Acórdão nº 2043/16.3T8SNT.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelCRISTINA NEVES
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

RELATÓRIO: MF, divorciada, residente na Rua P.I.A., nº..., ...º ..., 2...-1..., Q..., requereu Processo Tutelar Comum para o exercício do Direito de Visita de sua neta MV, contra ES, residente na Rua Dr. X em 2830-080 Barreiro.

Para o efeito, alegou ser avó paterna da menor MV, nascida em 27/06/2013, filha da requerida e de JV, encontrando-se privada de contactos com a menor desde a data em que a mesma completou um ano de vida, mantendo a partir daí apenas contacto telefónico com a requerida até Junho de 2014, data em que a mesma deixou de atender as chamadas telefónicas da requerente e de responder aos SMS desta, impedindo-a de visitar a menor.

* Designado dia para conferência, não foi possível o acordo, sendo ordenada a notificação da requerente e dos requeridos para alegações, tendo a requerida mãe da menor, vindo alegar que o pai da menor não vê a menor praticamente desde o seu nascimento, que contraiu matrimónio com PP, tendo dois filhos deste casamento, sendo intenção do seu marido adoptar a Maria, que esta encara como seus avós os pais deste seu marido e conclui alegando que a “pouca idade, a falta de maturidade e de capacidade de discernimento e as actuais circunstâncias de vida da menor, para quem a família biológica paterna é estranha, não autoriza seja atendida, neste momento, a pretensão da requerente, que deverá, assim, improceder.

” Foi realizada audição técnica especializada, conforme relatório junto de fls. 70 a 72.

Após, designado julgamento nos autos, veio a ser proferida decisão nos seguintes termos: “Em face de todo o exposto, e nos termos do artigo 1887.º-A do Código Civil, decido estabelecer o regime de contactos pessoais entre a requerente e avó paterna da menor, MF relativamente à menor MV da forma seguinte: 1.º -A menor MV, deverá conviver com a avó paterna MF, numa fase inicial de seis meses, contados desde o início efectivo desses contactos, pelo menos uma vez por mês, em dia, hora e local a combinar entre a avó paterna e a mãe da menor, durante pelo menos duas horas, com a presença da mãe ou de alguém de confiança da menor, e, em caso de desacordo quanto ao referido dia e hora, desde já designa o segundo Domingo de cada mês, entre as duas e as quatro horas da tarde; 2º.

-Caso a Requerida recuse ou por qualquer forma dificulte o início ou a continuação desses contactos por mais de um mês, a menor MV, deverá conviver com a avó paterna MF, numa fase inicial de seis meses, contados desde o início efectivo desses contactos, pelo menos uma vez por mês, durante pelo menos duas horas, com a intervenção de técnico especializado a mediar e supervisionar esses convívios, nos moldes e termos a definir pelo CAFAP-NOS, nos termos do artigo 40º nº. 3 e 6 do RGPTC.

  1. -Após o referido período de seis meses referidos em 1º ou 2º, a menor conviverá com a requerente, uma vez por mês, em dia de fim-de-semana (Sábado ou Domingo), a combinar entre a Requerente e a Requerida, devendo a requerente providenciar por ir buscar a menor à casa da requerida, às dez horas da manhã e indo entregá-la no mesmo local depois do jantar (nunca depois das vinte e uma horas), em caso de desacordo quanto ao dia de fim-de-semana em que ocorrerão tais contactos, desde já se fixa o segundo Domingo de cada mês; 4.º -Após o período de seis meses referido em 1º ou 2º, a menor deverá ainda estar com a avó paterna no dia de aniversário desta, desde que este não coincida com as obrigações escolares semanais da menor, indo a requerente buscar a menor a casa da requerida às dezasseis horas ou após o termo das actividades escolares da menor e indo entregá-la no mesmo local, pelas vinte e um horas e trinta minutos, caso o dia seguinte seja dia útil e pelas vinte e duas horas e trinta minutos, caso o dia seguinte seja feriado ou véspera de fim-de-semana; 5.º -Após o período de seis meses referido em 1º ou 2º, a menor deverá ainda estar com a avó paterna num dos dias compreendidos entre os dias 22 a 25 de Dezembro de cada ano, devendo a requerente ir buscar a menor a casa da requerida, após o almoço desse dia (pelas catorze horas e trinta minutos) e indo entregá-la a casa da requerida após o jantar (pelas vinte e uma horas e trinta minutos); 6.º -Após o período de seis meses referido em 1º ou 2º, a menor deverá ainda estar com a avó paterna num dos dias compreendidos entre os dias 29 a 31 de Dezembro e entre a Sexta-Feira Santa e o sábado anterior ao Domingo de Páscoa de cada ano, devendo a requerente ir buscar a menor a casa da requerida, após o almoço desse dia (pelas catorze horas e trinta minutos) e indo entrega-la ao mesmo local, após o jantar (pelas vinte e uma horas e trinta minutos); 7.º -A requerente e a requerida poderão ajustar qual o dia em que os contactos nos períodos de Natal, Ano Novo ou Páscoa terão lugar mas, na falta de acordo, os mesmos ocorrerão no primeiro dia fixado para cada um dos períodos; 8.º -Após o período de seis meses referido em 1º ou 2º, a menor deverá ainda estar com a avó paterna no dia dos avós (26 de Julho), desde que este não coincida com as obrigações escolares semanais da menor; em caso de coincidência, a avó paterna deverá ir buscar a menor a casa da requerida, após o termo das actividades escolares e indo entrega-la no mesmo local após a hora do jantar, pelas vinte e uma horas e trinta minutos, caso o dia seguinte seja dia útil e pelas vinte e duas horas e trinta minutos, caso o dia seguinte seja feriado ou véspera de fim-de-semana; * Vencida na pretensão deduzida, são devidas custas, a cargo da requerida (artigo 527º nos 1 e 2 do Código de Processo Civil).

