Acórdão nº 08594/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | JORGE CORTÊS |
Data da Resolução | 22 de Outubro de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACÓRDÃOI- Relatório As sociedades “F……….. - Sociedade …………………, Lda.” e “T……….. – …………….., Lda” interpõem recurso jurisdicional contra o despacho proferido a fls. 112/119, que indeferiu liminarmente os embargos de terceiro, deduzidos por apenso ao procedimento cautelar de arresto nº 913/12.7 BELRS, instaurado contra “ C….., …………………, SA.”, “Carlos ……………..” e “Francisco ……………………” e recurso jurisdicional contra o despacho de fls. 165/167 que condenou as embargantes em multa por litigância de má-fé.
I- Do recurso jurisdicional interposto contra o despacho que indeferiu liminarmente os embargos de terceiro.
Nas alegações de recurso de fls. 125/147, as recorrentes formulam as conclusões seguintes: "1
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A CRP a art°. 12°, n° 2, o Cód. Civil a art°s. 157° e ss., e o Código das Sociedades Comerciais, consagram a existência de pessoas colectivas de direito privado, como o são as 1ª) e 2ª) Embargantes/Recorrentes.
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Estas, portanto, estão dotadas de autonomia funcional (no mais rigoroso sentido técnico-jurídico), exercida de modo colectivo (que não de modo singular, dado que, este, está exclusivamente reservado para as pessoas humanas).
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As suas personalidades jurídicas são completa e totalmente distintas das dos representantes dos seus órgãos, representantes, cuja personalidade jurídica é singular, porque seres humanos são.
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E o conhecimento de factos e a vontade de umas e de outras, são igualmente distintas: o conhecimento daquelas provém de informação de sócio vulgarmente prestada em assembleia geral, da qual pode resultar deliberação em consequência de tal informação, sendo a vontade das mesmas (plasmada em acta) colectiva; a vontade dos últimos é singular.
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Tais personalidades jurídicas - a colectiva da sociedade e a singular da pessoa humana (sócio), mesmo que a(o) última(o) seja representante daquela - são completamente distintas e diferenciadas, sob pena de, se assim não fosse, não existir a autonomia funcional em modo colectivo das pessoas colectivas e como tal das sociedades comerciais, como são as 1ª e 2ª Embargantes/Recorrentes.
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Estas são assim titulares de direitos subjectivos próprios (que não se confundem com os dos seus sócios ou representantes), direitos no quadro dos quais releva o de serem informadas sobre a respectiva vida comercial pelos sócios, estando, por outro lado, adstritas a obrigações que também se não confundem com as dos sócios.
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O CSC estatui um regime das relações entre os sócios das sociedades comerciais, um regime sobre a situação jurídica destes face às últimas, e uma enumeração legal de direitos e deveres também dos sócios.
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No quadro de tais direitos e deveres relevam os de informarem os outros sócios e sobretudo a própria sociedade comercial sobre a vida desta, maxime quanto àquilo que for importante para o devir societário, e de serem correspectivamente informados do mesmo pelos outros sócios, informação toda vertida em acta que só assim chega ao conhecimento da sociedade, informação ainda tendente à tomada de deliberações sociais expressas na mesma acta, que para o efeito exterioriza para terceiros (como os Tribunais) a vontade colectiva da sociedade, acta que pode revestir diversas modalidades, como a que decorre de assembleia universal, sem observância de formalidades prévias.
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Quanto mais precisa for a informação/comunicação do sócio à sociedade, mais formal é o seu cumprimento, o que postula a acta.
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O Código Veiga Beirão obrigava a que fossem lançadas em acta todas as deliberações sociais, e a Jurisprudência nacional começou por tomar esta exigência como um requisito formal, o que ainda hoje está internalizado na corporação dos comerciantes.
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Para António Menezes Cordeiro, ainda hoje, escolhas mais soltas, segundo as quais, a acta seria um mero documento particular, a apreciar livremente pelo Juiz, não devem de colher, não devendo assim ser, tanto mais, que, se não houver acta ou de todo ela não for exibida, o Juiz deverá concluir que não houve deliberação.
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Por inferência, se não houve deliberação, óbvio que não houve informação prévia à sociedade, que fosse tendente àquela deliberação, o mesmo é dizer que o que está expresso em acta é um binómio informação dos sócios à sociedade/deliberação desta.
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A vontade social, decorrente da informação prestada por qualquer sócio, tem de ser formalizada e exteriorizada em acta, sob pena de incompletude da deliberação.
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A Sentença sob recurso fixou erradamente a data - maio de 2012 - em que um dos sócios das Embargantes/Recorrentes, ainda conforme a mesma Sentença (mas que aquelas não concedem, nem admitem fundadamente), teve conhecimento do arresto dos autos principais.
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Sentença que pretende estribar ainda tal data, no simples facto de uma sócia das Embargantes /Recorrentes, ter apenas pago uma taxa de justiça da oposição ao arresto, efectuada, aliás, por outrém, e ainda no facto de as procurações dos embargos estarem assinadas pela mesma pessoa, o que até não resulta do conteúdo de tais procurações.
