Acórdão nº 05275/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO SILVESTRE
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: RELATÓRIO F. ........ – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, LDA instaurou no TAF de Sintra acção administrativa comum contra a CÂMARA MUNICIPAL DA AMADORA com vista a obter a condenação desta a pagar-lhe “a quantia de € 23.239,31, devida pelos trabalhos efectuados a que correspondem as facturas em dívida, acrescida de juros de mora vencidos, calculados em 21/07/2006, em € 10.911,74, vincendos à taxa legal comercial até integral pagamento”; formula ainda, a título subsidiário, o pedido de condenação da ré “por enriquecimento sem causa nos termos do art. 473º do Código Civil e na obrigação de entregar à A. a quantia de € 23.239,31, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal comercial até integral pagamento”.

Por apenso aos presentes autos correu termos o incidente de habilitação de cessionária de Isaura ……….........., a qual foi julgada habilitada a prosseguir a presente acção em lugar da autora.

Em 5/12/2008 foi proferida sentença, que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a ré a pagar à habilitada a quantia de € 14.664,45, acrescida dos juros legais desde 2/06/2004, absolvendo-a dos demais pedidos.

Inconformada, a ré interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: “I. A douta sentença recorrida, condena a entidade demandada a pagar à habilitada da autora a quantia em questão, apenas com fundamento no facto de a autora ter solicitado a retenção da quantia em questão nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 267º do DL 59/99, e que como tal a entidade demandada não podia desconhecer, aquando da celebração do acordo de resolução convencional e do acordo com a comissão liquidatária, que a autora lhe havia exigido a retenção de importâncias relativas a trabalhos por si realizados ao empreiteiro C..............., SA.

  1. Não tendo o dono da obra efectuado a retenção do montante em questão, e não existindo qualquer vínculo contratual entre a entidade demandada e a autora, apenas restaria à autora accionar o Município no âmbito do instituto da responsabilidade civil extra-contratual.

  2. O art. 267º, n.º 1 do DL n.º 59/99, de 2 de Março, constitui apenas uma faculdade do dono da obra de exercer o direito de retenção de quantias do mesmo montante devidas ao empreiteiro e decorrentes do contrato de empreitada de obras públicas e não uma imposição legal.

  3. A decisão de condenação da entidade demandada carece em absoluto de qualquer suporte, já que não esclarece a que título foi o Município da Amadora condenado.

  4. A douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento na medida em que faz uma errada interpretação e aplicação do artigo 267º do Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas, carecendo em absoluto de fundamento a condenação do Município a pagar o montante em questão.” A autora apresentou contra-alegações e, simultaneamente, recurso subordinado da parte da decisão que lhe foi desfavorável.

Com referência às contra-alegações, formulou as seguintes conclusões: “1ª A douta sentença recorrida não se mostra inquinada do vício de erro de julgamento, tal como o mesmo é alegado pelo Município da Amadora, ora alegante/recorrente; 2ª Ao contrário do que defende o Município da Amadora nas suas alegações, o art. 267º do Decreto Lei de 59/99, de 2 de Março, foi bem interpretado pelo tribunal a quo, salvo no tocante a retirarem-se dessa interpretação todos os efeitos ou consequências como se apontará em sede de recurso subordinado; 3ª A responsabilidade da recorrente resulta exactamente da sua obrigação de responder perante os subempreiteiros pelos pagamentos em falta e ainda pelos acordos/declarações de dívida que produziu tanto perante o empreiteiro como perante os subempreiteiros; 4ª A retenção não é um poder discricionário nem o regime instituído nesse art. 267º pode ser afastado por vontade da recorrente/ente público; 5ª É um poder/dever, sendo a entidade pública obrigada a fazer a retenção das quantias/preço da empreitada logo que se verifique o incumprimento pelo empreiteiro das responsabilidades perante os subempreiteiros, sob pena de, se não fizer, responder pelas dívidas da obra; 6ª Ao ter prescindido das garantias bancárias sem ter assegurado o pagamento dos subempreiteiros, a recorrente actuou em puro abuso de direito da sua posição jurídica, prescindindo das garantias bancárias num contrato incumprido, resolvendo por mútuo acordo o mesmo por julgar-se compensada, tudo com violação da obrigação de pagamento aos subempreiteiros nos termos e para os efeitos do citado art. 267º do DL 55/99 de 22 de Maio.” No que concerne ao recurso subordinado, a autora concluiu do seguinte modo: “1ª A decisão recorrida não aplicou em toda a sua plenitude o art. 267º do Decreto Lei 59/99, de 22 de Março, à factualidade provada, podendo e devendo fazê-lo na medida em que esta permitia-lhe/permite-lhe concluir diversamente; 2ª Existe matéria de facto suficiente para sustentar a condenação do R. na totalidade dos pedidos; 3ª Ao absolver o R. do pagamento das facturas, que totalizam o montante de € 8.574,86, a decisão recorrida não só fez uma interpretação restrita do citado art. 267º como, mais grave, ainda entendeu não haver lugar ao enriquecimento sem causa regulado no art. 473º e ss do Código Civil, instituto que foi invocado subsidiariamente pela A., erros estes que importa corrigir em sede de recurso; 4ª A decisão recorrida deverá ser substituída por outra que julgue totalmente provada a acção e em consequência condene o R. no pagamento à A. da quantia de € 23.239,31 correspondente ao total dos créditos resultantes dos trabalhos por si executados no parque escolar daquela, acrescida de juros vencidos e vincendos à taxa de juros comerciais desde a data da mora do devedor; 5ª A recorrente não pagou nem quer pagar o custo que esses trabalhos de construção representaram para a recorrida, mas já os integrou no seu património, dando-lhe uso sem que tenha efectuado o correlativo pagamento do preço, tudo sem causa justificativa; 6ª A recorrente está enriquecida no exacto montante em que a recorrida está empobrecida; 7ª O princípio geral do enriquecimento sem causa consta no artigo 473º do Código Civil, segundo o qual, por um lado, aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem, é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou e, por outro, que a obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que se não verificou; 8ª Subsidiariamente, a recorrente deve ser condenada por enriquecimento sem causa nos termos do art. 473º do Código Civil e, consequentemente, condenada a pagar à A. a quantia de € 23.239,31, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal comercial até integral pagamento, o que desde já se requer.” A ré não apresentou contra-alegações com referência ao recurso subordinado interposto pela autora.

