Acórdão nº 874/16.3YIPRT.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO BRIGHTON
Data da Resolução30 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA : I – Relatório 1- “Pleno de ... – Manutenção e Reparação Veículos Automóveis Clássicos, Unipessoal Ldª” intentou a presente acção especial de cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, nos termos do Decreto-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro, contra Pedro ... ... Rodrigues ..., pedindo o pagamento, por este de : -11.003,05 €, a título de capital ; -279,75 €, a título de juros de mora ; -500 €, a título de “Outras quantias” ; -102 €, a título de taxa de justiça paga.

Para fundamentar tal pretensão alega, em síntese, ter acordado com o R. a reparação do veículo da marca “...”, modelo “Esprit Turbo”, com a matrícula 36-37-MR. Finda a reparação, apresentou ao R. a factura nº 1/235, de 18/5/2015, no montante de 11.003,05 €, a qual não foi paga.

2- O R. deduziu oposição, defendendo-se por excepção, por impugnação e deduzindo pedido reconvencional.

Em sede excepcional, invocou as excepções peremptórias de não cumprimento (atenta a permanência de defeitos no veículo após intervenção da A., e, bem assim, o incumprimento do acordado prazo de 5 meses para a reparação) e de pagamento parcial (de 3.515,535 €, correspondente a 50% do acordado preço, 7.031,07 €, sem incluir IVA).

Em sede de impugnação negou os factos narrados pela A., nomeadamente quanto à data da adjudicação e ao preço acordado.

Em sede reconvencional pede a condenação da A. “a reparar devidamente o veículo propriedade do Requerido tal como se obrigou, com a consequente reparação dos defeitos e anomalias que este ainda apresenta e que na devida data lhe foram comunicadas”.

3- Procedeu-se ao julgamento com observância do legal formalismo.

4- Foi, então, proferida Sentença que não admitiu o pedido reconvencional e julgou a acção improcedente, constando da parte decisória da mesma : “Pelo exposto, julgo procedente a excepção de não cumprimento, improcedente a acção e, em consequência, absolvo o R. do pedido formulado pelo A..

Custas pelo R. (artigo 527 do Código de Processo Civil).

Valor da ação e da causa: o supra decidido em III.1.

Registe.

Notifique”.

5- Desta decisão interpôs a A. recurso de apelação, para tanto apresentando a sua alegação com as seguintes conclusões : “A. A douta sentença sob recurso padece de erro na aplicação do direito à matéria de facto dada como provada nos autos, na medida em que considerou que a procedência da excepção de não cumprimento implica a absolvição do pedido, violando assim o artº 610º, nº 2 do CPC aplicado analogicamente.

  1. Padece ainda de erro de julgamento quanto à matéria de facto, na medida em que errou em factos considerados provados e no juízo sobre os mesmos, com base nos elementos juntos aos autos, tendo ainda valorado erradamente a prova produzida e não considerado provados factos que deveriam ter sido devidamente apreciados e valorados.

  2. Desde logo, do ponto de vista substantivo ou de mérito, o teor da prova produzida não permitia o julgamento da matéria de facto no sentido em que foi efectuado, designadamente quanto à existência das desconformidades referidas no ponto nº 9 dos Factos Provados.

  3. Com efeito, os elementos probatórios existentes nos autos (comunicações por emails entre as partes) contradizem o entendimento do Tribunal a quo de ter existido uma imediata reacção do Réu, o que tornaria verosímil a existência dos alegados defeitos ou desconformidades.

  4. Pelo contrário, o que se verifica da prova produzida é que o Réu não reagiu imediatamente, nem espontaneamente, mas mais tarde, e só depois da comunicação por parte do legal representante da Autora, no sentido de que pagasse a fatura, tal como combinado (cfr. comunicações por e-mail de 20 de Abril de 2015, às 16:12 e 17:02).

  5. Pelo que, não resulta dos autos qualquer prova que suporte a presunção do Tribunal a quo, não lhe servindo de apoio o douto excerto doutrinário em que a sentença recorrida se estriba.

  6. De resto, existindo nos autos elementos probatórios que permitem concluir pela comunicação prévia por parte da Autora (e-mail de 20 de Abril de 2015, às 16:12), têm estes de ser valorados e tidos em consideração na decisão quanto à matéria de facto.

  7. Por outro lado, a invocação da excepção de não cumprimento do contrato só é legítima se for feita em conformidade com o princípio da boa-fé, de modo a que o alcance da excepção seja proporcional à gravidade dos defeitos ou anomalias, sob pena de abuso de direito.

    I. Ora, no caso dos autos, é violadora da boa-fé e abusiva a invocação pelo Réu da excepção de não cumprimento, na medida em que manifestamente não existe proporcionalidade entre o elevado valor em dívida e a gravidade da alegada inexecução ou incumprimento.

  8. De resto, é ainda evidente o abuso de direito na invocação da excepção de não cumprimento, na medida em que, tendo-se remetido ao silêncio durante quase um ano, o Réu só a vem invocar em sede de oposição à injunção que deu origem aos presentes autos.

  9. De qualquer modo, num contrato de empreitada, para que o dono da obra tenha o direito de exigir do empreiteiro a eliminação dos defeitos daquela, é preciso alegar e demonstrar a existência de um nexo de causalidade entre os defeitos e a execução da obra, com violação dos deveres que incumbiam ao empreiteiro (artigo 1208º do Código Civil).

    L. Ora, no caso dos autos, não existem quaisquer elementos probatórios que permitam concluir que os alegados defeitos tivessem por causa ação ou omissão imputável à Autora.

  10. De resto, existem nos autos elementos probatórios que permitem concluir que, caso existissem defeitos ou anomalias na viatura, foi o Réu quem impediu a sua eliminação, remetendo-se ao silêncio e não disponibilizando a viatura para o efeito.

  11. Pelas razões acabadas de explanar e em conclusão, padece a douta sentença de erro de julgamento quanto à matéria de facto, já que errou em factos considerados provados e no juízo sobre os mesmos, e quanto à matéria de direito, já que errou na determinação dos efeitos jurídicos da exceção de não cumprimento.

    Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada Justiça”.

    6- O R. apresentou contra-alegações com as seguintes conclusões : “1. A douta sentença julgou com acerto e deve ser mantida.

    1. Devem manter-se integralmente os factos dados como provados, os quais não poderão merecer qualquer censura, bem como a apreciação que sobre os mesmos recaiu, mantendo-se o decidido quanto à excepção de não cumprimento do contrato por parte do Autor.

    2. Não foram violados quaisquer preceitos legais.

    Termos em que deve manter-se “in totum” a douta decisão recorrida, improcedendo o recurso, pois só assim se fará a habitual e sã Justiça”.

    * * * II – Fundamentação

    1. A matéria de facto considerada como provada na 1ª instância é a seguinte : 1- A A. dedica-se à atividade de reparação, reconstrução e manutenção de viaturas clássicas e históricas.

      2- No exercício da sua atividade, em data não apurada, mas antes de 19/8/2014, a A. acordou...

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