Acórdão nº 2164/10.6TCLRS.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA TERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução06 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: I– José e Julieta, em 7/3/2010 instauraram acção declarativa de condenação com processo comum, sob a forma sumária, contra “M………., Mediação Imobiliária. Lda” e C………, pedindo que ambas as RR.

sejam solidariamente condenadas a: a)- Ver julgado nulo e de nenhum efeito o contrato de trespasse celebrado por eles e a 2ª R. e intermediado pela 1ª; b)- Devolvê-los à situação anterior à outorga do contrato de trespasse, nomeadamente através da devolução de todas as quantias que eles pagaram no âmbito de tal; c)- Pagar-lhes uma indemnização pelos danos não patrimoniais por eles sofridos em consequência directa, necessária e adequada da suas actuações, e que deverá ser quantificada em sede de execução de sentença, mas que deverá ser arbitrada em quantia nunca inferior a € 25.000,00.

d)- Pagar-lhe todas as quantias referentes a juros, vencidos e vincendos, à taxa legal.

Alegam que viram um anúncio relativo ao trespasse de um estabelecimento de “snack bar” publicado pela 1ª R., que é mediadora imobiliária, ficaram interessados no negócio e contactaram essa R. O representante da mesma assegurou a excelência do negócio, que tinha um grande aviamento e aptidão legal para o fim a que se destinava. Tendo ocorrido uma reunião que abrangeu a 2ª R. o negócio foi celebrado em 12/1/2010, através de instrumento escrito elaborado pela 1ª. Nesse escrito ficou estabelecido que a 2ª R. trespassava aos AA. o estabelecimento comercial em causa, pelo preço total de € 50.000,00, que seria pago em prestações, a 1ª no montante de 10,000.00 €, que os AA. logo pagaram, e o remanescente em prestações nunca inferiores a 250,00 €/mensais, das quais os AA. pagaram, entretanto, à 2ª R., a quantia total de 1.700,00, em duas prestações de 850,00 € cada. Ficou clausulado que o estabelecimento estava devidamente licenciado pelo CMOdivelas (CMO), tendo sido transmitida a posse do mesmo aos AA. que o passaram a explorar. Porém, logo nos primeiros dias constataram terem sido ludibriados tanto pela 1ª R., como pela 2ª, pois que tendo sido visitados por fiscais da CMO, aperceberam-se que o estabelecimento não tinha licença de utilização e que o aviamento era escasso, tendo pouquíssimos clientes. A isso acresce que a 2ª R. não tinha em relação ao espaço onde estava instalado o estabelecimento qualquer vínculo contratual que possibilitasse aos AA., enquanto novos proprietários do estabelecimento, continuarem a ocupar as instalações em que o mesmo estava instalado, vindo estes a descobrir que a 2ª R. não era mais do que parte num contrato de locação do imóvel em que estava instalado o estabelecimento. Concluem pela nulidade do trespasse em função do disposto no art 280º CC, da qual resultará a devolução aos AA. das quantias por eles entregues à 2ª R., enquanto eles lhe devolverão o estabelecimento que, desde logo, colocaram à disposição desta, sem prejuízo do disposto no art 290º CC. Invocaram a disciplina do art 227º CC e a circunstância de as RR. terem negociado com eles de má fé, pois bem sabiam que o estabelecimento comercial não estava dotado de licença camarária necessária ao seu funcionamento, não estava dotado de qualquer vinculo fáctico ou jurídico que o ligasse ao imóvel onde estava instalado, e não possuía o movimento publicitado, pelo que são ambas as RR. solidariamente responsáveis pela situação e pelas consequências descritas - danos patrimoniais consubstanciados no preço entregue pelos AA., e danos não patrimoniais, na medida em que tiveram que sair do estabelecimento poucos dias após terem começado a explorar o mesmo, situação que os traumatizou, magoou e ofendeu. A R. Carla contestou, invocando a ineptidão da petição inicial, e impugnou o alegado pelos AA., dizendo que desconhece o que a 2ª R. terá dito quanto ao aviamento do estabelecimento, e que quanto a ela os AA. não a questionarem a esse propósito, ou a qualquer outro, tendo muita pressa no negócio, sendo que ela em nada contribuiu para o texto do mesmo, salientando que os AA. sabiam e confirmaram em função da leitura do contrato, que ela era locatária de um contrato de leasing com o BPI. Foi por isso que foi estabelecido que os AA. lhe pagariam todos os meses, num total de 12, € 850,00 a título de quantia fixa e outra variável no valor mínimo de € 250,00, tendo tal quantificação sido aceite, uma vez que até à manifestação de intenção de aquisição, ou não, pelo valor residual da fracção ao BPI, ela, 2ª R., continuaria a ser a única responsável pelas prestações de leasing. Os AA. pagaram duas prestações fixas, uma referente ao mês de Fevereiro e outra ao de Março. O estabelecimento tinha licença para funcionar – e com ela funcionou 9 anos - e a causa da má performance do negócio radica na actuação dos AA., que não souberam gerir o estabelecimento.

