Acórdão nº 4451/05.6TCLRS.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2018
Magistrado Responsável | ANA PAULA CARVALHO |
Data da Resolução | 08 de Março de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na 6ª Seção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO MC, residente da Rua X, em Caneças, intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra AR residente na Rua Y, Oeiras, alegando, em síntese (e com relevo para a pretensão deduzida), que viveu em união de facto com o R. e que na vigência dessa união A. e R. adquiriram pelo preço global de € 65.000,00 duas fracções autónomas num empreendimento sito em Sesimbra, correspondentes a fracção habitacional e a garagem, que o casal veio mais tarde a vender pelo valor global de € 84.795,64, tendo recebido a título de sinal a quantia de cerca de € 25.000,00 e aquando da escritura de compra e venda recebido um cheque no valor de € 59.855,78 que foi depositado numa conta da titularidade de A. e R. Acontece que aquando da separação o R. procedeu à transferência do valor de € 80.000,00 daquela conta de ambos para uma sua conta pessoal.
Na contestação, o réu alega que custeou diversas obras na casa de habitação da A. na qual o casal residiu e que procedeu à aquisição de diversos bens móveis de que esta ficou a beneficiar aquando da separação (factos dos quais não retirou quaisquer consequências em sede de eventual pedido), e relativamente ao pedido contra ele deduzido, no essencial, admitiu ter efectuado a transferência dos € 80.000,00 a que a A. alude porquanto os imóveis de cuja venda a A. pretende receber o correspondente a metade foram adquiridos exclusivamente com capital seu, e por isso entende não ter que proceder à divisão do valor realizado com aquela venda. Concluiu pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido, e pela condenação da A. como litigante de má fé, em multa e em indemnização não inferior a € 2.500,00.
Após vicissitudes várias, e tendo o Réu falecido na pendência da acção, foram habilitadas como suas sucessoras, para prosseguirem os ulteriores termos da causa, a sua cônjuge e as suas filhas (cfr. sentença proferida a fls. 139 ss. do apenso).
Dispensada a realização de audiência prévia, foi elaborado o despacho saneador que se encontra a fls. 200 ss., no qual foi definido o objecto do litígio e fixados os temas de prova sem que tenham sido objecto de reclamações.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e foi elaborada a sentença que julgou a acção procedente e, em consequência, condenou as RR. (habilitadas para prosseguirem os termos da causa na posição primitivamente ocupada pelo R. AR), a pagarem à A. a quantia de € 37.602,18 acrescida de juros de mora à taxa legal (juros civis) vencidos desde 20/02/2003 até à data de hoje no montante de € 21.294,20, bem como dos vincendos até efectivo e integral pagamento.
* Não se conformando, as rés ER e SR apresentaram recurso de apelação, pugnando pela revogação da sentença “a quo” e sua substituição por acórdão que julgue totalmente improcedente a ação.
A apelante ER formula as seguintes conclusões das alegações de recurso: «a) A Autora nenhum valor despendeu na aquisição do imóvel.
b) A Autora vivia com o pai da ora recorrente.
c) A Autora não possuía rendimentos de trabalho para fazer face a qualquer despesa mas sobretudo para adquirir imóvel.
d) Mas, mesmo que tal tivesse ocorrido, que não ocorreu, duas outras questões se levantam: 1) A Autora declarou na venda que recebeu o dinheiro, donde se poderá concluir que não pode vir agora reivindicar esses valores.
2) Se assim não tivesse sido, enquanto viveu com o pai da Recorrente usou e fruiu desse valor.
e) O que faz com que não possa ter a menor possibilidade de reivindicar nada.
f) Quando a A. sabe que o bem só esteve em seu nome por questão pessoal do pai da recorrente nada mais.
g) Acresce ainda que a prova carreada para os autos, foi mal analisada salvo melhor opinião, pois os extractos bancários e os movimentos financeiros provam o que a recorrente menciona.
h) Pelo que só poderia haver uma decisão que será certamente que V. Exas. irão proferir de absolvição da ora recorrente no pagamento do valor a que foi condenada e dos juros.
Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente, suprirão, deve a presente Apelação ser julgada procedente, alterando-se a resposta à matéria de facto e, em consequência, julgando-se a acção improcedente in totum, desta forma se fazendo, JUSTIÇA!.» * Por sua vez, a apelante SR apresenta as seguintes conclusões: 1. A A . e R viveram união de facto entre 7 Dezembro e 22 Fevereiro 2003; 2- Dado assente que A e R, por escritura publica datada de 20 de Janeiro de 1999, a A e R declararam comprar o imóvel de Sesimbra mas incorrectamente julgado por incapacidade de apuramento da proveniência do dinheiro para a aquisição do imóvel identificado em 2 dos factos provados da Douta sentença, e por consequência total impossibilidade de saber a titularidade das contas e propriedade dos dinheiros no 2º semestre do ano de 1998 e no mês Janeiro de 1999.
