Acórdão nº 5/12.9TBPTS.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelISABEL FONSECA
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa. I.

–RELATÓRIO: //////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////// Ação Declarativa comum.

***************************** Autor D... e mulher F...

Réu B.

- Companhia de Seguros, SA, posteriormente denominada de G. – Companhia de Seguros SA.

//////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////////// Pedido.

Que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de 86.599,97€, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, contados a partir de 23.04.2010 até efetivo e integral pagamento.

Causa de pedir.

Encontra-se atualmente descrito na Conservatória do Registo Predial da Ribeira Brava, sob o nº ..., da freguesia do Campanário, um prédio rústico, inscrito na matriz sob o artigo ..., com inscrição de aquisição por doação a favor do autor, prédio esse que, após a construção pelos autores de moradia na respetiva parte este, passou a constar também inscrito sob o artigo matricial ..., da freguesia do Campanário, concelho da Ribeira Brava, quanto à parte urbana; o prédio dos autores é atravessado pela Estrada Regional 101, sensivelmente no sentido norte-sul, situando-se uma parte do prédio a este, com a área de 470m2, na qual foi edificada a aludida construção, e a outra parte a oeste, com a área de 654m2, que lhe serve de logradouro, da dita Estrada Regional 101.

Tendo em vista a construção no identificado prédio rústico de uma moradia, os autores, outorgaram escritura pública de mútuo com hipoteca, no dia 26/10/2007, no Cartório Notarial da Ribeira Brava, contraíram empréstimo bancário junto do Banco..., S.A., no montante de 150.000,00 euros; para caução e garantia de todas as responsabilidades assumidas nos termos do aludido mútuo, os Autores constituíram hipoteca a favor do referido Banco sobre o prédio rústico, hipoteca essa que, nos seus próprios termos, incide sobre o “prédio rústico, com a área de mil cento e vinte e quatro metros quadrados, localizado no sito do Tranqual, freguesia do Campanário, concelho da Ribeira Brava, inscrito na matriz sob o artigo ... (…), e descrito na Conservatória do Registo Predial da Ribeira Brava sob o número ..., daquela freguesia.

Previamente à concessão do mútuo com hipoteca, um técnico daquele Banco deslocou-se ao prédio dado de hipoteca, observando-o, vistoriando-o e inspecionando-o tal como ele efetivamente é, designadamente em termos de configuração, não podendo deixar de verificar e constatar que o mesmo é atravessado pela referida Estrada Regional 101, estrada Regional essa que, como é do conhecimento geral, existe seguramente há mais de 30 anos.

Atento o facto do prédio dos autores se situar numa encosta de acentuado declive, e de modo a impedir a erosão do solo e a suportar as terras sobrantes do desaterro necessário à implantação da aludia moradia, imediatamente antes de iniciarem a construção, os autores erigiram à volta do mesmo um muro de vedação e de contenção de terras, o qual, em toda a extensão oeste do prédio, com cerca de 30m de comprimento, atinge cerca de 11,5m de altura, diminuindo gradativamente nas respetivas estremas norte e sul do mesmo.

Não obstante o contrato de seguro haver sido celebrado com a ré, é um produto comercializado pelo Banco ..., S.A., beneficiário da hipoteca sobre o imóvel dos autores; a moradia foi edificada pelos autores no seu identificado prédio ao longo do ano de 2008, tendo previamente os autores, em 25/10/2007, celebrado contrato de seguro com a ré, denominado Seguro ... Casa, titulado pela apólice ...

Tal contrato de seguro inclui várias e enunciadas coberturas; os autores vieram, posteriormente, a alterar o referido contrato de seguro, através da subscrição da designada fórmula Maxi, titulado pela mesma identificada apólice, o qual, para além das identificadas coberturas atinentes a tempestades, inundações e demolição e remoção de escombros, que se mantiveram, passou a abranger outras coberturas suplementares; tal contrato de seguro, desde o seu início, vem sendo anualmente prorrogado, sendo que os autores sempre pagaram o respetivo prémio; conforme resulta das “Condições Especiais” do referido contrato de seguro, a cobertura base do seguro cobre os danos do edifício, nomeadamente nos muros de vedação que o integram, resultantes em consequência direta designadamente de inundações provocadas por trombas de água ou queda de chuvas torrenciais; parte do valor do empréstimo contraído pelos autores foi destinado à construção o referido muro de vedação e de suporte de terras e, aquando da contratação do seguro, foi dito aos autores que “ficava seguro”.

Em 20/02/2010, por volta das 08h00m, começou a chover torrencialmente, cuja precipitação atmosférica atingiu elevada intensidade, certamente superior a 10 milímetros em dez minutos de pluviómetro, tendo a água da chuva rapidamente inundado o prédio dos autores, escorrendo velozmente para a parte do terreno situada a jusante da referida estrada, formando diversas trombas de água, as quais incidiram sobre o referido muro de vedação do prédio dos autores, concretamente em toda a zona oeste e parte da zona sul, provocando-lhe grandes fendas e desmoronando-o parcialmente na sua extrema a sul; o muro ficou danificado, deixando de garantir segurança ao prédio dos autores.