Deduziu incidente de intervenção de terceiros com vista a chamar à acção o Banco ….. e a Companhia de Seguros …… e formulou pedido reconvencional, pedindo a condenação de todos os chamados, bem como a 1ª R. e os AA., solidária e conjuntamente, a pagarem -lhe a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais a quantia de € 135.065,00, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos, contados a partir da citação até efectivo e integral pagamento. Para fundamentar tal pedido alega que sofreu danos em virtude do não cumprimento do contrato celebrado com os AA. - que, de forma injustificada, decidiram unilateralmente não assinar o contrato de transmissão da posição contratual no leasing, não cumpriram o contrato de trespasse, esvaziaram o estabelecimento, que fecharam no dia 11/2/2010 – sendo pois, responsáveis pelo conteúdo deste, bem como pelos valores não pagos e previstos no contrato de trespasse, e ainda pelos danos não patrimoniais por ela sofridos, visto ter pesadelos constantes e stress em função da situação em causa, pedindo a esse título a quantia de € 30.000,00. A R. “M……” contestou, alegando ter agido dentro das regras que regulam a sua actividade, pois que, através das informações que lhe foram disponibilizadas pela 2ª R., se assegurou que o negócio se encontrava em condições de ser realizado, estando o BPI disponível para autorizar uma eventual cessão da posição no contrato de leasing, sucedendo que mais tarde a 2ª R. pretendeu apenas trespassar o estabelecimento, mantendo a sua qualidade de locatária e subarrendando o locado, referindo-lhe ainda que estava pendente na CMO o pedido de licença de utilização para o referido estabelecimento, dispondo o imóvel de licença de utilização, tendo sido com base nestas informações que publicitou o imóvel e o estabelecimento em causa. A única informação que prestou aos AA. foi a de que se tratava de um estabelecimento com clientela habitual. No negócio mediado estava estabelecida a faculdade de os AA., no prazo de 18 meses, optarem pela aquisição do imóvel pelo preço de € 200.000,00, descontando-se nesse valor as quantias entretanto pagas até à respectiva escritura, sendo que entre os AA. e a 2ª R. seria celebrado um contrato de sublocação, segundo minuta facultada pelo BPI e com autorização do mesmo como locadora, ficando os mesmos a pagar uma renda mensal de € 850,00 enquanto a 2ª R. estivesse a pagar o leasing. Os AA. e a 2ª R. quiseram concluir o negócio rapidamente, em momento em que o BPI ainda não tinha disponibilizado a minuta para a sublocação e, por isso, o contrato de trespasse foi realizado em 12/1/2010, e a dita minuta chegou a 14/1/2010, tendo a mesma sido entregue pela 1ª R. aos AA. já preenchida em função dos intervenientes e estes não o assinaram. Mais refere que os AA. se estarão a aproveitar de um “mero lapso de redacção” da cláusula 3ª do contrato, pois que lhes foi explicado que o imóvel tinha licença de utilização, mas que a necessária para o exercício da actividade de restauração se encontrava em curso, tal como a 2ª R. a tinha informado a ela, 1ª R., e que essa circunstância não impedia a laboração do estabelecimento. Pediu ainda a condenação dos AA. como litigantes de má-fé.

Replicaram os AA., pugnando pela ineptidão do pedido reconvencional por cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis, e pela improcedência do mesmo, e pediram a condenação de ambas as RR. como litigantes de má-fé.

Foi proferido despacho a indeferir o incidente de intervenção de terceiros deduzido pela R. Carla.

Mais foi decidido que face à reconvenção apresentada a acção passasse a seguir os termos da forma ordinária de declaração, tendo a acção sido remetida às Varas Mistas de Loures.

Realizou-se a audiência prévia, na qual foi admitido o pedido reconvencional deduzido, mas unicamente na parte em que o mesmo é dirigido aos AA.; julgaram-se improcedentes as excepções dilatórias de ineptidão da petição inicial e da reconvenção; e foram fixados o objecto do litígio e os temas da prova.

Foi junta pelos AA., a fls 191, certidão da CMO.

Designado dia para julgamento, no seu início, os AA. e a R. Carla efectuaram transacção nos seguintes termos: «Os AA. desistem do pedido quanto à R. Carla; A R. Carla desiste do pedido reconvencional deduzido contra os AA.

Custas em partes iguais prescindindo-se das de parte» Tal transacção foi homologada por sentença proferida de imediato, tendo sido ordenado que os autos fossem com vista ao MP para se pronunciar, uma vez que a R. tem apoio judiciário. Realizada audiência de julgamento, finda a mesma, foi proferido despacho com o seguinte teor: «Quando me preparava para elaborar a sentença, constatei o seguinte: - um dos pedidos formulados nos autos é o de devolução das quantias que os autores alegam que entregaram por via da celebração do contrato (que no caso é a quantia de 11.700€ - cfr. artº 21 da p. i.); - os autores desistiram do pedido quanto à 2ª ré; - no entanto nada disseram em consequência dessa desistência, nomeadamente quanto ao facto de terem ou não dela recebido a referida quantia.

Independentemente das várias soluções de direito...

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