Acórdão nº 5379/12.9TBFUN.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelONDINA CARMO ALVES
Data da Resolução20 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA.

I.–RELATÓRIO: MARGARIDA, CARLA e ELIZABETE, residentes em ……, intentaram, em 29.11.2012, contra JOSÉ, e FÁTIMA, residentes na ……, acção declarativa, através da qual pedem que: a.

- Se declare as autoras donas e legítimas possuidoras do imóvel identificado no artº 1 e 3 da petição inicial (artº matricial 1925), que se encontra integrado no prédio misto denominado “Quinta” e identificado no artº 1º e a ser a posse exercida pelos réus, naquele referido imóvel, insubsistente, ilegal e de má fé.

b.

- Se condene os réus a reconhecerem às autoras o referido direito de propriedade sobre o dito imóvel e a restituir-lhes o mesmo, com todos os seus pertences, completamente devoluto de pessoas e coisas que lhes pertença.

c.

- Se condene os réus a pagarem às autoras a indemnização mensal de € 300,00 pela referida ocupação a partir de 1 Abril de 2012 até efectiva entrega, quantificando-se a parte vencida em € 2.100,00.

Alegaram, para tanto, que: 1.– As AA. são legítimas donas e possuidoras de um prédio misto, denominado “Quinta” com a área de 46.110m2, qual se acha implantada, entre outras, um prédio urbano inscrito na matriz sob o art. 1925 (antes sob o artº 1143) a confrontar por todos os lados com os proprietários e descrito na Conservatória respectiva, sob o n.º 671/19951214 – freguesia de ….

  1. – Tal prédio foi adquirido por sucessão legítima, por óbito dos pais das AA..

  2. – O mencionado imóvel foi ampliado pelas AA. e objecto de obras, tendo a s.c. de 112,5m e dependência de 137,5m, por volta dos anos de 1989/1990.

  3. – A mencionada casa foi adquirida pelos pais das AA. (senhorios do terreno), aos herdeiros do anterior caseiro/colono, Manuel que emigrou para os Estados Unidos, tendo por lá falecido.

  4. – Em 1962 tais benfeitorias, por escritura de 8 de Janeiro de 1962, lavrada a fls. 4 verso a 6 verso, do Lº 429-A do então primeiro Cartório da Secretaria Notarial do Funchal, foram vendidas por Teresa, viúva de ….., pelo preço de 36.000$00.

  5. – O Réu marido veio viver para o prédio, denominado “casinha O.” e identificado nos artigos precedentes, em 1962, na companhia de seus pais, ele contratado como trabalhador agrícola e que prestou serviço na Quinta até ao seu falecimento, que ocorreu em 21 de Dezembro de 1985, com o benefício de utilização do imóvel em causa, enquanto permanecesse como trabalhador agrícola.

  6. – O prédio acha-se registado a favor das requerentes, pela apresentação 10 de 1961/08/29 e, apresentação 2 de 1995/12/14 (doc. cit.).

  7. – As AA. por si e pelos seus antepossuidores, sempre estiveram na posse do prédio em questão, por mais de trinta, quarenta e cinquenta anos, posse que se tem mantido em nome próprio e de boa fé, de modo pacífico e continuado à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse.

  8. – E assim, tal posse e utilização traduziram-se sempre na prática de actos materiais de manutenção e fruição dos seus frutos, tais como melhoramentos efectuados, ampliação e remodelação da casa, satisfação de encargos, detenção e ocupação, bem assim arroteio de terra circundante, pagamento das respectivas contribuições no uso pleno das faculdades que integram o direito de propriedade, detenção e ocupação.

  9. – Assim, até por usucapião, se outro título não houvesse, que o há, que expressamente se invoca, o mencionado prédio (artº 1 e 3) pertence às requerentes.

  10. – Acontece, porém, que o Réu marido, vivia no objecto ocupado por seus progenitores, sendo o pai trabalhador agrícola da “Quinta” que por essa qualidade e profissão, beneficiou da ocupação da casa atrás identificada.

  11. – O Réu marido chegou a trabalhar juntamente com o pai, e tornou-se trabalhador agrícola permanente da “Quinta” a partir do ano de 1983/84, tal qual o seu pai o fora, beneficiando, igualmente, do direito de permanecer no objecto cedido, auferindo um salário mensal, actual, de € 485,00, enquanto subsistiu o vínculo laboral que o ligava à “Quinta” sendo a cedência da habitação causal à qualidade inerente de trabalho agrícola da “Quinta”.

  12. – O Réu marido deixou de prestar serviços agrícolas na “Quinta” a partir de um de Abril de 2011, por entretanto ter solicitado a reforma que lhe foi concedida, deixando de haver motivo para a permanência no objecto por parte dos RR., cessado que foi, a relação de trabalho, (permanente) então, existente.

