Acórdão nº 3180/13.1TBOER.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL MARQUES
Data da Resolução03 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: I.-H.STC., S.A., habilitada em substituição de Ge W.,S.A.

, intentou a presente acção declarativa de condenação com processo sumário contra Roberta M. de M.

, pedindo a condenação desta no pagamento das seguintes quantias: -€ 6.000,00, correspondente ao valor em dívida para com a A., acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contabilizados até 08.04.2013, no montante de € 2.099,68; -juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento; -despesas de devolução dos cheques, no montante de € 49,58.

Alegou, em síntese, ter no dia 28/08/2005 celebrado com a R. uma operação de crédito, formalizada através de escrito particular, denominado contrato de mútuo com taxa variável, que tinha por objecto o financiamento da aquisição de um veículo automóvel; que foi convencionado o pagamento de 72 prestações mensais sucessivas, no valor de €210,75 cada; que em 7/11/2009 a ré solicitou a antecipação do contrato para o que entregou à A, quantia em numerário e dois cheques, no valor global de €6.000,00, tendo a autora remetido por via postal toda a documentação relativa ao veículo; que os cheques foram apresentados a pagamento e vieram devolvidos com a informação de falta de provisão, o que acarretou despesas para a A.

A R. contestou, defendendo-se por excepção e por impugnação, tendo invocado a prescrição do direito da autora e alegado que os cheques foram entregues à A. pela Trevocar, comerciante por si incumbida da venda do automóvel; que após ter recebido a documentação da viatura, vendeu o veículo a Fábio A…, a favor de quem foi registado em 18.12.2008; que nada deve à autora, sendo ilegítimo o exercício pela autora do seu alegado direito; que à data do contrato residia na Praceta …. …, n.º …, 7ºO, em Paço de Arcos, residência que posteriormente alterou, com conhecimento da autora, para a Rua … …, ,,,, 2º dtº, Carnaxide; que as eventuais demoras na citação são imputáveis à autora, pois que a morada indicada na p.i. não corresponde à sua última morada em Portugal conhecida da autora; que à data da sua citação já se encontravam prescritas as quantias peticionadas.

A autora apresentou articulado de resposta.

No despacho saneador julgou-se improcedente a excepção de prescrição.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar a R. no pagamento à A. da quantia de: “1- € 6.000,00 (seis mil euros e zero cêntimos), correspondente ao valor em dívida para com a A, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contabilizados desde 08.04.2013, no montante de € 2.099,68 (dois mil e noventa e nove euros e sessenta e oito cêntimos).

2.juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento”.

Inconformada, veio a ré interpor o presente recurso de apelação, cujas alegações terminou com a formulação das seguintes conclusões: 1.Pela aliás douta sentença recorrida, a R., ora recorrente, foi condenada a pagar o empréstimo contraído junto da A. para financiar a aquisição de um veículo automóvel, pela segunda vez, pois se a A. ainda não se encontra reembolsada é, única e exclusivamente, na melhor das hipóteses, por culpa sua, por ter agido sem cuidado, ao dar quitação da dívida sem cuidar de saber se os cheques que recebera de terceiro tinham sido pagos, fazendo a R. crer que já havia recebido. Com efeito, 2.Como resulta da p.i. e do documento nº 1 a ela junto, a A. celebrou com a R., a operação de crédito formalizada através do escrito particular que junta como documento número 1 (cfr. artigos 1º e 2º da p.i.), em cujos termos o reembolso foi garantido por hipoteca ou reserva de propriedade sobre o veículo automóvel.

3.Pedida a antecipação do pagamento (cfr. artigo 5º da pi.), a A. enviou à R., "toda a documentação referente ao referido veículo" (cit. artigo 7º da p.i. e documento número 7 junto à p.i.) em 5.12.2008.

4.Crente de que a A. estava paga, sem razões para disso duvidar (e, se duvidasse, sem forma de o confirmar), a R. emitiu e entregou os documentos necessários à venda do veículo (cfr. documento junto aos autos pela R. em 2.12.2014).

5.Os cheques recebidos pela A., no montante de € 1.750, datado de 2008-09-20, apresentado a pagamento em 2008-11-07 e outro datado de 2008-09-31 (sic), no montante de € 4.250, apresentado a pagamento na mesma data, por depósito em conta de que é titular a A., foram devolvidos por falta de provisão no dia 11-11-2008 (cfr. doc. nº. 5 e 6 juntos com a p.i.).

6.Na fundamentação da sentença devem ser atendidos os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, consideradas e compatibilizadas todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las (d. artigos 413º e 607º, nº. 4 do CPC).

7.

Atendendo ao objecto do litígio, além da matéria de facto considerada, deviam também ter sido dados como provados os seguintes factos, indicados nas alíneas E) e G) a K) infra, mantendo-se apenas a redacção dos números 1 a 4 da fundamentação de facto: A.A "GE W., S.A./I tem por objecto, entre outros, a celebração de contratos de mútuo (Fundamentação, nº. 1).

B.No exercício da sua actividade, a "GE W., S.A.” celebrou com a R. a operação de crédito formalizada através de escrito particular com o nº- 68348599/VCR103308 (Fundamentação, nº. 2).

