Acórdão nº 12002/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelCATARINA JARMELA
Data da Resolução16 de Abril de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

*I – RELATÓRIOJoana ……………………… intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias contra a Ordem dos ........................

, na qual peticionou a intimação da ré a inscrevê-la como advogada.

Por decisão de 6 de Fevereiro de 2015 do referido tribunal foi julgada procedente a arguição da inidoneidade do meio processual usado e, em consequência, absolvida a entidade requerida da instância.

Inconformada, a autora interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões: «( Imagem)».

“ O recorrido, notificado, apresentou contra-alegações, onde pugnou pela improcedência do recurso.

O Ministério Público junto deste TCA Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso jurisdicional, posicionamento esse que, objecto de contraditório, não mereceu qualquer resposta.

II – FUNDAMENTAÇÃONa sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos: «( Imagem)».

*Presente a factualidade antecedente, cumpre entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão recorrida incorreu em erro ao julgar procedente a excepção de inidoneidade do meio processual usado e, em caso afirmativo, se deverá ser julgado procedente o pedido de intimação da recorrida a inscrever a recorrente como advogada (cfr. alegações de recurso e respectivas conclusões, supra transcritas).

Passando à análise da questão relativa ao alegado erro da decisão recorrida ao ter julgado procedente a excepção de inidoneidade do meio processual usado A sentença recorrida considerou procedente a excepção de inidoneidade do meio processual usado, arguida pela recorrida, com base na seguinte argumentação: - a recorrente não demonstrou a especial urgência da tutela, pois não indica o momento limite, o ponto de referência temporal, ultrapassado o qual será inevitável a lesão irreversível ou se tornará, de todo, impossível exercer o direito; - não existe qualquer incompatibilidade entre uma providência cautelar de “autorização provisória do interessado para iniciar ou prosseguir uma actividade ou adoptar uma conduta” (no caso para exercer provisória mas plenamente, isto é, com todos os direitos e deveres da advocacia, ao abrigo do título constituído pela sentença), concedida ao abrigo do art. 112º n.º 2, al. d), do CPTA, enquanto não fosse decidida a acção principal; - pretendendo a recorrente uma tutela definitiva, mediante uma decisão de mérito, e por isso não alegou factos integradores dos pressupostos de que depende a concessão de uma providência cautelar nos termos dos arts. 120º e ss., do CPTA, não pode legalmente a intimação ser convolada em providência cautelar.

A recorrente defende que a decisão ora sindicada violou o art. 109º n.º 1, do CPTA, por entender que não tinha que alegar outros factos de forma a justificar a indispensabilidade e, designadamente, os referentes às consequências da não realização da inscrição, sabendo-se, ademais, que essas consequências constituem factos notórios que, nos termos do art. 412º, do CPC, não carecem de alegação, nem de prova.

Passemos, então, à análise do acerto (ou não) da decisão judicial recorrida.

Dispõe o art. 109° n.° 1, do CPTA, referindo-se aos pressupostos do pedido de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, o seguinte: “A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar, segundo o disposto no artigo 131°”.

Desta disposição legal resulta que a utilização deste mecanismo processual depende dos seguintes pressupostos: 1) a necessidade de emissão urgente de uma decisão de mérito seja indispensável para protecção de um direito, liberdade ou garantia; 2) não seja possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar no âmbito de uma acção administrativa normal, seja comum ou especial.

Conforme explicam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2005, págs. 538, 539 e 541, em anotação a este normativo legal: “Os requisitos do n.º 1 são, no entanto, os requisitos mínimos indispensáveis para que se possa lançar mão deste processo de intimação. E são formulados em termos que intencionalmente restringem aquele que, à partida, poderia ser o seu campo de intervenção.

Em primeiro lugar, é necessário que esteja em causa o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia e que a adopção da conduta pretendida seja apta a assegurar esse exercício. Mas não basta isto, pois também se exige que a célere emissão da intimação seja indispensável “por não ser possível, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar, segundo o disposto no artigo 131.°”.

