Acórdão nº 366/09.7PBAGH.L2-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelAGOSTINHO TORRES
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em Conferência, os Juizes no Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: 1.1–Nos autos foram interpostos 3 recursos pelo arguido: a)-A 30 de Junho de 2015 (da decisão sobre incompetência territorial), ficando este sem efeito nos termos do despacho de fls 1262 (7.º vol), já transitado, por incumprimento do n.º 5 do art.º 412.º do CP.

b)-Da sentença condenatória a 15 Setembro de 2015, ainda pendente e já admitido.

c)-Da decisão de 5/12/2015 que rejeitou a invocação de nulidade resultante de gravação alegadamente deficiente e cujo recurso foi rejeitado na 1ª instância por haver sido considerado extemporâneo ( vide despacho de fls 1262). Não houve reclamação.

1.2–Está assim apenas pendente de apreciação de recurso a decisão final de 25.06.2015 proferida de fls 1094 a 1127 .

Por sentença de 25 de Junho de 2015, proferida nos autos em processo comum com intervenção de tribunal singular, foi decidido, além do mais: “ a)-Condenar o arguido C, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abuso de confiança qualificado, previsto e punido pelo art.° 205.°, n.° 1 e 4, al. a) do Código Penal, na pena de 300 (trezentos) dias de multa à taxa diária de 7,00€, perfazendo um total de 2.100,00€ (dois mil e cem euros); Com base na seguinte fundamentação: “(…) “I.RELATÓRIO.

O arguido C.

, foi pronunciado pelos factos constantes da acusação de fls. 327 a 332, que aqui se dão por reproduzidos, que integram a prática, em autoria, de um crime de abuso de confiança qualificado, previsto e punido pelo artigo 205.º, n.ºs 1, 4, alínea a) e 5, do Código Penal.

* Foi designado dia para julgamento.

* O arguido apresentou contestação ao despacho de pronúncia (cfr. requerimento de 29 01-2014 de fls. 649 a 655) e ao pedido de indemnização cível, arrolando prova testemunhal.

Defendeu, para o efeito e em síntese, que estão preenchidos os requisitos a que alude o n.º 2 do artigo 7.º do C.P.P., devendo suspender-se o processo por dependência de questão prejudicial com o processo n.º 1298/03.8TBAGH-B, acção intentada pelo arguido contra o ofendido com vista ao pagamento de honorários devidos por mandato forense; que o ofendido reconheceu ter recebido do arguido a quantia de 3.000,00€; que o cheque constante dos autos destinava-se a provisionar conta corrente do ofendido com vista ao adiantamento por conta dos honorários; provisão para despesas e adiantamento para depósito de tornas; a questão das tornas só ficou resolvida em Fevereiro de 2008; em Junho de 2008 os queixosos revogaram o mandato forense; a decisão de não restituição deveu-se à existência de saldo credor do arguido pelos serviços e despesas jurídicas, concluindo pela sua absolvição.

(…) II.

–FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO.

2.1.–Factos provados.

Da instrução e discussão da causa, com interesse para a decisão da mesma resultaram provados os seguintes factos: 1.–O arguido exerce a profissão de advogado, com a cédula profissional n° 6151 L, com domicílio profissional na Avª C... ..., n° ..., ...° Direito, em Lisboa.

  1. –O ofendido J.M.

    interveio, na qualidade de cabeça- de-casal e interessado, no processo de inventário, que correu termos, sob o n° 1298/03.8 TBAGH, pelo 2° Juízo do Tribunal judicial de Angra do Heroísmo. O arguido interveio no referido processo, como mandatário forense do ofendido J.M.

    , a partir do dia 3 de Outubro de 2005, data em que o anterior advogado do ofendido subscreveu substabelecimento, sem reservas, a favor do arguido.

  2. –No âmbito do referido processo de inventário, foi realizada conferência de interessados, no dia 8 de Maio de 2007, tendo as únicas verbas constantes da relação de bens sido licitadas pelo ofendido J.M.

    , pelo valor global de 12.600,00€.

  3. –No exercício do respectivo mandato forense, o arguido solicitou, por carta datada de 11 de Maio de 2007, que o ofendido depositasse, em conta titulada por aquele no Banco Millennium BCP, a quantia de 12.600,00€ euros destinada ao pagamento das tornas devidas aos contra-interessados na acção de inventário.

  4. –Mais requereu o arguido que o ofendido depositasse a quantia de 2.500,00€ euros a título de “reforço de provisão por conta de despesas e honorários”.

  5. –Para o efeito, porque não dispunha daquela quantia, o ofendido solicitou a uma cliente da sua actividade profissional de contabilista STVM, Lda. que lhe emprestasse o referido montante, tendo aquela emitido, à ordem do ofendido, o cheque do Banco Comercial dos Açores, nº 4848531058, datado de 22 de Maio de 2007, no valor de 15.814,27€.

  6. –A quantia aposta no cheque correspondia à soma dos seguintes valores: -12.600,00€ referente ao empréstimo para pagamento das tornas pelo ofendido; -2.500,00€ referente ao empréstimo para pagamento de adiantamento de despesas e honorários ao arguido; -714,27€ referente ao pagamento de serviços de contabilidade prestados pelo ofendido J.M. à sociedade Sotercar.

  7. –Assim, em data não concretamente apurada, em Maio de 2007, na área desta comarca, o ofendido endossou e entregou o referido cheque ao arguido.

