Acórdão nº 12515/14.9T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelONDINA CARMO ALVES
Data da Resolução24 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.

RELATÓRIO: MARIA …….

, residente em ….. Lisboa, intentou, em 08.12.2014, contra CONTROL …..

., com sede na ….. em Lisboa e, SIC.

, com sede na ……, acção declarativa, sob a forma comum, através da qual pede a condenação solidária das rés a pagar à autora a quantia de 150.000€, a título de danos morais.

Fundamentou a autora, no essencial, esta sua pretensão da forma seguinte: 1.

As rés, na qualidade de entidades que detém órgãos de comunicação social, divulgaram a imagem/fotografia da autora com a identificação de uma outra pessoa ligada ao processo designado de “vistos gold”; 2.

Por esse facto ficou a autora associada a uma investigação criminal de corrupção, violando, assim, a imagem e bom nome da autora; 3.

Tal violação da imagem e bom nome da autora, provocou-lhe angústia, medo, insónias, bem como a afectou na sua vivência a nível profissional e pessoal.

Citadas, as 1ª e 2ª rés apresentaram contestações, em 11.02.2015 e 09.02.2015, respectivamente.

A 1ª ré invocou, em suma, que não é nem proprietária, nem responsável pelo JN, nem de qualquer publicação periódica, impugnando ainda que a utilização da fotografia da autora tenha determinado que a mesma haja sido conotada como corrupta, pelo que conclui pela improcedência da acção.

A 2ª ré, excepcionou a ineptidão da petição inicial, visto inexistir qualquer fundamento para a solidariedade indemnizatória peticionada pela autora, pois as rés são pessoas colectivas distintas e com trabalhos jornalísticos também distintos.

Mais alegou a 2ª ré, que a autora não alega factos de onde resulte a ilicitude da actuação da ré, nem a ré por si só produz qualquer peça jornalística, competindo esta à direcção jornalística e editorial, além de que a ré utilizou uma imagem difundida pelo JN, fonte jornalística de relevo.

Invocou ainda que logo que a autora contactou a ré a peça jornalística foi retirada e não mais foi transmitida.

Alegou, finalmente, que a autora não concretiza os danos, nem o nexo causal, pois refere incómodos quando a imagem da autora apenas aparece durante 17 segundos, divididos entre dois momentos temporais distintos, concluindo, assim, pela improcedência da acção.

Notificada, a autora respondeu, em 24.02.2015, às excepções invocadas pelas rés e requereu a intervenção principal provocada de G… Publicações, proprietária do jornal “JN”.

As rés deduziram oposição à requerida intervenção, tendo a mesma sido indeferida, por despacho de 30.03.2015.

Na audiência prévia levada a efeito em 01.10.2015, foi proferido o despacho saneador, julgando improcedentes as excepções invocadas. Foi identificado o objecto do litígio e enunciados os Temas da Prova, tendo as partes declarado que nenhuma reclamação tinham a fazer.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, em 08.03.2016, o Tribunal a quo proferiu decisão, em 20.04.2016, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte: Por tudo o exposto, decido: a) Absolver a 1ª ré do pedido formulado pela autora; b) Condenar a 2ª ré a pagar à autora o valor de 5.000€ a título de danos morais acrescido de juros de mora devidos desde a citação.

Custas pela autora e ré na proporção do decaimento.

Notifique e registe Inconformadas com o assim decidido, quer a autora, quer a 2ª ré, interpuseram recurso de apelação, em 24.04.2016 e 27.05.2016, relativamente à sentença prolatada.

São as seguintes as CONCLUSÕES da autora/recorrente: i.

Como escreveu Agustina Bessa Luís: “A leitura responsabiliza muito menos que a palestra; e esta menos do que a imagem. Na imagem aparece a lógica do conteúdo com mais intensidade.” ii.

No caso Sub Júdice o que está em causa é a violação por parte da Recorrida SIC de dois direitos fundamentais da Recorrente: - Violação do seu Direito à imagem; - Violação da sua honra e do seu bom nome; iii.

O nome e a fotografia da Recorrente foi utilizada pela Recorrida em vários espaços noticiosos, associada a um processo de corrupção, o denominado processo dos “Vistos Gold” sem que esta tivesse qualquer relação direta ou indireta com tal processo; iv.

O Tribunal “a quo” deveria ter dado como provados os seguintes factos: 3.Que com a inclusão da imagem da A. às notícias apresentadas pelas Rés ficou esta associada a um processo de corrupção (provando-se apenas o que consta do pontos relativos à utilização da imagem em concreto); 4.Que a A. em consequência da utilização da sua fotografia, para a opinião pública em geral, ficou conotada como corrupta (provando-se apenas o que consta do pontos relativos à utilização da imagem em concreto); 5.Que com o modo e forma como a imagem da A. foi apresentado pretenderam as Rés transmitir a ideia, o que conseguiram, que a A. pertencia a uma rede de corrupção tendo por objecto a emissão de vistos; 6.Que devido à conduta das Rés, viu-se colocada num processo em que foi vista como corrupta; 10.Que tenha existido um sentimento de revolta e desprezo em relação à A.

v.