A imposição deste segundo requisito é da maior importância e deve ser realçada, pois, através dela, o Código assume que, ao contrário do que, à partida, se poderia pensar, o processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não é a via normal de reacção a utilizar em situações de lesão ou ameaça de lesão de direitos, liberdades e garantias. A via normal de reacção é a da propositura de uma acção não urgente (acção administrativa comum ou acção administrativa especial), associada à dedução de um pedido de decretamento de providências cautelares, destinadas a assegurar a utilidade da sentença que, a seu tempo, vier a ser proferida no âmbito dessa acção. Só quando, no caso concreto, se verifique que a utilização da via normal não é possível ou suficiente para assegurar o exercício, em tempo útil, do direito, liberdade ou garantia é que deve entrar em cena o processo de intimação.

O processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é, assim, instituído como um meio subsidiário de tutela, vocacionado para intervir como uma válvula de segurança do sistema de garantias contenciosas, nas situações – e apenas nessas – em que as outras formas de processo do contencioso administrativo não se revelem aptas a assegurar a protecção efectiva de direitos, liberdades e garantias.

A opção afigura-se compreensível, não parecendo, na verdade, que o âmbito de intervenção desta forma de processo esteja configurado em moldes excessivamente restritivos. Com efeito, cumpre ter presente que o normal e desejável é que os processos se desenrolem nos moldes considerados mais adequados ao cabal esclarecimento das questões, o que exige tempo, o tempo necessário à produção da prova e ao exercício do contraditório entre as partes. Não é, por isso, aconselhável abusar dos processos urgentes, em que a celeridade é necessariamente obtida através do sacrifício, em maior ou menor grau, de outros valores, que, quando ponderosas razões de urgência não o exijam, não devem ser postergados. Afigura-se, pois, justificado recorrer, por norma, aos processos não urgentes, devidamente complementados por um sistema eficaz de atribuição de providências cautelares, efectivamente apto a evitar a constituição de situações irreversíveis ou a emergência de danos de difícil reparação (sobre os processos cautelares, cfr. artigos 112º e segs.), e reservar os processos urgentes para situações de verdadeira urgência na obtenção de uma decisão sobre o mérito da causa, que são aquelas para as quais, na verdade, não é suficiente a utilização de um processo não urgente, ainda que complementado pelo decretamento – se as circunstâncias o justificarem, provisório (quanto a este ponto, cfr. artigo 131.º) – de providências cautelares.

(…) Cumpre, porém, notar que o sentido do preceito é o de afirmar a existência, (…) de uma relação genérica de subsidiariedade entre este processo e os processos não urgentes (acção administrativa comum e acção administrativa especial). A referência específica ao decretamento provisório de providências cautelares, previsto no artigo 131º, compreende-se, entretanto, porque a relação de subsidiariedade em relação aos processos não urgentes se estende, como não poderia deixar de ser, ao recurso à tutela cautelar – e, dentro desta, à mais incisiva das possibilidades que o regime da tutela cautelar oferece, a do decretamento provisório de providências cautelares, previsto no artigo 131º, quando as circunstâncias o justifiquem.

(…) Pelo contrário, o processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias há-de ser chamado a intervir em situações que não possam ser acauteladas deste modo, porque é urgente a obtenção de uma pronúncia definitiva sobre o mérito da causa.

(…) O que em situações deste tipo é necessário, é obter, em tempo útil e, por isso, com carácter de urgência, uma decisão definitiva sobre a questão de fundo: a questão tem de ser definitivamente decidida de imediato, não se compadecendo com uma definição cautelar. O processo principal urgente de intimação existe precisamente para suprir as insuficiências próprias da tutela cautelar, que resultam do facto de ela ser isso mesmo, cautelar.

” (sublinhados nossos).

Nesta matéria não podemos também deixar de ter em atenção os ensinamentos colhidos da doutrina expendida por Isabel Celeste M. Fonseca, Dos Novos Processos Urgentes no Contencioso Administrativo (Função e Estrutura), 2004, quando sustenta: - A págs. 76 e 77, que “Da interpretação e da valoração dos conceitos imprecisos previstos no art. 109.º parece que fica clara a natureza subsidiária da intimação. (…) Ora, a necessidade da intimação urgente, sob a forma de decisão de fundo, afere-se pela impossibilidade ou insuficiência da intimação urgentíssima provisória, sob a...

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