Acórdão nº 497/12.6TBMLD.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução24 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

RELATÓRIO: Em 22.10.2012 Herculano intentou no Tribunal Judicial de Mealhada ação declarativa de condenação com processo sumário contra 1) Herança Indivisa aberta por óbito de Carlos, representada pela cabeça de casal Emília e demais herdeiros e 2) Carlos Soares e mulher Maria João.

O A. alegou que na sequência de um acidente de viação ocorrido em 01.01.1999 na Mealhada, em que foi interveniente o veículo automóvel de matrícula FJ e uma outra viatura, o ora A., no exercício da sua atividade de pronto-socorro, com veículo de reboque de viaturas sinistradas ou avariadas, por indicação da GNR da Mealhada, autoridade chamada ao local, procedeu ao reboque e recolha das viaturas sinistradas nas suas instalações. Na ocasião do sinistro o veículo de matrícula FJ era conduzido pelo ora 2.º R., sendo certo que o veículo pertencia a Carlos, o de cujus cuja herança é ora demandada. Sucede que o proprietário da outra viatura em devido tempo pagou ao ora A. a quantia devida pelo depósito da mesma. Porém, o mesmo não sucedeu em relação ao FJ, pelo que o A. emitiu e enviou ao 2.º R. uma fatura, datada de 05.10.2001, com o valor global de € 2 993,25, respeitante ao serviço de reboque e ao depósito da viatura FJ desde 01.01.1999 a 05.10.2001. Ora, a verdade é que nada foi pago ao A., assim como a viatura em causa, que ficou totalmente destruída, continua nas instalações do A., e isto apesar de em 2010, no âmbito de processo judicial instaurado em 2001 por causa do sinistro supra referido, os interessados terem chegado a acordo, imputando 50% de responsabilidade do sinistro a cada um dos intervenientes, e o 2.º R. tenha recebido a respetiva indemnização.

O A. terminou formulando o seguinte petitório: “a)Serem os RR. (2.ºs RR. e herdeiros da 1.ª R.) condenados solidariamente a pagar ao A. a quantia de 15.356,86 €, acrescida de 5 € diários de parqueamento e juros de mora vincendos contados à taxa legal desde a data de citação, até efetivo e integral pagamento, b)ou, quando assim se não entenda, e a título subsidiário, a entregar ao A. a mesma quantia de 15.356,86 €, a título de enriquecimento sem causa, acrescida de juros de mora vincendos contados à taxa legal desde a data de citação, até efetivo e integral pagamento; c)Em caso de incumprimento da al. c), ou da sentença condenatória, serem os RR. condenados solidariamente numa sanção pecuniária compulsória a favor do A. no valor diário de 10,00€, até efectiva entrega da documentação, nos termos do disposto no artigo 829.º-A n.º 1 do Código Civil”.

Citada, a R. Emília contestou, arguindo a exceção da prescrição do direito reclamado, seja a título de indemnização por responsabilidade civil extracontratual, seja a título de enriquecimento sem causa. Mais arguiu a incompetência do tribunal em razão do território e a ilegitimidade passiva decorrente de preterição de litisconsórcio necessário, por não ter sido demandada a sociedade que, nos termos do registo automóvel, detém reserva de propriedade sobre o veículo referido. Por impugnação negou os factos alegados pelo A., em particular no tocante ao reboque e depósito da viatura, com base no seu desconhecimento. Concluiu pela sua absolvição do pedido, se não da instância.

Os 2.ºs RR.

Carlos Soares e Maria João também contestaram, tendo arguido a ilegitimidade do 2.º R., por um lado por estar desacompanhado dos restantes herdeiros da herança demandada e por outro lado por nada ter a ver com o veículo sinistrado, sendo certo que a indemnização que recebeu em relação ao sinistro respeitou aos danos pessoais sofridos, o mesmo ocorrendo em relação à 2.ª R., que é também parte ilegítima. Negaram a existência de qualquer contrato de depósito celebrado com o A., assim como a existência de responsabilidade civil extracontratual ou enriquecimento sem causa, cuja prescrição também arguiram.

Concluíram pela sua absolvição do pedido ou, se assim não se entendesse, da instância.

