Acórdão nº 7106/14.7TDLSB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE GON
Data da Resolução05 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: 1.Na sequência de denúncia apresentada pela assistente, Massa Insolvente da Sociedade T...-F... e C..., SA, o Ministério Público procedeu a inquérito, findo o qual pela assistente foi deduzida acusação particular contra S...-Sociedade J...(Expresso) (I... P..., SA), CA..., LM... e JP..., todos melhor identificados nos autos, imputando-lhes a prática de um crime p. e p. pelo artigo 187.° e 183.°, n.°2, do Código Penal.

O Ministério Público não acompanhou a acusação particular deduzida pela assistente.

Os arguidos requereram a abertura da instrução, alegando que não praticaram qualquer ilícito e pedindo a consequente não pronúncia, arguindo, igualmente, a nulidade do inquérito por insuficiência, porquanto não foram no decurso do mesmo constituídos e interrogados como arguidos.

Finda a instrução, foi proferido despacho de não pronúncia.

  1. Inconformada com a decisão de não pronúncia, interpôs a assistente o presente recurso, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): A-O Tribunal a quo decidiu pela não pronúncia dos Arguidos, CA..., LM..., JP..., pela prática do crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva, p. e p. nos termos do artigo 187.º do Código Penal, especialmente agravado pela alínea a) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 183.º do Código Penal. Nomeadamente, o Tribunal a quo considerou no que concerne aos Recorridos CA... e JP..., as afirmações proferidas "não são agradáveis", mas foram proferidas como uma opinião e comentário, no âmbito da liberdade de expressão. No que concerne ao Recorrido LM..., o Tribunal a quo considerou que não foi por este proferida qualquer afirmação dirigida à Recorrente, que pusessem em causa o seu bom nome e credibilidade.

    B-Os factos cuja prova documental irrefutável consta dos autos e não foi posta em causa a sua veracidade, tendo sido aliás transmitida e divulgada publicamente por meio da comunicação social, refere-se a uma entrevista, publicada em ...-04-20..., na "R...", suplemento do S... "Expresso", realizada pela Recorrida CA..., onde esta dirigindo-se à Recorrente, expressamente afirmou que a Recorrente nunca deu formação profissional e que uma empresa "fake", que apenas existe para "sacar fundos". Em acto sequencial e como resposta, o Recorrido LM... refere que a "fraude é sempre possível" e que o "dinheiro não garante a qualidade dos cursos de formação".

    C-Já a ...-09-20..., no programa semanal "Q...C...", que é transmitido em directo, no canal informativo S...N..., o Recorrido JP... proferiu afirmações falsas dirigidas à Recorrente, entre as quais afirmou aquele que a Recorrente era uma "empresa falsa", "criada" para servir o poder político, sem verdadeira vida económica e que apenas "vive do tráfico de influências". Mas não só naquele programa o Recorrido proferiu tais afirmações, nos últimos 02 anos, continuadamente, através do seu blog pessoal, "Abrupto", faz afirmações, nos chamados "Posts", com conteúdo factual inverídico e não meramente desagradável, da actividade da Recorrente.

    D-A Recorrente é uma empresa com 30 anos de actividade comprovada no mercado, tendo ministrado centenas de cursos de formação e ajudado a formar milhares de pessoas, e assim perante as imputações feitas pelos Recorridos, verifica-se que o Tribunal a quo fez uma incorrecta aplicação de direito aos factos indiciados, com a não pronúncia dos ora Recorridos pela alegada prática do crime supra enunciado, uma vez que as afirmações dos Recorridos ultrapassam largamente o manto da liberdade de expressão e entram no âmbito das ofensas ao bom nome e credibilidade a pessoa colectiva, sendo que tais afirmações não são verdadeiras e mais não fazem do que por em causa 30 anos de trabalho demonstrado pela Recorrente na área da formação profissional.

    E-Motivo pelo qual, inclusive a Lei da Imprensa, nos seus artigos 29." e 30.°, por referência aos princípios constitucionais como a liberdade de expressão, reconhece e prevê a responsabilidade civil e criminal pelos actos dos profissionais ligados à comunicação social nas suas diversas vestes e também a CRP que prevê o direito à Liberdade de Expressão no seu artigo 37.°, prevê o direito ao bom nome e reputação no seu artigo 26.° n.° 1. E deste modo não pode a Recorrente conformar-se com uma "explicação" restritiva de actos lícitos, pela liberdade de expressão, em detrimento de uma flagrante desresponsabilização.

    F-Perante estes factos o Tribunal a quo, sufragando a falta de coragem do Ministério Público em investigar e reconhecer a força da prova produzida, com o devido respeito, optou por uma decisão simplista e redutora dos factos, quando nesta fase processual se lhe impunha o conhecimento de indícios fortes e suficientes para indagar de uma possível condenação em sede de julgamento e não de uma real certeza de condenação e assim se escondeu atrás do comum fundamento da liberdade de expressão, que nos autos comprovadamente não é perante uma verdadeira liberdade de expressão que estamos, mas quanto muito uma "liberdade" permitida pelos Tribunais de "dizer mal por dizer" e assim apenas se espera deste Tribunal ad quem uma decisão de responsabilização.

