Acórdão nº 08641/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Junho de 2015
Magistrado Responsável | CATARINA ALMEIDA E SOUSA |
Data da Resolução | 18 de Junho de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul l – RELATÓRIO A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IRC (e correspondentes juros compensatórios), respeitantes aos exercícios de 2003, 2004 e 2005, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional.
Formula, para tanto, as seguintes conclusões: “
-
A sentença sob recurso determinou a anulação das liquidações de IRC dos anos de 2003, 2004 e 2005 impugnadas, por julgar que tendo a AT decidido recorrer à avaliação directa da matéria tributável, não poderia subsequentemente alicerçar-se em presunções de qualquer espécie, como entende ter vindo a suceder, impondo-se que, nesse caso, tivesse lançado mão da avaliação indirecta.
-
Todavia a AT não procedeu a qualquer avaliação indirecta, pois que não se socorreu de nenhum dos critérios ou indicadores de natureza técnico-científica elencados no art. 90º da LGT.
-
As correcções técnicas efectuadas pelos SIT constituem meras manipulações numéricas, corrigindo os erros de contabilização detectados e a matéria tributável dos exercícios envolvidos.
-
Os casos que a sentença sob recurso aponta como exemplos de presunções constituem, afinal, também eles meras operações meramente correctivas e aritméticas.
-
Veja-se o apuramento das vendas do ano de 2003, em que a decisão de considerar apenas um colchão vendido nas vendas a dinheiro que incorrectamente indicavam duas unidades vendidas, resulta demonstrado pelas operações de circularização de Clientes e pelo valor as vendas a dinheiro (página 22 do RI- ponto 31/i) do probatório).
-
Ou seja, constituiu uma mera operação de correcção contabilística, assente não em qualquer presunção, mas nos dados e valores objectivos trazidos documentalmente ao procedimento inspectivo ou evidenciados na contabilidade da impugnante.
-
E as dificuldades da análise dos meios financeiros que o RI dá conta, prendem-se com a confirmação dos valores inscritos, no sentido de as entradas de meios monetários não estarem integralmente suportadas documentalmente, mas não exactamente com a presunção de quaisquer valores contabilísticos (página 24 do RI e ponto 39 do probatório).
-
Ainda quanto à correcção do resultado tributável dos anos de 2004 e 2005, os cálculos necessariamente efectuados partiram sempre dos dados lançados contabilisticamente e mencionados nos balancetes exibidos (páginas 26 e 27 do RI e pontos 46/a e c) do probatório).
-
Não estamos perante presunções, na definição legal, ou seja, as ilações que a lei, ou o julgador, tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido (art. 349° do CC).
-
Mas mesmo que a AT tivesse presumido quaisquer valores, cabia à sociedade impugnante fazer a contraprova, cenário que a sentença sob recurso também não equacionou, nem avaliou, não permitindo decidir no sentido em que veio a decidir.
-
Todos estes factos resultam provados através dos documentos juntos pela RFP aos autos, designadamente o relatório inspectivo e seus anexos, particularmente os anexos nº 5 e 6.
-
Sendo que tais documentos nunca foram impugnados e são, portanto, idóneos à demonstração dos factos que titulam.
-
Resultam ainda provados pelos depoimentos das testemunhas arroladas pela Fazenda, as quais demonstraram ter um conhecimento pessoal e directo dos factos e cujos depoimentos, coerentes e credíveis, confirmam a factualidade aludida nesta peça processual (CD áudio, de 01;03:51 a 02;37:55 – primeira testemunha, e de 02:38:01 a 03:14:47 – segunda testemunha) e que a sentença recorrida considerou, no essencial, corroborar o conteúdo do relatório inspectivo final.
-
Existe, assim, erro de julgamento consubstanciado na deficiente avaliação da prova documental e testemunhal produzida e acima recortada O) A sentença sob recurso fez desacertada interpretação dos normativos que lhe são aplicáveis, designadamente dos artigos 74º, 86°, 88° e 90º da LGT, pelo que não deve manter-se.
Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de Vossas Ex.as, deverá ser concedido provimento ao presente, com o que se fará como sempreJUSTIÇA” * Não foram apresentadas contra-alegações.
* O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
* Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir já que a tal nada obsta.
*Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
Assim sendo, as questões que constituem objecto do presente recurso, consistem em saber se: (i) - a sentença recorrida errou no julgamento consubstanciado na deficiente avaliação da prova documental e testemunhal produzida; (ii) - a sentença sob recurso fez errada interpretação/ aplicação dos artigos 74º, 86°, 88° e 90º da LGT, ao considerar que a AT, efectivamente, recorreu a presunções para cálculo da matéria tributável, não obstante ter alegadamente procedido à avaliação directa.
