Acórdão nº 12059/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução26 de Novembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO · SUSANA ……………………………………………………, devidamente identificada nos autos, intentou no T.A.C. de Beja ação administrativa comum sob a forma de processo sumário contra · INSTITUTO POLITÉCNICO DE BEJA.

Pediu o seguinte: -Reconhecimento e pagamento da compensação pela caducidade do contrato de trabalho em funções públicas.

* Por saneador-sentença de 27-4-2014, o referido tribunal decidiu condenar a Entidade Demandada a reconhecer e pagar à Autora compensação pela caducidade do contrato de trabalho.

* Inconformado, o réu recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: 1. O Recorrente considera que a Sentença recorrida errou quando considerou aplicável à presente pretensão a ação administrativa comum.

  1. A ação administrativa especial seria antes a adequada, quer se considere que houve uma atuação administrativa no momento em que o Recorrente processou o vencimento final da Recorrida e não lhe atribuiu a compensação por caducidade, quer, igualmente, se se considerar que houve falta da prática desse ato perante a falta de resposta dada ao requerimento onde a Recorrida deduziu tal pretensão.

  2. Em ambos os casos esteve em causa uma atuação administrativa contra a qual se impunha, sobre a Recorrida, um ónus de reagir.

  3. Impunha-se ao Tribunal a quo a determinação do erro na forma de processo, e, ao não o ter feito, houve manifesta violação dos artigos 46º e 58° nº 2 do CPTA.

  4. Sendo certo que a inércia da Recorrida durante mais de um ano fez caducar o seu direito de ação, atento o prazo previsto para tal tipo de ações preceituado no artigo - cfr. art. 58º nº 2 alínea b) do CPTA.

  5. Que a Recorrida, na vigência do seu vínculo laboral com o Recorrente, se encontrava enquadrada num regime muito próprio e específico, em concreto, o regime dos docentes no instituto superior politécnico.

  6. Este regime possui um conjunto de normas que o afastam do regime geral da função pública e que não pode ser desconsiderado na hora da sua articulação.

  7. Desde logo, devemos sublinhar que o contrato celebrado com a Recorrida, ao invés do regime geral e que se impõe por decorrência constitucional plasmada no artigo 47º da CRP, não foi precedido de concurso público.

  8. Outra diferença face ao regime geral da função pública radica no facto de os docentes por ele abrangidos não se encontrarem forçosamente obrigados à exclusividade.

  9. As diferenças são vastas e podem encontrar-se ao longo da Lei 7/2010 de 13 de maio que define, muito claramente, qual o regime aplicável à cessação dos contratos a termo certo, estipulando-se aí desvios claros ao regime geral. Nas várias disposições deste diploma são consagradas regras de transição entre carreiras, assim como os tempos de duração dos contratos a termo resolutivo certo e a possibilidade das suas renovações de acordo com um conjunto de requisitos próprios da específica função de docente do ensino superior politécnico.

  10. Este regime, tão particularizado neste diploma, leva-nos a concluir que o legislador quis nele definir as normas que se aplicam aos seus destinatários com um recorte suficientemente expresso, nele consagrando favorecimento s manifestos face às demais carreiras gerais da função pública.

  11. Perante as diferenças deste regime, que se afasta radicalmente da linha geral, não temos por líquida a interpretação e articulação entre o regime geral e este regime especial.

  12. Do silêncio da lei não podemos automaticamente assumir que estaremos perante uma lacuna a ser preenchida pelo regime geral previsto no RCTFP.

  13. A especialidade do diploma, os especiais favorecimentos nele consagrados, a sua exaustiva regulamentação e a ausência de concurso público fazem-nos crer que a melhor interpretação deste regime é a que sustenta o não reconhecimento do direito à compensação por caducidade do contrato de trabalho.

  14. Entendemos que o Tribunal a Quo errou na interpretação do artigo 252º do RCTFP, por se considerar que a mesma não pode ser aplicada a casos como a da Recorrida.

  15. Também de outro ponto de vista, se deve ter este direito à indemnização por excluído.

  16. A motivação da não renovação do contrato deve ter este efeito sempre que a mesma não seja oponível à vontade da entidade empregadora, mas antes, resultante duma impossibilidade objetiva de ser executada a prestação laboral.

  17. Como se deixou alegado, ainda que o Tribunal a Quo não tenha permitido a instrução neste processo, o vínculo laboral da Recorrida não terminou apenas pela não renovação do contrato, mas também e especialmente pela ausência de serviço docente para lhe ser distribuído.

  18. Não está aqui em causa uma não renovação discricionária ou arbitrária, mas sim uma renovação que se tornou objetivamente impossível, o que se comunicou à Recorrida.

  19. Estão em causa vínculos públicos cuja sustentação depende de fundos públicos e, tal facto, não é de todo irrelevante mormente em tempos como o atual, em que os constrangimentos orçamentais têm implicado sacrifícios (também) a todos os que estão integrados no regime da função pública .

  20. O artigo 252º do RCTFP não pode deixar de se conciliar com o fundamento que sustenta a cessação do contrato de trabalho e cremos que uma indemnização deste tipo não se poderá exigir da entidade pública sempre que à mesma não seja imputável a vontade de não renovar. Se é certo que o normativo em causa parece querer acautelar a precariedade não menos certo será que a sua oponibilidade à Administração, quando esta nada tenha a ver com o fundamento que a levou a não renovar o contrato, será um excesso penalizante (com reflexos no erário público que deve ser especialmente protegido) transformando-se esta norma numa autêntica sanção cega.

  21. Ocorreu assim uma errada aplicação do artigo 252º do RCTFP.

  22. Em terceiro lugar, o artigo 252º do RCTFP consagra uma compensação indemnizatória quando a entidade empregadora não comunique a intenção de renovar o contrato.

  23. Todavia, este direito não decorre da lei quando ao trabalhador seja comunicada a intenção de não renovação, na medida em que tal comunicação acautela o seu direito e diminui o impacto de uma decisão inesperada, que a norma visa proteger.

  24. Sendo o artigo 252º do RCTFP uma norma de atribuição de indemnização compensatória baseada em factos lícitos, ela tem natureza excecional e, por força do disposto no artigo 11º do Código Civil, afigura-se insuscetível a sua aplicação analógica.

  25. Conclui-se, assim, pela inaplicabilidade do artigo 252º do RCTFP por falta de abrangência normativa e impossibilidade manifesta de aplicação analógica.

  26. No que respeita aos cálculos da compensação, a Sentença recorrida considerou ser devida uma compensação por caducidade que deveria ser calculada à razão de dois dias por cada mês de trabalho completo, socorrendo-se do artigo 252º do RCTFP, quando o referido normativo preceitua no seu número 4, que: "A compensação a que se refere o número anterior corresponde a 20 dias de remuneração base por cada ano completo de antiguidade." 28. Houve assim violação do nº 4 do artigo 252° do RCTFP, também quanto a este ponto.

  27. Por último, entendemos que a decisão deixou de apreciar um ponto em que as partes claramente divergiram e que influencia decisivamente o quantum da decisão.

  28. Referimo-nos à data de referência para contagem do tempo de antiguidade que interfere na indemnização compensatória.

  29. O Recorrente considera que esta contagem deve fazer-se a partir da entrada em vigor do DL 207/2009 de 31 de agosto, já que foi este diploma que converteu, como no caso da Recorrida, os contratos de provimento em contratos a termo certo e por via deste regime contratual é que se admite que tomará aplicável o direito à indemnização contratual.

  30. Ou, quando assim se não entenda, sempre deverá apenas ser contabilizado o tempo de serviço desde a entrada em vigor do RCTFP (1 de janeiro de 2009) na medida em que foi este o diploma que fez nascer o direito da Recorrida e originou a respetiva previsão normativa plasmada no artigo 252º do RCTFP.

  31. Segundo nos parece, esta omissão da sentença fere-a de nulidade por força do previsto no artigo 615º nº 1alínea d) do CPC aplicável ex vi art.140º do CPTA.

* O Ministério Público foi notificado para se pronunciar como previsto na lei de processo.

Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência.

* Este tribunal tem presente o seguinte: (1º) o primado do Estado democrático e social de Direito material, num contexto de uma vida socioeconómica submetida ao bem comum e à suprema dignidade de cada ser humano (conforme a nossa Lei Fundamental); (2º) os valores ético-jurídicos do ponto de vista da nossa Lei Fundamental; (3º) os princípios constitucionais estruturantes do Estado de Direito (ex.: a juridicidade, a segurança jurídica para todas as pessoas e a igualdade jurídica de todos os seres humanos); (4º) os comandos definitivos ou normas jurídicas...

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