Acórdão nº 15/04.0TBCBR.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelORLANDO NASCIMENTO
Data da Resolução13 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes,do Tribunal da Relação de Lisboa.

  1. RELATÓRIO.

    T. International, SA e T. Investments SA, propuseram contra N.V.D.Snel e outros dez RR, esta ação declarativa, ordinária, pedindo que se declare a resolução dos contratos-promessa com eles celebrados, por incumprimento culposo, que se condenem os RR a entregarem as parcelas de terreno e construções a que se reportam, a indemnização de € 1.000,00 por dia até à sua entrega efetiva e indemnização por todos os prejuízos causados com as suas condutas, a liquidar em execução de sentença.

    Alegam para tanto, em síntese, que celebraram com os RR contratos-promessa de compra e venda de lotes de terreno e chalés, a serem neles construídos, e que a partir de 2001 os RR passaram a considerar-se donos dos lotes e construções, procurando autonomiza-los como prédios urbanos, deixando de cumprir os compromissos assumidos nos contratos e inviabilizando o projeto das AA, referente a empreendimento turístico designado “Aldeia do Almegue”.

    Citados, contestaram os RR, todos com exceção do 7.º, por um lado, e este 7.º, por outro, pedindo, em síntese, a improcedência da ação, a absolvição do pedido e a condenação das AA no pedido reconvencional que formularam, por incumprimento por parte das AA.

    Realizada audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença, declarando a nulidade dos contratos-promessa, condenando as partes a restituírem tudo o que foi prestado em razão de tais contratos-promessa, julgando improcedente a pretensão das AA, absolvendo os réus dos pedidos contra si formulados, mais julgando improcedentes os pedidos reconvencionais formulados pelos RR, deles absolvendo as AA.

    Inconformados com esta decisão, dela recorreram, por um lado a 7.ª R e por outro, todos os restantes RR, pedindo a sua revogação, tendo os recursos sido recebidos como apelação, formulando as seguintes conclusões:

    1. A apelação da 7.ª R.

    1- Entende a douta sentença recorrida que o objecto do contrato-promessa de compra e venda é legalmente impossível, em face do disposto no artº 1376º, nº 1 do Código Civil e na Portaria nº 202/70, de 21 de Abril, uma vez que implica a realização de um destaque de uma parcela de terreno com área inferior à unidade de cultura.

    2- No entanto, a sanção aplicável à infracção das regras de fracionamento de prédios rústicos era, quer à data da celebração dos contratos-promessa quer à data da instauração da acção, a mera anulabilidade, conforme artsº 1376º e 1379º do Código Civil. Ora, a mera anulabilidade não é de conhecimento oficioso (cfr. artº 287º do Código Civil), pelo que a douta sentença recorrida não podia decidir sobre este alegado vício.

    3- Sem prescindir, mesmo que assim não se entenda, a verdade é que não existe nos factos provados qualquer referência aos artigos matriciais onde as casas estão implantadas. Assim, não se sabe se cada casa está implantada num só artigo matricial e qual a respectiva área ou se, pelo contrário, várias casas estão implantadas num único artigo matricial. Com efeito, se cada casa estiver construída num único artigo matricial autónomo, não haverá necessidade de qualquer destaque. Deste modo, não existem factos provados nos autos que permitam concluir que teria de haver um destaque ou que existe uma violação da unidade de cultura ou das regras de fraccionamento de prédios rústicos.

    4- Por outro lado, mesmo que assim não se entenda, a verdade é que existem outras formas legais, para além do destaque, que permitem a implantação de várias casas num único artigo matricial. Com efeito, existe a possibilidade de constituição de uma propriedade horizontal, de um aldeamento turístico ou de um simples loteamento.

    5- Assim, sendo possível a constituição de uma propriedade horizontal, de um aldeamento turístico ou até de um simples loteamento, não existe qualquer impossibilidade originária da prestação. A prestação era por isso possível, embora não o fosse ainda à data da celebração do contrato-promessa.

    6- Acresce que a “legalização” do Almegue é possível, mediante a aprovação pela CM da Sertã de um plano para essa zona, adequado ao espaço e valores em causa e compatível com os planos de ordem superior (cfr. ponto 67 dos factos provados).

    16/20 14 7- Assim, ao não decidir desta forma, violou a douta decisão recorrida o disposto nos artigos 401º, 1376º, 1438º-A, 1376º, 1379º e 287º do Código Civil.

    8- Deste modo, o contrato-promessa é válido (e não nulo), pelo que deve a douta sentença recorrida ser revogada nesta parte.

    9- Sendo o contrato-promessa válido, entende a ora Apelante que o mesmo foi cumprido no que diz respeito ao chalé, tendo havido já transmissão da respectiva propriedade, atentos os factos provados com os nºs 119) a 121), 79) e 33).

    10- Com efeito, decorre deste factos provados que o chalé da 7ª Ré, ora Apelante, é um bem ou coisa móvel, nos termos do disposto no artº 205º do Código Civil.

