Acórdão nº 3415/08.2TVLSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelANA PAULA CARVALHO
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 6ª Seção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO 1.1. M. E. M. P. R. P., residente na R…; J. M. P. R. P., residente na Rua…, e A. M. P., residente na Alameda…, intentaram acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra O. – Organizações Hoteleiras, SA, com sede na Rua…, Lisboa, peticionando que seja decretada a resolução do contrato de arrendamento e o despejo imediato da Ré.

Para tanto, alegam, em síntese, que por contrato de arrendamento celebrado por escritura pública de 12/03/1969, lavrada no 19º Cartório Notarial de Lisboa, os 2º e 3º autores e seu Pai, António José Rodrigues, deram de arrendamento à Ré o prédio urbano então em vias de acabamento, situado em Lisboa na Rua Castilho, nº 74. Ficou convencionado na escritura de arrendamento que o prédio era destinado a nele ser explorado um hotel, podendo nele ser exercidas quaisquer actividades normalmente consideradas como complementares da indústria hoteleira. Os senhorios garantiram no contrato de arrendamento que o prédio arrendado estava construído de modo a nele poder funcionar um hotel considerado de utilidade turística prévia com classificação de primeira A., no respeito e observância da legislação então em vigor.

Nos termos do contrato de arrendamento, a Ré inquilina ficou obrigada a instalar e manter no prédio arrendado os seus serviços por forma a que fossem confirmadas – como foram – a utilidade turística e a categoria do hotel como de primeira A.

Em 28/10/2002, a Câmara Municipal de Lisboa realizou uma vistoria, através da Comissão de Vistoria da Zona Central, nos termos do disposto no art. 26º do DL 167/97 de 04/07/1997, ao edifício locado, na sequência de requerimento do 3º autor em que pediu a emissão de alvará de licença de utilização. (Proc. 1756/PGU/2002). E o referido A. fê-lo em acto de boa vontade e sobretudo no interesse da inquilina, convencida da sua legitimidade para tal e que os serviços lhe vieram negar.

Efectuada a vistoria, concluiu-se pela existência de várias vicissitudes da responsabilidade da Ré. Pese embora a abertura de processo administrativo camarário 430/EDI/2008 (aliás com o hotel limitado a obras de conservação e não de alteração), a verdade é que a ré inquilina tem vindo a incumprir desde 2002, com comportamento continuado, o disposto nas cláusulas 7ª e 8ª do contrato de arrendamento.

E a Ré, sem qualquer acordo dos autores, deixou de fornecer refeições no hotel, o que determinou que a própria ré requalificasse o hotel em mero hotel residencial. Tal incumprimento tem posto em risco a continuação do funcionamento do hotel, como se mostra das informações constantes dos processos administrativos graciosos referidos neste articulado.

Situação que tem vocação positiva para desvalorizar o próprio edifício locado, o que já aconteceu pelas reduções sucessivas do preço por que os autores, ao longo deste lapso de tempo de seis anos, têm querido vender o edifício.

Na contestação, a ré invoca que os AA. formulam o pedido de resolução do contrato de arrendamento a que se referem os autos e a consequente condenação da Ré ao despejo imediato do prédio dado de arrendamento, nos termos do art.º 1083 do Código Civil (na redacção da Lei n.º 6, de 27 de Fevereiro de 2006), com fundamento na alegada inobservância do disposto nas cláusulas sétima e oitava do contrato de arrendamento junto. Os AA. afirmam que “a ré inquilina tem vindo a incumprir desde 2002, com comportamento continuado, o disposto nas cláusulas 7ª e 8ª do contrato de arrendamento”, limitando-se a descrever o processo administrativo que, “sobretudo no interesse da inquilina”, desencadearam junto da C.M.L., com vista à obtenção da Licença de Utilização Turística, e que não tem qualquer relação com o alegado fundamento do pedido de resolução do contrato.

Atente-se, antes de mais, nas referidas cláusulas do contrato de arrendamento, cujo teor se transcreve: “Sétima: A inquilina obriga-se a instalar e a manter, no prédio arrendado, os seus serviços por forma a que sejam confirmadas a utilidade turística e a categoria de primeira A, já reconhecidas oficialmente para o estabelecimento hoteleiro que no mesmo prédio funcione.” Após a celebração do contrato de arrendamento foi alterada a terminologia da classificação dos hotéis (a que se refere a cláusula sétima supra transcrita) e que o “Hotel D. ” foi reclassificado automaticamente, como Hotel de 1ª classe A, por via do D.L. n.º 49.329/69, de 24 de Novembro, em Hotel de 4 estrelas. Ao contrário do que afirmam os AA. na petição inicial, a Ré não tem vindo a incumprir, desde 2002, com comportamento continuado, a mencionada obrigação contratual, pois, na presente data, o Hotel D. É UM HOTEL DE 4 ESTRELAS. Facto que se poderá constatar pela notificação do Turismo de Portugal, de 17 de Abril de 2008, do despacho do Sr.º Vogal do Conselho Directivo de 02/04/2008, onde consta que, leia-se: “…foi reclassificado definitivamente o empreendimento como Hotel Residencial, com a categoria de 4 estrelas, nos termos do n.º 1 do artigo 36º do D.L. n.º 167/97, de 4 de Julho”.

