Acórdão nº 2139/12.0TVLSB.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Dezembro de 2016
Magistrado Responsável | MARIA ADELAIDE DOMINGOS |
Data da Resolução | 15 de Dezembro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.
I–RELATÓRIO: António ... ...
e mulher, Maria Helena de ... ... ...
, instauraram a presente ação declarativa condenatória, sob a forma de processo ordinário, contra Caixa ……., S.A.
, peticionado que seja: a)Declarado que os autores pagaram à ré as importâncias emergentes do mútuo hipotecário que identificam, nada mais sendo devido por parte dos mesmos; b)A ré condenada a devolver aos autores a quantia de €6.955,94 euros, bem como todas as importâncias que recebam por conta do mútuo hipotecário a partir da instauração da ação (07/11/2012), acrescidas de juros à taxa legal a partir da citação; c)Ordenado o cancelamento do registo: -Da hipoteca, sobre a fração urbana “D” melhor identificada nos autos, hipoteca essa efetuada através da AP. 60 de 1982/04/22 e -Da penhora, da mesma fração “D”, efetuada através da AP. 3666 de 13/09/2010.
Para fundamentarem a sua pretensão, alegaram, em síntese, o seguinte: No dia 24/09/1982, autores e ré celebraram um contrato de empréstimo (mútuo com hipoteca) destinado à aquisição de uma fração, nos termos do qual os mesmos se confessaram devedores à ré da quantia de €7.980,77 (1.600.000$00).
Foi estabelecido entre os outorgantes que a taxa de juros contratual seria a máxima legal em cada momento em vigor para este tipo de operações, sendo inicialmente de 26%, suportada pela forma seguinte: pelos mutuários, 22,25%; pela Caixa mutuante, 1 % e pelo Banco de Portugal, 2,75%.
O empréstimo seria amortizado em 300 prestações mensais.
Para garantia desse empréstimo, respetivos juros e despesas, os autores constituíram hipoteca sobre a referida fração “D”, cave esquerda do prédio urbano sito no Impasse à Rua do C..., lote n.º ..., no lugar de ..., freguesia de ... – ....
O conteúdo do contrato foi apresentado aos autores num formulário pré-elaborado e não sujeito a discussão ou a alteração, que os autores se limitaram a subscrever.
No contrato de mútuo nada se clausulou a título de juros moratórios.
Não existe qualquer cláusula inserida no contrato que permita à ré considerar antecipadamente vencida toda a dívida e exigir o seu imediato pagamento no caso de incumprimento de qualquer obrigação decorrente do contrato e quando subscreveram o contrato desconheciam as consequências que o não pagamento atempado das prestações lhes acarretaria.
Não pagaram à ré a 1.ª prestação contratual, nem nenhuma outra subsequentemente vencida.
Em Setembro de 1987, foi instaurada execução fiscal para cobrança coerciva da quantia exequenda no valor de 3.138.278$00 (€15.653,66), acrescidos de juros vincendos computados a partir de 08/03/1986.
A taxa de juros aplicada, entre 8/11/82 e 8/3/86, foi de 28,86% sobre os 1600 contos.
Foi penhorada a favor da Fazenda Nacional, no âmbito do processo de execução, a fração autónoma dada de hipoteca.
Segundo o Serviço de Finanças de Loures 4, em 16/02/2012 a importância em falta para a liquidação da dívida exequenda ascendia a €9.162,72 euros, tendo já sido penhorada a quantia de €16.485,53.
A taxa de juros que foi aplicada no capital que precede foi de cerca de 30,4%.
O banco réu jamais teve em conta que as taxas máximas legalmente admitidas foram, sucessivamente, decrescendo e, desde 08/11/1982 e até hoje, a ré e o Serviço de Finanças de Loures 4 continuam a calcular juros moratórios a uma taxa igual ou superior a 28%.
Para se apurar a taxa de juros moratórios a aplicar ao contrato em apreço, há que apurar a taxa de juros bancária máxima legal que passou a vigorar em cada momento, no que toca ao crédito à habitação.
Apesar das quantias já entregues pelos autores à data de 30/10/2012, a ré continua a reclamar dos autores a importância de €54.039,12, continuando a pugnar por uma taxa de juros moratórios de 28% sobre um capital que inclui juros capitalizados.
Foi marcada para o dia 08/11/2012 a venda judicial da aludida fração urbana “D”.
Tendo em conta as quantias já entregues e as taxas de juros moratórios máximas a aplicar sucessivamente ao mútuo em causa nos autos, os autores já nada devem, devendo ser-lhe restituída a quantia já paga em excesso.
Contestou a ré.
Por exceção, invocou caso julgado, abuso de direito e falta de interesse em agir.
Também impugnou os factos alegados pelos autores, sustentando que o contrato celebrado não constitui um contrato de adesão, tendo sido celebrado por escritura pública e as respetivas condições foram negociadas entre as partes.
Os autores nunca pagaram qualquer prestação das acordadas com a ré.
A taxa de juro aplicada entre 08/11/1982 e 08/03/1986 é de 28% sobre o capital de Esc. 1.600.000$00, conforme acordado entre as partes.
A ré imputou as quantias recebidas no âmbito da execução fiscal à quantia exequenda.
A taxa de juro era fixa – 28% (26% + 2%).
A ré pode proceder à capitalização de juros.
