Acórdão nº 13162/14.0T2SNT.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelRUI VOUGA
Data da Resolução19 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: O. – Elevadores, Lda.

(com sede em …, freguesia de …, …, Concelho de ….) instaurou contra Condomínio do Edifício nº 118, sito na Avenida .. B.., em São Marcos, uma acção declarativa de condenação com processo comum, peticionando a condenação do Réu no pagamento da quantia de €18.475,40, acrescida de juros vencidos, à taxa legal - que quantificou em € 668,43 até 04.07.2014 - e vincendos, até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que: -No âmbito da sua actividade de fornecimento, montagem e manutenção de elevadores, a Autora celebrou com o Réu, em 15.12.2009, um acordo escrito denominado “Contrato O. Controlo OC ”, nos termos do qual a Autora se obrigou a prestar ao Réu serviços de conservação, de reparação e de inspecção periódica; -Os serviços contratados tinham o valor mensal inicial de Esc. 90,00 (+IVA), o qual sofreu, entretanto, as actualizações anuais de preço contratadas entre as partes, tendo, à data do seu terminus, o valor de € 142,38 (com IVA incluído); -Ficou convencionado em tal contrato que: “Independentemente do direito à indemnização por mora, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do CLIENTE e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à O. por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado”.

-Face ao reiterado incumprimento por parte do R., no que concerne ao pagamento dos serviços prestados, foi celebrado entre as partes, em 11.12.2009, um acordo de pagamento relativamente ao montante que se encontrava em dívida até aquela data (€ 10.514,72), em 36 (trinta e seis) prestações mensais no valor € 292,07 cada, com início em 15.11.2009 e fim em 15.10.2012; -Não obstante o referido acordo, desde Janeiro de 2011, o R. foi acumulando dívida em sede de prestações do aludido acordo de pagamento, reparações e conservações, que até ao presente não pagou; -As facturas relativas aos serviços de conservação e reparação prestados pela Autora ao Réu totalizam 12.431,88 €; -Por carta de 04.11.2013, e porque a situação se mantinha, a A. solicitou ao R. que, no prazo de dez dias, lhe remetesse uma proposta para resolução do incumprimento, findo o qual procederia à resolução, com justa causa, do contrato dos autos; Regularmente citado, o Réu não contestou.

Nos termos do artigo 567º, nº 1, do actual Código de Processo Civil, foram declarados confessados os factos articulados pela Autora na sua petição inicial, tendo sido observado o disposto no nº 2 da mesma disposição legal.

Foi ainda facultada à Autora a possibilidade de se pronunciar quanto à questão da aplicabilidade do regime das cláusulas contratuais gerais ao acordo celebrado entre as partes, designadamente no que concerne à nulidade da cláusula 5.5.2 do referido acordo celebrado (de conhecimento oficioso, ao abrigo do disposto no artigo 286º, do Código Civil), nada tendo a Autora vindo dizer.

Finalmente, foi proferida Sentença (datada de 30/1/2005) com o seguinte teor decisório: «Por todo o exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, consequentemente: a)condeno o réu Condomínio do Edifício nº , sito na Avenida d.. B…, em São M…, a pagar à autora, O. – Elevadores, Lda.

, a quantia de 12.431,88 € (doze mil quatrocentos e trinta e um euros e oitenta e oito cêntimos), acrescida de juros vencidos e vincendos, às taxas legais para as operações comerciais, a partir das datas de vencimento de cada um das facturas acima elencadas e até efectivo e integral pagamento; b)declaro nula a cláusula 5.5.2 do “Contrato O. Manutenção OM, nº NSR102” celebrado entre autora e réu, absolvendo, nessa decorrência e no mais, o réu do correspondente pedido.

* Custas por autora e réu, sendo na proporção de: 10 % para a autora e de 90 % para o réu, nos termos do artigo 527, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.» Inconformada com o assim decidido, a Autora apelou da referida sentença, tendo rematado as concernentes Alegações com as seguintes Conclusões: «I.Na sentença recorrida o tribunal a quo entendeu que a cláusula 5.7.4 constante do contrato celebrado entre a recorrente e o recorrido é nula, por desproporcional, o que não merece a concordância da recorrente, a qual considera que o referido tribunal não aplicou correctamente a regra contida no art. 19º-C do DL 446/85, de 25 de Outubro.

