Acórdão nº 07366/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCHÃO MARQUES
Data da Resolução30 de Outubro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório Aida ……….., Alexandra …………….. Ana Cristina …………., Ana Filipa …………, Ana Maria …………, Ana Paula ………………, Ana Rita ……….., Ana Rita ………., Ana Rita …………., Ana Sofia …………, Anabela …………., Ângela ……………, António ……………, António Jorge ……….., António Pedro …………….., Artur ………….., Branca ……………, Carla ………….., Carla Maria ……….., Carla Sofia ……………, Constança …………., Cristina ……………, Dionísia ……………………., Eliane …………, ELsa ………….. …….., Eugénia …………………, Filipa ………………….., Helena …………………., Isaura ………………., Joana ……………., Joana Maria …………….., Joaquim ………………., Leonor ……………….., Margarida ………….., Margarida Dulce ……………., Maria Alexandra …………….., Maria ………….., Maria dos Anjos …………….., Maria Gabriela ……………, Maria José ………….., Maria Lúcia …………., Maria Luísa ………….., Maria Manuela …………….., Maria Salomé ………………………, Maria Teresa …………….., Marília S……….., Marina ……………….., Melania ………………., Patricia ……………., Pedro ……………, Raquel …………….., Teresa …………..

e Teresa Maria ……….., não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou a improcedente a impugnação por estes deduzida dos indeferimentos dos pedidos de revisão oficiosa das autoliquidações de tributos efectuadas ao abrigo do art. 16.º da Portaria n.º 385/2004, de 16 de Abril., dela vieram recorrer.

As alegações de recurso que apresentaram culminam com as seguintes conclusões: A) O tributo previsto no artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004, de 16 de Abril é manifestamente ilegal e inconstitucional, pelo que deve a sentença recorrida ser revogada na íntegra.

B) A matéria de facto dada como provada na sentença recorrida apresenta, na opinião dos Recorrentes, omissões importantes para a boa resolução da causa, sendo tais omissões evidenciadas pelos documentos juntos aos autos, pelo que o presente recurso tem também por objeto a matéria de facto, requerendo-se, com fundamento no disposto no artigo 712.º, n.º 1, alínea a), do CPC, aplicável ex vi artigo 281.º do CPPT, a adição dos factos omissos.

C) O tributo em causa nos autos configura um imposto, pelo que o artigo 16.º, n.º 1, da Portaria n.º 385/2004, de 16 de Abril, é organicamente inconstitucional.

D) E mesmo se o fosse, haveria aí ilegalidade (melhor, inconstitucionalidade) grave e notória.

E) No que respeita aos sistemas de comunicação, de tratamento e de armazenamento da informação do Ministério da Justiça - que seria, nos termos do artigo 16.º da Portaria n.º 385/2004, uma contraprestação pública enquadrada na taxa em causa -, a inconstitucionalidade é evidente, visto que o Estado nunca conferiu aos Notários o acesso a qualquer sistema que justificasse o pagamento de uma taxa.

F) A utilização dos sistemas que, no entender do Secretário de Estado da Justiça, justifica o pagamento do tributo só foram disponibilizados muitos anos depois do início do pagamento do tributo e, o que é mais grave, são disponibilizados gratuitamente a todos os cidadãos e empresas.

G) Ou se considera que as quantias previstas no artigo 16.º da Portaria n.º 385/2004 são também imputáveis à utilização desses serviços ou sistemas (o que apenas se admite por dever de patrocínio e não resulta da factualidade assente), e então a taxa é inconstitucional por violação grosseira do princípio da igualdade, ou não se considera que tais quantias são imputáveis à utilização desses serviços, e então a taxa não terá qualquer causa ou serviço concreto que a justifique, e será consequentemente um imposto, logo, inconstitucional por violação do princípio da legalidade fiscal, previsto no do artigo 165.º/1, alínea i), da CRP.

H) Não há forma de escapar a um dos vícios sem cair no outro, ou então mais vale assumir, parafraseando o nome de um livro de Gomes Canotilho, que os princípios constitucionais nem sempre são para ser tomados a sério.

I) O próprio Governo que, reconhecendo tardiamente a iniquidade desta suposta "taxa", procedeu à sua revogação, pela Portaria n.º 574/2008, de 4 de Julho.

J) No que diz respeito aos Serviços de Auditoria e Inspeção, que também se encontram elencados no artigo 16.º da Portaria, também aqui não há qualquer prestação de serviços, pelo que, também nesta parte, a "taxa" do artigo 16.º da Portaria n.º 385/2004 não consubstancia um tributo causal, mas um verdadeiro imposto "travestido" de taxa, que, nos termos da Constituição, só poderia ser criado por Lei da Assembleia da República, violando-se assim o artigo 165.º n.º 1, alínea i), da Lei Fundamental.

