleições europeias para dar um abraço e apoiar o cabeça-de-lista do Partido X, viajou para o Brasil durante o campeonato do Mundo de Futebol e retomou os comentários semanais na RTP. Mas, durante todo este tempo, o ex-primeiro-ministro tem também estado sob apertada vigilância do Ministério Público (MP) que o considera suspeito no caso L, a mega investigação a fraudes fiscais, crimes de falsificação e branqueamento de capitais que, na semana passada, expôs na praça pública o ex-banqueiro M.

    A operação L, que já deu origem a vários processos-crime autónomos, incluindo aquele em que é visado A, ameaça tornar-se uma espécie de queda contínua de peças de dominó que arrastará várias figuras públicas do mundo financeiro e da política: o ex-primeiro-ministro deverá ser um dos próximos a ter de dar explicações aos inspectores das finanças, aos procuradores do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e ao juiz de instrução O.

    Ao que a K conseguiu apurar, as suspeitas prender-se-ão com indícios de crimes de natureza fiscal e económica.

    “Desculpe, mas vamos ficar-nos por aqui", disse de imediato A quando, na segunda-feira, dia 28, foi questionado por telefone pela K sobre a investigação judicial em que é um dos alvos prioritários das autoridades. ''Faça o favor de não insistir e de não me ligar ou incomodar mais com isso", finalizou, antes de se despedir e desligar o telemóvel.

    A investigação da equipa de peritos das finanças e de vários procuradores, liderados pelo procurador P está a ser feita há largos meses sob rigoroso sigilo.

    A tem sido vigiado de muito perto e os investigadores já terão avançado para a quebra do sigilo fiscal, patrimonial e bancário do antigo primeiro-ministro.

    É a primeira vez que isto acontece a A num processo judicial.

    O próximo passo - agora que a primeira fase da investigação está praticamente concluída - deverá ser a constituição como arguido do ex-governante.

    No MP também se pondera, há várias semanas, a possibilidade de deter A para interrogatório, à semelhança do que aconteceu, na semana passada, com M, o ex-homem-forte do Banco Q.

    O primo e os milhões na Suíça.

    No inquérito-crime onde A é visado e que decorre no DCIAP, um órgão do Ministério Público especializado no combate à criminalidade mais complexa, os investigadores estão a seguir o rasto de diversos fluxos financeiros que se suspeita atingirem milhões de euros.

    O MP já terá também enviado cartas rogatórias para vários países com vista a identificar a totalidade das transacções financeiras internacionais consideradas suspeitas.

    A K não conseguiu apurar se este dinheiro suspeito, ou parte dele, que foi sobretudo encaminhado para contas na Suíça, é efectivamente de A, mas sabe que a investigação judicial tem em cima da mesa, pelo menos, outros dois suspeitos: R, um dos primos do ex-primeiro-ministro ouvido pelo MP no processo N e o empresário S, o amigo que comprou, em 2011 e 2012, três casas à mãe de A.

    Contactados por email pela K, R e S não responderam às questões enviadas. […] […] O amigo da AM.

    Outro dos suspeitos identificados pelas autoridades no processo que visa A é o discreto empresário S. A relação de amizade com o ex-primeiro-ministro é pública há muitos anos. Os dois ter-se-ão conhecido na AM, onde S nasceu e montou os primeiros negócios e onde A viveu e trabalhou como engenheiro técnico. Muitos anos depois, segundo o J, quando A surge nas escutas telefónicas feitas a NA no processo AO, a PJ suspeitou que o ex-primeiro-ministro tivesse usado um telefone do empresário da AM em conversas que ficaram gravadas pelas autoridades e que até hoje não foram tornadas públicas por decisão do então procurador-geral da República e do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.

    A 25 de Setembro de 2012, foi também o empresário da AM que comprou o apartamento de AP, mãe de A, localizado no andar X, letra X do edifício X, na Rua X, em AG, sem sequer precisar de entrar no cartório da Av. X, para formalizar o negócio. Na escritura do imóvel, que a K consultou, consta que o comprador e o vendedor se fizeram representar por um procurador comum, para fazer o negócio de 600 mil euros.

    Segundo o J, um ano antes já o empresário tinha comprado outros dois imóveis que a mãe de A tinha no concelho de AQ.

    Dessa vez, as transacções foram menos avultadas em Junho, um dos apartamentos foi adquirido por 100 mil euros; o outro, um mês depois, por 75 mil euros.

    […] Peritos das Finanças e escutas.

    Já muito se escreveu na comunicação social sobre a fortuna da...

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