Tais factos para além de resultarem do senso comum, resultam, ainda, da própria peça jornalística em causa, bem como dos documentos juntos com a Petição inicial como docs. 4, 5 e 6; vi.

Os comentários publicados nas redes sociais são sintomáticos da revolta e desprezo em relação à Recorrente: -"Adeus.... menos uma corrupta...." • "ambientou-se bem" • "Ficamos a aguardar qual o emprego a seguir." • "Ooooo, lá foi mais uma corrupta PSD/CDS à vida para outro cargo dourado em breve, depois do buzz baixar ... " -"Vai um corrupto vem logo dois ou mais..." • "Os ratos começam abandonar o barco...Basta começar a entrar água." • "E menos uma chula a mamar" • "Esta vai mas com os bolsos cheios. E os Chineses pagam bem." vii.

O Tribunal “a quo” deveria igualmente ter dado como provados os pontos 3, 4, 5, 6 e 10 da matéria de facto dada como não provada os quais devem ser aditados à matéria de facto dada como provada; viii.

Com base na prova documental junta na audiência prévia em 01/10/2015, documentos identificados com os números 15 a 18, não impugnados pela Recorrida, era possível, ainda retirar os seguintes elementos: -No dia 17/11/2014 o Primeiro Jornal da SIC teve uma audiência de 532.000 (quinhentos e Trinta e Dois Mil) espectadores; -No dia 17/11/2014 o Jornal da Noite da Sic teve uma audiência de 1.178.000 (Um milhão Cento e Setenta e oito Mil) Espectadores; ix.

Tais factos são, a nosso ver, importantes para se perceber a dimensão da violação dos direitos da recorrida.

x.

Assim, com base nos documentos apresentados pela Recorrente deveria, ainda o tribunal “a quo” ter dado como provado que: -No dia 17/11/2014 o Primeiro Jornal da SIC teve uma audiência de 532.000 (quinhentos e Trinta e Dois Mil) espectadores; -No dia 17/11/2014 o Jornal da Noite da Sic teve uma audiência de 1.178.000 (Um milhão Cento e Setenta e oito Mil) espectadores; xi.

Sempre com o devido respeito que o Tribunal “a quo” nos merece, que é muito, a indemnização arbitrada pelo Tribunal “a quo” é manifestamente desajustada e desproporcional à gravidade da conduta da Recorrida; xii.

O tribunal “a quo” com o devido respeito não teve em consideração que a peça jornalística da Recorrida passou na televisão, pelo menos, 7 (sete) vezes xiii.

E que: 29.A exibição da fotografia da A. juntamente com os demais referidos tem a duração de cerca de 17 segundos na notícia televisiva em causa; xiv.

Ou seja, tempo mais do que suficiente para que os telespectadores observassem bem a imagem da Recorrente, sendo certo que, a Recorrida só colocou cobro a esta situação após a própria Recorrente a ter alertado para isso… xv.

A Recorrida não tinha sequer autorização da Recorrente para utilizar a sua imagem fosse em que peça jornalística fosse; xvi.

A reportagem em causa passou em vários espaços informativos e foi vista por milhões de telespectadores; xvii.

Por outro lado, o tribunal “a quo” não teve em atenção a concreta atividade profissional da Recorrente, e a especial sensibilidade da mesma, e os efeitos nefastos que tal “peça jornalística” provocou; xviii.

A Recorrente é uma conceituada funcionária e representante da OIT, participando em inúmeras conferências e dando a cara pela Organização; xix.

“A OIT desenvolve o seu trabalho no âmbito da redução da pobreza, de uma globalização justa e na melhoria das oportunidades para que mulheres e homens possam ter acesso a trabalho digno e produtivo em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humana.” www.ilo.org xx.

Toda a actividade profissional da A. tem como objecto a representação em questões que se prendem com a igualdade e a transparência, tudo situações opostas aquilo em que a mesma foi envolvida “Corrupção no seio da Administração Pública”; xxi.

No caso Sub Judice existiram milhares de pessoas que, obviamente, sem o expressarem directamente interiorizaram as reportagens colocadas no ar pela Recorrida formando sobre esta a sua própria opinião de corrupta; xxii.

“A indemnização reveste, no caso dos danos não patrimoniais, uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar; no plano civílistico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente.” (Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral, Vol.I, pág. 607, 608) xxiii.

No caso Sub Judice, a Recorrida não ignora, nem pode ignorar que as peças jornalísticas que transmite nos seus canais televisivos têm enorme impacto social; A Recorrida não ignora, nem pode ignorar, que as peças jornalísticas que transmite nos seus canais televisivos são visualizadas por milhões de pessoas em todo o mundo; xxiv.

Em situações idênticas às dos presentes autos, obviamente com as devidas proporções, o Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se nos seguintes termos: § Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 1410/05- 6ª Secção, de 24/05/2005, em que foi relator o Conselheiro Salreta Pereira: (…) § Acórdão proferido no âmbito do...

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