Acórdão nº 459-13.6TBPCV.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.

Relatório: J..., nos autos melhor identificado, instaurou no Tribunal Judicial de Penacova a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra C..., SA, pedindo a condenação desta no pagamento do montante total de € 51.933,42, acrescido de juros vincendos.

Alegou, em síntese, que celebrou e assinou, no balcão de Penacova, perante determinado funcionário, uma declaração individual de adesão a um contrato de seguro de vida grupo, em que os questionários referentes às pessoas seguras e a declaração de saúde se encontravam em branco, sendo que foram posteriormente preenchidos por pessoa que desconhece, nunca lhe sendo a conhecer os condicionalismos subjacentes à celebração do contrato em causa. Nunca lhe foi entregue a apólice. O contrato previa que em caso de incapacidade superior a 75% o tomador do seguro teria direito a receber €30.000,00.

Sofreu acidente em 2011, do qual resultou uma incapacidade permanente de 80%, com incapacidade total para o exercício da sua profissão habitual, com os inerentes danos morais, entre os quais os que resultam da conduta da Ré, ao invocar a nulidade do contrato com base em falsas declarações, sendo tal inverídico, e sendo ainda que o Autor realizou diversos exames médicos que comprovam que nem sequer sofre das patologias prévias que a Ré invoca não terem sido comunicadas, patologias essas erradamente informadas pelo Centro de Saúde de Mortágua.

De resto, invocando a nulidade, a Ré não restituiu ao A. as quantias por este pagas, fazendo-as suas de forma ilícita.

A Ré contestou, invocando a excepção peremptória de nulidade do contrato de seguro, por prestação de informações e dados relativos ao estado de saúde, por parte do Autor, com expressa menção de ter respondido com verdade e exactidão e conhecimento de que qualquer omissão ou inexactidão ou resposta incompleta que induza erro na apreciação do risco terá a consequência da nulidade da adesão ao contrato. Após a análise da documentação clínica que foi entregue pelo Autor à Ré, veio a apurar-se que o A. sofria, ou havia sofrido, de diversas patologias, osteo-articular, esófago-gástrica, psiquiátrica, alergológica. A nulidade foi comunicada ao A. e a Ré mantém o direito aos prémios já pagos, não havendo lugar ao pagamento de qualquer indemnização em função do sinistro.

Impugnou também a Ré a matéria alegada pelo Autor, além do mais, defendendo que o funcionário que atendeu o A. lhe leu as perguntas e foi escrevendo as respostas que o Autor lhe foi dando, sendo pois as falsas declarações da exclusiva responsabilidade do Autor.

Respondeu o A., invocando a existência, além da excepção de nulidade, de excepções inominadas.

Foi posteriormente proferida decisão que julgou o tribunal territorialmente incompetente, determinando a remessa dos autos às Varas Cíveis de Lisboa, o que veio a suceder.

Dispensada a audiência prévia, foi fixado à acção o valor de €51.933,42, saneados os autos, definido o objecto do litígio e enunciados os temas de prova, considerando-se desde logo assente parte da matéria de facto. Ambas as partes reclamaram, reclamações que foram indeferidas.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, veio a ser proferida sentença de cuja parte dispositiva consta: “12–Em face do exposto, o Tribunal decide julgar o contrato de seguro celebrado entre as partes inválido, por anulabilidade, julgando a presente acção totalmente improcedente, por não provada, absolvendo, consequentemente, a ré dos pedidos deduzidos pelo autor.

Custas pelo autor”.

Inconformado, interpôs o Autor o presente recurso formulando a final as seguintes conclusões: I.Vem interposto o presente recurso da douta sentença do Tribunal a quo que julgou o contrato de seguro celebrado entre as partes inválido, por anulabilidade, julgando a ação totalmente improcedente.

II.Discute-se nos presentes autos o contrato de seguro vida/invalidez, tendo o Autor sofrido um acidente ocorrido em 2011, do qual resultou uma incapacidade de 80% pedindo o pagamento do montante do seguro, assim como a indemnização por danos sofridos.

III.A Ré recusa-se a proceder ao pagamento alegando a nulidade do contrato de seguro celebrado, pois não foram as declarações exatas pelo Autor no que respeita ao seu historial clínico.

IV.Considerou o tribunal a quo que nos termos do artigo 429º do Código Comercial e ainda de acordo com a cláusula 15ª do contrato celebrado, o negócio celebrado é inválido, assumindo que se trata de anulabilidade.

V.No que respeita ao artigo 5º e artigo 6º do regime das cláusulas contratuais gerais (Decreto Lei nº446/85, de 25 de Outubro) foram cumpridas as obrigações que decorrerem desses preceitos.

VI.Considerou ainda, o douto tribunal que o vício do contrato, anulabilidade, não se encontrava sanado.

