Acórdão nº 07231/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCHÃO MARQUES
Data da Resolução30 de Outubro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório M…….. B……… IMOBILIÁRIA, S.A., (Recorrente) veio recorrer da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação adicional de IRC do ano de 2009, no montante de EUR 13.539.227,91, formulando as seguintes conclusões: (

  1. Quer a Administração Tributária, quer a Mmª Juiz a quo tomaram como pressuposto expresso da não aceitação da menos-valia fiscal cuja dedução (em metade do seu valor) para efeitos de determinação do lucro tributável de 2009 não foi aceite que a liquidação da sociedade no âmbito de cuja liquidação a Recorrente adquiriu a participação social que está na origem daquela menos-valia se regeu pelo disposto no artigo 150° do Código das Sociedades Comerciais.

    (b) E não se tratou apenas da "interpretação" dos conceitos de liquidação e partilha a que a Mmª Juiz a quo subsume a invocação, pela Administração Tributária, do artigo 150° do Código das Sociedades Comerciais, já que de tal norma é retirada a conclusão quanto ao efeito, na esfera da Recorrente, da dissolução da sociedade: a Recorrente não poderia ter adquirido a participação em causa em 2009 (e, em conformidade, não poderia ter efectuado a dedução contestada) porque, nos termos do artigo 150° do Código das Sociedades Comerciais, a partilha apenas pode ocorrer em simultâneo com a dissolução ou após a dissolução, daí se concluindo que a liquidação daquela sociedade só se concretizou em 2010 ou em data posterior.

    (c) No entanto, uma vez que a sociedade no âmbito de cuja liquidação a Recorrente adquiriu a participação social que alienou apurando a menos-valia fiscal cuja dedução (em metade do seu valor) para efeitos de determinação do lucro tributável de 2009 não foi aceite foi constituída à luz da lei das Ilhas Virgens Britânicas e aí tinha a sede principal e efectiva da sua administração, pelo que a sua lei pessoal era a lei das Ilhas Virgens Britânicas e não a lei portuguesa, nos termos do artigo 33° do Código Civil e do artigo 3° do Código das Sociedades Comerciais.

    (d) O facto jurídico relevante para estes efeitos è a dissolução da sociedade constituída à luz da lei das Ilhas Virgens Britânicas, de cujo processo resultou a aquisição da participação que deu origem à menos-valia cuja dedução (em metade do valor) não foi aceite pela Administração Tributária, e esse facto jurídico tem conexão não apenas com o ordenamento jurídico português, porque a Recorrente, única accionista da sociedade dissolvida, é uma sociedade comercial com sede em território português, mas também com o ordenamento jurídico das Ilhas Virgens Britânicas, porque a sociedade dissolvida aí tinha a sua sede. É assim clara a conexão com os dois ordenamentos jurídicos.

    (e) Nos termos do artigo 33° do Código Civil, à lei pessoal compete em especial regular, entre outros, a "dissolução e extinção da pessoa colectiva".

    (f) Em conformidade, o regime aplicável à dissolução e extinção (nomeadamente por liquidação) da sociedade constituída à luz da lei das Ilhas Virgens Britânicas não é o que se encontra previsto no Código das Sociedades Comerciais, nomeadamente no artigo 150° respectivo, mas o que decorre da legislação das Ilhas Virgens Britânicas.

    (g) Desta forma, a "aplicação das regras do direito português" preconizada na sentença recorrida, se entendida por referência ao regime jurídico da liquidação e partilha de sociedades (como parece ser a intenção), viola linearmente o disposto no artigo 33° do Código Civil e 3° do Código das Sociedades Comerciais.

    (h) Ao abrigo da legislação aplicável (a legislação das Ilhas Virgens Britânicas), as decisões escritas do administrador único e do accionista único e que foram tomadas em 2009 legitimavam a Recorrente para contabilizar a detenção da participação que a sociedade liquidada detinha e que foram em substância (com os reflexos contabilísticos exigidos por tal substância) cedidas no mesmo exercício de 2009, dando origem à menos-valia fiscal cuja dedução (em metade do seu valor) não foi aceite.

    (i) Ao partir do pressuposto expresso de que a liquidação da sociedade constituída à luz da lei das Ilhas Virgens Britânicas se regeu pelo disposto no artigo 150° do Código das Sociedades Comerciais, a liquidação contestada e a decisão recorrida encontram-se viciadas de erro quanto aos pressupostos de direito, pelo que devem ser anuladas.

    (j) As menos-valias fiscais a cuja dedução (em metade do respectivo valor) a Recorrente procedeu para efeitos de apuramento do seu lucro tributável de IRC do exercício de 2009 foram por si efectivamente incorridas, na sequência do reconhecimento contabilístico da operação que está na sua origem.