    G-Nestes termos mal andou o Tribunal a quo, devendo a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que decida peja pronúncia dos Recorridos, pela prática do crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva, p. e p. nos termos do artigo 187.° do Código Penal, especialmente agravado pela alínea a) do n.° 1 e n.° 2 do artigo 183.° do Código Penal.

  2. O Ministério Público junto da 1." instância apresentou resposta em que sustenta o não provimento do recurso.

  3. Os arguidos CA... e JP... responderam ao recurso, concluindo (transcrição das conclusões): A-O Direito de Queixa da Recorrente encontra-se prescrito relativamente às publicações do aqui Recorrido JP..., no seu blogue, nos dias .../10/20..., .../10/20... e .../12/20...; B-Também o Procedimento Criminal se mostra já prescrito relativamente aos textos publicado pelo Recorrido JP..., no seu blogue pessoal, cm .../10/20... e .../10/20...; C-Os comentários e entrevista realizados pelos Recorridos foram-nos ao abrigo do seu direito de liberdade de expressão e informação, protegido constitucionalmente, devendo prevalecer sobre os bens jurídicos cuja violação penal vem invocada nos autos pela Recorrente; D-Não se mostram indiciados nos autos os elementos objetivos e subjetivos do tipo de crime p. e p. do art. 187.° do C.P., uma vez que os comentários e demais intervenções jornalísticas decorreram de notícias anteriores, não tendo os Recorridos razões para crer que os factos não eram verdadeiros e que, portanto, não poderiam com eles sustentar os respetivos exercícios do direito de liberdade de expressão e informação, não se mostrando, ainda, e em suma, indiciada nos autos a necessidade social imperiosa para restringir aquele direito dos Arguidos; E-O comportamento dos Arguidos em análise nos autos não ofenderam a credibilidade, prestígio e confiança da Recorrente, o que, a ter acontecido, sempre teria sido consequência das próprias notícias, e não dos comentários feitos sobre a Assistente e/ou, também, tendo por base os processos-crime instaurados contra a Recorrente; Nestes termos, e nos demais de direito que se mostrem aplicáveis ao caso, deve o presente Recurso ser julgado totalmente improcedente, por não provado, e, em consequência, deve ser integralmente mantida nos autos a proferida decisão instrutória de não pronúncia, por não merecer qualquer reparo e ter interpretado e aplicado corretamente a Lei aos Factos.

  4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pronunciando-se, a fls. 1111 e seguintes, no sentido do não provimento do recurso.

  5. Cumprido o disposto no artigo 417.°, n.°2, do C.P.P. e apresentada resposta ao parecer, foi efectuado exame preliminar, após o que, colhidos os vistos, foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.°3, do mesmo diploma.

    II-Fundamentação.

  6. Conforme jurisprudência constante e pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

    Assim, a questão a decidir é a da suficiência e/ou insuficiência da prova indiciária para sujeição (ou não) dos arguidos a julgamento.

    Como questões prévias colocam-se a invocada prescrição do procedimento e a caducidade do direito de queixa.

  7. O despacho recorrido.

    O despacho recorrido tem o seguinte teor (transcrição): Decisão Instrutória.

    Nos presentes autos e na sequência da denúncia apresentada pela Assistente Massa Insolvente da Sociedade T...-F... e C..., SA, o Ministério Público procedeu a inquérito, tendo no fim deste pelo Assistente sido deduzida acusação particular, contra os arguidos S...-Sociedade J...(Expresso) (I...P..., SA), CA..., identificada a fls. 906 dos autos, LM..., identificado a fls. 866 dos autos e JP..., identificado a fls. 898 dos autos, imputando-lhes a prática de um crime p. e p. pelo artº 187º e 183º nº2 do Cod. Penal.

    O Ministério Público, conforme consta, do despacho que faz fls. 796 a 805 dos autos não acompanhou a acusação particular deduzida pela Assistente.

    Os arguidos por discordarem da acusação particular deduzida nos autos, vieram requerer a abertura da instrução, nos termos do artº 287º do CPP, pelos motivos que constam dos respetivos requerimentos de abertura da instrução que fazem fls. 845 e seguintes, 889 e seguintes e 915 e seguintes, os quais aqui se dão por integralmente reproduzidos pedindo que seja proferido despacho de não pronuncia, porquanto inexiste a prática de qualquer ilícito por parte dos arguidos e arguindo a nulidade do inquérito por insuficiência deste, porquanto os arguidos não foram no decurso do inquérito constituídos e interrogados como tal.

    * Foram juntos documentos.

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