Em resposta, o A.

pugnou pela improcedência das exceções arguidas, chamou à ação os demais herdeiros, que os 2.ºs RR. haviam identificado na contestação e retificou o pedido formulado sob a alínea c), que assim formulou: “c) Serem os RR condenados a ver declarada a cessação da obrigação de depositário do A., face ao incumprimento no pagamento por parte dos RR., e a verem fixado um prazo razoável de 30 dias, contados da data de citação, para que os RR. diligenciem no sentido de se deslocarem às instalações do A., e na presença deste e com a devida assinatura de documento de retirada de veículo, promoverem a saída da viatura 64-22-FJ dessas instalações, sob cominação de não o fazendo nesse prazo, poder livremente o A. rebocar o veículo FJ para qualquer das moradas dos RR., deixando-o junto às mesmas (sendo da responsabilidade dos RR. quaisquer procedimentos contra-ordenacionais previstos no Cód. Estrada para as viaturas abandonadas ou sinistradas na via pública).

” Em 19.6.2013 foi admitida a intervenção principal provocada de Mário e Anabela os quais, citados, nada disseram.

Em 10.3.2014 foi proferido despacho em que se julgou o Tribunal Judicial de Mealhada incompetente quanto ao território e se determinou a remessa do processo para o Tribunal Judicial da comarca de Sintra.

Em 11.12.2015, já perante o Juiz 5 da Secção Cível, Instância Local de Sintra, Comarca de Lisboa Oeste, realizou-se audiência prévia, na qual se admitiu a alteração do pedido formulado sob a alínea c), julgaram-se improcedentes as exceções dilatórias de ilegitimidade processual passiva dos RR. e bem assim a preterição de litisconsórcio necessário por falta de intervenção da sociedade alegadamente titular de reserva de propriedade sobre a viatura objeto dos autos e relegou-se para final a apreciação das exceções de prescrição. Mais se indicou o objeto do litígio e se enunciou os temas da prova.

Realizou-se audiência final e em 29.3.2016 foi proferida sentença, em que se julgou a ação improcedente, por não provada, e se absolveu os RR. dos pedidos formulados.

O A. apelou da sentença, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões: 1)Em 01/01/1999 ocorreu um acidente de viação no lugar de Carqueijo, Mealhada, no qual foi interveniente, entre outro, o veículo de matrícula FJ.

2)Esse veículo FJ era à data conduzido por Carlos Soares, coR./ recorrido, tendo este e outra ficado feridos na sequência do acidente, e sido transportados aos Hospitais da Universidade de Coimbra.

3)O veículo FJ ficou impossibilitado de se deslocar pelos seus próprios meios, não tendo condutor removido o veículo da via pública.

4)A Guarda Nacional Republicana da Mealhada contactou o autor para que recolhesse aquela viatura com o seu reboque.

5)O autor procedeu à recolha daquele veículo nas suas instalações.

6)O coR./recorrido Carlos Soares acordou com Companhia de Seguros Allianz, S.A., no processo n.º 893/2001, que correu termos no Tribunal Judicial de Anadia, no pagamento por esta da quantia de 55.000€.

7)O autor emitiu a fatura n.º 1217, datada de 05/10/2001, em nome do coR. Carlos Soares, com a quantia de 2.993,25€.

8)O veículo automóvel FJ está registado em nome de Carlos, com reserva de propriedade a favor de (…), S.A..

9)Um profissional da área de atividade de reboques carece de espaço para colocar as viaturas sinistradas e, por consequência, a ocupação, por anos, de um qualquer veículo, tem prejuízos.

10)A omissão do legislador não pode significar que profissionais como o recorrente tenham que ficar prejudicados pelas condutas omissivas e de desleixo dos condutores das viaturas e dos seus proprietários.

11)Face à peritagem à viatura 6422FJ pela Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A., é de total incredibilidade que os RR. não soubessem onde se encontrava a viatura FJ, porque o desacordo do valor indemnizatório é que causou a instauração pelo coR. Carlos Soares do processo judicial.

12)As normas impõem o desimpedimento das vias públicas de circulação automóvel (exemplificativamente, os arts. 50.º, n.º 1, al. a), 87.º, n.º 1, 164.º do Cód. Estrada ), demonstrando que o recorrente só poderia ter acatado a indicação da GNR e recolhido a viatura sinistrada no seu parque privado de recolha, 13)existindo a obrigação de quem conduz um veículo, alvo de sinistro, de procurar o contacto do recorrente, para efeitos de pagamento das despesas devidas pela remoção e recolha da viatura, e levantamento da viatura para outro local.

14)O “condutor deve proceder imediatamente ao seu regular estacionamento ou, não sendo isso viável, retirar o veículo da faixa de rodagem ou aproximá-lo o mais possível do limite direito desta e promover a sua rápida remoção da via pública” (art. 50.º, n.º 1 Cód. Estrada) – o que o coR./recorrido não fez.

15)Não pode ser julgada contra o aqui recorrente a omissão legislativa, mas sim contra os infratores: os quais...

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