Acórdão nº 773/16.9T8PRT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA TERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução20 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: I– Manuel .... e mulher, Filomena ……, intentaram acção declarativa de condenação contra o Banco ……, SA, pedindo a sua condenação a pagar-lhes o montante de 75.000,00€, acrescido de juros legais vincendos à taxa legal em vigor, desde a citação, até efectivo e integral pagamento.

Para o efeito, alegaram, no essencial, que, em 1995 celebraram com o R. um contrato de mútuo, com hipoteca, com vista à construção e beneficiação do imóvel destinado à sua habitação própria e permanente, e que, posteriormente, em 2006, celebraram novo mútuo com hipoteca, agora para fazer face a problemas financeiros, incidindo a hipoteca, num caso e noutro, sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de …… sob o nº 00...., da freguesia de Rio Mau, inscrito na matriz predial sob o art. ….. Tendo deixado de cumprir junto do R. as obrigações decorrentes desses contratos, este instaurou contra eles execução para pagamento do valor de 32.346,81 €. E no âmbito da mesma foi-lhe adjudicado o acima referido prédio urbano, composto por casa de um pavimento. A adjudicação foi feita através de propostas em carta fechada, pelo preço de 20.300 €, correspondente a 70% do valor base de 29.000,00 €. Dado o valor simbólico que aquele imóvel tem no seio familiar – por terem sido os AA. quem o construiu - decidiram os mesmos apresentar uma proposta de compra ao R., que, no entanto, os veio a informar, em 29/1/2013, que “só aceitava para análise e aprovação superior, propostas de aquisição para o imóvel desde que iguais ou superiores a 105.000,00 €.”. Entendem deste modo os AA. que emergiu no património do R., com a expectável venda do imóvel, um activo de cerca de 75.593,81€. Sucede que os AA, para além da sua edificação, realizaram no imóvel, durante os últimos anos, várias obras, tendo construído nele mais um piso, passando assim o prédio a ter mais 3 quartos, uma cozinha e duas casas de banho, e que essas benfeitorias, que implicaram que o prédio tivesse aumentado para o dobro, surgem reflectidas na contraproposta do R. de venda, mas não foram consideradas no momento da adjudicação do imóvel . Com o que este enriqueceu à custa deles no montante de 75.000,00€ a titulo de benfeitorias, que não foram consideradas, nem foram levantadas, nem o podendo ser, sem que isso acarrete a sua demolição, invocando o disposto nos arts 216º, 1273º/1 e 2, 473º/ 3 e 480º todos do CC.

O R. contestou, invocando a prescrição, em função do disposto no art 482º CC, visto que entre a data da adjudicação e a da instauração da presente acção decorreram mais de três anos. Invocou ainda a preclusão do direito a que os AA. se arrogam, pois que se os mesmos realizaram despesas úteis para melhorar o prédio – o que ele desconhece – competia-lhes, como possuidores de boa fé, invocar as benfeitorias realizadas e, enquanto não fossem delas ressarcidos, exercer o direito de retenção, reclamando tal crédito na execução, para nela o verem reconhecido e graduado no lugar a que tivesse direito. Não o tendo feito e realizada que foi a venda judicial do imóvel, porque esta é feita sem transmissão dos direitos reais de garantia que o oneram e transfere para o R. os direitos do executado sobre a coisa vendida /adjudicada, sempre teria caducado o direito de retenção dos AA. sobre o prédio em causa, não podendo agora socorrer-se do “remédio” da acção de enriquecimento sem causa. Invocou ainda que a hipoteca constituída a seu favor sobre o prédio em causa se estende às benfeitorias nele realizadas nos termos do art 691º/1 al c) CC.

Tendo sido entendido ser possível o imediato conhecimento de mérito, foram notificados os AA. para se pronunciarem sobre a questão da prescrição suscitada pelo R., e ambas as partes para se pronunciarem sobre a questão da dispensa da audiência prévia, com a advertência de que o seu silêncio seria entendido no sentido da não oposição à dispensa de tal diligência.

Os AA. pronunciaram-se sobre a prescrição, referindo que no caso em apreço se está perante a aplicação do art 473º/2 CC, que remete para o instituto do enriquecimento sem causa, mas apenas para o seu cálculo, e não para o seu regime, pelo que na situação a que os autos se referem a prescrição é de 20 anos.

Não teve lugar audiência preliminar, tendo sido de imediato proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo a R. do pedido.

II– Do assim decidido, apelaram os AA.

que concluíram as respectivas alegações do seguinte modo: 1.

– A douta sentença pôs termo à causa nos termos e efeitos dos artigos 595º n.º 1 al. b) e 644º n.º 1 al. a), do CPC.