Fixo como valor da causa trinta mil euros e um cêntimo (artigo 303º n.º 1 do C.P.C.).” * Notificado da sentença, não se conformando com a decisão, dela apelou a requerida ES, formulando no final das suas alegações, as seguintes conclusões: “1.ª -A sentença recorrida parte para a determinação do regime de visitas entre avó e neta após definir, em abstracto, o conteúdo do direito de convívio entre ambas e analisar o que entendeu por pressupostos justificativos do impedimento dos contactos, sem atentar em questões tão melindrosas quanto o facto da neta desconhecer a existência do pai e da avó biológicos, de ser ignorada pelo pai, de estar integrada numa família onde o papel do pai e dos avós paternos tem sido substituído por pessoas que agem como pai e avós, aceites pela menor, num ambiente familiar sólido e estável.

  1. -A decisão do tribunal a quo enfatiza o conceito de família como um conjunto de laços de parentesco e não como um grupo de afinidade, baseado na convivência e proximidade dos seus membros, denotando uma empatia pela figura da avó e o que a mesma tipicamente representa, sem explicar, nas circunstâncias concretas das vidas desta avó e desta neta, absolutamente desligadas de afectos, em que medida a primeira, introduzindo-se num ambiente familiar estruturado que a ignora, poderá contribuir para o desenvolvimento emocional e equilibrado da menor.

  2. -O artigo 1887.º-A do Código Civil conota-se essencialmente com comportamentos que comprometam ou conduzam ao rompimento de laços afectivos que sempre existiram, por factos supervenientes estranhos a relações familiares consolidadas, como é o caso das relações entre avós e netos ou entre irmãos na sequência de divórcio ou separação dos pais.

  3. -A apelante considera que há alguma ligeireza na análise da sentença recorrida, porquanto concede implicitamente à requerida as capacidades, qualidades ou atributos da avó conceptualizada, nada havendo no processo sobre a personalidade e hábitos da requerente que suportem a confiança que o tribunal a quo nela consagra e o incompreensível regime de visitas que estabeleceu.

  4. -A sentença recorrida compromete a superioridade do interesse da criança ao não apreciar adequadamente as actuais circunstâncias de vida da menor, inserida em meio familiar definido e estável, sem quaisquer referências ao pai biológico e à mãe deste, ora requerente.

  5. -Com efeito, a sentença recorrida incidiu a sua análise sobre o papel da avó e os benefícios da relação avó-neta, mas em abstracto, fazendo, no decisório, prevalecer o interesse da avó sobre o da neta, desacautelando as concretas vantagens que, para a criança, no contexto especialíssimo em que vive, poderiam advir desta nova relação.

  6. -A razoabilidade da pretensão da requerente teria obrigatoriamente de ser aferida por dois aspectos fundamentais, que o tribunal a quo descurou: – o primeiro, a maturidade e capacidade de discernimento da criança para, com quatro anos de idade, perceber a diferença entre o pai afectivo e o pai biológico, entender e dominar o sentimento de rejeição paterna e introduzir no seu mapa familiar, por imposição de uma realidade que lhe é estranha, o tribunal, um elemento, a avó biológica, que será pouco mais do que uma ficção, por lhe ser desconhecida e estar desligada da figura do pai; – o segundo, tendo a criança alcançado essa maturidade, capacidade de...

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