Acórdão nº 647/11.0TBVPV.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelONDINA CARMO ALVES
Data da Resolução20 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.-RELATÓRIO: FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, integrado no Instituto de Seguros de Portugal, com sede ……, intentou, em 24.11.2011, contra COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., com sede …… e, subsidiariamente, contra FILIPE ….., residente na ……., acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, através da qual pediu que: 1. O condutor do veículo …BF seja considerado único e exclusivo culpado pela produção do acidente aqui em crise, e, consequentemente, 2.

A Ré, COMPANHIA DE SEGUROS, seja condenada no pagamento da quantia de € 122.767,47, acrescida dos juros legais, vencidos e vincendos, contados desde a interpelação até efectivo e integral pagamento e incrementados em 25%, e ainda ao pagamento das despesas que o ora Autor vier a suportar com a cobrança do reembolso que serão oportunamente liquidadas em ampliação do pedido ou em execução de sentença, bem como em custas e procuradoria; 3.

Subsidiariamente, para o caso de se provar que o veículo BF circulava sem beneficiar de seguro automóvel válido e eficaz à data dos factos, ser o Réu subsidiário condenado nos precisos termos requeridos em 2.

Fundamentou o autor a sua pretensão, no essencial, da seguinte forma: 1.

No dia 3 de Agosto de 2006, ocorreu um acidente de viação; 2.

O segundo Réu conduzia um Opel, com a matrícula BF; 3.

O Réu conduzia o BF acompanhado de Miguel …., que seguia ao seu lado; 4.

No caminho até ao destino, o Réu passou pela freguesia de …. para dar boleia a Susana ….. e Sonia….., conforme haviam combinado; 5.

Susana ….. e Sonia …entraram no BF para o banco traseiro; 6.

Após a entrada daquelas, o segundo Réu mandou-as “apertar as fraldas”, acrescentando que tinha acabado de andar num carro de rally e informando que iriam circular a uma velocidade elevada; 7.

O segundo Réu arrancou, e seguiu a uma velocidade nunca inferior a 120 km/h; 8.

Ao descrever uma curva, o segundo Réu perdeu o controlo do BF, entrou em despiste, acabando por embater num muro ali existente; 9.

A colisão ficou a dever-se única e exclusivamente ao comportamento culposo do ora segundo Réu que, não obedecendo às mais elementares regras de circulação rodoviária, nomeadamente ao circular com velocidade excessiva, praticou uma conduta imprudente e irresponsável, provocando o acidente; 10.

O segundo Réu iniciou a condução com intentos perigosos, dizendo às passageiras que apertassem as fraldas e fazendo referência ao carro de rally em que havia circulado recentemente, donde se retira que o segundo Réu podia perfeitamente prever o que viria a acontecer e conformou-se com a situação, que não o demoveu, violando, assim, entre outros, o disposto nos artigos 18.º e 24.º do Código da Estrada; 11.

O risco emergente da circulação do BF encontrava-se, à data do acidente, transferido para a primeira Ré, mediante um contrato de seguro titulado pela apólice n.º 003797148; 12.

Contactada a seguradora referida, a mesma disse que o veículo BF não estava coberto, naquela data, uma vez que a referida apólice seria nula em virtude de terem sido prestadas declarações inexactas por parte do tomador; 13.

Está criada uma situação em que há fundadas dúvidas sobre o verdadeiro titular do dever de indemnizar, já que, a provar-se a existência de seguro válido à data dos factos, é a seguradora parte legítima no presente pleito, ou, caso contrário, será o Réu subsidiário parte legítima no presente dissídio.

14.

Como causa directa e necessária do referido embate, resultou a morte de Miguel ….., de 20 anos e de Susana …., de 16 anos e ferimentos graves sofridos por Sonia …., com 18 anos à data do acidente; 15.

Os referidos falecimentos implicaram sofrimentos inarráveis aos seus herdeiros e familiares mais próximos, sendo que a morte dos jovens não foi imediata, sofrendo ambos os jovens, nesse hiato de tempo que decorreu entre o acidente e a morte, dores incomensuráveis; 16.

Os falecidos deixaram como seus herdeiros os seus pais, …….

17.

Do acidente resultaram danos para a Sonia …… 18.

Instaurado o competente processo de averiguações, a que foi atribuído o n.º 72255, concluiu o Autor dever pagar, ao abrigo do artigo 50.º do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, as seguintes verbas: ……….

Para prevenir uma hipótese de ilegitimidade passiva, formulou o autor, o pedido, subsidiariamente, contra o Réu subsidiário, nos termos do disposto no artigo 31.º B do Código de Processo Civil, invocando que o réu subsidiário será sempre responsável ao abrigo do n.º 3 do artigo 25.º do Dec. Lei n.º 522/85 de 31 de Dezembro, entendimento legal que veio a ser acolhido no artigo 54.º, n.º 3 do novo diploma legal - Lei do Seguro Obrigatório - Dec. Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.

