Acórdão nº 2464-16.1T8PDL.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução24 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

1.

Relatório: A, residente em Ponta Delgada, intentou acção com processo especial contra B, Sociedade Unipessoal, Lda., com sede em Ponta Delgada, requerendo a declaração de insolvência desta última.

Alegou, para tanto e em síntese, que : -Sendo gerente remunerado da requerida, a verdade é que há muito que a sociedade demandada – por falta de liquidez – não lhe paga qualquer remuneração, devendo-lhe já a quantia total de €18.745,95 de remunerações vencidas e não pagas; -Acresce que, porque a requerida tem vindo a desenvolver uma trajectória financeira deficitária, com decréscimo contínuo da facturação , é o próprio requerente que tem pago do seu próprio bolso as contas da sociedade, sendo o requerente já credor de quantia que calcula em €115.848,82; -De resto, credores da sociedade requerida são também os seus ex-funcionários, além de alguns fornecedores; -Não gerando a requerida receitas suficientes para as responsabilidades que tem, a continuação da sua actividade é de todo inviável, razão porque deve ser decretada a sua insolvência.

1.1. - Conclusos os autos para apreciação liminar ( cfr. artº 27º, do Cire ), foi então proferido despacho de indeferimento, sendo o respectivo teor o seguinte : “(…) No plano do processo de insolvência a legitimidade a que a lei se refere é, nitidamente, não a legitimidade substantiva - mas a legitimidade processual, ad causam (artigo 20.°, n.° 1 do CIRE).

Portanto, essa legitimidade é aferida nos termos gerais (artigo 17.° do CIRE).

Retornando ao caso concreto, resulta que o requerente da insolvência, não obstante ser o único sócio da sociedade comercial requerida e a alegação de que é credor da mesma, a verdade é que, embora integre a classe dos credores a que alude o artigo 20.°, n.° 1 do CIRE, assume uma concreta específica qualidade - sócio único da aqui requerida - que nos leva a tratá-lo de maneira diferenciada em relação aos demais credores ( é a diferença específica, differentia specifica ).

Caso contrário, não haveria diferenciação das espécies do mesmo género: não haveria especificação, não haveria especificidades.

Claro que, em termos epistemológicos, a generalidade/especialidade tanto se pode referir a seres, ou entes, como pode referir-se a casos previstos, ou outras realidades. Dentro do género credores, pode haver especificação, designadamente conforme a qualidade do sujeito ( imaginemos: credor sócio ou não sócio) ou conforme a fonte ou a natureza do crédito respectivo (v.g. crédito por mútuo, crédito por locação, crédito por suprimento, etc....): nessa configuração, teríamos várias espécies dentro do mesmo género. Evidentemente, a consideração de espécies dentro do género só tem relevância no campo do direito se este associar à especificação alguma diferenciação jurídica, como no caso em apreço onde o ente colectivo não pode agir por si só, mas perante a acção do particular, o que se agudiza, exponencialmente, no caso de estarmos perante sociedades unipessoais por quotas ( como acontece no caso em apreço, que se encontram previstas no artigo 270.°-A e segs. do CSC).

Assim, não tem legitimidade para requerer a declaração de insolvência o concreto requerente, sendo certo que deverá, querendo, lançar mão da apresentação da sociedade requerida à insolvência, ao abrigo do disposto no artigo 18.° e segs. do CIRE.

Aqui chegados, importa esclarecer o que consiste o pressuposto processual legitimidade das partes.

A legitimidade é, no campo do direito material, um conceito de relação - relação entre o sujeito e o objecto do acto jurídico. Encarada essa relação na perspectiva do sujeito, exprime a posição pessoal deste nessa relação, justificativa de que se ocupe juridicamente do objecto [ Castro Mendes, apud José Lebre de Freitas - Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, Vol. I, 1999, p. 50 ].

A legitimidade processual não é o mesmo que legitimidade substantiva, dando, de facto, aquela falta lugar à absolvição da instância e esta à absolvição do pedido. Consequentemente, facilmente se conclui que o requerente é parte ilegítima, ilegitimidade que é de conhecimento oficioso e determina a absolvição da requerida da instância [ cfr. artigos 577.°, alínea e), 578.° e 278.°, n.° 1, alínea d), todos do C.P.Civil ].

Pelo exposto, sem necessidade de maiores considerandos e face aos fundamentos supra explanados, julgo verificada a excepção de ilegitimidade do requerente e, em consequência, indefiro liminarmente a petição apresentada.

Custas a cargo do requerente [artigo 7.°, n.° 1 do RCP].

Registe e notifique.”.

1.2.-Discordando da decisão referida em 1.1, e inconformado, da mesma apelou então o requerente A, formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões: 1-O Tribunal a quo por douta decisão decidiu verificada a excepção de ilegitimidade do requerente e, em consequência, indeferiu liminarmente a petição apresentada: 2-fundamentando que, embora integre a classe dos credores a que alude o artigo 20.°, n.° 1 do CIRE , assume uma concreta específica qualidade - sócio único da aqui requerida - que nos leva a tratá-lo de maneira diferenciada em relação aos demais credores.

3-a lei é clara no seu artigo 20 do CIRE ao legitimar para requerer a declaração de insolvência e citamos "por qualquer credor" 4-são pessoas distintas o requerente A, contribuinte n.° 229517692.

5-e a pessoa colectiva, sociedade comercial requerida insolvente B - Restauração Sociedade Unipessoal Lda, NIPC...

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