3- Por escritura publica datada de 17 Abril de 2002 a A e o R declaram vender a MB , que declarou comprar pelo preço de setenta e nove mil oitocentos e sete euros e noventa e oito cêntimos , a fracção designada pelas letras AD a que corresponde a habitação 82, segundo piso, corpo K, registada a aquisição a favor dos vendedores na conservatória Registo Predial Sesimbra.
4- No dia da Escritura referida em C (supra 3) A e R receberam um cheque no valor de 59855.78 euros.
5-O cheque referido em E. (supra 5) foi depositado na conta bancaria nº TT do Banco Nacional de Crédito, cujos titulares eram o A e o R.
6- Por escritura pública datada de 13 de Janeiro de 1999, o R AR declarou vender a JS que declarou comprar pelo preço de doze milhões e quinhentos mil escudos, a fracção autónoma designada pela letra C, corresponde ao r/c direito do prédio urbano sito EE do Estoril , concelho de Cascais, descrito CRP Cascais sob o nº 972 da freguesia do Estoril e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 6023.
7- A Douta Sentença não respeitou e nem permitiu às Rés, a mesmas armas e de forma a exercer o contraditório, coartando a possibilidade das Rés de provar que o dinheiro era só do falecido Reu pai da ora aqui recorrente , ou seja, as contas bancarias e movimentações desde ano 1993 até ano de 2002 , e opta ter a base e fundamento da decisão judicial na prova que o réu não conseguiu produzir.
8- A Autora não faz prova nenhuma da compropriedade relativamente à partilha das despesas e encargos, não faz prova nenhuma da sua comparticipação na aquisição dos bens imóveis.
9- Não foi feito o levantamento do sigilo bancário relativamente aos Bancos Caixa Geral de Depósitos e Banco Millenium BCP, apesar de solicitado atempadamente, e devido a isso também não conseguimos quantificar quais os rendimentos e dinheiros da autora à data dos factos e qual a sua comparticipação.
O levantamento do sigilo bancário junto CGD e BCP era meio probatório essencial para o apuramento e clarificação da titularidade e propriedade dos dinheiros junto da Banca e a omissão dessa prova configura um erro crasso na apreciação da prova.
10- A nulidade da sentença por falta e insuficiente fundamentação e insuficiente e total falta de elementos de prova e falta de exame crítico.
11- A Douta Sentença cinge-se de forma restritiva a somente a fazer a fundamentação da não prova, onde invoca e remete tal argumentação para as duas escrituras e para a certidão e nada mais resulta da Douta Sentença. Pergunta-se, Onde é que a Douta Sentença faz a prova? 12 - Veja-se que a mesma refere de forma peremptória que foi transferido o dinheiro de uma conta para outra conta, mas não indica nenhuma prova desse facto na Douta Sentença e nem junta sequer qualquer documento comprovativo do alegado.
13- A Autora alega o facto de ter vivido com o Réu AR porém não faz qualquer prova que tenha contribuído com dinheiro seu na aquisição do referido imóvel o qual vem agora reclamar metade do dinheiro.
14 - As Rés e ora recorrente provaram que o dinheiro para a compra do imóvel em apreço saiu do trabalho e esforço do seu pai e do produto da venda do prédio do Estoril nada despendendo a Autora para a compra do mesmo.
15- O processo de partilhas entre o Pai da Recorrente e a sua mãe estava em curso, facto esse que caracteriza a posse precária e fragilizada que a Autora detinha sobre o referido imóvel.
16- A Douta sentença condenatória peca por falta de objectividade e falta de fundamentação centrando o seu alvo de atenções na Recorrente Ré e demais Rés, fazendo crer que obtiveram benefícios do produto da venda desse imóvel quando na verdade nenhuns benefícios tiveram.
17-A Autora recebeu a parte que lhe seria devida eventualmente, sem que tenha contribuído para tal, pois não trabalhava não auferindo rendimentos; posteriormente á venda desse imóvel gozou do dinheiro da venda.
18- A prova tem de ser feita com base nos documentos, num exame critico dos factos, uma prova firme e concreta baseada em todos os elementos feita em audiência de julgamento.
19-A Douta Sentença padece de falta de fundamentação da prova e como tal nulidade da sentença uma vez que não se conseguiu apurar de forma plena se existiam contas e movimentos relativos ao Falecido e à Autora nos Bancos Caixa Geral de Deposito e Banco Espírito Santo por os mesmos se escudarem no sigilo...
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