    Ora, a compra e venda de bens móveis não necessita para a respectiva formalização de qualquer documento, nomeadamente de escritura pública ou de documento particular autenticado (cfr. artº 875 do Código Civil, a contrário).

    11- No presente caso, tratou-se ainda de uma promessa de compra e venda de uma coisa futura (artº 211º do Código Civil), uma vez o chalé ainda iria ser construído, pelo que se deve considerar que a eficácia real foi diferida para o momento da conclusão da construção ou da aquisição da coisa pelo alienante, nos termos do nº. 2 do artigo 408º do Código Civil.

    12- Ora, conforme resulta dos supra referidos factos provados, o respectivo preço foi integralmente pago e o chalé foi construído e entregue à ora Apelante para esta o usar, tendo havido por isso entrega e tradição do mesmo.

    13- Assim, verifica-se que se encontram produzidos os efeitos essenciais da compra e venda, conforme plasmado no artº 879º do Código Civil, pelo que se deve entender que o contrato prometido, nessa parte, foi realizado. Como tal, deve a ora Apelante ser reconhecida como a legítima proprietária do chalé.

    14- Sem prescindir, mesmo que se considere que o contrato-promessa é nulo, como é entendido na douta sentença recorrida, a verdade é que sempre devia haver uma redução do negócio, nos termos do art.º 292º do Código Civil, mantendo-se a validade do mesmo na parte que diz respeito ao chalé e declarando-se o efeito translativo da propriedade do mesmo a favor da ora Apelante, como supra se expôs, atenta a sua natureza de bem móvel.

    15- Ao não decidir desta forma, violou a douta decisão recorrida o disposto nos artigos 205º, 875º, 211º, 408º, 879º e 292º do Código Civil, pelo que deve a mesma ser revogada nesta parte e deve ainda ser declarado que a ora Apelante é a única e legítima proprietária do chalé em causa.

    B) A apelação dos restantes RR.

    1- Entende a douta sentença recorrida que o objecto de cada um dos contratos-promessa de compra e venda é legalmente impossível, em face do disposto no artº 1376º, nº 1 do Código Civil e na Portaria nº 202/70, de 21 de Abril, uma vez que implica a realização de um destaque de uma parcela de terreno com área inferior à unidade de cultura.

    2- No entanto, a sanção aplicável à infracção das regras de fracionamento de prédios rústicos era, quer à data da celebração dos contratos-promessa quer à data da instauração da acção, a mera anulabilidade, conforme artsº 1376º e 1379º do Código Civil. Ora, a mera anulabilidade não é de conhecimento oficioso, pelo que a douta sentença recorrida não podia decidir sobre este alegado vício.

    3- Sem prescindir, mesmo que assim não se entenda, a verdade é que não existe nos factos provados qualquer referência aos artigos matriciais onde as casas estão implantadas. Assim, não se sabe se cada casa está implantada num só artigo matricial e qual a respectiva área ou se, pelo contrário, várias casas estão implantadas num único artigo matricial. Com efeito, se cada casa estiver construída num único artigo matricial autónomo, não haverá necessidade de qualquer destaque. Deste modo, não existem factos provados nos autos que permitam concluir que teria de haver um destaque ou que existe uma violação da unidade de cultura ou das regras de fraccionamento de prédios rústicos.

    4- Por outro lado, mesmo que assim não se entenda, a verdade é que existem outras formas legais, para além do destaque, que permitem a implantação de várias casas num único artigo matricial. Com efeito, existe a possibilidade de constituição de uma propriedade horizontal, de um aldeamento turístico ou de um simples loteamento.

    5- E, de facto, em todos os contratos-promessa é referido que “os direitos do subscritor resultantes do parágrafo (a)1 serão concretizados por meio de uma escritura pública de transferência, de acordo com a legislação portuguesa sobre propriedades aplicável a condomínios” e que “O Almegue será construído como um condomínio, uma forma legal portuguesa de propriedade horizontal comum”.

    6- Na verdade, o artigo 1438º-A do Código Civil, aditado pelo DL 267/94, de 25/10, veio permitir a propriedade horizontal de conjuntos de edifícios, estipulando que “O regime previsto neste capítulo pode ser aplicado, com as necessárias adaptações, a conjuntos de edifícios contíguos funcionalmente ligados entre si pela existência de partes comuns afectadas ao uso de todas ou algumas unidades ou fracções que os compõem”.

    7- Ora, como se encontra provado nos pontos 39) e 40) dos factos provados, “Para além dos chalés e terreno estavam previstos para o empreendimento do “Almegue” equipamentos colectivos tais como recepção, restaurantes, bares, 26/45 23 discotecas, lojas, supermercado, marina e desportos náuticos” (ponto 39) e “Estava igualmente prevista a construção de cerca de 350 casas, divididas em 5 condomínios fechados” (ponto 40).

    8- Deste modo, dúvidas não restam de que se visava a constituição de um condomínio fechado, pelo que se aplicariam as regras da propriedade horizontal e não as regras do destaque, da unidade de cultura e do fraccionamento de prédios...

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