Acórdão nº 5473/13.9TDLSB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelAGOSTINHO TORRES
Data da Resolução15 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência, os Juízes no Tribunal da Relação de Lisboa I-RELATÓRIO: 1.1-Por sentença de 1.3.2016 proferida no âmbito do proc.º NUIPC 5473/13.9TDLSB.L1 (Juiz 10 - Sec. Criminal Instância Local Lisboa), foi decidido: O Ministério Público requereu o julgamento em processo comum perante tribunal singular de DN,nascido em 24 de Março de 1975, filho de JM e AG, residente ..., Lisboa imputando-lhe a prática de um crime de falsificação de documento, previsto e punível pelos artigos 256°, n.º 1, alínea d) do Código Penal e um crime de simulação de crime, previsto e punido pelo art.º 366º, n.º 1 do mesmo código.; CMPdeduziu pedido de indemnização civil contra o arguido sustentado nos factos que lhe são imputados no despacho de acusação, reclamando a sua condenação no pagamento de 13.500€, correspondente ao valor inscrito nos cheques e 156e correspondentes a despesas e impostos suportados com a devolução dos cheques.

Alegou sumariamente que arrendou ao arguido, em 13.09.2012 um imóvel destinado a instalação de estabelecimento comercial, tendo o arguido outorgado o respectivo contrato na qualidade de sócio gerente da arrendatária e fiador, contrato celebrado pelo prazo de 1 ano, renovável, que a sociedade representada pelo arguido entregou à demandante, nesta data, montante correspondente a 3 rendas, sendo convencionado a entrega de 9 cheques como garantia de garantia de bom pagamento das restantes rendas., cheques estes emitidos e assinados pelo demandado.

Mais alegou que volvidos dois meses o demandando encetou negociações para cessação do contrato de arrendamento, apresentando à demandante dois potenciais novos arrendatários, com os quais esta veio a celebrar novo contrato de arrendamento, convencionando com o ora demandado que este assumia a posição de fiador no novo arrendamento e que os títulos entregues para garantia de bom pagamento das rendas vencidas no pretérito contrato ficariam em posse da demandante como garantia de bom pagamento das rendas vincendas no novo contrato, este outorgado a 21.12.2012.

Por fim alegou que, vencidas e não pagas, rendas reportadas ao contrato de arrendamento celebrado a 21.12.2012, apresentou a pagamento os cheques entregues pelo arguido, devolvidos pela entidade bancária, com a indicação de cheque extraviado.

Notificado para o efeito o arguido ofereceu o merecimento dos autos e contestou o pedido de indemnização civil, alegando, em suma, que os cheques entregues para garantia de bom pagamento abrangiam apenas as rendas vencidas no período de 12 meses subsequente à assinatura do primeiro contrato de arrendamento – 13.09.2012 – e ainda que a demandante, por via de interpelação que lhe foi dirigida, reconheceu que a sociedade outorgante do segundo contrato de arrendamento (de 21.12.2012) efectuou o pagamento das rendas vencidas nesse contrato até Maio de 2013, e que entregou as chaves do locado a 01.07.2013, com a consequente resolução do contrato, e ainda, por fim, que os cheques garantia foram apresentados a pagamento de Maio a Setembro de 2013 sem que o demandado (na qualidade de fiador) ou a sociedade arrendatária tivessem sido interpelados para pagamento.

Alegou ainda que a “resolução” deste contrato de arrendamento ocorreu por causa imputável à demandante – alteração a licença de funcionamento do espaço das 04h para as 22h e deficiências na insonorização do espaço.

Na ausência de quaisquer questões prévias ou incidentais que obstassem ao conhecimento do mérito, procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo, tal como a acta o documenta.

* Questão prévia: DO REENVIO DO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL PARA OS MEIOS COMUNS: Analisada a prova produzida, os documentos juntos aos autos, concretamente os juntos a fls. 155 a 176, 188 a 195 e 222 a 227, apurou-se que os cheques objecto dos autos foram emitidos (integralmente preenchidos) e assinados pelo arguido e entregues à demandante como garantia de bom pagamento das rendas vencidas na pendência do contrato de arrendamento que com aquele foi celebrado, na qualidade de gerente da arrendatária e de fiador.

Mais se apurou que tais cheques foram apresentados a pagamento pela demandante nas datas exaradas no despacho de acusação, para pagamento de rendas vencidas no âmbito do contrato de arrendamento celebrado entre demandante e outra sociedade, no qual o arguido interveio na qualidade de fiador.

A demandante alega que ficou convencionando com o ora demandado que os títulos entregues para garantia de bom pagamento das rendas vencidas no pretérito contrato ficariam na sua posse como garantia de bom pagamento das rendas vincendas no novo contrato, este outorgado a 21.12.2012, e que, vencidas e não pagas, rendas reportadas a este contrato de arrendamento, apresentou a pagamento os cheques entregues pelo arguido, devolvidos pela entidade bancária, com a indicação de cheque extraviado.