O empréstimo à data de 05/12/2012 apresenta o valor em dívida de €59.318,98.
Os autores apresentaram réplica.
No despacho saneador foi julgada procedente a exceção dilatória de caso julgado, reportada a alegados pagamentos efetuados pelos autores em datas anteriores à instauração da execução fiscal que lhes foi movida pela Fazenda Nacional e julgada improcedente no que concerne a alegados pagamentos efetuados pelos mesmos autores em datas posteriores à instauração da execução fiscal, bem como à alegada incorreção do cálculo de juros moratórios por ela efetuado no âmbito do mesmo contrato.
Foi igualmente julgada improcedente a exceção dilatória invocada pela ré de falta de interesse em agir.
Foi fixado o objeto do litígio e foram enunciados os Temas da Prova nos termos constantes de fls. 396-421.
Os autores reclamaram em relação ao modo como foi fixado o objeto do litígio e enunciados os Temas de Prova, tendo sido indeferida.
Os autores apresentaram articulados supervenientes, que foram admitidos.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a ré do pedido.
Inconformados, apelaram os autores apresentando as conclusões de recurso infra transcritas.
Contra-alegou a ré e requereu ampliação do recurso conforme infra transcrito.
Os autores pronunciaram-se sobre a requerida ampliação.
O recurso e ampliação foram admitidos por despacho de fls. 716.
Conclusões da apelação dos autores: 1.-Quanto ao objeto do litígio a M.ma juiz a quo entendeu que ele consistia “em apurar se os Autores já pagaram à Ré as importâncias antes devidas mercê de um contrato de mútuo hipotecário celebrado entre eles, tendo inclusivamente direito à restituição daquelas que esta recebeu a mais(mercê nomeadamente da aplicação de indevidas taxas de juros), bem como ao cancelamento dos registos efetuados no pressuposto da vigência e incumprimento de tal contrato”.
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-Os autores sustentaram na reclamação que apresentaram quanto ao objeto do litígio que, na parte final do objeto do litígio identificado pelo tribunal a quo, deveria ler-se “…, bem como ao cancelamento dos registos efectuados no pressuposto de terem liquidado o antedito mútuo”, alterando os dizeres finais dessa identificação pela parte ora posta em realce.
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-S.m.o., os registos só seriam cancelados no pressuposto do mútuo ter sido liquidado, aliás a liquidação do mútuo é uma forma de cumprimento da obrigação a que os mutuários estavam adstritos.
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-Com o pagamento do mútuo hipotecário, o incumprimento, referenciado na identificação do objeto do litígio feita pelo tribunal a quo, deixa de fazer qualquer sentido, uma vez que que não se pode incumprir um contrato extinto, não vigente, posto que já não produz quaisquer efeitos.
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-Sustentámos, quanto ao facto provado sob 10.º, que a taxa de juros de 28%, não espelha com rigor a taxa de juros aplicada nas contas enunciadas sob 22. e 25; 32. e 34; e, 54. da petição inicial, uma vez que a taxa de juros é superior à indicada, pelo que deveria o teor desse artigo ser retificado nessa conformidade.
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-Esta reclamação foi indeferida porque o tribunal a quo considerou que foi esta taxa que os autores aplicaram na ação que formularam.
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-Porém, a taxa de 28% nunca foi considerada pelos autores ao longo da sua petição inicial.
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-No documento de fls. 54, denominado “nota de débito”, aludido no art.º22.º da petição, verificamos que os juros calculados entre 8/11/82 e 8/3/86, sobre o capital de 1600 contos, à taxa de 28%, não são no valor de 1.537.878$00, mas sim no valor de 1.492.516$32.
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-No art.º 33.º da petição inicial não consideramos a taxa de 28%, quem a considera é a recorrida/CGD.
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-Os juros aí calculados são de 28% sobre 9.634,03 euros, quando o capital mutuado se situou em 7.980,77 euros (na altura, Esc. 1.600.000$00), cfr. o n.º 2- dos factos provados.
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-No art.º 32.º da petição, para onde o art.º 33.º remete, os juros de 8/9/1985 até 9/7/2007 sobre 9.634,03, à taxa de 28%, não se contabilizam em 63.894,19 euros, mas sim em 58.931,76 euros.
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-Os juros de 63.894,19 euros foram calculados pela recorrida a uma taxa de juros de, mais ou menos, 30,36%.
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-Os factos constantes dos art.os 28.º e 54.º da petição inicial, que se baseiam em informações escritas do serviço de finanças, o qual promove a execução em benefício da ré, o teor dos mesmos deveriam ser aditados aos factos provados ou, assim não se entendendo, aos temas de prova.
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-Os autores defenderam, quanto à matéria constante do art.º 32.º da petição inicial - que se baseia numa “nota de débito”, de fls 56, emitida pela própria ré - que o teor do mesmo deveria constar dos factos provados.
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-O tribunal recorrido ao não dar como provada a matéria vertida nesse artigo, não teve em conta factos relevantes para se poder afirmar que a taxa de juros aplicada pela recorrida é superior a 28% e que, além do mais, houve lugar a capitalização de juros, tal como é reconhecido pelo próprio banco recorrido no penúltimo parágrafo do documento emitido pelo banco de fls. 56.
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-Atendendo ao objeto da presente ação, os autores consideram que os factos provados sob 19. a 22. não interessavam...
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