Diz-se também, na mesma comunicação do Turismo de Portugal, que “em resultado duma vistoria realizada em 21.01.2004, …a unidade dispõe de bons padrões de qualidade e oferece um aspecto geral e ambiente confortáveis, compatíveis com a classificação de hotel de 4 estrelas” .

Nos termos do número dois da cláusula 8ª do contrato de arrendamento, a Ré não tinha de pedir autorização aos AA. para encerrar o restaurante, estando apenas obrigada a manter, repita-se, a categoria do hotel, como hotel de 4 estrelas.

Em segundo lugar, a Ré não podia, nem pode requalificar o Hotel D., como afirmam os AA. na petição inicial, competia-lhe, apenas, apresentar o pedido de reclassificação do Hotel, junto da entidade competente para o efeito, o que fez em 30 de Abril de 2004.

Finalmente, importa esclarecer que o termo “Residencial” não tem qualquer relação com a definição legal da categoria dos hotéis, utilizando-se na denominação do estabelecimento para distinguir se o hotel dispõe ou não do serviço de restaurante.

Em relação à preocupação que os AA. manifestaram com a desvalorização do prédio e com as reduções sucessivas do preço por que têm querido vender o edifício, factos que não constituem fundamento para a resolução do contrato de arrendamento, cumpre fazer um reparo.

Donde, não se alcança qual a relação que os AA. entendem existir entre o fundamento de resolução invocado - desclassificação do estabelecimento hoteleiro - e o processo administrativo iniciado na Câmara Municipal de Lisboa, por sua iniciativa, com vista à obtenção da L.U.T.

O pedido de emissão da licença de utilização turística, apresentado na Câmara Municipal de Lisboa, deu lugar à vistoria que ocorreu em 28 de Outubro de 2002, tendo os AA. sido notificados do respectivo auto, pela C.M.L, no dia 27 de Janeiro de 2003, data essa que omitem, quando juntam cópia do auto de vistoria, sob documento n.º 4 da petição inicial, suprimindo a folha de rosto da notificação.

Na mesma notificação, foi-lhes concedido um prazo de 90 dias para entrega de projecto de alterações, para adaptar o hotel à legislação em vigor. (cfr. Doc. n.º 8 junto à contestação).

Impõe-se uma questão: Se os AA., após a leitura do auto, estavam tão convictos de que “as alterações propugnadas na vistoria ….são da exclusiva responsabilidade da ré, como decorre das cláusulas 7ª e 8ª do contrato de arrendamento” (art.º 13º da P.I.), não seria acertado enviar uma cópia do auto à ora Ré para que esta tomasse conhecimento do seu conteúdo. Bem como comunicar à Câmara que a execução das alterações previstas no auto de vistoria era da responsabilidade da Ré e que, por isso, era à ré que a Câmara deveria notificar para apresentação do projecto de alterações.

Isto, evidentemente, em conformidade com o cenário apresentado pelos AA. na petição inicial, de que todas as iniciativas que tomaram foram sempre, é claro, no interesse da Ré.

Ao invés, em 26/05/2003, requerem prorrogação do prazo, por um período de 180 dias, para apresentação do projecto de alterações, sendo completamente falso que apresentaram tal requerimento a pedido da Ré, até porque a Ré ignorava a sua existência até à notificação da C.M.L. de 24/05/2004, mencionada infra no art.º 54º.

Além de que, estava em curso uma outra acção de despejo, a que os AA. convenientemente se esqueceram de fazer referência, e, por isso, interessava-lhes manter a Ré na ignorância, na expectativa de, quem sabe, vir a ser decretado o despejo.

A Ré deduziu dois pedidos reconvencionais nos termos dos quais peticionou a condenação dos AA. a assinarem a credencial, e a realizarem as obras de conservação da fachada do prédio onde se encontra instalado o Hotel D..

Para o efeito alegaram que os AA. deveriam ter assinado a credencial que a Ré lhes enviou em 29/12/2008, sobretudo porque se trata de uma obrigação que assumiram no contrato de arrendamento outorgado por escritura pública de 12 de Março de 1969, e que decorre da sua cláusula 8ª. Configurando tal recusa, por isso, incumprimento do contrato de arrendamento, obstando, desse modo, a que a esta última possa realizar as obras.

Por outro lado, a inércia dos AA. perante os vários avisos da Ré acerca do estado da fachada do imóvel onde se encontra instalado o Hotel D., impõe que seja o tribunal a intimá-los para executar as necessárias reparações.

Dos termos conjugados dos n.ºs 1 e 2 do art.º 1111º do Código Civil resulta que, quando o contrato de arrendamento é omisso relativamente à obrigação de realização de obras de conservação, cabe ao senhorio executá-las.

E as aludidas obras são, nos termos da lei, obras de conservação.

Por conseguinte, e uma vez que o contrato de arrendamento em apreço é omisso quanto à responsabilidade de execução das referidas obras de conservação, deverá o T. impor aos AA. a sua execução.

Mais peticionou a condenação dos Autores como litigantes de má-fé, em quantia certa...

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