Acórdão nº 92/07.1TELSB-E.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução24 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: 1.Não se conformando com o despacho proferido em 8 de Janeiro de 2016 na Secção Única do Tribunal Central de Instrução Criminal, constante de fls. 1145 destes autos (fls. 14770, dos autos principais), pelo qual foram indeferidas as irregularidades e a nulidade anteriormente arguidas e se tomou posição quanto ao requerido justo impedimento para a prática de acto processual - pedido de abertura de instrução -, o arguido J..., interpôs o presente recurso, que motivou, formulando as seguintes conclusões: I.O presente recurso tem a sua origem no despacho proferido a fls. 14.770 dos presentes autos, mediante o qual o Tribunal a quo decidiu indeferir (i) o pedido de reconhecimento do justo impedimento para a prática do acto processual enquanto não fosse assegurada aos Arguidos a consulta de todos os elementos do processo (incluindo os apensos e anexos que não se encontravam digitalizados), sob pena de nulidade, e (ii) a irregularidade invocada por omissão de pronúncia sobre o requerido a fls. 14.140 e seguintes antes do termo do prazo fixado - e já anteriormente prorrogado - para abertura da instrução.

II.

No despacho recorrido, o Tribunal a quo entendeu que: i.A limitação à consulta dos autos e à obtenção de cópias e certidões verificada nos presentes autos na pendência do prazo para requerer a abertura da instrução não colidia com a regra publicidade do processo, não se tendo por violado o disposto nos artigos 86.°, n.°s 1 e 6, alínea c), e 89.°, n.° 1, ambos do CPP nem se verificando a nulidade arguida; e que ii.Não se verificava a irregularidade fundada na omissão de pronúncia sobre o requerimento atinente à falta de acesso aos autos e a (consequente) verificação do justo impedimento para a apresentação do pedido de abertura da instrução por parte dos arguidos até que o processo voltasse a estar disponível para consulta na íntegra, dado que no momento da sua apresentação pelo ora Recorrente não se encontrava esgotado o prazo fixado para a prática do acto processual.

III.No decurso do prazo para requerer a abertura da instrução - prorrogado com fundamento na excepcional complexidade dos presentes autos -, o ora recorrente, através dos seus Mandatários, foi informado de que o acesso aos autos estaria vedado durante o período em que decorresse a mudança de instalações do departamento central de investigação e Acção Penal (DCIAP), estimando-se que esse impedimento durasse aproximadamente uma semana, o que levou a apresentar o requerimento de fls. 14.140 cuja transcrição se encontra vertida na motivação de recurso.

IV.O ora recorrente foi posteriormente informado de que o acesso aos elementos que constam dos autos se faria a elementos que constam dos autos se faria a pedido, uma vez que o processo não se encontrava disponível para consulta na íntegra nem existia uma cópia digital completa que pudesse ser-lhe facultada em sua substituição - os presentes autos não voltaram a estar disponíveis na íntegra até ao termo do prazo fixado para a apresentação do requerimento para abertura da instrução (21 de Dezembro de 2015), nem depois dessa data - seja no decurso das férias judiciais de Natal, seja já depois do seu termo -, mantendo-se o sistema de consulta a pedido e diferido até à presente data, não obstante o requerimento do ora Recorrente para que lhe fosse entregue cópia digitalizada integral dos apensos referidos na acusação datado de dia 12 de Janeiro de 2016.

V.A regra da publicidade do processo, tal como decorre do artigo 86.°, n.°s 1 e 6, alínea c), do CPP, não se pode considerar observada quando o acesso aos autos depende, como nos presentes autos, da prévia formulação do "pedido específico" de consulta de elementos dos autos, pelo que a tese sustentada no despacho recorrido, com base na promoção do Ministério Público, traz implícita uma limitação processualmente inadmissível à compreensão e ao conhecimento dos arguidos relativamente aos elementos que constam dos autos (que não conhecem, nem têm como conhecer a sua extensão).

VI.O conhecimento dos autos e o exercício cabal e efectivo do direito de defesa dos arguidos só se logram obter com o acesso ilimitado e irrestrito a todo o processo, ou, melhor dito, à integralidade dos autos - cfr., nesse sentido, os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.° 395/95, de 5.12.1995, 117/96, de 6.2.1996, ambos disponíveis para consulta em www.tribunalconstitucional.pt e ainda o Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 363/2000, de 5 de Julho, proc. n.° 838/98, DR, II série, de 13.11.2000, que julgou inconstitucional, por violação do artigo 32.°, n.° 1, da Constituição, «os artigos 107. n.° 2, do CPP e 146.°, n° 1, áo CPC [artigo 140.°, n.° l, do NCPC] (...), quando interpretados no sentido de que a impossibilidade de consulta das actas de julgamento (...) por as mesmas não estarem ainda disponíveis, não constitui justo impedimento para a interposição de recurso da decisão final condenatória em processo penal».

VII.Ao não reconhecer a existência do justo impedimento para a prática do acto processual por um período idêntico ao da falta de acesso à integralidade do processo pelos arguidos, e com isso a nulidade resultante da inobservância do disposto no artigo 86.°, n.° 1, do CPP, o Tribunal a quo aplicou uma norma inconstitucional, extraída por interpretação conjugada dos artigos 86.°, n.°s 1 e 6, alínea c), 89.°, n.° 1,107.°, n.°s 2 a 4, e 287.°, n.° 1, do CPP, e do artigo 140.° do Código de Processo CIVIL (CPC), de acordo com a qual a impossibilidade de consulta da integralidade do processo, depois de proferida a acusação contra o arguido, não constitui justo impedimento para a apresentação do requerimento para abertura da instrução, norma que é inconstitucional por violação do artigo 32.°, n.° 1, da Constituição.

VIII.O entendimento vertido no despacho recorrido apenas se poderia admitir caso os factos que relevam para o reconhecimento do justo impedimento fossem desconhecidos do Tribunal no termo do prazo para a prática do acto processual em causa - sucede, porém, que assim não sucedeu no presente caso.

IX.In casu, apesar de o Arguido ter requerido que fosse reconhecido o justo impedimento resultante da falta de acesso aos autos ainda na pendência do prazo para requerer a abertura de instrução e de o Tribunal a quo ter reconhecido reconhecer a sua verificação limitado no período de 5 a 11 de Dezembro de 2015 -, o despacho sobre esta questão só veio a ser proferido depois de...

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