Acórdão nº 2619/15.6T8PDL.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelRUI VOUGA
Data da Resolução19 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Cível da Relação de Lisboa.

Relatório: R. ... DA ... ... intentou contra CARLOS ... ... ...

Incidente de Incumprimento do Acordo de Responsabilidades Parentais, nos termos do artigo 181º da Organização Tutelar de Menores (O.T.M.), alegando – em síntese – que o Requerido, apesar de ter obrigado (nos termos do acordo de regulação das responsabilidades parentais que concluiu com a Requerente aquando do divórcio que dissolveu o casamento entre ambos celebrado e que recebeu a homologação da Conservadora do Registo Civil de Vila Franca do Campo) a contribuir mensalmente com a quantia de € 150,00 (actualizada anualmente de acordo com a taxa de inflação verificada no ano anterior) a título de prestação de alimentos para o menor ... ... ... ... (filho da Requerente e do Requerido), apenas pagou € 270,00 (no ano de 2007), € 180,00 (no ano de 2008), € 300,00 (no ano de 2009), € 920,00 (no ano de 2012), € 1076,66 (no ano de 2013), € 765,00 (no ano de 2014 e € 545,00 (no ano de 2015), não tendo pago qualquer quantia nos anos de 2010 e 2011 e tão pouco havendo pago metade das despesas de saúde e escolares do menor suportadas pela Requerente nos anos de 2008, 2011, 2012, 2014 e 2015 (num total de € 1.233,80), ascendendo os débitos alimentícias do Requerido ao valor total de € 13.138,05.

Jamais se logrou citar o Requerido para os termos do processo, nem na morada que lhe era imputada pela Requerente (na PI) – tanto por via postal como através do Consulado geral de Portugal em Toronto (com jurisdição consular na área da sua presumível residência no Canadá) -, nem naqueloutra morada que lhe era conhecida no Canadá sita na província do Ontário.

Posto o que foi o mesmo citado editalmente, nos termos e para os efeitos previstos no art. 41º, nº 3, do RGPTC (Regime Geral do Processo Tutelar Cível) aprovado pela Lei nº Lei n.º 141/2015, de 8 de Setembro.

Tendo resultado infrutíferas todas as diligências levadas a cabo com vista à citação do Requerido, foi proferido, em 1/03/2017, despacho a declarar extinto, por impossibilidade de prosseguimento da lide, o procedimento para efectivação da prestação de alimentos, nos termos do artigo 277º, al. e), do Código de Processo Civil.

Inconformada com o assim decidido, a Requerente R. ... DA ... ...

interpôs recurso da referida decisão – o qual foi admitido como de Apelação, com subida imediata, nos próprios autos, e efeito meramente devolutivo -, tendo extraído das concernentes alegações as seguintes conclusões: «1– A Recorrente instaurou incidente de incumprimento das responsabilidades parentais pedindo a condenação do Requerido no pagamento da quantia de 13.138,05 €, acrescida de juros à taxa legal até efetivo e integral pagamento.

2– Devolvida a citação do Requerido com a indicação de que aquele não reside naquela morada e que se encontra em parte incerta, a Meritíssima Juiz declarou extinto o incidente nos termos da al. e) do art. 277.º do C.P.C.

3– Assente está que se, por um lado, a obrigação alimentar para com os filhos menores corresponder a um dever natural, moral e legal dos progenitores (n.º 3 e 5 do art. 36 da C.R.P. e art. 1878º do C.C.), por outro lado, configura também um dever social da comunidade em que menores e progenitores se inserem (n.º 1 e 2 do art. 69.º C.R.P.).

4– Um entendimento que conclua pela não fixação de alimentos a menores por ser desconhecido o paradeiro do progenitor e a impossibilidade daí decorrente de poder aceder ao Fundo, coloca-os numa situação de manifesta desigualdade perante outros menores, relativamente aos quais foi possível apurar a situação económica dos pais o que configura uma clara violação do princípio da igualdade (art. 13.º da C.R.P.).

5– Tal entendimento colide ainda com os princípios da mais elementar justiça material uma vez que configuraria uma verdadeira recompensa para “o progenitor que se exime às suas responsabilidades, abandonando e desinteressando-se da sorte do filho, em manifesta violação dos deveres que sobre si impendem”.

