Acórdão nº 691-04.3TBSCR.L2-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução25 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


  1. - Relatório.

A e mulher B, intentaram em 2004 acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra C ( REGIÃO AUTÓNOMA ), pedindo que : a) No seguimento da procedência da acção, seja judicialmente reconhecido que a Declaração de EXPROPRIAÇÃO por Utilidade Pública que teve por objecto os prédios dos autores identificados na petição inicial, caducou pelo decurso do prazo, sendo a mesma NULA e de nenhum efeito.

1.1.

- Para tanto, alegaram, os AA, em síntese, que : - São os donos de três prédios rústicos e urbanos, ao Sítio da Serra de Água, freguesia e concelho de Machico, os quais adquiriram por escritura pública de 25-11-1952 ; - Ocorre que, por ofício de 25-03-2002, foram os autores notificados de decisão de expropriação por utilidade pública, datada de 21-02-2002 , de áreas pertencentes a cada um dos referidos prédios, atingindo a área total expropriada cerca de 389 m2 ; - Porém, não apenas a entidade expropriante C não promoveu a constituição da arbitragem no prazo de um ano após a decisão de declaração de utilidade pública da expropriação, como, não remeteu sequer ao tribunal competente, e no prazo de dezoito meses, o processo em causa; - Logo, mostra-se operada a caducidade da declaração de utilidade pública da expropriação.

1.2. - Regularmente citada , veio a ré contestar a acção, por excepção [ invocando verificar-se uma espécie de litispendência ] e por impugnação, pugnando ainda pela suspensão da instância por pendência de causa prejudicial.

1.3.- Após resposta dos AA, e no pressuposto de nada obstar ao conhecimento imediato do mérito da acção, foi em 18/4/2008 proferido Saneador-sentença , sendo a acção julgada improcedente.

1.4.- Tendo os AA apelado da decisão identificada em 1.3., veio o Tribunal da Relação de Lisboa, por Ac. de 18/6/2009, a anular a sentença recorrida que havia apreciado do mérito da acção , julgando-a improcedente , e , em sede de cumprimento do determinado no referido Acórdão de 18/6/2009, proferiu a primeira instância ( em 31/8/2011 ) despacho saneador - tabelar -, seleccionando-se ainda a matéria de facto assente/provada e organizando-se a base instrutória da causa [ peças estas últimas que foram objecto de reclamação, parcialmente atendida ].

1.5.- Por fim, procedeu-se em 21/11/2016 à realização da audiência de discussão e julgamento e, conclusos os autos para o efeito [ em 2/12/2016 ], proferiu o tribunal a quo a competente sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor: “(…) Decisão Com os fundamentos supra explanados, decide este Tribunal julgar a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, totalmente improcedente, por não provada, e , em consequência: a. Absolver a ré do pedido.

Custas a cargo dos autores.

Registe e notifique Funchal,d.s.” 1.6. - Inconformados com a referida sentença, da mesma apelaram então os AA A e mulher B, apresentando os recorrentes na respectiva peça recursória as seguintes conclusões: 1 - Em sede factual é totalmente insustentável a opção que foi assumida pelo julgador no "ponto 24" da matéria considerada como provada face à total deriva para campos meramente conclusivos que se verificou.

2 - Conclui-se aí que as parcelas que são objecto do presente litígio "estão integradas nas ligações rodoviárias às estradas regionais que integram um eixo rodoviário que serve a zona leste da Região e onde se inclui a Via Rápida Machico/Caniçal" mas não existe qualquer suporte factual para essa conclusão.

3 - E, antes pelo contrário, a Declaração de Utilidade Pública, tal como foi publicitada e notificada aos expropriados, apenas menciona: - "Obra de Construção da Via Rápida Machico/Caniçal - Nó de Machico Sul".

4 - Nem é possível concluir que uma ligação entre o Túnel da ER 101 entre Água de Pena e Machico e os Sítios da Fazenda e dos Portais tenha o que quer que seja a ver com a zona onde se situam as parcelas que estão em causa.

5 - Nem a matéria que foi assente pelo julgador fornece qualquer indicação, por mínima que seja, quanto aos factos que permitiriam chegar à conclusão que tomou.

6 - Além disso, no aludido "ponto 24", consagrou-se também que as parcelas que são objecto do presente litígio "são necessárias para a sua prossecução ininterrupta", resolvendo-se desta forma a questão de direito que tinha sido colocada à apreciação do Tribunal.

7 - Com efeito, o próprio julgador, no corpo da sentença, reconhece que a caducidade se deveria ter por verificada se não fosse impedida pela razão das parcelas estarem integradas numa "obra contínua".

8 - Sendo patente que "obra contínua" e "obra ininterrupta" são exactamente a mesmíssima coisa, o julgador resolveu automaticamente o "Thema decidendum" através da consagração desta suposta factualidade.