Em 19/03/2010, os autores participaram o ocorrido ao seguro, junto da agência do Banco ... da Ribeira Brava; a ré, no dia 23/03/2010, fez deslocar ao local um técnico, o qual, após verificar o estado em que o muro se encontrava, elaborou relatório no qual assinalou e requereu aos autores que apresentassem “Orçamento de reparação/substituição/reconstrução devidamente discriminado por tipo de trabalho, áreas, etc. e respectivos custos apurados”; os autores solicitaram três orçamentos, cujos valores necessários para a reconstrução parcial do aludido muro variavam entre € 79.090,00 e € 82.439,10, IVA não incluído, orçamentos que apresentou e entregou à ré.

Por carta datada de 04/08/2010, a ré veio a declinar qualquer indemnização; dada a urgência de proteção e segurança do imóvel em causa, associada à necessidade de cumprimento de injunção camarária, os autores, porque os aludidos orçamentos não se mantinham, ou não se encontrando disponíveis as respetivas empreiteiras, solicitaram novo orçamento a uma outra empreiteira, concretamente a sociedade C... - Sociedade de Construção Civil, Lda., tendo em vista a reconstrução do muro, tendo a mesma apresentado o orçamento pelo valor de 74.655,15€ quantia essa que, acrescida do IVA à taxa em vigor de 16%, ascende ao montante total de € 86.599,97, 2.

Os autores adjudicaram a obra a essa empreiteira, obra que já está concluída.

Oposição.

A ré impugna alguns dos factos alegados pela autora; o muro danificado encontra-se numa parcela de terreno que não pertence ao objeto do contrato de seguro pelo que a ré não é responsável pela reparação; o valor peticionado para reparação dos trabalhos é excessivo; deve ser deduzida a franquia de 145,00€ alusiva ao custo de “demolição e remoção de escombros” que está limitado ao capital de 3.000,00€.

Réplica.

Replicaram os autores, reiterando o alegado na petição inicial e reduzindo o pedido para o montante de 86.454,97 euros, em virtude da franquia prevista no contrato de seguro, que aceitam.

Saneamento.

Foi dispensada a realização da audiência prévia, procedeu-se à prolação do despacho saneador, que considerou não escritos alguns artigos da réplica, admitiu a redução do pedido e declarou a instância válida e regular, bem como de despacho que identificou o objeto do litígio e enunciou os temas de prova.

Julgamento.

Procedeu-se a julgamento após o que se proferiu sentença, em 14-03-2016, que concluiu como segue: “Por todo o exposto decide-se julgar a presente ação totalmente procedente e, em consequência, condenar a ré a pagar à autora a quantia de 74.510,15 euros, a que acresce IVA, acrescida de juros, à taxa legal de 4%, contados desde 23.04.2010, até efetivo e integral pagamento.

* Custas pela ré.

Registe e notifique”.

Recurso.

Não se conformando a ré apelou, formulando as seguintes conclusões: “I.

– Na presente lide, a ora Recorrente foi condenada pelo Tribunal a quo no pagamento aos AA. do montante de €74.510,15, acrescido de IVA e juros à taxa legal de 4% contados desde 23 de Abril de 2010, até efectivo e integral pagamento, sentença com a qual não se pode conformar e da qual recorre. II.

– A questão a decidir nos presentes autos é apenas, e tão-somente, a da inclusão, ou exclusão, dos danos sofridos pelos AA., no objecto seguro pelo contrato celebrado entre as partes. III.

– Em face da ausência de definição legal, o contrato de seguro é aquele pelo qual a seguradora, mediante retribuição do tomador do seguro, se obriga, a favor do segurado ou de terceiro, à indemnização de prejuízos resultantes, ou ao pagamento de valor pré-definido, no caso de se realizar um determinado evento futuro e incerto. IV.

– É um contrato formal (ex vi artigo 426.º do Código Comercial) no regime aqui aplicável (a lei exige a forma escrita enquanto requisito ad substantiam), bilateral ou sinalagmático (dele resultam obrigações para ambas as partes, visto a prestação da seguradora consistir no suporte do risco, por contrapartida do recebimento do prémio), oneroso (dele resulta para ambas as partes uma atribuição patrimonial e um correspetivo sacrifício patrimonial), aleatório (a prestação da seguradora fica dependente de um evento futuro e incerto) e de execução continuada (a sua execução prolonga-se pela vida do contrato, facto que determina, designadamente, a eficácia “ex nunc” da resolução).

V.

– Atento o princípio da boa-fé, impõe-se que as partes implicadas na sua formação – tomador, segurador e segurado – revelem mutuamente todas as circunstâncias que possam afetar o risco, previamente à celebração do contrato.

VI.

– No contrato de seguro facultativo são as partes que, nos termos do...

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