Acórdão nº 110/15.0PEAMD.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 01 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelANA PAULA GRANDVAUX
Data da Resolução01 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juizes do Tribunal da Relação de Lisboa.

  1. Relatório: 1.-No âmbito do Proc. nº 110/15.0PEAMD, a correr termos na Secção Criminal da Instância Local do Tribunal da Amadora, J1, foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, o arguido C.R.S., solteiro, padeiro/pasteleiro, nascido em …. de … de 1975, natural de Lisboa, filho de C.C.S. e S.R.S., residente na Rua ……………… em Lisboa, acusado pelo M.P da prática de factos susceptíveis de integrarem em autoria moral e na forma consumada um crime de condução de veículo sem habilitação legal p.p no artº 3º/1 e 2 do D.L nº 2/98 de 3.1 2.-Realizado o julgamento, veio o arguido, por sentença lida e depositada em 25.1.2016 (fls 109 a 120) a ser condenado pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime um crime de condução de veículo sem habilitação legal p.p no artº 3º/1 e 2 do D.L nº 2/98 de 3.1 na pena de 4 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano.

  1. -Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido, retirando da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: 1.-O acórdão recorrido padece de nulidade por insuficiência da prova produzida para a condenação que veio a final a ser proferida.

  2. -Com efeito, a única testemunha ouvida afirmou que os factos em questão ocorreram no dia 5 de Fevereiro e não no dia 25 de Janeiro, de 2015.

  3. -Como tal, não poderia o Tribunal recorrido ter condenado o arguido, com base na prova produzida, por factos ocorridos no dia 25 de Janeiro de 2015.

  4. -Acresce ainda que existe contradição entre a fundamentação da decisão e a decisão, pois o arguido foi acusado pela prática do crime como autor moral (instigador) e a final condenado como autor material do crime, o que está em total e flagrante contradição com os factos descritos na acusação e com a fundamentação da decisão.

  5. -Pelo exposto, enferma a decisão recorrida de nulidade, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais, pelo que deve ser revogada e substituída por outra que absolva o arguido da prática dos crimes de que vem acusado nos presentes autos.

  6. -O M.P no Tribunal de 1ª instância, notificado nos termos e para os efeitos do artº 413º do C.P.P, apresentou resposta a fls 167 a 169 dos autos, defendendo a improcedência total do recurso e sintetizando a sua posição nos seguintes (transcritos) termos (com sublinhados nossos): “(…) O facto de a testemunha ter mencionado como data dos factos o dia 5 de Janeiro de 2015 (em vez do dia 25) só pode ter-se devido a lapso, pois resulta claramente do depoimento em questão uma descrição pormenorizada dos factos, sem quaisquer imprecisões ou incoerências, pelo que é inegável que o agente policial se referia à situação objecto dos autos.

    Aliás, a noção de que a indicação da data foi devida a lapso foi de tal modo evidente que na sentença tal questão nem sequer é referida, não tendo o Tribunal qualquer dúvida do conhecimento concreto da testemunha a respeito dos factos.

    Pelo contrário, tendo em conta o Princípio da Livre Apreciação da Prova, previsto no art. 127º do Código de Processo Penal, na sentença recorrida explica-se detalhadamente por que motivo se valorizou mais o depoimento da testemunha policial, em detrimento das declarações do arguido, concluindo-se basicamente que o primeiro foi objectivo, claro e coerente e as segundas pouco lógicas e credíveis (…) Quanto à questão da contradição entre o dispositivo e a fundamentação da sentença admitimos que efectivamente se verifica. Contudo, é absolutamente evidente, tendo em conta tudo o que vem referido na sentença que a menção à autoria material feita no dispositivo se deveu a lapso manifesto.

    De facto, todo o raciocínio lógico-dedutivo expendido na sentença demonstra que o Tribunal considerou como provada a prática do crime pelo arguido, em autoria moral e que o condenou nessa qualidade.

    Assim, constatado o lapso manifesto da sentença, poderá o Tribunal proceder à sua rectificação ao abrigo do disposto no art. 380º, nº 1, alínea b) e nº 3 do Código de Processo Penal.

  7. -O recurso foi admitido em 26.4.2016 por despacho de fls. 163.