O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não se pronunciou sobre o mérito do recurso.

* As questões a decidir no presente recurso – delimitadas pelas conclusões das alegações [cfr. artigos 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 do CPC ex vi artigo 140º do CPTA] – são as seguintes: (i) Recursos da autora e da ré: erro de julgamento por violação do artigo 267º, n.º 1 do Decreto-lei n.º 59/99, de 2/03; (ii) Recurso da autora: erro de julgamento por violação do disposto no artigo 473º do Código Civil.

* Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

FUNDAMENTAÇÃO 1.

Matéria de facto O Tribunal a quo deu como assente a seguinte matéria de facto: A) A Sociedade C……….. – Empreiteiros, S.A, celebrou com a F. B…………. – Sociedade de ……….., S.A. dois contratos de subempreitada para execução de obras de construção civil de reabilitação de quatro escolas primárias e pré-escolares no concelho de Amadora, designados de “Adjudicação ………../296/01-FG/SN e Adjudicação ………../296/01-FG/JC – cfr. doc. 1 a 3 juntos à p.i.; B) O preço global da subempreitada foi de Esc. 25.156.101, equivalente a €125.478,10, a pagar de forma faseada, correspondendo cada fase do pagamento aos autos de medição dos trabalhos a cargo das partes – acordo e doc. 1 a 3 juntos à p.i.; C) O dono da obra era o Município da Amadora – acordo; D) Com data de 21.02.2002 a Autora dirigiu ao Presidente da Câmara Municipal da Amadora o ofício, sob o Assunto: Obra 296 – Reabilitação de 4 (quatro) escolas Primárias e Pré-Escolares Amadora, com o seguinte teor: “F. ……… – Sociedade de …………., Ld.ª (…), vem, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 267º do DL 55/99, de 22 de Março (….), comunicar a V. Exª, na qualidade de subempreiteiro da sociedade C………..– E……..S.A, com sede na Rua ………….., lotes 1 e 2, 2795-619 Carnaxide, que, relativamente à obra identificada em epígrafe, lhe é devida a quantia de Esc.3.679.33 (três milhões seiscentos e setenta e nove mil novecentos e trinta e três escudos), titulada pela factura 0734 e parte da factura nº 0732 cujas cópias se juntam. O referido crédito encontra-se já vencido, não tendo, todavia, sido pago até à data.

Nestes termos, requer a V. Exª ao abrigo do disposto no art. 267º do DL 55/99, de 22 de Março, se digne mandar proceder à retenção das quantias em dívida, até integral regularização dos montantes devidos à reclamante e decorrentes do aludido contrato.” – acordo e cfr. doc. 13 junto à p.i.; E) Por deliberação da Câmara Municipal da Amadora, tomada em reunião de 05.06.2002, foi aprovada (proposta nº 225/2002, do Presidente da CM Amadora), a Minuta de Resolução Convencional do Contrato de Empreitada por Mútuo Acordo, relativa à Reabilitação de 4 escolas e pré-escolar pertencentes à freguesia da Brandoa (E.B.Brandoa 2 e Brandoa 3), à freguesia da Buraca (E.B.Buraca) e à freguesia da Reboleira (E.B. Reboleira 2) – cfr...

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