O demandado alega que os cheques entregues para garantia de bom pagamento abrangiam apenas as rendas vencidas no período de 12 meses subsequente à assinatura do primeiro contrato de arrendamento (de 13.09.2012 a 13.02.2013) e que a demandante, por via de interpelação que lhe foi dirigida, reconheceu que a sociedade outorgante do segundo contrato de arrendamento (de 21.12.2012) efectuou o pagamento das rendas vencidas nesse contrato até Maio de 2013.

Alegou ainda que o segundo contrato de arrendamento no qual interveio na qualidade de fiador se “resolveu” em 01.07.2013, não sendo por isso devidas rendas desde essa data, e que os cheques foram apresentados a pagamento de Maio a Setembro de 2013 sem que o demandado (na qualidade de fiador) ou a sociedade arrendatária tivessem sido interpelados para pagamento.

Alegou, por fim que a “resolução” deste contrato de arrendamento ocorreu por causa imputável à demandante – alteração a licença de funcionamento do espaço das 04h para as 22h e deficiências na insonorização do espaço.

Em face destas questões, oferece-nos reflectir sobre o disposto no art.º 82º do Código de Processo Penal.

O nosso Código de Processo Penal, através do art.º 71º, que dispõe que o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei, consagra, como regra, o princípio da adesão obrigatória da acção cível ao processo penal e como excepção a dedução da acção cível fora do processo penal.

Optou assim o legislador por conhecer e decidir, em princípio, a acção penal e o pedido cível num único e mesmo processo, consagrando uma adesão obrigatória do mecanismo civil ao penal.

São vistas como vantagens deste sistema, razões de economia processual e economia de meios, pretendendo-se que num único processo se resolvam todas as questões que envolvem o facto criminoso, sem que os interessados tenham que despender e dispersar custos acrescidos, e ainda razões de prestígio institucional, evitando-se deste modo julgados contraditórios.

As excepções ao princípio da adesão vêm previstas no art.º 72º do Código de Processo Penal, aí se enumerando taxativamente os casos em que o pedido cível pode ser deduzido, ab initio, em separado perante o tribunal civil. De realçar que, mesmo nestes casos, a dedução em separado é sempre uma opção, “pode ser” deduzido em separado diz o texto da lei, consagrando-se assim a regra da opção que faculta ao lesado a possibilidade de se subtrair ao processo penal.

Uma dessas excepções, e bem importante, são os crimes semipúblicos e particulares, o que atendendo ao grande número destes crimes, há quem coloque em dúvida que se possa continuar a afirmar o princípio da adesão obrigatória como o princípio regra.

Outra excepção ao princípio de adesão decorre do reenvio do pedido de indemnização civil para os tribunais civis, nos termos previstos no nº 3 do art.º 82º, do Código de Processo Penal.

Dispõe o citado nº 3 do art.º 82º, que “O tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento, remeter as partes para os tribunais civis quando as questões suscitadas pelo pedido de indemnização civil inviabilizem uma decisão rigorosa ou forem susceptíveis de gerar incidentes que retardem intoleravelmente o processo penal”.

Decorre deste preceito legal que são duas as situações em que o tribunal pode remeter as partes para os meios comuns: a)Surgindo questões atinentes ao pedido cível que inviabilizam uma decisão rigorosa; b)Surgindo questões atinentes ao pedido cível susceptíveis de gerar incidentes que levem ao retardamento intolerável do processo penal.

À luz deste preceito legal, o Tribunal avalia as questões suscitadas pela dedução do pedido cível, e reenvia para os meios comuns, se concluir que ocorre grande desvantagem na manutenção da adesão, ou porque as questões suscitadas inviabilizam uma “solução rigorosa”, havendo assim desvantagem para o pedido cível, ou “retardam intoleravelmente o processo penal”, havendo assim desvantagem para o processo penal.

E concluindo pela ocorrência de desvantagens na manutenção da adesão, a remessa para os meios comuns vai permitir que o pedido seja julgado em melhores condições e/ou sem custos de protelamento do processo penal.

O reenvio é no fundo um mecanismo que tem em vista evitar os prejuízos que podem ocorrer com a manutenção da adesão, designadamente, quando está em causa a boa decisão da causa cível e/ou o julgamento da causa penal num prazo razoável.

Acresce ainda realçar que este poder do tribunal de remeter as partes para os meios comuns não é um poder arbitrário ou discricionário, mas que obedece a rigorosa fundamentação dentro do quadro da previsão daquela norma.

Dito isto, vejamos agora se no caso em apreço havia fundamento legal para o reenvio das partes para os meios comuns.

Em face das questões acima enumeradas, entende o Tribunal que está inviabilizada a prolação de decisão rigorosa acerca do pedido de indemnização civil, mormente face às questões supra enunciadas que ficaram por apurar, atinentes ao...

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