K) Na parte que se reporta aos serviços de auditoria e inspeção, esta taxa, se não for -como parece -puramente artificial, destina-se, no máximo, a financiar as estruturas orgânicas do Estado dedicadas a tais serviços, se é que elas existem, sendo que este financiamento toma o tributo num imposto (ac. do TC n.º 473/99).

L) Tal como a inspeção tributária não justifica o pagamento de uma taxa aos potenciais inspecionados, também a inspeção dos notários não o pode justificar.

M) A suposta utilização do Arquivo Público também não justifica o pagamento de uma taxa, visto que a guarda e conservação do arquivo notarial é um dever dos notários, tal como dispõe a alínea m) do n.º 2 do artigo 4.º do Código do Notariado.

N) Pretender cobrar uma taxa aos Notários pela utilização do arquivo notarial tem a mesma lógica do de cobrar uma taxa aos Tribunais por estes guardarem e utilizarem os processos judiciais ou às entidades particulares certificadoras da inspeção automóvel por guardarem os processos administrativos.

O) Se a referência a "arquivo público" constante do artigo 16.º da Portaria dissesse (também ou apenas) respeito ao acervo documental que constava dos cartórios notariais públicos que foram objeto do processo de privatização e que ficaram à guarda dos Notários "privados”, vislumbrar-se-ia duas inconstitucionalidades: a primeira, resultante da cumulação das despesas no património do particular (do Notário), da despesa com a taxa e da despesa com a manutenção do Arquivo, em grosseira violação do princípio da proporcionalidade (do artigo 266.º/2 da CRP); a segunda, resultante de, também aqui, nesta parte do Arquivo Público, não haver qualquer prestação de serviço público.

P) Uma demonstração de que esta "taxa" é um imposto (uma "taxa" desligada de qualquer utilização especial de um serviço público) é o modo e critério do apuramento do seu valor, pois recai sobre todos os atos praticados por todos os Notários, independentemente de qualquer outro facto.

Q) Mesmo que assim não se considere (o que não se vê como), a taxa em apreço sempre seria manifesta e gritantemente desproporcional - e é tanto mais desproporcional quanto mais se desse por inexistentes as diferentes causas que supostamente a justificam, elencadas no artigo 16.º da Portaria n.º 385/2004.

R) Se o Governo criou uma taxa devida supostamente por três contraprestações públicas e lhes fez corresponder um montante proporcional de € 10 por cada escritura e € 3 por cada um dos demais atos que o Notário pratica, essa taxa é inevitavelmente inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, mesmo que afinal se constate que afinal há uma contraprestação pública – não se vê qual -, então os montantes em causa, estabelecidos para as três contraprestações, são necessariamente desajustados à realidade, pecando por excesso.

S) A desproporcionalidade elimina ou desvirtua a correspetividade inerente ao conceito da taxa, de onde se conclui que o tributo em causa nos autos constitui um imposto.

T) Face ao acima exposto, os atos de autoliquidação aqui em causa representam uma injustiça grave e notória e foram efetuados em erro, imputável aos serviços nos termos do n.º 2 do artigo 78.º da LGT.

Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, devendo, em consequência, ser revogada a decisão recorrida.

• O Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP, notificado da sentença e do despacho de admissão do recurso (cfr. fls. 11.467), veio aos autos referir não ter sido anteriormente chamado ao processo, pelo que não apresentou contestação ou alegações (cfr. fls. 11.469-11.470).

Pelo despacho de fls. 11.484, devidamente notificado ao requerente (cfr. fls. 11.487), a Mma. Juiz do TT de Lisboa pronunciou-se sobre o requerimento do Instituto nos seguintes termos: “Considerando que o requerimento apenas expõe uma situação, sem nada requerer em concreto, não se invoca qualquer nulidade que tenha prejudicado a sua defesa (…), e deixa ao tribunal que ordene o que tiver por conveniente, pois bem, o tribunal não vislumbra o que poderá ser conveniente numa fase em que se encontra proferida sentença favorável ao IGFEJ, II, e da qual foi devidamente notificado, podendo ter apresentado contra-alegações de recurso se assim o entendesse, mas não obrigatoriamente, pois as contra-alegações são facultativas. // Por conseguinte, não se vislumbra nada a ordenar, e porque mais nada foi requerido, nada mais a decidir. // Notifique”.

• Neste Tribunal Central Administrativo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, no douto parecer que emitiu, concluiu pela existência da nulidade processual por falta de citação do Impugnado, geradora da nulidade de todo o processado (cfr. fls. 11.495-11.496).

Notificados os intervenientes processuais para se pronunciar sobre tal parecer, o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP.

veio pronunciar-se em sentido concordante com o mesmo (cfr. fls. 11.509), vindo os Recorrentes emitir pronúncia no sentido da inoportunidade da questão prévia suscitada e de que o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP conhecia o processo não tendo diligenciado pela sua intervenção.

• Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

• II.

Fundamentação II.1.

De facto É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa: A) Os impugnantes exercem a profissão de Notário, de acordo com o Estatuto do...

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