  13. – Por mera tolerância e complacência das AA., continuaram os RR. a viver no referido local, mas agora as requerentes necessitam do referido espaço ocupado pelos RR. e da casa que detêm, o que, já por diversas ocasiões, e oportunidades, a partir do início do corrente ano, foram instados a procederem à entrega do objecto que detêm, isto após a cessação do vínculo laboral que existia, o que os RR. têm protelado com os mais variados pretextos.

  14. – Passaram, assim, os RR. a deter o objecto acima identificado e bem assim o terreno circundante, parte do respectivo logradouro, sem título que nunca houve, ou melhor dizendo com a cessação da relação de trabalho e agora contra a vontade dos seus donos, as ora requerentes.

  15. – O que as AA. podem exigir como exigem deles, o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhes pertence (n.º 1311 do CC), bem assim a serem indemnizados dos prejuízos sofridos e que porventura venham a sofrer até acontecer a aludida restituição.

  16. – A habitação vazia terá um valor de, pelo menos € 300,00 mensais, valor esse correspondente à indemnização, impedindo e privando as AA. de usufruírem aquilo que lhes pertence.

  17. – Os RR. não têm qualquer motivo para recusarem a restituição e estão por consequência, obrigados a abandonar e a retirar do mesmo tudo quanto lhes pertence.

  18. – A posse das AA. alicerça-se em justo título, sendo, por isso, de boa fé, além de pacífica e exercendo, ostensivamente de modo a ser conhecida por toda a gente, o que, aliás, resulta, bem como a propriedade, de presunção legal – artº 7º do Código de Registo Predial.

Citados, os réus apresentaram contestação, em 04.02.2013, impugnando os factos alegados pelas autoras na petição inicial, e deduziram ainda reconvenção, na qual invocaram terem efectuado ampliação e melhoramentos no prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 1935º que traduzem numa benfeitoria útil, na medida em que constituem um melhoramento ou aperfeiçoamento feito por quem tem um vínculo à coisa (relação de facto ou de direito), na perspectiva de lograr uma sua mais utilidade ou melhoria.

Invocam, assim, os réus que, em caso de procedência da acção de reivindicação, lhes assiste o direito de serem indemnizados, não só pelas obras de conservação (benfeitorias necessárias) feitas na parte primitiva do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 1935, como também à ampliação (benfeitorias úteis) efectuadas pelos RR. no referido prédio, que aumentaram o valor do referido prédio, valor esse que estimam em cerca de € 20.000,00.

Pediram, por isso, os réus, que acção seja julgada improcedente, absolvendo-se os réus do pedido ou, caso assim se não entendesse, deveria o pedido reconvencional ser julgado procedente e, em consequência, serem as autoras condenadas a indemnizarem os réus: a)-Pelas benfeitorias úteis realizadas no referido prédio e que consistiram na ampliação feita pelos réus ao referido prédio urbano, no montante de € 20.000,00 ( vinte mil euros).

b)-Pelas benfeitorias necessárias efectuadas na parte primitiva do prédio urbano inscrito na matriz sob o artº 1935º, em montante a liquidar em execução de sentença.

Notificadas, as autoras apresentaram articulado de réplica, em 26.02.2013, através do qual suscitaram o incidente de valor e responderam à reconvenção deduzida pelos réus, invocando que as obras que foram autorizadas foram custeadas pela autora, J bem assim o trabalho produzido pelo réu foi efectivamente pago. Quanto a obras eventualmente efectuadas pelos réus, para além daquelas autorizadas, nunca mereceram a concordância, conhecimento e autorização das autoras, quer verbais, quer escritas, pelo que nada é devido aos réus.

Terminam as autoras, pedindo que seja julgada procedente a excepção invocada e julgado improcedente o pedido reconvencional, mantendo-se o pedido inicial, com as legais consequências.

Por despacho de 22.05.2013, foi decidido o incidente de valor, atribuindo à causa o valor de € 35.000,00, pelo que julgou o Tribunal verificar-se uma excepção dilatória de incompetência relativa, declarando-se incompetente em razão do valor, determinando a remessa oficiosa dos autos para as Varas de competência mista do Funchal, por serem competentes em razão do valor.

Por despacho de 22.10.2013, proferido pelo Tribunal competente, foram as partes notificadas, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 5º, nº4 da Lei nº4172013, de 26.06.

As partes apresentaram os respectivos requerimentos probatórios.

Em 14.11.2013 foi proferido despacho, designando para a realização de audiência prévia o dia 18.03.2014, no...

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