Acórdão nº 3831/15.3T8LRA.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMANUEL RODRIGUES
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I - Relatório: 1. António (…) e mulher, Maria (…), intentaram, em 19/11/2015, no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra o Banco (…), peticionando a condenação do Réu a restituir-lhes a quantia de €103.920,96, acrescida de juros à taxa supletiva legal para as operações comerciais, contados sobre €100.000,00, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.

Para tanto, alegam, em síntese, que tinham aplicado no banco Réu, num depósito a prazo, a quantia de €50.000,00. No entanto, seduzido pela conversa dos funcionários do banco Réu, o Autor marido, subscreveu, em 24 de Outubro de 2004, o boletim de subscrição de uma Obrigação (…) Rendimento Mais 2004, no valor de €50.000,00, que foi colocado à sua frente, já preenchido, limitando-se a assiná-lo, julgando que se tratava de uma variante de um depósito a prazo, só que mais remunerado. Nesse mesmo dia, resgatou o supra referido depósito a prazo e, novamente seduzido pelos funcionários do banco Réu, aplicou a referida quantia na subscrição de uma outra Obrigação (…) Rendimento Mais 2004, no valor unitário de €50.000,00, por endosso de outro cliente do banco, o que fez com base na confiança que tinha na relação bancária estabelecida com os funcionários dos Réu, que lhe afiançaram que se tratava de um sucedâneo de um depósito a prazo, mas com melhor remuneração. Sendo que se soubesse que perdia o controlo do dinheiro, que só poderia ser reembolsado a partir de Outubro de 2014 e se tivesse sido informado das características do produto, nomeadamente “REEMBOLSO ANTECIPADO” e “GARANTIAS E SUBORDINAÇÃO”, nunca teria aceitado efectuar essa operação.

Entretanto, a Sociedade (…), hoje denominada “ G…, SGPS, S.A.” não pagou as obrigações na data do seu vencimento, em 24 de Outubro de 2014, apenas tendo pago os juros semestrais em Outubro de 2014 e em Abril de 2015, após o que apresentou no Tribunal da Comarca de Lisboa em Processo Especial de Revitalização Pretendem, assim ser ressarcidos dos prejuízos sofridos por força da actividade do Réu como entidade bancária e intermediário financeiro, nos termos dos artigos 73º, 74º, 75º e 78º do Regime Geral das Instituições Financeiras e Sociedades de Crédito (doravante RGIFSC), aprovado pelo Dec.-Lei n.º 298/1992, de 31 de Dezembro e dos artigos 304º, , n.º 1 e 312º, n.º 1, do Código dos Valores Mobiliários (doravante CVM), aprovado pelo Dec.-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro.

2. Citado, veio o Réu contestar, por excepção, invocando a incompetência territorial do tribunal, e por impugnação, contrapondo, em substância, que os funcionários do banco Réu agiram sempre de acordo com a vontade expressa pelos Autores - subscrever Obrigações -, tendo explicado as características do produto e que após a subscrição das Obrigações (…) Rendimento Mais 2004, o Autor sempre recebeu um extracto mensal onde lhes apareciam as obrigações em como integrando a sua carteira de títulos, assim como receberam os Autores, semestralmente, a remuneração dos juros dos respectivos cupões, com a indicação de que diziam respeito às Obrigações (…). Foi explicado ao Autor marido que a única forma de liquidar o produto de forma unilateral e antecipada seria transmitindo as obrigações a um terceiro interessado, mediante endosso, dado que o seu reembolso antecipado apenas seria permitido a partir do quinto ano, por iniciativa da (…) e com o acordo do Banco de Portugal. Alegou, ainda, que a responsabilidade pelo pagamento da Obrigação momento do vencimento era da inteira responsabilidade da entidade emitente, no caso, a (…) SGPS, S.A, posto que em momento algum o banco Réu garantiu o pagamento desta emissão de Obrigações. E que a interposição da presenta acção 7 anos após a nacionalização do banco Réu, dez após a subscrição, bem como o facto de os Autores terem aguardado o desenrolar das assembleias de obrigacionistas que se seguiram (sem olvidar o facto da G (…) ter apresentado um PER) para tomar a decisão de tentar obter o pagamento junto do banco Réu demonstra a consciência que os mesmos tinham e têm do produto que subscreveram.

3. Em resposta, os Autores pugnaram pela procedência da excepção dilatória de incompetência territorial invocada e pela subsequente remessa do processo para o Tribunal da Comarca de Lisboa.

4. Por decisão de 07/04/2016 (ref.ª Citius 8125597) foi julgada procedente a excepção de incompetência territorial da Instância Central da Comarca de Leiria, tendo os autos sido remetidos para a Comarca de Lisboa, onde foram distribuídos pela Instância Central – 1ª Secção Cível - J8.