II.Desde logo porque, ao contrário do que entendeu o tribunal a quo, o contrato em causa nos presentes autos não pode subsumir-se tout court ao regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, na medida em que não é um contrato de adesão.

III.Isto porque, apesar do contrato em causa constar de um documento pré elaborado pela recorrente, o que se explica por uma questão de economia e comércio jurídicos, o mesmo é passível de ser negociado pelas partes contratantes, existindo para esse efeito um espaço no mesmo, na página das “Condições Contratuais Específicas”, designado “CONDIÇÕES PARTICULARES (a praticar em caso de derrogação, alteração e/ou substituição das condições contratuais anteriores)”.

IV.Assim, é possível aos clientes da recorrente – foi possível ao recorrido – alterar, adaptar, derrogar e/ou aceitar apenas parcialmente as “condições gerais” do mesmo contrato.

V.Por outro lado, não entende a recorrente a razão por que deve a cláusula penal (5.7.4) inserida no referido contrato ser considerada desproporcional e, por essa via, nula.

VI.Como todas as restantes, também essa cláusula foi devidamente explicada ao recorrido aquando da negociação que teve lugar antes da celebração do contrato (tendo o tribunal a quo dado esse facto como provado), não tendo o mesmo feito qualquer reparo ao teor e implicações da mesma.

VII.Assim, e ao abrigo da liberdade contratual consagrada na lei civil portuguesa, tal cláusula foi inserida no contrato.

VIII.Dessa forma, as partes contratantes ficaram a saber, de antemão, com todas as vantagens a esse facto inerentes, nomeadamente em termos de segurança jurídica, qual o quantum indemnizatório que seria devido à parte contrária em caso de quebra injustificada do vínculo contratual firmado por ambas.

IX.Efectivamente, ao contratar com o recorrido, a recorrente teve de se dimensionar em termos humanos e técnicos, para assegurar o cumprimento das obrigações que estava a assumir com a celebração do contrato em causa, perspectivando, naturalmente, quais os lucros provenientes desse cumprimento integral do contrato pelas partes.

X.Tal expectativa resultou, no entanto, frustrada com a atitude do recorrido ao não liquidar atempadamente as facturas correspondentes à prestação de serviços realizada pela recorrente, o que conduziu ao fim antecipado e injustificado do contrato, deixando a recorrente de auferir os lucros que antecipara, não sendo de outra forma ressarcida do investimento técnico e humano que fez para a manutenção/conservação dos elevadores instalados no prédio do recorrido.

XI.Por outro lado, caso fosse a recorrente a incumprir, o prejuízo para o recorrido seria certamente diminuto, uma vez que, poderia imediatamente contratar com outra empresa do ramo a conservação/manutenção dos seus elevadores.

XII.Caso, ainda assim, pretendesse que a recorrente continuasse a prestar-lhe serviços e viesse a ocorrer outra situação de incumprimento por parte desta, teria a mesma de o indemnizar novamente, podendo esta situação repetir-se, ao contrário do que sucede quando o incumprimento parte do cliente.

XIII.Não há, pois, qualquer desproporcionalidade na cláusula penal acordada entre as partes, no que se acompanha de perto as ilações do Tribunal da Relação de Lisboa, em especial no seu acórdão de 06.12.2011, bem como nos acórdãos de 27.05.2010, 26.09.2006 e 14.06.2011, do mesmo Tribunal, disponíveis, na sua maioria, em www.dgsi.pt.

XIV.Não havendo o R., apesar de devidamente citado para o efeito – apresentado contestação, não cabe ao tribunal suscitar oficiosamente a questão da validade das cláusulas contratuais, mormente a cláusula penal.

Termos em que deve o presente recurso ser recebido e julgado procedente, revogando-se a sentença de fls. ____, condenando-se o recorrido nos termos originalmente peticionados pela recorrente, com todas as consequências legais.» O Réu/Apelado não apresentou contra-alegações.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

O OBJECTO DO RECURSO: Como se sabe, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintéctica, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 639º, nº 1, do C.P.C. de 2013) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem [1] [2].

Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 635º, nº 3, do C.P.C. de 2013), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 4 do mesmo art. 635º) [3] [4]. Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.

Por outro lado, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, i.é., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo.

Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação...

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