VII.No que respeita ao nexo de causalidade, considerou o douto tribunal a quo que o que releva não é a causalidade entre as patologias e o sinistro, mas sim o nexo causal entre o conhecimento de tais patologias pela ré e a decisão de celebrar o contrato de seguro em certos termos.

VIII. Salvo o devido respeito e melhor opinião, o douto tribunal a quo aplicou indevidamente os artigos 5 º artigo 6º do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, o artigo 429º do Código Comercial e o artigo 287º do Código Civil.

IX.Resulta da douta sentença proferida pelo tribunal a quo, que antes da assinatura do contrato em causa nos autos, o funcionário da CCAM da Bairrada e Aguieira leu ao Autor as condições do seguro, o teor dos referidos documentos e o seu conteúdo.

X.Ora uma coisa é a assinatura dos papéis que são entregues ao subscritor do seguro para que sejam assinados e, outra coisa bem diferente, é a informação específica que a seguradora (Ré) deve fornecer acerca do conteúdo dos mesmos e das cláusulas em concreto.

XI.Não basta ler as cláusulas para considerar que a Ré cumpriu as obrigações que sobre si impediam sobre tal matéria.

XII.Pois, estamos perante o Autor com parcos conhecimentos que se limitou a assinar os documentos apresentados pelo funcionário da CCAM da Bairrada e Aguieira.

XIII.Ora, não sendo explicitado todo o conteúdo das cláusulas, entende-se que não foram cumpridos os requisitos previstos nos artigos 5 º artigo 6º das Cláusulas Contratuais Gerais (Decreto Lei nº 446/85, de 25 de Outubro).

XIV.Por conseguinte, cabia a Ré provar que fez a comunicação adequada e efetiva do teor e significado de tais cláusulas (como estatuí o artigo 5º e artigo 6º do Decreto Lei nº 446/85, de 25 de Outubro), no âmbito de um contrato de seguro de vida.

XV.Neste sentido o Acórdão da Relação de 3/7/2014 refere que “A seguradora, enquanto credora das obrigações que o segurado assume no referido contrato, incluindo a do pagamento do prémio, não se pode alhear dos termos e condições em que os segurados aderem ao seguro de grupo e lhes prestam ou não o dever de informação sobre o conteúdo. A falta do dever de informação reflete-se no próprio contrato de adesão; na sua conexão com a seguradora, afetando a falta de informação a relação jurídica entre o segurado- tomador de seguro, entre segurado-seguradora ou entre o tomador de seguro-seguradora não deixando a seguradora de responder perante o segurado pela ausência dessa informação por parte do tomador do seguro.” XVI.Decidiu, pois, mal o tribunal a quo, ao considerar ao considerar que foram cumpridas as exigências dos referidos artigos, pelo facto de se ter provado que se procedeu à leitura dos termos do contrato, facultando para leitura pelo próprio Autor o respectivo teor, nenhuma dúvida tendo sido colocada por este.

XVII.Por mera cautela de patrocínio, caso não se considerassem tais cláusulas não escritas, XVIII.No que respeita ao artigo 429º do Código Comercial, é praticamente unânime, ao nível da jurisprudência e doutrina, que estando em causa interesses meramente particulares, de acordo com uma interpretação corretiva e teológica, é de se considerar que se pretendeu estabelecer, neste artigo, um regime de anulabilidade.

XIX.Ora estando perante o regime de anulabilidade, será de aplicar o artigo 287º do Código Civil, só podendo a Ré arguir a dita anulabilidade, no prazo de um ano subsequente à cessação do vício que lhe serve de fundamento.

XX.Por conseguinte, o contrato está cumprido com a formalização e aceitação do mesmo por parte da seguradora e o pagamento do prémio por parte do segurado, pois é nesse momento que a seguradora assume o risco contra o pagamento do prémio.

XXI.Nos presentes autos o contrato foi celebrado em 2007.11.26. Poderia a Ré ter arguido a anulabilidade até 2008.11.26 pois foi nessa data que assumiu o risco perante o pagamento do prémio.

XXII.Porém, o tribunal a quo considerou que a “Ré assume o conhecimento do erro precisamente em 15 de Novembro de 2012 (facto5), na sequência do processo que desencadeou com vista ao esclarecimento das condições em que o contrato de seguro foi celebrado e da veracidade das informações então prestadas pelo Autos.

Ora, a contestação deu entrada em juízo em 24 de Outubro de 2013.

Improcedendo, pois, também a alegada sanação do vício do contrato.” XXIII.A aceitar tal posição levaria a situações em que as seguradoras na maior parte dos contratos celebrados, por os segurados desconhecerem que na data da celebração dos mesmos terem de declarar todo o historial clínico, a todo o tempo durante a vigência do contrato as seguradoras pudessem declarar a sua anulabilidade.

XXIV.Ou apenas declaravam a anulabilidade quando ocorrem sinistros nunca assumindo o risco inerente do contrato.

XXV.Acresce que, como tem sido entendimento em vária jurisprudência, nomeadamente, no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 29/10/2015, de...

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