    (k) Nem se vê, aliás, como poderiam tais encargos ter sido incorridos pela sociedade constituída à luz da lei das Ilhas Virgens Britânicas, como é argumentado pela Administração Tributária, já que esta sociedade, e em obediência ao regime aplicável, reflectiu contabilisticamente a sua liquidação em data anterior (l) A Administração Tributária não demonstra, aliás, que os encargos em causa foram suportados pela sociedade constituída à luz da lei das Ilhas Virgens Britânicas, o "terceiro" que identifica para efeitos de negação da dedutibilidade na esfera da Recorrente, quando, em obediência às regras da repartição do ónus da prova, lhe competiria tal demonstração.

    (m) A validação da correcção efectuada pela Administração Tributária é fundamentada na sentença recorrida com a aplicação do princípio da especialização dos exercícios plasmado no artigo 18° do Código do IRC, que também fora invocado pela Administração Tributária, afirmando assim implicitamente a Mmª Juiz a quo que a menos-valia cuja dedutibilidade (em metade do seu valor) foi negada "dizia respeito" não ao exercício de 2009, mas a um qualquer outro exercício (aliás não especificado pela Administração Tributária nem pela Mmª Juiz a quo).

    (n) Uma vez que tal conclusão decorre da validação do pressuposto de que a aquisição, pela Recorrente, da participação cuja alienação deu origem à menos-valia fiscal deduzida (em metade do seu valor) para efeitos de apuramento do lucro tributável de 2009 da Recorrente ocorreu em 2010 ou posteriormente, o erro subjacente a tal conclusão é o já antes devidamente assinalado: as consequências jurídicas da dissolução da sociedade constituída à luz da lei das Ilhas Virgens Britânicas (nomeada e especialmente, para o que aqui interessa, a transferência da participação por ela detida) não podem ser aferidas à luz do artigo 150° do Código das Sociedades Comerciais e se, como aliás foi comprovado pela Administração Tributária, a Recorrente reflectiu contabilisticamente tais consequências no exercício de 2009 mediante as decisões escritas do administrador único e do accionista único tomadas em tal exercício, reflexo esse adequado à luz da legislação aplicável, a menos-valia deduzida "dizia respeito" ao exercício de 2009, pelo que foi correctamente imputada pela Recorrente a tal exercício.

    (o) Em conformidade, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, ao validar a não aceitação da dedução efectuada pela Recorrente para efeitos de apuramento do seu lucro tributável de 2009 relativa a 50% da menos-valia fiscal realizada relativamente à participação que a Recorrente adquirira no processo de dissolução e liquidação de uma sociedade constituída à luz da lei das Ilhas Virgens Britânicas, por si detida, que produziu os seus efeitos relevantes no exercício em causa.

    (p) Em 2009 a Recorrente procedeu à reversão, para efeitos contabilísticos, de ajustamentos ao valor de investimentos financeiros que efectuara em exercícios anteriores. Uma vez que os ajustamentos em causa não tinham influenciado negativamente o apuramento do lucro tributável de exercícios anteriores a 2009, ou seja, não tinham sido deduzidos para aqueles efeitos, a Recorrente deduziu o montante respectivo para efeitos de apuramento do lucro tributável de 2009, o ano da reversão, em que se verificou o reflexo positivo na sua situação líquida.

    (q) Decidiu-se na sentença recorrida que estamos perante uma variação patrimonial negativa não reflectida no resultado líquido da Recorrente do exercício de 2009, motivo pelo qual é aplicável o artigo 24° do Código do IRC, competindo à Recorrente, em obediência ao artigo referido, que implicitamente remete para a alínea g) do número 1 do artigo 42° do mesmo Código (actual artigo 45°), demonstrar quais as provisões que deram origem à reversão, quais os exercícios em que foram tributadas e quais as condições objectivas que determinaram a reversão.

    (r) Mais se decidiu que, estando em causa a reposição de provisões tributadas, são aplicáveis as regras previstas no número 3 do artigo 34° do Código do IRC (actual artigo 35°), que determina uma ordem de reconhecimento dos proveitos do exercício, pelo que a Recorrente deveria ter provado que considerou, em primeiro lugar, as provisões que tivessem sido aceites como custo fiscal no exercício da respectiva constituição, o que não fez, já que se concluiu que os elementos juntos pela Recorrente (as declarações modelo n°22 de IRC dos exercícios relevantes, os mapas de provisões dos exercícios relevantes e o quadro descrevendo as movimentações contabilísticas) não são suficientes para o efeito.

    (s) São notórios os erros quanto aos pressupostos de facto e de direito da sentença recorrida, que reflecte também a violação das regras do ónus da prova, dos artigos 13° e 100° do Código de Procedimento e de Processo Tributário e do artigo 99° da Lei Geral Tributária.

    (t) É que, e desde logo, não estamos no caso concreto perante uma variação patrimonial negativa à qual seja aplicável o artigo 24° do Código do IRC, já que as variações patrimoniais negativas a que respeita este artigo são as que, não se encontrando reflectidas no resultado líquido do exercício, afectam negativamente o património do...

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