C.Este contrato tinha por objecto o financiamento para a aquisição a crédito do veículo automóvel da marca CHEVROLET, modelo KALOS, com a matrícula ..-..-.. (Fundamentação, nº. 3).

D.Nos termos do referido contrato ficou estipulado o reembolso do crédito concedido em 72 prestações mensais e sucessivas, no valor de € 210,75 cada, vencendo-se a primeira em 28.09.2005 (Fundamentação, nº.4).

E.Nos termos do referido contrato o reembolso do crédito foi garantido por hipoteca ou reserva de propriedade, registada na Conservatória do Registo Automóvel (cfr. artigo 6º da contestação e documento junto em 2.12.2014.

F.Em 7.11.2008, a R. solicitou à A. a antecipação do pagamento da quantia em dívida, com efeitos no dia 20.11.2008 (Fundamentação, nº. 5) G.A antecipação do pagamento destinava-se a permitir a venda do veículo (dr. doc. nº. 1 junto com a contestação e depoimento da testemunha VM..., prestado no dia 16-4-2015, ao mn 5:28).

H.Em 7.11.2008, a A. depositou na sua conta bancária aberta junto do Santander Totta, € 938,47 em numerário, o cheque nº. 1362557096,datado de 20.09.2008, no montante de € 1.750,00 e o cheque nº. 7144947086, no montante de € 4.250,00, ambos sacados por JG..., que vieram ambos a ser devolvidos por falta de provisão no dia 11 seguinte (cfr. docs. números 4 a 6).

I.Os referidos cheques foram entregues à A. pela Trevocar, comerciante incumbido da venda do automóvel (cfr. depoimento da testemunha VM..., prestado no dia 16-4-2015, aos minutos 5:22 e 17:09).

J.Por carta datada de 5.12.2008, a A. remeteu à R. a documentação necessária para distratar o ónus que incidia sobre o veículo para garantia do pagamento do empréstimo (cfr. doc. 7 junto à p.i.) e só não emitiu declaração expressa de quitação por assim lhe não ter sido solicitado (cfr. depoimento da testemunha VM..., prestado no dia 16-4-2015, ao minuto 14:55 e seguintes).

K.Recebida esta documentação, a R. vendeu o veículo a Fábio A..., a favor de quem foi registado em 18.12.2008 (cfr. documento junto aos autos em 2.12.2014).Por carta de 29.01.2009 a A. informou a R. que tinha na sua posse os dois cheques que se destinavam à liquidação do contrato e intimou-a a regularizá-los (cfr. doc. nº. 9 junto à p.i.).

8.Na, aliás douta sentença, devia por isso ter-se julgado provado que a R. fez o que devia quando, de posse dos documentos que a A. lhe enviou, concluiu que a divida se encontrava paga e emitiu por sua vez a declaração de venda do veículo automóvel! Com efeito, 9.A declaração negocial pode ser expressa ou tácita, isto é, pode se deduzir de "factos que, com toda a probabilidade, a revelam" (cit. artigo 217º do Código Civil), como é o caso quando o credor, voluntariamente, entrega ao devedor o título original do crédito, o que faz presumir a sua liberação (d. nº. 3 do artigo 786º do Código Civil). Assim, 10.Do documento número nº. 7 junto com a p.i. a R. concluiu - por outra conclusão não ser possível, que a A. estava reembolsada e vendeu o veículo, pagando assim as suas dívidas: a resposta à primeira questão incluída no objecto do litígio - "aferir sobre a qualificação jurídica do documento nº. 7, a fls. 17, junto com a p.i." - deveria por isso ter sido a de que se tratava de uma declaração de quitação do empréstimo cujo pagamento é pedido nos autos.

11.Ao assim não se decidir, na aliás douta sentença, violou-se o disposto nos artigos 413º e 607º, nº. 4 do CPC, 217º e 786º, nº. 3 do Código Civil. por sua vez, 12.Os novos factos referidos na, aliás douta sentença, a partir da Acta da Direcção de Controle de Crédito da A., de 17.02.2009, data em que há mais de dois meses a R. tinha pago o empréstimo, apenas interessam às questões incluídas nos números 3 e 4 do objecto do litígio: 13.Apurado o seu "lapso", a A., instituição de crédito, no lugar de assumir as suas responsabilidades, "empurrou-as" para a R., convencendo-a que a ela competia resolver o problema que não tinha criado, nem podia evitar.

14.A presente acção foi assim proposta em abuso de direito e sabendo a A., por não o poder ignorar, da falta de fundamento da sua pretensão, com o que litigou de má-fé, pelo que deveria ser condenada em multa e indemnização a favor da R. para reembolso de todas as despesas em que incorrer, incluindo os honorários do seu mandatário (dr. artigo 542º do CPC). De qualquer modo, sempre se dirá, 15.

Também no, aliás, douto, despacho proferido na audiência prévia, se fez errada interpretação e aplicação do direito, ao julgar improcedente a invocada excepção de prescrição: 16.A R. requereu a antecipação do contrato com efeitos no dia 20.11.2008 (cf. Fundamentação...

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