5. No dia 29/09/2016 (ref.ª Citius 358254096), teve lugar audiência prévia, no decurso da qual foi elaborado despacho saneador tabelar, fixou-se o objecto do processo e enunciaram-se os temas da prova seguintes: «1.º - O Réu disse aos Autores que se tratava de um produto sem risco de capital e remunerado através de uma taxa de juros fixa? 2.º - O Réu comprometeu-se perante os Autores a recomprar as obrigações nas datas acordadas, pelo valor da compra, pagando juros pelo período correspondente, à taxa pré-estabelecida? 3.º - O Réu disse aos Autores que as obrigações poderiam ser resgatadas em qualquer altura, tendo esse resgate como consequência uma penalização nos juros? 4.º - Os Autores transmitiram ao Réu que pretendiam um produto sem risco de capital e que pudesse ser resgatado a qualquer altura? 5.º - Os Autores exigiram ao Réu a entrega de documento escrito do qual constassem as condições da aplicação, como sejam o prazo, a rentabilidade e as condições de movimentação? 6 .º - Esta entrega foi omitida ? 7.º - O Réu explicou ao Autor as características do produto, incluindo que a única forma de o liquidar unilateral e antecipadamente seria transmitindo as obrigações a um terceiro, mediante endosso, dado que o seu reembolso antecipado apenas seria permitido a partir do quinto ano, por iniciativa da (…) e com o acordo do Banco de Portugal? 8.º - O Réu agiu de acordo com a vontade dos Autores e com as instruções recebidas dos mesmos? 9.º - Após a subscrição, o Réu enviou mensalmente aos Autores um extracto mensal do qual constavam as obrigações em como integrando a sua carteira? 10.º - A partir do momento da subscrição os Autores receberam semestralmente a remuneração dos cupões das obrigações, com a indicação que de que os juros diziam respeito a estas?» 6. Em 17/03/2017 (ref.ª Citius 364327197) procedeu-se à audiência de julgamento, numa única sessão e com registo das declarações orais nela prestadas.

7. Posteriormente, em 10/04/2017 (ref.ª Citius 364579021), foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, por não provada, absolvendo o Réu do pedido.

8. Não se conformando com esta decisão, dela apelaram os Autores, formulando, no final das suas alegações, as seguintes Conclusões, que se reproduzem: «A. Reputamos, quase como um facto público e notório (sobretudo quando acaba de ser tornado público que (…), o chefe da quadrilha, cabeça da S. e Banco (…) foi condenado a 14 anos de prisão e que (…), o numero dois do Banco o gestor da área financeira da S (…) foi condenado a 8 anos e meio de prisão, ambos pela prática, entre outros, do crime de burla qualificada), o modus operandi do Banco réu nas relações que mantinha com os seus clientes.

B. Tal modus operandi, em ordem ao seu financiamento consistiu, como é do conhecimento comum, em seduzir meros aforradores com produtos financeiros com remuneração superior à comummente praticada por outros operadores financeiros.

C. E, em ordem a esse desiderato, convencerem tais aforradores que os produtos vendidos eram meros sucedâneos de depósito a prazo, mobilizáveis a qualquer tempo, com eventual perda de juros, o que não correspondia á realidade.

D. Foram carreadas para os autos provas inequívocas e irrefutáveis que impunham resposta diversa (a de “não provados”) ao ponto 9 factos provados.

E. O tribunal não procedeu a uma análise crítica das provas, não especificou os fundamentos que forma decisivos para formar a sua convicção e não compatibilizou toda a matéria de facto adquirida e dela não extraiu as presunções impostas por lei ou pelas regras da experiência.

F. Se o produto era garantido pelo Banco, é evidente que o Banco réu garantia o retorno das quantias subscritas com as obrigações (…)! Outra interpretação não pode ser feita.

G.

Os depoimentos de Teófilo (…), José (…) e Renato (…) impunham que o tribunal a quo tivesse dado a resposta de não provados aos factos vertidos no ponto 9 dos factos provados, uma vez que o que se provou sem qualquer sombra de dúvida foi, não que os autores tivessem dado instruções, mas antes que os autores assentiram na transferência de depósitos a prazo para obrigações subordinadas, depois de terem sido enganados sobre as reais características das mesmas.

H.

Os depoimentos de Teófilo (…) e Renato (…), conjugados com o documento n.º 5 da petição inicial, impunham que o tribunal a quo tivesse dado por “provado” que o R. se comprometeu perante os AA. a recomprar as obrigações nas datas acordadas, pelo valor da compra, pagando juros pelo período correspondente, à taxa pré-estabelecida, bem como que o R. disse aos AA. que as obrigações poderiam ser resgatadas em qualquer altura, tendo esse resgate como consequência uma penalização nos juros.

I.

O depoimento de Renato (…), conjugado com os de Teófilo (…) e José (…) impunham que o tribunal a quo tivesse dado por provado que os AA. transmitiram ao R. que pretendiam um produto sem risco de capital e que pudesse ser resgatado a qualquer altura.

J. Deparamo-nos com uma sentença minimalista ou, mais do que isso, redutora, no que toca à apreciação de toda a matéria de facto que lhe coube apreciar.

K. A sentença recorrida deixou de se pronunciar sobre muitos factos, importantes para a descoberta da verdade e para a boa decisão da causa, não os elencando nos factos...

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