  8. -Já depois da admissão do recurso, o Sr. Juiz do Tribunal a quo proferiu um despacho a fls 170 dos autos, onde claramente se expressa no sentido de haver sido cometido um lapso na redacção do texto da sentença ora recorrida.

    Assim, onde no dispositivo daquela ficou escrito “Condenar o arguido pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime de condução de veículo sem habilitação legal” deverá ler-se para todos os efeitos “Condenar o arguido pela prática em autoria moral e na forma consumada de um crime de condução de veículo sem habilitação legal”, devendo tal lapso ser corrigido ao abrigo do artº 380º/1/b) do C.P.P .

  9. -Nesta Relação, a Digna Procuradora Geral Adjunta quando o processo lhe foi com vista nos termos e para os efeitos do artº 416º do C.P.P não emitiu qualquer parecer (fls 177).

  10. -Foram colhidos os vistos legais e procedeu-se à conferência, com observância do legal formalismo, cumprindo, agora, apreciar e decidir.

    II.-Fundamentação.

  11. -Delimitação do objecto do recurso.

    É pacífica a jurisprudência do S.T.J. no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, do conhecimento das questões oficiosas (artº 410º nº 2 e 3 do C.P.Penal).

    Por outras palavras, do artº 412º/1 do C.P.P resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso (neste sentido vide Germano Marques da Silva em “Curso de Processo Penal”, III, 2ª edição, 2000, pág. 335 e Acs do S.T.J de 13.5.1998 in B.M.J 477-263; de 25.6.1998 in B.M.J 478º-242 e de 3.2.1999 in B.M.J 477º-271), exceptuando aquelas que são do conhecimento oficioso (cf Artº 402º, 403º/1, 410º e 412º, todos do C.P.P e Ac. do Plenário das Secções do S.T.J de 19.10.1995 in D.R, I - série de 28.12.1995).

    Assim, as questões a apreciar por este Tribunal ad quem, são: A)-nulidade da sentença por insuficiência de prova produzida para a condenação que veio a final a ser produzida - a única testemunha ouvida em juízo, o agente autuante D.P., (conforme acta de julgamento de 11.1.2016) situou os factos no dia 5 de Fevereiro e não no dia 25.1.2015.

    B)-a sentença recorrida padece ainda do vício de contradição insanável entre a fundamentação e a decisão previsto no artº 410º/2/b) do C.P.P ? - o arguido vem acusado da prática de um crime como autor moral e na parte decisória da sentença é condenado como autor material.

  12. -A Decisão recorrida.

    Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos (transcrição): 2.1.1.-No dia 25 de Janeiro de 2015, pelas 09h15 horas, na Rua ……………, Amadora, o arguido C.R.S., fazia-se transportar no veículo automóvel ligeiro de passageiros, de matrícula XX-XX-AA, da marca Ford, modelo Courier, sentado à frente, do lado direito.

    2.1.2.-Ao seu lado, no lugar do condutor, seguia L.S., menor de 15 anos de idade, filho do arguido, que procedia à condução do seu veículo automóvel e com o seu próprio consentimento.

    2.1.3.-L.S. não é titular de carta de condução ou qualquer outro título que o habilite a conduzir veículos na via pública.

    2.1.4.-O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, ao permitir, autorizar e facultar que o seu filho L.S. circulasse com o veículo na via pública, bem sabendo que o mesmo não podia conduzir veículos automóveis na via pública por não possuir carta de condução e mesmo sendo conhecedor que ele nem sequer se podia habilitar legalmente a obtê-la, atenta a sua idade.

    2.1.5.-O arguido mais sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.

    2.1.4.-O arguido é solteiro, tem um filho e mora sozinho.

    2.1.5.-É vendedor ambulante ganhando cerca de €250 por mês.

    2.1.6.-Mora em casa dos pais.

    2.1.7.-Tem uma carrinha de matrícula XX-XX-AA.

    2.1.8.-Tem a 4ª classe.

    2.1.9.-O arguido possui antecedentes criminais tendo já sido condenado: -em pena de prisão no âmbito do processo nº 38/01, pela prática do crime de roubo e de roubo na forma tentada a 27.10.2000, por acórdão de 04.07.2001, transitado em julgado a 26.12.2001.

    -em pena de prisão no âmbito do processo nº 476/00.6SELSB, pela prática do...

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