  8. –Já na posse do referido cheque, o arguido depositou-o em conta por si titulada.

  9. –Sucede que, no processo de inventário, não chegou a ser depositada qualquer quantia a título de tornas, tendo sido declarada a nulidade de todo o processado desde o auto de declarações do cabeça-de-casal, por despacho judicial datado de 17 de Dezembro de 2007. Tendo, mais tarde, o referido processo de inventário terminado mediante acordo apresentado em 27 de Janeiro de 2010, por todos os interessados, e homologado em 10 de Fevereiro de 2010, não havendo lugar ao pagamento de tornas.

  10. –O ofendido, quando tomou conhecimento da nulidade de todo o processado e que o pagamento de tornas não teria lugar, que o pagamento de tornas não teria lugar, enviou carta ao arguido, datada de 9 de Maio de 2008, dando-lhe conhecimento que pretendia revogar a procuração forense emitida a favor daquele, bem como lhe fosse devolvido o dinheiro das tornas.

  11. –Após, em 2 de Junho de 2008, o ofendido apresentou, no processo de inventário, requerimento a revogar o mandato forense a favor do arguido.

  12. –O arguido fez sua a quantia remanescente aposta no referido cheque, sabendo que 12.600,00€ euros se destinavam ao pagamento de tornas no processo de inventário, as quais não vieram a ter lugar, tendo conhecimento disso em Fevereiro de 2008 – data em que foi notificado da decisão que anulou todo o processado.

  13. –Com o dinheiro com que, assim, se apoderou, o arguido aplicou-o em seu próprio proveito, não evolvendo tal quantia ao seu cliente, aqui ofendido.

  14. –O cheque identificado em 6) foi entregue e endossado ao arguido pela razão de incumbir ao mesmo, no desempenho das funções que o mesmo prestava enquanto advogado do ofendido J.M.

    no processo de inventário identificado em 1).

  15. –Ao apropriar-se da quantia de 9.600,00€, incluída no montante aposto no cheque e destinada ao pagamento de tornas no processo de inventário, as quais não vieram a ter lugar, o arguido bem sabia que a mesma não lhe pertencia e que não tinha o direito de dela dispor em proveito próprio, o que não o impediu de a fazer sua e aplicá-la em seu proveito, não comunicando aos ofendidos que as tornas não teriam lugar como devia, nem devolvendo ao ofendido aquela quantia, causando a estes um prejuízo patrimonial que ascendeu a 9.600,00€.

  16. –Actuou o arguido livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

    * 20.

    B)–Do arguido e da defesa: Em Julho de 2007, o arguido devolveu a J.M.

    a quantia de 3000,00€.

  17. –O arguido enviou ao ofendido, em 16-03-2010, nota de honorários e despesas, com respectiva descriminação de serviços prestados, que apresentava um saldo a favor do arguido de 2.484,98€.

  18. –Nenhum dos queixosos se dirigiu ao escritório do arguido a fim de fazer contas com este.

  19. –Em 16 de Março de 2010, o arguido tomou a iniciativa de fazer as contas, enviando a respectiva nota de honorários e despesas.

  20. –J.M.

    e esposa M.M.

    revogaram o mandato em 12 de Junho de 2008 quando já tinham apresentado queixa na Ordem dos Advogados em 06 de Junho de 2008.

  21. –Revogaram o mandato um ano depois sem pedirem contas ou darem qualquer explicação, apresentaram participação na Ordem dos advogados e, posteriormente, denúncia ao Ministério Público.

    * 26.–O arguido mora em casa arrendada, com 2 filhos menores (de 6 anos e 12 meses) e a esposa, estudante universitária.

  22. –O agregado familiar do arguido suporta encargo mensal com renda habitacional no valor de 700,00€ mensais.

  23. –O arguido aufere rendimentos variáveis, de cerca de 1000,00€ mensais.

  24. –O agregado familiar do arguido beneficia de ajuda económica da família próxima.

  25. –O arguido não possui veículo automóvel.

  26. –O arguido declarou rendimentos no valor de 7.000,00€ em 2013.

  27. –O arguido encontra-se a concluir mestrado em ciências jurídicas na Faculdade de Direito, Universidade de Lisboa.

  28. –O arguido não tem antecedentes criminais.

    * 2.2.

    –Factos não provados.

    Não resultaram provados com interesse para a discussão da causa os seguintes factos: 34.–O descrito em 9) ocorreu entre os dias 22 e 29 de Maio.

  29. –Aquando do descrito em 10), o arguido dirigiu-se à agência do Milleniumm BCP, sita na Praça Velha, em Angra do Heroísmo.

  30. –O descrito em 13) ocorreu quando o ofendido se dirigiu ao Tribunal.

  31. –O descrito em 15) ocorreu em Dezembro de 2007 – data em que foi anulado todo o processado naqueles autos, e de cuja decisão o arguido foi notificado.

    * 38.

    –O cheque constante dos autos destinava-se a provisionar conta corrente do ofendido com vista ao adiantamento por conta dos honorários; provisão para despesas e adiantamento para depósito de tornas.

  32. –O arguido não utilizou em proveito próprio quaisquer quantias que o ofendido lhe tenha entregue.

  33. –J.M.

    reuniu-se com o arguido por três vezes, já após a extinção do mandato, na Ilha Terceira, em Agosto de 2008, Dezembro de 2008 e Agosto de 2009.

  34. –Nas referidas reuniões o arguido...

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