Acórdão nº 5356/12.0TBVFX-B.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução07 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa ( 7ª Secção ).

I – RELATÓRIO.

Apresentaram José e Teresa requerimento executivo, entrado em juízo em 15 de Outubro de 2012, contra José Silva, Mariana e Carlos .

Essencialmente alegaram: São senhorios do imóvel que identificam, tendo celebrado sobre o mesmo, em 19 de Novembro de 1997, contrato de arrendamento com o executado Carlos Alberto Gonçalves Barbosa.

Os executados José Silva e Mariana constituíram-se fiadores e principais pagadores pelas obrigações decorrentes desse contrato de arrendamento.

O arrendatário deixou de pagar as competentes rendas a que estava obrigado, desde as que se venciam no mês de Julho de 2004.

Perante tal situação de incumprimento, os exequentes notificaram/comunicaram aos executados, em 23 de Abril de 2008, 30 de Abril de 2008 e 10 de Maio de 2008, as rendas em atraso àquela data, nos termos e para os efeitos da conjunção do disposto no nº 3 do artigo 1083º, nº 1 e 3 do artigo 1041, ambos do Código Civil, e nº 7 do artigo 9º da Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro.

Os executados não procederam ao pagamento das identificadas rendas, ainda em dívida.

A comunicação junta aos autos é título executivo bastante, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 15º da Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro.

Em 21 de Janeiro de 2014, foi proferido o seguinte despacho: “Inexistindo fundamento para indeferir liminarmente o requerimento executivo determina-se a citação dos executados para, no prazo de 20 dias, virem pagar ou oporem-se à execução (artigo 812º-E, nº 5 do Código de Processo Civil.” (cfr. fls. 51).

Foi proferido o seguinte despacho, datado de 4 de Novembro de 2015: “Da análise dos autos resulta estarmos perante acção executiva para pagamento de quantia certa, proposta contra arrendatário e fiadores com base em contrato de arrendamento e notificação judicial avulsa efectuada aos executados, comunicando-lhes o valor das rendas vencidas e não pagas.

Como é sabido, nos termos do artigo 14º-A do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU/2012), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, com a alterações da Lei nº 31/2012, de 14 de agosto, "o contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é titulo executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargo ou às despesas que corram por conta do arrendatário”.

Antes destas alterações, o NRAU regulava a matéria em causa no artigo 15.°, nº 2, invocado no requerimento executivo, que dispunha o seguinte: “0 contrato de arrendamento é título executivo para a acção de pagamento de renda quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em divida".

Estamos, portanto, à luz de qualquer uma das citadas previsões legais, perante um título executivo complexo cuja possibilidade de formação passou, com NRAU/2012, a ser maior: também constitui título executivo o conjunto formado pelo contrato de arrendamento e pelo comprovativo da comunicação ao arrendatário quando referido a renda, a encargos e a despesas que corram por conta do arrendatário.

Pois bem, a extensão da força executiva dos referidos documentos tem vindo a ser objecto de discussão na doutrina e na jurisprudência, questionando-se se inclui ou não o fiador. Entre os que respondem afirmativamente, discute-se ainda se para haver título contra o fiador é necessário comprovativo da comunicação ao próprio ou basta a comunicação ao arrendatário, havendo partidários de ambas as soluções.

Ora, na nossa opinião, e salvo o devido respeito por entendimento contrário, a razão está do lado dos defensores da inexistência de título executivo contra o fiador, ainda que seja comprovada a comunicação ao mesmo do montante em dívida, como sucede, aliás, no caso vertente.

Neste sentido se pronunciaram, na doutrina, Rui Pinto Duarte (Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, 2013, pp. 1164 e 1165) Fernando de Gravato Morais (Cadernos de Direito Privado, n.º 27, p. 57 e segs; Falta de Pagamento da Renda no Arrendamento Urbano, p. 76 e segs.) e Miguel Teixeira de Sousa (Leis do Arrendamento Urbano Anotadas, Almedina, 2014, p. 406), e, na jurisprudência, entre outros, os Acs. da RP de 24 de Abril de 2014, proc. 869/l3.9YYPRT.PI, com um voto de vencido, e da RL de 18 de Setembro de 2014. proc. 6126/12.0TCLRS.L1-2, www.dgsi.pt.

Rui Pinto Duarte apresenta os seguintes argumentos: a norma (atual artigo 14.

0-A do NRAU/2012) não prevê a formação de título executivo contra o fiador e por força do princípio da taxatividade dos títulos executivos e da natureza restritiva das normas que os preveem não é possível fazer interpretações extensivas do preceito; a alteração do RAU pela Lei n° 31/2012 deixou intocado o texto quando a questão já se discutia, num sinal de que o legislador não pretendeu tornar claro que o fiador também pode ser executado; o Decreto-Lei n° 1/2013, de 7 de Janeiro, denuncia essa intenção legislativa ao consagrar expressamente que só o arrendatário pode ser objecto do procedimento especial de despejo quando nele está compreendido a execução das rendas em dívida.

Fernando de Gravato de Morais, por seu turno, defende que não se forma título executivo contra o fiador com o fundamento essencial de que não sendo a norma clara no sentido de incluir o fiador e havendo elementos literais que indiciam que o quis excluir, uma vez que o fiador se encontra numa posição mais débil, não lhe deve corresponder um regime mais agravado do ponto de vista processual, como sucede se inclusivamente se prescindir da notificação.

Segundo Miguel Teixeira de Sousa, o preceito (artigo 14.

o-A do NRAU/201~) apenas admite que a comunicação seja realizada ao arrendatário, certamente porque emente esta parte está em condições de controlar a veracidade do seu conteúdo e de deduzir alguma eventual oposição. Por isso, o título executivo só se pode formar contra o próprio arrendatário, o que significa que o mesmo não se estende ao fiador que seja responsável pelo pagamento das rendas em dívida.

Assi, tendo presente estes ensinamentos, que julgamos corresponderem à melhor interpretação do conjunto de dados normativos do nosso sistema jurídico, impõe-se concluir que os artigos 15º, nº 2 e 14º-A supra citados, não prevêem a possibilidade de formação de título executivo contra o fiador do arrendatário.

Vale isto dizer que, no nosso caso, não existe título executivo contra os executados Florentino José da Silva Mendes Delfino e Mariana Henriques Nogueira Delfino, o que conduz à rejeição, quanto aos mesmos, da presente execução, com a sua consequente extinção, nos termos do artigo 734.° do CPC.

De salientar que o despacho liminar anteriormente proferido nos autos, que considerou inexistir fundamento de indeferimento liminar do requerimento executivo, não obsta à extinção da execução nos termos referidos, uma vez que não faz caso julgado formal, tratando-se de despacho meramente tabelar ou tarifado – artigo 595º, nº 3, a contrario, do CPC, aplicável analogicamente.

Decisão: pelo exposto, rejeita-se a execução e, em consequência, declara-se a sua extinção, no que concerne aos executados Florentino José Silva Mendes Delfina e Mariana Henriques Nogueira Delfino”.

Apresentaram os exequentes recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação (cfr. fls. 363).

Juntas as competentes alegações, a fls. 324 a 336, formularam os apelantes as seguintes conclusões: i) Questão Prévia: A execução, na qual se recorre, não foi inicialmente rejeitada, tendo sido somente rejeitada decorrido que foram já diligências de penhora, o que não deixa...

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