  1. – Quando na verdade, salvo melhor opinião, o estado do processo não permitiria conhecer imediatamente do mérito da causa, havendo necessidade de mais provas para a boa decisão, bem como foram aplicadas normas que no entender dos recorrentes foram equivocamente aplicadas e interpretadas, devendo-se impor outra para a boa decisão da causa, e, por conseguinte, diversa da proferida.

  2. – Em sede de despacho saneador, foi proferida sentença que julgou a acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, intentada pelos Recorrentes contra o Recorrido, improcedente, por não provada.

  3. – Para sustentar a sua douta decisão o tribunal “a quo” atendeu à seguinte doutrina: 5.– “O que resulta dos autos é, em suma, e afinal de contas, que os autores pretendem ser indemnizados no montante de € 75.000,00, a título de benfeitorias que realizaram no prédio acima identificado: 6.– Dispõe o art. 1273º, do CC: «1. Tanto o possuidor de boa-fé como o de má-fé têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito, e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento dela. 2. Quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa».

  4. – Têm razão os autores quando afirmam que o art. 1273º/ 2, do CC, nos remete para o instituto do enriquecimento sem causa, mas apenas para o seu cálculo, e não para o seu regime; ou seja, o que o preceito quer significar é que o cálculo da indemnização por benfeitorias deve ser feito segundo as regras do enriquecimento sem causa, e não que seja aplicado o regime do instituto no seu todo, nomeadamente no que ao prazo prescricional diz respeito.

  5. – Os autores, limitam-se a alegar, de modo vago, que durante «os últimos anos realizaram no imóvel várias obras.

    Desde logo, construíram mais um piso, passando, assim, o prédio a ter mais 3 quartos, uma cozinha e duas casas de banho. Isto é, com as benfeitorias, o prédio aumentou mais do dobro.

  6. – Estas alterações, obviamente, aumentaram o valor do imóvel.

  7. – Aumento que apenas foi refletido na contraproposta (105.000,00 €) de venda e não no momento da adjudicação (20.300,00 €).

  8. – Pois, foi o imóvel vendido abaixo de valor de mercado, bem como não teve em linha de conta as benfeitorias implantadas no referido imóvel, e que se computam em cerca de 75.000,00€.

  9. – Assim sendo, o imóvel em apreço, apesar de descrito como um prédio urbano composto por 1 pavimento, com as benfeitorias, passou a constituir um prédio urbano composto por uma Cave, R/Chão, 1º Andar, tendo não 4 divisões, mas mais 6 divisões».

  10. – Assim, além de não concretizarem especificadamente as benfeitorias realizadas no prédio, não alegam: - quando é que cada uma das benfeitorias foi realizada; - o custo de cada benfeitorias à data em que foi realizada; - o valor actual de cada benfeitoria realizada.

  11. – Ora, retornando à petição inicial com que foi introduzida em juízo a presente acção, o que se conclui é que não foram sequer alegados factos constitutivos de que a lei faz depender o direito a indemnização por benfeitorias úteis.

  12. – Na verdade, não resulta alegado, sequer, por exemplo, qual o valor do imóvel à data da verificação de algum dos factos referidos nas duas alíneas do art. 480º do CC ("ex vi" do art. 479º, nº 2 do CC), antes e após a realização das benfeitorias nele alegadamente introduzidas pelos autores [o enriquecimento pressupõe e reduz-se sempre a uma diferença, entre a situação real e actual do beneficiado e a situação em que se encontraria, se não fosse a deslocação patrimonial operada ].

  13. – Em suma, pois, mesmo que os autores fizessem prova de tudo quanto alegam na petição inicial, ainda assim, pelas razões expostas, a acção estaria votada ao insucesso.

  14. – E não há lugar a convite ao aperfeiçoamento quando o que é insuficiente não é a alegação, mas a realidade alegada, destinando-se o mecanismo do art. 508º nº 3 a suprir a insuficiência do alegado.

  15. – Assim, pois, “o princípio da cooperação tem de ser temperado pelo princípio da responsabilidade das partes, não podendo estas esperar que o Juiz tudo venha suprir, nomeadamente as suas lacunas, nem podendo o convite ao aperfeiçoamento tornar-se numa autêntica subversão do processo”».

  16. – Os Recorrentes no uso do seu direito, alegaram que o imóvel foi adjudicado à Ré, pelo módico valor de 20.300,00€, 70%, do valor em dívida, para depois ser vendido pelo valor de 105.000,00€.

    Emergindo no património da Ré, com a venda ou expectável venda, um activo de cerca de 75.593,81€, resultando da diferença do valor em dívida de 29.406,19€ e o valor da proposta de venda de 105.000,00€.

  17. – Como facilmente se denotará, para além da sua edificação, durante os últimos anos, os AA., realizaram várias obras, desde logo, construíram mais um piso; passando a ter mais 3 quartos, 1 cozinha e 2 casas...

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