9 - Tornando-se imperiosa a eliminação daquele "ponto 24" face ao seu carácter meramente conclusivo.

10 - De qualquer forma, e face aos factos consagrados nos "pontos 22.º , 23.º e 25.º ", é por demais evidente que as parcelas em causa não fazem parte de uma obra geometricamente linear e que estivesse dotada de um traçado contínuo.

11- Esclarecendo o legislador que está em causa "uma obra" e não o projecto global em que a mesma possa estar inserida.

12- Nem tendo sido apurados quaisquer factos que permitam concluir que as ditas parcelas se destinassem a um projecto articulado, global e coerente.

13 - Como será por demais evidente, não existe qualquer disposição legal que determine que a caducidade só é verificável nos casos em que a obra não tenha sido construída.

14 - Nem a determinação do direito pode estar condicionada à antevisão dos seus efeitos práticos, a não ser nos casos de excepcional abuso do direito.

15 - Não existindo qualquer expressa cobertura legal para o chamado "princípio da intangibilidade da obra pública", apenas perante situações abusivas o mesmo poderá ser invocável.

16 - As questões antes referidas estão exemplarmente respondidas em Acórdão deste Venerando Tribunal de 15/12/16, onde se afirmou: « Estranhando à operatividade da caducidade a consideração das consequências práticas da mesma, que se situam a jusante daquela e que, em última instância, apenas à inércia da entidade expropriante são imputáveis ».

17 - Tal como se acha provado, a R. levou vários anos para que procedesse ao envio dos autos de expropriação ao Tribunal e tal sucedeu apenas porque os AA. o requereram (pontos 9 e 10), o que apenas pode ser visto como uma forma de obstaculizar ao pagamento das indemnizações e forçar os expropriados a "renderem-se pela fome", pois, até à data, ainda nada receberam quanto a uma propriedade de que foram desapossados em 2002.

18 - Sendo indiscutível a verificação da caducidade do direito a expropriar, a sentença recorrida fez errada interpretação do disposto no art.º 13.º , n.º 3 e 7 do Código das Expropriações.

Termos em que, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida, Como é de Justiça.

1.7.- Tendo a Ré C, apresentado contra-alegações, nestas veio sustentar que deve ser mantido o julgamento da matéria de facto nos seus precisos termos, assim como a decisão final proferida pelo Tribunal a quo, tudo com as necessárias consequências legais.

Thema decidendum Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir resumem-se em aferir : Primo - Da pertinência da impetrada alteração da decisão do tribunal da 1ª instância proferida sobre a matéria de facto; Secundo - Se não podia a primeira instância ter julgado a acção improcedente, como julgou, porque indiscutível é a verificação da caducidade do direito a expropriar.

2. - Motivação de Facto.

Mostra-se fixada pelo tribunal a quo a seguinte factualidade : A) PROVADA 2.1. - Pela Resolução n.° 165/2002 do Conselho do Governo da Região Autónoma da C, reunido em plenário em 21 de Fevereiro de 2002, publicada no Jornal Oficial da Região Autónoma da C, I Série - Número 24, de 28 de Fevereiro de 2002, foi declarada a utilidade pública da expropriação, com carácter de urgência da expropriação, das parcelas dos imóveis e suas benfeitorias e todos os direitos a elas inerentes e ou relativos ( servidões e serventias, colónias, arrendamentos, acessões, regalias, águas, pertences e acessórios, prejuízos emergentes da cessação de actividades e todos e quaisquer outros sem reserva ), constantes da relação e plantas anexas, por as mesmas serem necessárias à prossecução ininterrupta dos trabalhos destinados à "Obra de Construção da Via Rápida Machico/Caniçal - Nó de Machico Sul", correndo os respectivos processos de expropriação pela Secretaria Regional do Equipamento Social e Transportes, que, para o efeito, é designada entidade expropriante. Simultaneamente e em consequência, fica a Secretaria Regional do Equipamento Social e Transportes autorizada a tomar a posse administrativa das referidas parcelas, nos termos dos artigos 19° e seguintes do citado Código das Expropriações, por se considerar essa posse indispensável à prossecução ininterrupta dos trabalhos em curso.

2.2.- Na relação anexa à Resolução referida em 2.1. figuram entre as parcelas a expropriar as seguintes: - n.° 165 - artigo 64/22, secção BU, terra nua - A …., Vila - Machico, área a expropriar (m2) - 1 144 ; - n.° 169 - artigo 64/8, secção BU, A ….., Vila - Machico, área a expropriar (m2) - 83; - n.° 170 - artigo 64/9, secção BU, terra nua - A ….., Vila - Machico, área a expropriar (m2) - 280 ; - n.° 171 - artigo 64/12...

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