Concluiu o Autor que se encontra sub-rogado nos direitos dos lesados, nos termos do n.º 1, nº.3 e nº.4 do artigo 54.º do Dec. Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, sendo parte legítima nesta acção, assistindo-lhe o direito de exigir dos Réus a indemnização satisfeita, tendo ainda direito ao juro de mora legal e ao reembolso das despesas de liquidação e cobrança que houver feito.

Citados, apenas a ré seguradora apresentou contestação, em 27.01.2012, aceitando a responsabilidade e dinâmica do acidente, tal como alegado, impugnou os valores pagos, bem como a sua responsabilidade no seu pagamento, excepcionando a existência de um contrato de seguro inválido, que a desonera desse pagamento, tudo se passando como se não existisse seguro que cobrisse aquela situação.

Invocou, para tanto, que: 1.

O contrato de seguro invocado pelo autor na p.i. é nulo; 2.

Foi celebrado contrato de seguro, titulado pela apólice nº 003797148, com Manuel …., referente à viatura com a matrícula BF. Porém, 3.

O tomador de seguro em tal apólice não é o proprietário (e co-Réu), mas sim entidade empregadora, à data, do proprietário do veículo; 4.

No momento da celebração de tal contrato de seguro, a ora R. desconhecia que o tomador não era o proprietário do veículo, nem o seu condutor habitual ou eventual, apenas figurando tal tomador de seguro com vista à obtenção de contrato de seguro com prémio inferior; 5.

O co-réu proprietário do veículo, à data da celebração do contrato de seguro, tinha 20 anos, como tal, licença para condução de veículos automóveis há menos de 5 anos; 6.

Sabendo de tal, quer o co-réu enquanto proprietário, quer o tomador de seguro, acordaram entre si, celebrar contrato de seguro em nome deste último, com vista a beneficiar de prémio de seguro mais baixo; 7.

O contrato foi subscrito e assinado por Manuel …., mas quem utilizava a viatura, quem suportava os seus custos de manutenção era o co-réu; 8.

O tomador de seguro não possuía qualquer interesse na celebração do contrato de seguro, condição essencial para a celebração de um contrato de seguro, sendo o contrato de seguro é intuito personae, ou seja, é um contrato pessoal, dado que, o que se transfere para o segurador é a responsabilidade de alguém, enquanto detentor do veículo e não o próprio veículo, motivo pelo qual, os prémios de seguro sofrem agravamentos em função da pouca idade do condutor e da sua inexperiência; 9.

No contrato de seguro em apreço, o tomador de seguro não declarou que o mesmo era por conta de outrem, como estabelece o art.° 428° do Código Comercial, logo, considerou-se contratado por Manuel …., apesar de este não ser proprietário, condutor, usufrutuário, possuidor de tal veículo, tendo prestado falsas declarações unicamente com o intuito de obter benefício de prémio de seguro, pelo que este não transferiu para a R. qualquer risco, já que nunca lhe poderia ser assacada, qualquer responsabilidade por acidente, que seja emergente da circulação do referido veículo, pois ao contrato de seguro faltava o objecto: a transferência da responsabilidade pela condução do veículo em questão; 10.

As falsas declarações incidem sobre um elemento determinante na celebração do contrato: a definição/identificação do próprio outorgante do mesmo, que se fossem conhecidas do segurador, levariam a uma análise diferente do risco ou até à não celebração do contrato de seguro; 11.

Se a R. soubesse de tal, jamais teria celebrado contrato nas condições em que o fez, pois possui normas internas específicas no que respeita à aceitação de contratos de seguro, nomeadamente atendendo à idade e experiência do condutor; 12.

A R. apenas tomou conhecimento da actuação concertada por parte do tomador de seguro e do co-réu quando diligenciou as competentes e necessárias averiguações após o acidente de que tratam os autos, tendo, após tais informações, considerado o contrato nulo, por aplicação do art. 428º do Código Comercial; 13.

O contrato de seguro é nulo, constando tal nulidade do artigo 11º, nº 1 das Condições Gerais do Contrato de Seguro de Responsabilidade Civil Automóvel, onde se pode ler no art. 11º, nº 1.

Concluiu a ré, pedindo que seja julgado procedente a excepção invocada, decidindo-se pela sua absolvição do pedido.

Notificado, o Autor apresentou réplica, em 25.06.2012, pugnando pela improcedência da arguida excepção, defendendo que o contrato de seguro se encontrava válido e eficaz à data do sinistro, não podendo a ré seguradora furtar-se aos direitos e deveres a ele emergentes.

Concluiu, o autor, pedindo a condenação dos Réus nos termos constantes da petição inicial.

Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, em 11.03.2013, elaborada a condensação com a fixação dos Factos Assentes e a organização da Base Instrutória.

Em 15.03.2013, o autor deduziu ampliação do pedido, nos termos do n.° 2, do artigo 273.° do Código de Processo Civil, tendo por base os fundamentos seguintes: 1.

O Autor intentou a presente acção em 24 de Novembro de 2011.

2.

Com a propositura dessa acção o Autor pretende ser reembolsado dos prejuízos sofridos com a liquidação de indemnizações processadas aos identificados lesados, na sequência do acidente de viação ocorrido em 3 de Agosto de 2006; 3.

O Autor, nesse articulado, conclui...

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