6– Perante tais situações haverá de operar-se uma inversão do ónus da prova, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 344.º do C.C., devendo considerar-se que o progenitor que assim procedeu tornou impossível a prova do beneficiário necessitado de alimentos.

7– Assim não o entendendo, o infeliz despacho recorrido violou, entre outros, o disposto nos arts. 13.º, n.º 1 e 2 do art. 69.º da C.R.P., n.º 2 do art. 344.º do C.C., al. e) do art. 277.º C.P.C., a contrario, e n. 1.º da Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro.

Termos em que deve o despacho recorrido ser substituído por outro que se pronuncie quanto à verificação do incumprimento das responsabilidades parentais, por ser de Direito e de JUSTIÇA!» O MINISTÉRIO PÚBLICO contra-alegou, pugnando pelo não provimento da Apelação da Requerente e pela consequente confirmação da decisão recorrida, formulando – a rematar a sua resposta às alegações da Apelante – as seguintes conclusões: «1.

– Mediante decisão de 11.09.09 proferida no âmbito de processo que correu termos na Conservatória do Registo Civil de Vila Franca do Campo no qual foi decretado o divórcio entre os progenitores do menor ... ... ... ..., nascido a 08.07.00, o pai ficou obrigado ao pagamento de pensão de alimentos no montante mensal de 150,00€, a entregar à mãe até ao dia 8 do mês a que dissesse respeito, atualizada anualmente de acordo com a taxa de inflação verificada no ano anterior, quantia acrescida de metade das despesas médicas e escolares do menor.

  1. – A mãe iniciou a 01.10.15 o processo neste tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 48º RGPTC, para “efetivação da prestação de alimentos” por parte do pai, incumpridor a partir de 2007, formulando um pedido de pagamento de 13.138,05 €, acrescido de juros à taxa legal.

  2. – Procedeu-se a buscas nas bases de dados disponíveis, não se localizando o pai, ou bens ou rendimentos auferidos pelo mesmo, até à citação edital.

  3. – Decorrido o prazo, foi proferida a 01.03.17, decisão, que declarou não ser possível a efetivação da prestação de alimentos pelos meios previstos no artigo 48ºRGPTC e não obstante estar verificado o incumprimento da obrigação de pagamento de prestação de alimentos, declarou extinto, por impossibilidade de prosseguimento da lide, o procedimento para efetivação da prestação de alimentos, nos termos do artigo 277º, al. e) do C.P.C.

  4. – Lavra em erro a recorrente quando afirma que a decisão não aplica o comando do artigo 344º CC, quanto à inversão do ónus da prova.

  5. – O Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores assegura o pagamento dos alimentos devidos a menores, quando os obrigados a não assumam, ficando aquele sub-rogado nos direitos dos menores contra os devedores – cfr. Lei n.º 75/98, de 19/11.

  6. – De harmonia com o disposto no artigo 1º, da referida Lei e art. 3º do DL n.º 164/99, de 13/05, que regulamenta a atribuição daquela prestação social, constituem pressupostos do direito de acesso do Fundo, designadamente a fixação por sentença de alimentos devidos a menores (que existe, desde o divórcio), a não satisfação pelo devedor daqueles alimentos e a não obtenção coerciva da prestação de alimentos através dos meios previstos no artigo (ao tempo 189º da OTM) atualmente 48º RGPTC (ambos os requisitos já verificados nesta sentença em recurso) 8.

    – Os mecanismos de intervenção do Fundo de garantia de alimentos devidos a menor implicam portanto, entre outros pressupostos, exista previamente ao acionamento da intervenção, uma decisão do teor da que aqui é colocada em crise.

  7. – Está a mãe em condições de intentar o Incidente próprio, neste processo de Incumprimento/efetivação da prestação de alimentos, com a legitimidade que lhe é conferida pelos seus poderes genéricos de representação do filho, e especialmente pelos artigos 3º, nº1 da Lei nº75/98 de 19.01 e 17º RGPTC.

  8. – Daqui que a decisão de que se recorre se mostra adequada à situação do menor, salvaguarda cautelarmente os seus direitos, designadamente o direito a ser alimentado/sustentado pelo pai...

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