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Razões desde logo para que em tal parte, a Sentença padeça de nulidade, nos termos e para os efeitos do art°. 615°, n° l, b), maxime, alínea c), primeiro trecho, do CPC (Lei n° 41/2013. de 26/06), ex vi, art°. 2°, e), do CPPT, dado que, não especifica devidamente os fundamentos de facto e sobretudo não especifica os fundamentos de direito que justificam a decisão da data do conhecimento do arresto, conhecimento que aliás admite tão-só por pessoa singular distinta e que não é qualquer das pessoas colectivas embargantes, e os fundamentos de que partiu para a fixação da referida data estão em manifesta oposição com a decisão que proferiu.
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Pelo que, neste passo, se requer prolacção de Acórdão que, nos termos do art°. 639°, n° l, do CPC, ex vi, art. 2°, e), do CPPT, anule a Sentença recorrida, alterando-a no sentido da admissão dos embargos de terceiro das 1a) e 2a) Embargantes/Recorrentes.
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Sentença ainda, que irrelevou o facto/situação/posição jurídica de as 1a) e 2a) Embargantes/Recorrentes serem dotadas de personalidade jurídica colectiva, completamente distinta das personalidades jurídicas singulares dos seus sócios.
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Ao tê-lo feito, postergou todo um regime aplicável a tais pessoas colectivas, especialmente previsto no CSC.
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Teve como personalidade singular e data do conhecimento por esta do arresto, tout court, um dos sócios de ambas as Embargantes/Recorrentes, irrelevando a forma, motivos e data efectiva, pelas quais, nos termos do CSC, e efectivamente, tal sócio transmitiu àquelas o arresto, o que o mesmo sócio só fez através do doc. 3 junto aos embargos.
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E contra tudo o que está na lei, desde a CRP, passando pelo C.C. e terminando no CSC, não só irrelevou a personalidade colectiva das Embargantes, mas ainda todo um regime de relações entre sócios das sociedades comerciais, a situação jurídica deles no quadro das últimas, os direitos e sobretudo os deveres daqueles para com estas, maxime o dever de informar e a forma de o fazer (acta) perante as sociedades relativamente à vida destas – dever para o qual in casu (comunicação do arresto) a lei não determina prazo - e ainda, o regime das deliberações sociais decorrentes daquele dever de informação do sócio, tal como, a função e natureza jurídica da acta de assembleia geral, documento através do qual fica fixada a data em que a comunicação/informação do sócio foi prestada à sociedade, por forma a que esta delibere em consequência o que entender, através da vontade colectiva expressa de modo colectivo, o que nada tem a ver com o conhecimento e a vontade da pessoa singular (sócio), que aliás só se exterioriza com a comunicação/informação em assembleia geral.
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Só através da acta que perfaz doc. 3 junto à petição dos embargos, e na data que consta da mesma, é que as Embargantes tomaram conhecimento da existência do arresto objecto daqueles embargos, e pelos motivos devidamente dilucidados e demonstrados que constam da mesma acta.
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A Sentença aqui sob recurso inaplicou e não teve em consideração como devia, o art°. 12°, n° 2, da CRP, os art°s. 157° e ss., do Cód. Civil, e o art°. 5°, do Cód. das Sociedades Comerciais, pelo que olvidou que as Embargantes são pessoas colectivas de direito privado, titulares de direitos subjectivos, nomeadamente, com direito a serem informadas pelo(s) sócio(s) sobre a vida comercial, tendentemente à tomada de deliberações sociais, portanto, entes cuja personalidade jurídica colectiva se não confunde com e é distinta da personalidade singular dos sócios.
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E inaplicou e não teve em consideração, relativamente à acta que faz doc. 3 junto à petição dos embargos, os art°s. 21º/1, c), e 214°, ambos do CSC, segundo os quais os sócios têm o direito de obter informações sobre a vida da sociedade, o que por tal documento, como única forma, foi feito pelo Sócio Francisco Pita à sócia Maria João, e, concomitantemente, a ambas as Embargantes/Recorrentes, que depois deliberaram intentatar atempadamente os embargos de terceiro, indeferidos liminarmente e incorrectamente pela Sentença.
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Que inaplicou e irrelevou também e in casu os art°s. 53° e 54°, do CSC, relativamente ao mesmo doc. 3 junto aos embargos de terceiro.
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Tal como desconsiderou, não o tendo aplicado, o art°. 63°, n° l, maxime, n° 9, do CSC, pois, as deliberações dos sócios, após informação para o efeito em sede de assembleia geral universal, como sucedeu nos termos do doc. 3 junto aos embargos, só podem ser provadas por actas, constituindo estas - como in casu - princípio de prova que o Tribunal a quo não considerou, nem valorou (ainda que fosse negativamente), donde, não se ter sequer pronunciado sobre a mesma.
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António Menezes Cordeiro doutrina que "não deve de ser assim ".
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Por tudo na parte em apreço da Sentença, esta padece de nulidade, nos termos e para os efeitos do art°. 615°, n° l, alínea d), do CPC, ex vi, art°. 2°, e), do CPPT, dado que, não se pronunciou sobre as questões vindas de...
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