* 2 - FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida: 1 - A impugnante foi sujeita a fiscalização externa que incidiu sobre os exercícios de 2003 a 2005.
2 - O 1° projeto de relatório concluído em 6/6/2007 foi notificado à impugnante por oficio n.º 400/07, de 11/6/2007, como consta da «pasta 1 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
3 - Posteriormente foi elaborado outro relatório, datado de 23/7/2007, notificado à impugnante em 24/7/2007 (pasta I Cujo conteúdo se dá por reproduzido) 4 - Nesse relatório referia-se, no canto superior esquerdo, «Este projecto de relatório substitui na íntegra o Projecto de Relatório anteriormente enviado em 12/6/2007, considerando-se o mesmo sem efeito».
5 - O objeto social registado da impugnante era o comercio a retalho de loiças, cutelarias e artigos similares para o lar, comercio a retalho de artigos ortopédicos, nomeadamente colchões, almofadas e outros na mesma área, representações de marcas, mas na realidade, a impugnante exercia a atividade de comércio a retalho de colchões ortopédicos, essencialmente aos consumidores finais, e comércio por grosso apenas a um cliente a .........................
6 - Para exercer a atividade, o sujeito passivo alugava várias salas no pais, onde efetuava reuniões de demonstração do produto, para além de exposições em feiras, contactos telefónicos e contactos porta-a-porta, cujos custos destes últimos eram levados a uma conta 44.1 7 - Para efetuar a venda dos colchões, utilizavam como aliciante dos consumidores, oferta de produtos, tais como cadeiras, almofadas, e algumas viagens.
8 - Deixou de exercer a atividade de facto em 30-09-2005,data em que emitiu a última venda a dinheiro relativa a colchões - venda a dinheiro n.º 9 - Foi cessada a atividade para efeitos de IVA, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 33.º do ClVA, por declaração de cessação apresentada em 2007-02-01, com efeitos a 31-12-2005.
10 - A partir de 01-01-2005, o sujeito passivo está enquadrado no regime simplificado de determinação do lucro tributável para efeitos de IRC.
11 - Mas no exercício de 2004 obteve um volume total anual de proveitos superior a €149 639,37, pelo que efetuado boletim de alteração oficiosa.
12 - No inicio do procedimento inspetivo estavam em falta: a. As declarações periódicas do IVA dos meses 0412, 0510 e posteriormente também dos 0511 e 0512.
b. A declaração de rendimentos modelo 22 de IRC referente aos exercício de 2004, (e posteriormente 2005) c. A declaração de informação contabilística e fiscal relativa ao mesmo exercício, com exceção do anexo J (e posteriormente 2005, e o anexo J) 13 - A administração tributária procedeu à liquidação oficiosa do IRC relativa ao exercício de 2004, não apurando qualquer valor a pagar.
14 - As vendas ao consumidor final, eram efetuadas por três modalidades de venda: a.Com pagamento imediato do produto por parte do cliente; b.Com pagamento através de cheques pré-datados; c.Com recurso ao crédito ao consumo, através de uma instituição financeira indicada pela empresa vendedora.
15 - A impugnante trabalhava com três instituições de financiamento de crédito ao consumo, a ................. do banco ............, a ............... do grupo ................, e a ....................... do grupo ...................
16 - Era pratica comercial em qualquer tipo de venda o preenchimento de uma nota de encomenda. Na modalidade de venda com recurso ao crédito, com a nota de encomenda era celebrado um contrato de compra e venda a prestações com proposta para um contrato de financiamento por crédito ao consumo a propor a uma das instituições financeiras indicadas.
17 - O valor de venda evidenciado nos referidos contratos é superior ao preço do produto mais o IVA liquidado e indicado no documento de venda, correspondendo o valor total da venda a dinheiro exatamente ao valor depositado pelas instituições financeiras nas contas bancarias da empresa, respeitante aos referidos contratos financeiros, quando aprovados, e não anulados.
18 - Este diferencial de valor é justificado pelos encargos financeiros provenientes do crédito ao consumo obtido, incluídos no valor de venda referido no contrato e suportados pelo cliente.
19 - Aprovado o financiamento, e recebido o respetivo meio de pagamento pela impugnante, estas vendas davam origem aos seguintes movimentos contabilísticos: a.Pela venda debitavam a conta 11-caixa, por contrapartida de uma conta de proveitos 71- Vendas, que era lançada apenas pelo valor total do mês; b.Pela transferência do meio financeiro, debitavam a conta 12 - Depósitos, por...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO